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26 de Abril de 2024

Peculato e lavagem de dinheiro para financiamento de campanha eleitoral (Info. 570)

há 14 anos

Informativo STF, nº 570

Brasília, 30 de novembro a 4 de dezembro de 2009.

Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua publicação no Diário da Justiça.

PLENÁRIO

Financiamento de Campanha Eleitoral: Peculato e Lavagem de Dinheiro 2

Por vislumbrar indícios de autoria e de materialidade, o Tribunal, por maioria, recebeu denúncia oferecida pelo Procurador-Geral da República contra Senador da República, acusado pela suposta prática dos crimes de peculato (sete vezes) e de lavagem de dinheiro (seis vezes), previstos, respectivamente, no art. 312, , do CP e no art. , V, da Lei 9.613/98. Na espécie, o parlamentar acusado, na condição de Governador do Estado de Minas Gerais, supostamente teria organizado um esquema criminoso de desvio de verbas estatais, colocando em ação mecanismos que permitiriam a ocultação da origem criminosa desses recursos e o financiamento ilícito da sua reeleição. Narra a denúncia que o então Governador teria ordenado a expedição de ofícios à Companhia de Saneamento de Minas Gerais - COPASA, à Companhia Mineradora de Minas Gerais - CEMIG e ao Banco do Estado de Minas Gerais - BEMGE, determinando o patrocínio de evento esportivo, o que implicara a transferência de recursos estatais para determinada empresa de comunicação, responsável pela veiculação publicitária do evento, da qual o então candidato a Vice-Governador fora sócio. Por meio de acordo com os sócios dessa empresa, o parlamentar teria planejado a aplicação dessas verbas na sua campanha de reeleição ao Governo do Estado de Minas Gerais em 1998. Para tanto, e visando à ocultação da origem desses recursos, os sócios da referida empresa de comunicação teriam tomado empréstimos junto a banco, aplicando-os na campanha do parlamentar acusado. Tais empréstimos teriam sido parcialmente liquidados com os recursos públicos que deveriam ser destinados ao evento esportivo v. Informativo 566. Vencidos os Ministros Dias Toffoli, Eros Grau e Gilmar Mendes, Presidente, que rejeitavam a denúncia. Inq 2280/MG, rel. Min. Joaquim Barbosa, 3.12.2009. (Inq-2280) .

NOTAS DA REDAÇAO

Dando continuidade ao julgamento no âmbito do Inq 2280 de Minas Gerais, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, por maioria de votos, entendeu que, no caso, estão presentes indícios suficientes de autoria e materialidade ao recebimento da denúncia oferecida pelo Procurador-Geral da República contra Senador da República, acusado pela suposta prática dos crimes de peculato e lavagem de dinheiro.

Como se sabe, os crimes funcionais são próprios ou impróprios. Os primeiros caracterizam-se pelo fato de que, ausente a condição de servidor público ao autor, o fato torna-se atípico; é o que ocorre, por exemplo, com a prevaricação ( Art. 319 - Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal ), pois somente o servidor pode preencher as exigências desse tipo penal. Os crimes funcionais impróprios, por sua vez, são aqueles nos quais faltando a condição de servidor ao agente, o fato deixa de configurar crime funcional, caracterizando um crime comum como o peculato que, praticado em outro âmbito, pode enquadrar no tipo da apropriação indébita ( Peculato : Art. 312 - Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito próprio ou alheio . Apropriação Indébita : Art. 168 - Apropriar-se de coisa alheia móvel, de que tem a posse ou a detenção. ).

O Código Penal brasileiro apresenta seis modalidades criminosas para o peculato (crime funcional impróprio, como visto), distinguindo-se basicamente em peculato próprio e peculato impróprio. O peculato próprio está previsto no caput do artigo 312 e divide-se em peculato apropriação, na primeira parte, e peculato desvio, previsto na segunda parte do referido caput ( Art. 312 - Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo , - peculato apropriação ou desviá-lo, em proveito próprio ou alheio - peculato desvio - sem grifos no original).

No parágrafo primeiro do mesmo artigo 312 encontra-se o peculato furto com a seguinte redação: 1º - Aplica-se a mesma pena, se o funcionário público, embora não tendo a posse do dinheiro, valor ou bem, o subtrai, ou concorre para que seja subtraído, em proveito próprio ou alheio, valendo-se de facilidade que lhe proporciona a qualidade de funcionário . O peculato culposo previsto no 2º é quarta modalidade de peculato e preconiza: 2º - Se o funcionário concorre culposamente para o crime de outrem .

O Código ainda prevê o peculato estelionato ( Art. 313 - Apropriar-se de dinheiro ou qualquer utilidade que, no exercício do cargo, recebeu por erro de outrem ) e o peculato eletrônico ( Art. 313-A. Inserir ou facilitar, o funcionário autorizado, a inserção de dados falsos, alterar ou excluir indevidamente dados corretos nos sistemas informatizados ou bancos de dados da Administração Pública com o fim de obter vantagem indevida para si ou para outrem ou para causar dano (...) Art. 313-B. Modificar ou alterar, o funcionário, sistema de informações ou programa de informática sem autorização ou solicitação de autoridade competente ).

O presente informativo de jurisprudência faz menção à prática de fato previsto no artigo 312, 2º, ou seja, a denúncia recebida relata hipótese de peculato culposo. Relata, também, a prática de crime de lavagem de capitais.

Citando Março Antonio Barros, Renato Brasileiro ensina que a lavagem de capitais é o método pelo qual uma ou mais pessoas, ou uma ou mais organizações criminosas, processam os ganhos financeiros ou patrimoniais obtidos com determinadas atividades ilícitas. Sendo assim, lavagem de capitais consiste na operação financeira ou transação comercial que visa ocultar ou dissimular a incorporação, transitória ou permanente, na economia ou no sistema financeiro do país, de bens, direitos ou valores que, direta ou indiretamente, são resultado de outros crimes, e a cujo produto ilícito se pretende dar lícita aparência ( Legislação criminal especial , RT, p. 518).

No ordenamento jurídico pátrio, a matéria é regulada pela Lei nº 9.613/98, que no artigo , dispõe:

Art. 1º Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de crime:

(...) V - contra a Administração Pública, inclusive a exigência, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, de qualquer vantagem, como condição ou preço para a prática ou omissão de atos administrativos;

(...)

Pena: reclusão de três a dez anos e multa. (sem grifos no original).

Note-se que o próprio tipo penal em apreço exige a existência de um crime anterior para a consumação do crime de lavagem em espécie. E essa prática anterior se faz necessária exatamente porque é o caráter ilícito dos bens ou valores que dá origem à prática de incorporar, de maneira clandestina, valor ao sistema econômico. Veja-se assim, que o crime antecedente é uma elementar do crime de lavagem, havendo entre as infrações uma relação de acessoriedade. Logo, a ausência de um dos crimes taxativamente previstos no artigo , da Lei 9.613/98, acaba por afastar a própria tipicidade do delito de lavagem, o que, definitivamente não ocorreu no caso em tela.

Como exposto no presente enunciado de informativo do Supremo, a manobra consistente em usar o aparato estatal para facilitar o angario de verbas a financiar uma campanha eleitoral, tipifica o fato no artigo 1º, inciso V, da lei de crimes de lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores.

Por todo o exposto, justifica-se o recebimento da denúncia em comento, pois com esta decisão apenas se procedeu a um juízo de admissibilidade da ação penal, sendo possível que no curso da instrução venham outros elementos a interferir o convencimento do julgador.

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