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5 de Maio de 2024

STJ Fev 23 - Nulidade do Acórdão - fundamentação per relationem

ano passado

Decisão Monocrática

HABEAS CORPUS Nº 699148 - RS (2021/0323522-9)

RELATOR : MINISTRO ROGERIO SCHIETTI CRUZ


DECISÃO

GISELE SANTOS DA SILVA e LUCAS DE BARROS COSTA alegam ser vítimas de coação ilegal em decorrência de acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul , que negou provimento à Apelação Criminal n. 70084679968 (CNJ n. 0106355-29.2020.8.21.7000).

Consta dos autos que a paciente Gisele foi condenada pela prática do crime previsto no art. 33, caput , da Lei n. 11.343/2006; e o paciente Lucas, pelo cometimento dos delitos descritos nos arts. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006 e 14, caput, da Lei n. 10.826/2003.

A defesa aduz, em síntese, que "o voto do Relator não enfrentou as razões do recurso, uma vez que, ao lhe negar provimento, utilizou-se exclusivamente dos fundamentos do parecer ministerial" (fl. 4). Assim, afirma que "o acórdão exarado, porque desvinculado de elementos próprios, é incapaz de justificar a manutenção da decisão proferida pelo juízo originário" (fl. 20).

Requer, diante disso, a concessão da ordem, "para o fim de sanar a ilegalidade constante do acórdão proferido pela 1a Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul" (fl. 23).

Depois de as informações haverem sido prestadas, o Ministério Público Federal manifestou-se pelo não conhecimento do habeas corpus e, caso conhecido, pela denegação da ordem.

Decido.

O Tribunal de origem, ao negar provimento ao recurso de apelação interposto pela defesa, assim fundamentou (fls. 30-60, destaquei):

Os recursos são tempestivos e preenchem os demais pressupostos de admissibilidade, daí por que são conhecidos.

E, porque adequadamente os examinou, de forma idêntica à que eu faria, assim como a fim de evitar inútil tautologia e em homenagem ao seu Procurador de Justiça que oficiou no feito, Dr. Ivory Coelho Neto, que passo a transcrever parcialmente, a título ilustrativo:

[...]

Como se viu, a enorme quantidade de entorpecentes apreendida, aliada às denúncias recebidas pela Polícia, não deixa qualquer dúvida acerca da ocorrência do comércio hediondo. E, havendo a apreensão de uma arma de fogo com o réu, necessária é a manutenção da condenação pelo delito de armas, tendo em vista que não existe nos autos nenhum indício de que o artefato bélico era utilizado apenas com o fim de facilitar/garantir a prática do narcotráfico.

Quanto ao apenamento, mostrou-se, para ambos os condenados, até insuficiente à repressão e à prevenção dos fatos em estudo - em razão da quantidade, diversidade e natureza das substâncias tóxicas -, assim como levando em consideração o histórico criminal do denunciado.

Portanto, nenhuma alteração há de ser feita na decisão de primeiro grau.

Ante o exposto, AFASTO AS PRELIMINARES e NEGO PROVIMENTO aos apelos.

É o voto.

Sobre a matéria posta em discussão, faço o registro de que não desconheço que a jurisprudência desta Corte e do Supremo Tribunal Federal assinalam que a fundamentação per relationem constitui motivação válida e não ofende o dever de motivação das decisões judiciais ( Inq. 2.725/SP , Rel. Ministro Teori Zavascki, 2a T./STF, DJe 30/9/2015; AgRg no AI n. 738.982/PR , Rel. Ministro Joaquim Barbosa, 2a T./STF, DJe 19/6/2012; AgRg na ADI n. 416/ES , Rel. Ministro Celso de Mello, Tribunal Pleno/STF, DJe 3/11/2014; AgRg no AREsp n. 431.316/RJ , Rel. Ministro Felix Fischer, 5a T., DJe 16/2/2018; HC n. 355.914/MS , Ministro Antonio Saldanha Palheiro, 6a T., DJe 14/12/2017).

Todavia, não é admissível que as razões de decidir do acórdão se baseiem, exclusivamente, na remissão à decisão proferida em primeiro grau ou ao parecer ministerial, sem que haja a mínima menção, com argumentos próprios, às questões tratadas no recurso de apelação.

A motivação dos atos jurisdicionais não se limita à mera condição formal de validade do ato, mas ao contrário, serve como parâmetro de controle das partes sobre a atividade intelectual do julgador, a fim de possibilitar o exame do acerto ou do desacerto de todos os pontos relevantes que foram utilizados em confronto com as provas produzidas.

Despiciendo dizer que esse dever de motivação se acentua ainda mais no julgamento do recurso de apelação criminal , por ser este o momento crucial e definitivo quanto ao reexame do material cognitivo, sobre o qual será traçado o destino do acusado diante da atividade persecutória do Estado. Nessa perspectiva, considero passível de anulação o acórdão que se limita, apenas, a transcrever o parecer do Ministério Público ou a sentença de primeiro grau.

A propósito, a jurisprudência deste Superior Tribunal, a partir do julgamento do HC n. 216.659/SP , pela Terceira Seção (DJe 1/7/2016), consolidou o entendimento de que "é válida a utilização de fundamentação per relationem que faça referência à sentença penal condenatória proferida pelo Juízo de primeiro grau ou à manifestação ministerial, desde que esse não seja o único fundamento adotado pelo Tribunal" ( HC n. 426.170/RS, Rel. Ministro Ribeiro Dantas , 5a T., DJe 16/2/2018, grifei).

Assim, a admissão da motivação per relationem, embora aceitável, não

prescinde de "um mínimo de fundamentos" próprios ( AgRg no HC n. 416.956/SC , Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, 6a T., DJe 15/12/2017).

No caso dos autos, verifico que o voto condutor do acórdão impugnado, ao analisar o recurso de apelação interposto pela defesa, basicamente se limitou a fazer referência ao parecer lavrado pela Procuradoria de Justiça , sem acrescentar praticamente nenhum fundamento pelo qual aderia àquela conclusão: das 30 páginas nas quais foram descritas as razões de decidir, em apenas uma o Tribunal de origem afirmou que deveria ser mantida a condenação dos réus, bem como o apenamento a eles imposto, a evidenciar a nulidade do acórdão, por ausência de fundamentação.

À vista do exposto, com fundamento no art. 34, XX, do RISTJ, concedo a ordem , a fim de anular o acórdão proferido nos autos da Apelação Criminal n. 70084679968 (CNJ n. 0106355-29.2020.8.21.7000), para que outro seja proferido, dessa vez com o devido exame das matérias arguidas pela defesa, nos termos acima expostos.

Comunique-se, com urgência, o teor desta decisão às instâncias ordinárias, para as providências cabíveis.

Publique-se e intimem-se.

Brasília (DF), 15 de fevereiro de 2023.

Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ

Relator

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(STJ - HC: 699148 RS 2021/0323522-9, Relator: Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, Data de Publicação: DJ 16/02/2023)

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