Página 886 da Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte III do Diário de Justiça do Estado de São Paulo (DJSP) de 26 de Setembro de 2016

desdobramentos do contrato e da sua dissolução (inteligência do artigo 45 do Código Civil). Irrelevante, em termos de atribuição de responsabilidade, o fato do nome da pessoa jurídica ter constado de alguns dos e-mails que teriam sido trocados entre os demais litigantes, pois tal situação apenas teria o condão de gerar a responsabilidade daqueles que indevidamente se utilizaram do nome dela antes da sua formal constituição (artigos 988, 989 e 990, ambos do Código Civil) e não de antecipar-lhe o nascimento. Nesse sentir já se pronunciou a jurisprudência:”Ação de cobrança de comissão por corretagem. Autora que intermediou a compra e venda de prédio para a União, tratando com os seis proprietários, pessoas físicas. Demanda dirigida contra pessoa jurídica constituída posteriormente às propostas dos autos e por três daqueles proprietários. Evidente ilegitimidade passiva, eis que a pessoa jurídica tem existência distinta da dos seus membros e sequer existia quando da celebração do negócio. Sentença confirmada de extinção por ilegitimidade passiva. Apelação não provida” (TJSP Apelação n. 000XXXX-19.2011.8.26.0564 36ª Câmara de Direito Privado Relator: Romeu Ricupero j. 16/02/12).Quanto à multa prevista no item ‘d’ do parágrafo primeiro da cláusula terceira, passível também de aplicação em desfavor do vendedor, uma vez pretendendo a autora a dissolução do contrato não há como ser admitida a cobrança da citada penalidade, que serve como verdadeiro instrumento cominatório, destinando-se, também, a constranger o devedor ao cumprimento da obrigação originariamente inadimplida. Com efeito, não mais interessando à autora, credora da obrigação, a satisfação dela, figura incoerente sob o ponto de vista lógico que se assegure a ela o pagamento de multa que visa justamente compelir o devedor, pelo temor da sanção, ao cumprimento da prestação a ele atribuível.Sobreleva destacar, por outro lado, que a admissão da cobrança da multa moratória em hipóteses como a dos autos importaria em odioso bis in idem, eis que justamente com base no inadimplemento do (s) vendedor (s) está sendo assegurado à adquirente o pagamento da multa compensatória, suficiente para o ressarcimento dos prejuízos advindos do rompimento do contrato.Não há falar, por fim, em lesão moral indenizável.Afinal, a frustração da expectativa gerada pela contratação, isoladamente considerada, não revela magnitude bastante para ocasionar sofrimento digno de vulto, apto a romper, de forma duradoura, com o equilíbrio psicológico e/ou com o bem-estar emocional, afetando a dignidade individual. Tal situação, a meu sentir, embora evidentemente não seja desejada por aquele que a vivencia, não consubstancia grave lesão aos direitos da personalidade, representando, no mais das vezes, dissabor ou aborrecimento desprovido de maior intensidade, imprestável, como regra, para caracterização dos propalados danos extrapatrimoniais, conceituados por Sérgio Cavalieri como a “dor, vexame, sofrimento ou humilhação que, fugindo à normalidade, interfira intensamente no comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe aflições, angústia e desequilíbrio em seu bem-estar” (Programa de Responsabilidade Civil, 2ª edição, São Paulo, Malheiros, Ed., p. 78). A propósito, confira-se o seguinte precedente:”Empreendimento imobiliário promovido por cooperativa habitacional. Indenizatória por danos materiais e morais, acionada por cooperado desistente. Sentença de procedência em parte, com acolhimento dos pedidos restitutório de quantia paga (na proporção de dois terços dos montantes pagos) e de dano moral. Apelação pela ré. Dano moral. Afastamento. Não ofensa à esfera psicológica da autora. Margem de relativa previsibilidade de inexecução dos negócios jurídicos. Mantida a forma de devolução das parcelas pagas, em prestação única e imediata. Sucumbência recíproca. Recurso provido em parte. Apelação adesiva da autora. Prejudicada apreciação de majoração do montante indenizatório a título de dano moral. Elevação da porcentagem a ser devolvida para o parâmetro de 90% (noventa por cento) das parcelas pagas. Retenção suficiente à cobertura de custos de administração e operação do empreendimento. Sentença mantida. Recurso provido em parte” (TJSP Apelação nº 994030454428 9ª Câmara de Direito Privado

