TJMS cassa liminar, desonerando o Estado de fornecer medimento, haja vista não comprovado o periculum in mora nem a hipossuficiência do autor
17.2.2011
Quinta Turma Cível
Agravo - N. - Fátima do Sul.
Relator - Exmo. Sr. Des. Sideni Soncini Pimentel.
Agravante - Estado de Mato Grosso do Sul.
Proc.Est. - Ivanildo da Silva Costa.
Agravado - Guilherme Gratival.
Def.Pub.1ª Inst - Clarence Willians Duccini.
E M E N T A AGRAVO DE INSTRUMENTO AÇAO DE
OBRIGAÇAO DE FAZER ILEGITIMIDADE PASSIVA DO ESTADO
REJEITADA MÉRITO TRATAMENTO DE EPILEPSIA URGÊNCIA E
NECESSIDADE DO FORNECIMENTO GRATUITO DE MEDICAMENTOS
NAO DEMONSTRADAS RECURSO PROVIDO.
1. Ainda que tenham sido estabelecidas normas operacionais para a organização do sistema de saúde, com a distribuição de atribuições entre os entes, tais normas não podem sobrepor-se à responsabilidade dos entes públicos quanto à prestação dos serviços de saúde à população. Daí que não merece prosperar a alegada ilegitimidade passiva sustentada pelo Estado agravante.
2. Não demonstrou a agravante o periculum in mora necessário para a concessão da liminar e nem sequer comprovou a insuficiência de recursos financeiros para aquisição dos medicamentos a suas expensas. Ao menos é o que se verifica em cognição sumária para a análise da liminar, o que não exclui a melhor instrução do feito a permitir que o autor/agravado tenha sucesso ao final da lide. Recurso provido para cassação da liminar.
A C Ó R D A O
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os juízes da Quinta Turma Cível do Tribunal de Justiça, na conformidade da ata de julgamentos e das notas taquigráficas, por unanimidade, rejeitar a preliminar e, no mérito, dar provimento ao recurso, nos termos do voto do relator.
Campo Grande, 17 de fevereiro de 2011.
Des. Sideni Soncini Pimentel Relator
R E L A T Ó R I O
O Sr. Des. Sideni Soncini Pimentel
O Estado de Mato Grosso do Sul agrava da decisão que deferiu tutela antecipada nos autos da Ação de Obrigação de Fazer promovida por Guilherme Gratival, determinando o fornecimento de medicamentos, sob pena de multa diária. Alega que não há comprovação de que houve recusa no fornecimento dos fármacos; que é parte ilegítima
para figurar no pólo passivo, pois os remédios pretendidos são fornecidos gratuitamente
pelo Município; que o médico do agravado não se encontra cadastrado no Sistema Único de Saúde; que não é admitida por lei a concessão de tutela antecipada de caráter satisfativo em face do poder público; que não é possível a fixação de multa cominatória. Pugnou pela concessão do efeito suspensivo e, ao final, pelo provimento do recurso, revogando-se a tutela antecipatória, ou o afastamento da multa cominada.
Recebido o recurso no efeito devolutivo, o agravado apresentou resposta requerendo a manutenção da decisão agravada (f. 59/67), enquanto que o juiz da causa prestou informações à f. 56. V O T O
O Sr. Des. Sideni Soncini Pimentel (Relator)
Trata-se de agravo de instrumento interposto pelo Estado de Mato Grosso do Sul em face de Guilherme Gratival, objetivando a reforma da decisão que concedeu a antecipação de tutela nos autos da Ação de Obrigação de Fazer, e determinou o fornecimento da medicação pleiteada pelo agravado.
Preliminar - Ilegitimidade Passiva
Em que pesem os argumentos expedindos pelo agravante, a Constituição Federal, no capítulo atinente aos direitos e garantias fundamentais, assegura a inviolabilidade do direito à vida (art. 5º, caput ), dispondo, ainda, no art. 196, ser a saúde direito de todos e dever do Estado, garantindo a todos o acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação. Além disso, já se pronunciou o Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que:
.....é da competência solidária entre a União, os Estados, o Distrito
Federal e os Municípios a responsabilidade pela prestação do serviço de saúde à
população, sendo o Sistema Único de Saúde composto pelos referidos entes,
conforme pode se depreender do disposto nos arts. 196 e 198, 1º, da Constituição Federal, concluindo, mutatis mutandis, o seguinte: De fato, como
bem registrado, a CF/1988 erige a saúde como um direito de todos e dever do
Estado (art. 196). Daí, a seguinte conclusão: é obrigação do Estado, no sentido
genérico (União, Estados, Distrito Federal e Municípios), assegurar às pessoas
desprovidas de recursos financeiros o acesso à medicação necessária para a cura
de suas mazelas, em especial, as mais graves. Sendo o SUS composto pela União,
Estados e Municípios, impõe-se a solidariedade dos três entes federativos no pólo
passivo da demanda. (AgRg no Agravo de Instrumento 858.899 Rel. Min. José
Delgado 1ª T. J. 26.6.2007).
