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26 de Maio de 2024
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    STJ trata da multa diária quanto ao descumprimento de ordem de depósito judicial

    há 14 anos

    DECISAO (www.stj.jus.br)

    STJ reduz multa diária por descumprimento de depósito judicial de R$ 50 mil para R$ 3 mil

    O Banco Société Générale Brasil S/A continua obrigado a depositar em juízo uma fiança equivalente a US$ 76.850,35. O valor corresponde a dívidas do navio MV American Energy com a Container and Cargo Services International Inc, em razão do não pagamento do fornecimento de óleos e lubrificantes. O navio só foi autorizado a deixar o Brasil porque o banco afiançou a dívida. A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve a obrigação do depósito, mas reduziu o valor da multa diária pelo descumprimento da decisão de R$ 50 mil para R$ 3 mil.

    A determinação para que o banco efetuasse o depósito judicial ocorreu no julgamento de ação cautelar movida pela empresa fornecedora de óleos. A ação foi proposta antes do vencimento do prazo da fiança. A liminar foi deferida em primeira instância e confirmada pelo Tribunal de Justiça do Paraná. No recurso ao STJ, o banco alegou que o acórdão do tribunal estadual seria nulo e que seria inadmissível a fixação de multa pecuniária nas demandas que tenham como objeto o cumprimento de obrigação em dinheiro.

    O relator, ministro Aldir Passarinho Junior, considerou que o acórdão não era nulo, pois estava suficientemente fundamentado, e solucionou as questões essenciais para esclarecimento da controvérsia. Ele também ressaltou que a ação cautelar tem o objetivo de assegurar a eficácia da fiança prestada para liberação do navio, cuja dívida foi reconhecida por sentença proferida em outra demanda. Como o navio, ante a prestação da fiança, foi liberado para partir, e a dita garantia se achava próxima de expirar, foi requerido o depósito judicial do valor respectivo para facilitar a futura execução do julgado, afirmou o relator, no voto.

    Nesse contexto, em razão da peculiaridade do caso o ministro Aldir Passarinho Junior entendeu ser cabível a ordem judicial de depósito do valor da fiança, da forma como foi justificada. O relator ressaltou ainda que a importância depositada não é de valor tão elevado a dificultar as operações de um banco.

    Contudo, o relator considerou o valor de R$ 50 mil, fixado como multa diária em caso de recusa ao depósito do valor da fiança, extremamente elevado e incompatível com o montante da fiança. Assim, o recurso especial foi parcialmente provido para reduzir o valor da multa diária para RS 3 mil. A decisão foi unânime.

    NOTAS DA REDAÇAO

    Na decisão em comento, o STJ trata a respeito de dois interessantes institutos de direito civil: a fiança e o depósito, na modalidade judicial. Vejamos.

    A fiança consiste em garantia de natureza pessoal que tem por objetivo assegurar uma obrigação, fundada na confiança que se extrai da pessoa do garantidor ou fiador.

    Veja-se que a fiança, como obrigação acessória que é tem por finalidade tão somente assegurar que a obrigação principal, que é a desejada a ser adimplida, venha de fato a ser cumprida pelo devedor.

    O depósito judicial, por sua vez, é um tipo de depósito necessário, e existe como um meio para a efetivação da tutela jurisdicional, a fim de que o processo realize a função social de proporcionar, tanto quanto possível, tudo o que a parte espera conseguir pela realização do direito. Em outras palavras o que se pretende ao bater às portas do Judiciário é obter a satisfação não adquirida voluntariamente, conforme pactuado entre as partes. Assim, tem-se que contas correntes para fins de depósito judicial serão fiscalizadas pelo próprio Poder Judiciário.

    O depósito judicial, tal qual o feito nos autos, não cria entre o depositante e o depositário nenhum tipo de relação jurídica de caráter privado, é relação essencialmente pública, já que é ato judicial e não contratual, muito diferente dos depósitos bancários comuns, depósitos de poupança e afins.

    Discutiu-se se o depósito judicial consubstanciaria um contrato de mútuo, mas decidiu a Corte Superior que não:

    Não se aplica ao depósito judicial o regime civil do contrato de depósito de bens fungíveis. No depósito judicial, o depositário representa a longa manus do juízo da execução, seu auxiliar e órgão do processo executório, com poderes e deveres próprios no exercício de suas atribuições", (José Frederico Marques) cumprindo-lhe, no exercício do mister, guardar e conservar os bens apreendidos, estando sempre pronto a apresentá-los em juízo. (STJ, 2ª Turma, AGRHC 30045, Relator: Min. João Otávio de Noronha, j. 26.8.2003) .