Relator: Des. Piva Rodrigues j. 18/05/10).Pertinentes, aqui, as colocações lançadas no julgamento do Resp n. 876.527/RJ, citado na ementa do julgamento do AgRg no AREsp n. 287870/SE, ambos do Superior Tribunal de Justiça:”O inadimplemento de contrato, por si só, não acarreta dano moral, que pressupõe ofensa anormal à personalidade. É certo que a inobservância de cláusulas contratuais pode gerar frustração na parte inocente, mas não se apresenta como suficiente para produzir dano na esfera íntima do indivíduo, até porque o descumprimento de obrigações contratuais não é de todo imprevisível”.Lembre-se que indenizar significa restabelecer o status quo, não se confundindo tal obrigação, ao menos do ponto de vista ontológico, com a aplicação de uma pena, instituto que por sua natureza deve ficar limitado ao âmbito do Direito Penal. Assim, não se pode conceber a indenização por dano moral unicamente como um instrumento punitivo.No ponto, cumpre trazer à baila a advertência feita por Rui Stoco quanto ao que o renomado jurista chamou de “processo perigoso de exacerbação na pretensão e no estabelecimento do quantum da indenização”, o qual teria se iniciado de acordo com o ilustre Desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo com o advento da atual Carta Magna:”Há, neste momento, um sério risco de o Brasil atingir o nefasto status a que chegaram os Estados Unidos da América, onde todo e qualquer produto contém em sua embalagem advertências (warning) de toda ordem, visando prevenir possíveis ações judiciais que certamente virão.Nesse país, o exagero nas pretensões de quem pede particulares ou consumidores e a perda do senso de equilíbrio e de equidade que devem nortear e orientar (na fixação do valor do dano) aquele a quem se pede, contribuíram decisivamente para estabelecer verdadeira ‘indústria’ das indenizações....Há décadas o magistral Georges Ripert já nos alertava, pedindo cautela na aplicação das regras que exprimem o ideal de Justiça, que não se deve justificar pela sua banalização: ‘Há centenas de anos que uma regra moral precisa criou a civilização ocidental; esta civilização exprime-se no seu direito. Defendendo as regras fundamentais deste direito, impedindo que desapareça esta concepção moral do mundo. Mas estas regras fundamentais não são a expressão dum vago ideal de justiça comum a todos os povos. Não se procure justificá-las banalizando-as e defendendo-as em nome dum ideal comum a todos. Devemos, pelo contrário, mantê-las nos seus severos mandamentos e na sua necessária intransigência’ (A Regra Moral nas Obrigações Civis. Livraria Acadêmica, 1937, p. 7)....”Calha ao estudo a advertência de Maria Celina Bodin de Moraes (Danos à Pessoa Humana. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 3), ao trazer a lume a observação de Tzevtan Todorov em sua obra O Homem Desenraizado, acerca do fenômeno denominado ‘vitimização social’: ‘Aqui podemos somente procurar a responsabilidade dos outros por aquilo que não vai bem na vida. Se meu filho cai na rua, a culpa é da cidade, que não fez calçadas planas o suficiente; se corto o dedo cortando a grama, a culpa é do fabricante de grama. Se não sou feliz hoje, a culpa é dos meus pais no passado, de minha sociedade no presente, eles não fizeram o necessário para o meu desenvolvimento. A única hesitação que posso ter é saber se para obter a reparação me volto para um advogado ou para um psicoterapeuta; mas, nos dois casos, sou uma pura vítima e minha responsabilidade não é levada em conta” (Tratado de Responsabilidade Civil, 7ª ed., Ed. RT, p. 1728).Oportuno realçar, por outro lado, que a Constituição Federal reconheceu a indenizabilidade do dano moral de forma ampla, não tendo a legislação infraconstitucional o definido. Nesse contexto, cabe ao julgador, inclusive à luz de sua percepção do que ordinariamente acontece, examinar se um determinado acontecimento pode ou não ser qualificado como fonte geradora de lesão moral. Há, portanto, um razoável grau de subjetivismo no processo de avaliação da existência de eventual ofensa moral indenizável.Ante todo o exposto, julgo parcialmente procedente a ação, o que faço para romper o contrato a cujo respeito se debate nos autos, condenando os corréus Alexandre da Silva Paschoalatto e Roseli da Silva Paschoalatto à restituição da totalidade dos valores comprovadamente pagos pela autora, monetariamente atualizados, desde os respectivos desembolsos, pelos índices da Tabela Prática do TJSP, e acrescidos de juros moratórios, estes à razão de 1% ao mês (artigo 406 do CC) e contados a partir da citação (artigo 405 do CC), e da multa à razão de 10%.Em razão da sucumbência recíproca, caberá à autora e aos corréus Alexandre da Silva Paschoalatto e Roseli da Silva Paschoalatto arcar, cada qual, com metade das

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