A repartição de competências em saúde pública e o Sistema Único de Saúde - SUS.
Quem cuida de quem?
O direito à saúde foi consagrado na Constituição Federal de 1988, pactuando a competência comum aos entes federativos, bem como sua concretização. Com isso, formou-se o que se entende por federalismo cooperativo, ou seja, a competência comum atua conjuntamente e articuladamente objetivando alcançar todos os cidadãos.
José Afonso da Silva ensina que competência comum “Se trata da prestação do serviço por uma entidade, qual não exclui igual competência de outra – até porque aqui se está no campo da competência-dever, porque se trata de cumprir a função pública de prestação de serviços à população”.
Nessa perspectiva, a carta mandamental instituiu no art. 198 orientações básicas e diretrizes que devem ser observadas na organização do Sistema Único de Saúde – SUS. Estas estabelecem que as ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada que constituem um único sistema, fixando como diretrizes a descentralização, com direção única em cada esfera de governo, o atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas e, por fim, a participação da comunidade.
Por conseguinte, o § 1º do referido artigo, estabelece as regras gerais de financiamento, que se realizará com os recursos do orçamento da seguridade social, da União, dos Estados-membros, do Distrito Federal e dos Municípios.
Diante desta configuração, tal sistema trabalha com a ideia de ser orgânico, ou seja, as várias partes que lhe integram realizam ações autônomas, de modo que todas as tarefas ficam divididas.
Neste modelo, o legislador constituinte instaurou um federalismo solidário, impondo a competência comum da União, dos Estados-membros, do Distrito Federal e dos Municípios para cuidar da saúde, conforme destaca o art. 23, II da CF.
Atenta-se, entretanto, ao art. 30, VII que aclara pela municipalização na execução dos serviços de saúde, ou seja, incumbiu-se aos Municípios a condição de executores diretos das ações de saúde.
Por disposição constitucional, entende-se que cada esfera de governo é autônoma na sua organização. Diante de tal autonomia acrescentam-se as características peculiares quanto às ideologias políticas do povo e seus governantes, as quais interferem diretamente no sistema único a serviço dos cidadãos.
Nessa senda, o artigo 196 apregoa que a saúde é um direito de todos e dever do Estado, assegurando o acesso universal e igualitário, garantido mediante políticas públicas (sociais e econômicas) ações que visem à redução do risco de doenças e de outros agravos.
Sendo a saúde um direito social fundamental que tem natureza assistencial, cujo acesso é universal e igualitário, significa dizer que o tratamento pelo SUS será assegurado a todos, com isonomia no tratamento e no acesso, sem preconceito ou privilégio de qualquer espécie.
Ao entender que nas demandas judiciais devem ser prestigiadas as políticas públicas instituídas, a suprema corte jurídica do país reconhece a validade das normas administrativas que regulam a saúde, inclusive, quanto às regras de repartição da competência.
A norma mandamental assegura a integralidade no atendimento à saúde, e a judicialização dessa seguridade é a decorrência da falha desses serviços. Outrossim, as decisões judiciais proferidas atentam-se às regras de repartição de competência de modo a evitar desorganização administrativa e garantir o cumprimento efetivo constitucional necessário.
A Constituição Federal fixou as diretrizes de organização do SUS, delegando a regulação administrativa do sistema. Uma vez criada a rede de atenção com a repartição de competência haverá o fracionamento da solidariedade, que se transforma em responsabilidade subsidiária, se pensando no bem coletivo.
Desta feita, o Sistema Único de Saúde e sua estruturação são considerados pelo Poder Judiciário, de modo que União e os Estados-membros continuam responsáveis subsidiários pela deficiência nas ações e serviços de saúde que estão sob a responsabilidade do Município.
Conclui-se, portanto, que a Constituição Federal, pensou em um sistema de saúde que abarcasse todas as pessoas, fazendo-as sentirem-se sujeitos direitos que são, não podendo abster-se do cumprimento mandamental a União, os membros federativos e seus municípios, quer seja por um federalismo cooperativo, solidário e quando necessário pelo poder judiciário a fim de que todos possam respirar.
Referências
AITH, Fernando. Curso de Direito Sanitário: a proteção do direito à saúde no Brasil. São Paulo: Quartier Latin, 2007, p. 341-342.
CARVALHO, Guido Ivan de. SANTOS, Lenir. Sistema Único de Saúde: comentários à Lei Orgânica da Saúde (Leis nº 8.080/90 e nº 8.142/90). 3. ed. Campinas – SP: Editora da Unicamp, 2001, p. 147.
GADELHA, Maria Inez Pordeus. Funcionamento e financiamento do SUS. Revista de Doutrina da 4ª Região, Porto Alegre, n. 35, abril de 2010.
SANTOS, Lenir. Direito à saúde e sistema único de saúde: conceito e atribuições. O que são ações e serviços de saúde. In Direito da saúde no Brasil. SANTOS, Lenir (Org.). Campinas, SP: Saberes Editora, 2010, p. 145-179.
3 Comentários
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Show. 👏👏 continuar lendo
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Ótimo tema, pois é atual e não são muitos que entendem a organização do SUS, inclusive o ex-ministro da saúde não sabia nem da eexistência desse sistema, o que é um absurdo. continuar lendo