A internet não é uma "terra" sem lei: a responsabilidade de todos na luta contra o extremismo on-line
Resumo do artigo
A internet revolucionou a forma como vivemos, mas também se tornou um espaço para a propagação de ideias extremistas e perigosas. A liberdade de expressão é fundamental, mas não deve ser usada para justificar a violência ou a disseminação do ódio. É importante lembrar que a Constituição e as leis brasileiras impõem responsabilidades e limites ao uso da internet.
Você já parou para pensar em como a internet mudou completamente a forma como vivemos? Hoje em dia, ela faz parte do nosso cotidiano de todas as maneiras possíveis, e é difícil imaginar um mundo sem ela. Mas será que essa revolução digital só trouxe coisas boas? Infelizmente, não. A internet se tornou “uma terra sem lei", onde “nada” é proibido e o anonimato é"possível". E isso pode levar a consequências graves, como o aumento de ameaças e massacres neonazistas que têm sido vistos recentemente nas redes sociais.
Mas a verdade é que dizer que a internet é uma terra sem lei constitui uma falácia grotesca uma vez que o Marco Civil da Internet (Lei n. 12.965/2014) estabelece princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da rede no Brasil, bem como determina, em seu primeiro artigo, as diretrizes para atuação da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios. É fato que, a Internet permitiu a circulação rápida e irrestrita de informações, reduzindo as barreiras de tempo, tamanho e distância entre as pessoas, fortalecendo ainda mais o fenômeno da globalização, alterando e modificando a linguagem, o comportamento e a cultura, estamos, portanto, adentrando na Sociedade da Informação, em que a informação é vista como dados apresentados dentro de um contexto que torna relevante e útil para as pessoas que o desejam.
Por que isso importa? Recentemente, testemunhamos ameaças e massacres que circularam livremente nas redes sociais, com inúmeros textos, fotos e vídeos celebrando os autores desses ataques e a violência por eles cometida. O algoritmo das redes sociais funciona de forma sincronizada, conectando pessoas com interesses semelhantes, o que pode ser uma excelente maneira de cooptar jovens que tenham o mínimo de interesse no tema, jogando diariamente centenas de informações sobre esse tópico e intensificando o movimento.
A liberdade de expressão é o principal fundamento do uso da internet no Brasil, que inclui a liberdade de informação e de comunicação. Essa é uma garantia prevista pela Constituição Federal de 1988 em seu art. 5, inciso IV. Ocorre que, apesar de livre a manifestação do pensamento, é vedado o anonimato. Ainda, é importante ressaltar que essa garantia não anula as consequências que podem advir das suas manifestações.
Os incisos subsequentes a essa garantia trazem consigo algumas ressalvas, vejamos:
V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem;
VI - e inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias;
IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença;
X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;
Logo, a Constituição impõe responsabilidade na mesma medida em que proíbe a censura. Em seu art. 221 a Carta Magna condiciona a liberdade de expressão aos princípios da promoção da cultura e do respeito aos valores éticos e morais da família. Além disso, o Pacto de San Jose da Costa Rica (Convenção Americana sobre os Direitos Humanos), do qual o Brasil é signatário, nos seus art. 13, 1 e 2, contempla a liberdade seguida de responsabilidade, o que significa que a liberdade está condicionada ao respeito à individualidade, à honra, à vida privada, à dignidade, ao meio ambiente cultural, aos valores éticos e morais.
Acontece que, grupos no aplicativo Telegram, por exemplo, abrigam todo tipo de comércio de drogas, armas, pornografia infantil e outros crimes, contrariando todas as normas supracitadas. São usados também para" aliciar " jovens que tenham o mínimo de interesse no tema dos massacres e do movimento neonazista, transformando-os em grandes apoiadores. Isso porque o Telegram não respeita o ordenamento jurídico brasileiro, tampouco obedece às ordens judiciais que recebe para investigações de determinados delitos.
Portanto, é importante que os pais, mães ou tutores monitorem as relações e informações às quais as crianças têm acesso, pois, por mais que se confie neles, nunca se pode confiar em quem está do outro lado da tela, e enquanto houver plataformas como essa, que não seguem o ordenamento jurídico brasileiro, estaremos colocando nossa sociedade em risco, como temos presenciado nos últimos tempo.
Em resumo, a Internet e a Sociedade da Informação trouxeram inúmeras mudanças para nossas vidas. No entanto, é necessário ficar atento às ameaças que circulam nela. O Direito Digital no Brasil ainda está caminhando, e é essencial contribuirmos na medida em que podemos, principalmente não consumindo conteúdos ilegais ou imorais e denunciando-os às plataformas e, se necessários, as autoridades.
Bruna Alves - analista jurídico, especializada em direito digital
Doutora Sabrina Almeida Pereira - Advogada especializada em Direito Digital e Proteção de Dados
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