Portanto, ainda que tenham sido estabelecidas normas operacionais para a organização do sistema de saúde, com a distribuição de atribuições entre os entes, tais normas não podem sobrepor-se à responsabilidade dos entes públicos quanto à prestação dos serviços de saúde à população. Daí que não merece prosperar a alegada ilegitimidade passiva sustentada pelo ora agravante.
Mérito
Para a concessão da tutela antecipada, necessários os seguintes requisitos (CPC, art. 273):
a) prova inequívoca da verossimilhança do direito alegado;
b) requisitos alternativos: fundado receio de dano irreparável ou de
difícil reparação; ou abuso de direito de defesa; ou manifesto propósito
protelatório do réu;
c) inexistência de risco de irreversibilidade do provimento
antecipado.
Ou, ainda, em se tratando de pedidos cumulados:
d) ausência de controvérsia sobre um ou mais pedidos cumulados, ou parcela destes.
No caso em julgamento, à vista desses requisitos, entendo que, não obstante haja declaração médica acerca da enfermidade que acomete o agravado (HD G 40.2 - epilepsia), com afirmação de que o uso da medicação deve ser contínuo, o que atenderia ao requisito da convicção exigida pela lei, entendo que, por outro lado, não se faz presente o requisito atinente ao fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação.
Explico:
Analisando os autos, percebe-se que é fato incontroverso que o agravado apresenta patologia orgânica cerebral. No entanto, os documentos apresentados pelo agravado não esclarecem a finalidade e a urgência dos fármacos que lhe foram indicados. Cabia ao agravado fornecer elementos substanciais que justificassem a urgência do medicamento, demonstrando ao menos qual seria o risco de se aguardar o final da demanda, com o julgamento do mérito.
Frise-se que o fato do agravado necessitar do uso contínuo da medicação não justifica, por si só, a antecipação da tutela. Não fosse assim, em toda e qualquer situação de necessidade de medicamento a tutela de urgência seria sempre um imperativo, porque a saúde da pleiteante nesses casos sempre estará comprometida.
Não se discute o direito do cidadão a uma vida saudável, nem o dever do Estado em garantir o acesso universal à saúde. Todavia, a justificativa apresentada pelo agravado, mais precisamente no que diz respeito ao perigo da demora, se limita ao fato do atestado médico indicar o tratamento, mas sem mencionar o risco na demora de sua administração.
Mister ressalvar ainda que não há nem mesmo informação de qual seria a renda mensal auferida pelo agravado e que demonstre que o custo mensal de R$ 116,71 (f. 14/15) impossibilita a aquisição por via própria. Outrossim, apesar do tratamento por meio do SUS não ser condição sine qua non para a concessão da tutela, na falta de outros elementos de prova quanto a condição econômica do paciente, demonstraria que este não possui condições financeiras de arcar com os custos de seus tratamento. Porém, nestes autos embora o agravado esteja sendo assistido pela Defensoria Pública, realiza seu tratamento com médico particular.
Cumpre ressaltar, por fim, que não obstante o direito à saúde, o tratamento a ser disponibilizado não deve ficar ao livre arbítrio do paciente ou de determinado profissional da área médica, sem que para tanto se demonstre ser o único meio ou o mais indicado para o tratamento da enfermidade.
Portanto, o fato de a agravante necessitar do uso contínuo da medicação não justifica, por si só, a antecipação da tutela, apesar do alegado comprometimento de seu estado de saúde, sob pena de onerar-se em demasia o Estado, compelindo-o a arcar, desnecessariamente, com o fornecimento de medicamento. Ao menos é o que se verifica
em cognição sumária para a análise da liminar, o que não exclui a melhor instrução do feito a permitir que o autor tenha sucesso ao final da lide.
Posto isso, por absoluta insuficiência de provas inequívocas que possibilitem aferir a verossimilhança das alegações do autor/agravado, conheço do presente recurso de agravo de instrumento e dou-lhe provimento para cassar a liminar concedida em primeira instância.
D E C I S A O
Como consta na ata, a decisão foi a seguinte:
POR UNANIMIDADE, REJEITARAM A PRELIMINAR E, NO
MÉRITO, DERAM PROVIMENTO AO RECURSO, NOS TERMOS DO VOTO DO
RELATOR.
Presidência do Exmo. Sr. Des. Luiz Tadeu Barbosa Silva.
Relator, o Exmo. Sr. Des. Sideni Soncini Pimentel.
Tomaram parte no julgamento os Exmos. Srs. Desembargadores Sideni
Soncini Pimentel, Vladimir Abreu da Silva e Luiz Tadeu Barbosa Silva.
Campo Grande, 17 de fevereiro de 2011.
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