    A regra insculpida no art. 1.280 do Código Civil [1] não se aplica à espécie dos autos, pois a obrigação em apresentar o bem penhorado ou seu equivalente em dinheiro não é oriunda de contrato, mas, sim, do cumprimento de um munus público confiado ao depositário do juízo. Demonstrado o rompimento da relação de fidelidade estabelecida entre o órgão judicante e o depositário, não há falar em ilegalidade na decisão que determinou a apresentação do bem. (STJ, 2ª Turma, HC 20066, Relator: Min. Franciulli Neto, j. 16.04.2002) .

    Voltando à decisão em comento, tem-se que a dívida já declarada em sentença, passou a fase de seu cumprimento. Nesse sentido, foi requerido então ao juízo que permitisse que o navio fosse movido do território brasileiro dando em contrapartida garantia da coisa litigiosa em razão de processo judicial.

    Dessa feita, interpôs-se o recurso especial com a finalidade de discutir se caberia multa diária, decretada na importância de R$ 50.000,00 em uma ação cuja obrigação tutelada consistia em obrigação de pagar dinheiro. Discutiu-se inclusive que o acórdão proferido pelo Tribunal a quo era nulo.

    No caso em tela, restou afastada as teses de nulidade pelo STJ. Entendeu-se então que o depósito judicial culminado em razão do processo era devido, cabendo inclusive a imposição de multa diária, que deveria ser minorada em razão da sua finalidade.

    Lembramos, por oportuno, que a finalidade de cominação de multa diária decorre do objetivo judicial de viabilizar que o que é devido, seja satisfeito ao credor da obrigação da forma mais efetiva possível. Daí permitir o ordenamento que seja fixado multa diária, as denominadas astreintes . Compreende de fato, uma medida que tem por natureza constranger o devedor da obrigação a adimpli-la.

    É de pasmar alegar-se a inaplicabilidade de imposição de multa diária no tocante à execução de obrigação de pagar quantia certa, tendo em vista que objetivando penalizar aquele que dificulta ou retarda cumprimento de obrigação, o próprio ordenamento no tocante a fase satisfativa do processo comum, hoje denominado fase do cumprimento de sentença, atribui penalidade àquele que deixa de cumprir a ordem judicial voluntariamente, no prazo assinalado em lei.

    Lembramos ainda que o CPC em seu art. 461 permite o uso do instrumento da multa diária, desde que compatível com a obrigação:

    Art. 461 - Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou, se procedente o pedido, determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento.

    1º - A obrigação somente se converterá em perdas e danos se o autor o requerer ou se impossível a tutela específica ou a obtenção do resultado prático correspondente.

    2º - A indenização por perdas e danos dar-se-á sem prejuízo da multa (art. 287).

    3º - Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo justificado receio de ineficácia do provimento final, é lícito ao juiz conceder a tutela liminarmente ou mediante justificação prévia, citado o réu. A medida liminar poderá ser revogada ou modificada, a qualquer tempo, em decisão fundamentada.

    4º - O juiz poderá, na hipótese do parágrafo anterior ou na sentença, impor multa diária ao réu, independentemente de pedido do autor, se for suficiente ou compatível com a obrigação, fixando-lhe prazo razoável para o cumprimento do preceito.

    5º - Para a efetivação da tutela específica ou a obtenção do resultado prático equivalente, poderá o juiz, de ofício ou a requerimento, determinar as medidas necessárias, tais como a imposição de multa por tempo de atraso, busca e apreensão, remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obras e impedimento de atividade nociva, se necessário com requisição de força policial.

    6º - O juiz poderá, de ofício, modificar o valor ou a periodicidade da multa, caso verifique que se tornou insuficiente ou excessiva.

    O que deve ser o parâmetro da multa então é o valor da obrigação principal, não podendo excedê-lo.

    Art. 412, CC. O valor da cominação imposta na cláusula penal não pode exceder o da obrigação principal.

    A finalidade não é a de levar o devedor a bancarrota, mas de persuadi-lo a cumprir o que pactuou. Espoliar o devedor não pode ser a máxima dessa medida. Afinal, não pode deixar de ser conferido ao mesmo a ampla defesa, o contraditório, dentre as garantias tuteladas por nossa Carta Política. Ademais, não é instrumento que deve viabilizar o enriquecimento ilícito, e sim meio coercitivo para se chegar ao resultado almejado, a satisfação do crédito. A finalidade é exclusivamente garantir a efetivação da tutela específica.

    Desse raciocínio é que resultam decisões como a que comentamos nesse momento, em que a Corte Superior diminui o valor vultoso de multas e por vezes de indenizações, que se prestam na maioria das vezes ao esbulho patrimonial do devedor, ao invés de garantir que o processo viabilize o que é almejado através dele: a satisfação da obrigação contraída.

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