Busca sem resultado
jusbrasil.com.br
3 de Maio de 2024

O Decreto 9.785/19 e as armas de fogo de uso restrito

há 5 anos

Por Pedro Magalhães Ganem

Recentemente, o presidente da república editou o Decreto 9.785/19 que regulamenta questões relacionadas ao porte de arma de fogo, principalmente quanto aquelas de uso restrito, tratando-se de uma novatio legis in mellius.

Além de possibilitar o porte de armas para um grande número de pessoas, o Decreto modificou o rol de armas de uso restrito, fazendo com que vários calibres que antes eram de uso restrito das forças armadas sejam agora de uso permitido.

E isso tem uma implicação direta nas ações já em curso e até mesmo naquelas já julgadas.

Acontece que agora são consideradas de uso permitido as armas de fogo que, dentre outras questões, “com a utilização de munição comum, não atinjam, na saída do cano, energia cinética superior a mil e duzentas líbras-pé e mil seiscentos e vintejoules”.

E são consideradas de uso restrito, dentre outros fatores, as armas “que, com a utilização de munição comum, atinjam, na saída do cano, energia cinética superior a mil e duzentas líbras-pé e mil seiscentos e vintejoules; ou “de alma raiada que, com a utilização de munição comum, atinjam, na saída do cano, energia cinética superior a mil e duzentas líbras-pé e mil seiscentos e vintejoules”.

Trocando em miúdos, várias armas de fogo que eram consideradas de uso restrito passaram a ser de uso permitido e isso traz grande consequência nas ações penais em curso e até mesmo já julgadas.

Antes do Decreto, eram permitidas armas de até 407 joules, como as de calibre 38, 22, 25 e 32.

Depois do Decreto, são permitidas armas de até 1.620 joules, incluindo diversas armas que eram de uso restrito, como a 9mm, .40, .44, .44 Magnum, .45 e .357 Magnum.

Permanecem restritas, falando de armas portáteis, a .50 Magnim e a .454 Casull, pois possuem potência de 1.900 e 2.531 joules, respectivamente.

armas de fogo de uso restrito 01

Mas o que isso tem relação com os processos em curso e já julgados?

De acordo com o Estatuto do Desarmamento (Lei 10.816/03), a pessoa pode responder pela posse ou pelo porte de arma de fogo de uso permitido (artigos 12 e 14, respectivamente) e pela posse ou porte de arma de fogo de uso restrito (artigo 16).

Logo, aquele que não possui autorização para ter arma ou para portar uma, caso fosse flagrado, antes do Decreto, com um revólver calibre 380, responderia ou pelo crime do artigo 12 ou pelo do artigo 14; enquanto se o flagrante fosse com uma arma calibre 9mm, a imputação seria da prática do crime do artigo 16.

A consequência disso é que o crime do artigo 16 possui uma pena mais severa, além de ser considerado um crime hediondo, fazendo com que a progressão da pena seja de 2/5 ou 3/5 (se reincidente), além de ser vedada a anistia, indulto, graça, sursis, …

Inclusive, a maioria dos crimes de posse/porte de arma de fogo de uso restrito ocorria em decorrência de armas calibre 9mm e .40 (com exceção daqueles casos da figura equiparada do artigo 16, parágrafo único, inciso IV, que trata sobre armas com numeração raspada, adulterada ou suprimida).

Sem falar que, com a maior circulação legal de armas como essas, com maior potência, aumentará o número delas no mercando clandestino, ou seja, teremos mais “bandidos” portando armas 9mm, .40 e até mesmo .44 Magnum por aí.

Com isso, todas aquelas pessoas que respondem a uma ação penal ou foram condenados em decorrência de posse/porte de armas de fogo calibres 9mm, .40, .44, .44 Magnum, .45 e .357 Magnum, serão beneficiados, pois estamos diante de uma novatio legis in mellius.

Isso significa que uma lei mais benéfica sempre retroage para beneficiar o réu, em qualquer circunstância e em qualquer fase.

Vejamos o que diz o artigo do Código Penal:

Art. 2º – Ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime, cessando em virtude dela a execução e os efeitos penais da sentença condenatória. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

Parágrafo único – A lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado.

Assim, se estamos diante de uma modificação do conceito de armas de fogo de uso permitido e de uso restrito, todos aqueles que respondiam a uma ação penal em decorrência de armas que antes eram consideradas de uso restrito e agora não são mais, serão beneficiados.

Portanto, caso tenha algum cliente já condenado nesse crime, basta requerer ao Juízo da Execução o reconhecimento da novatio legis in mellius.

Será que o presidente pensou nisso antes de editar o Decreto? Logo ele que é totalmente contrário a qualquer tipo de “benefício” a réus de ações penais?

Fonte: Canal Ciências Criminais


Quer estar por dentro de todos os conteúdos do Canal Ciências Criminais?

Siga-nos no Facebook e no Instagram.

Disponibilizamos conteúdos diários para atualizar estudantes, juristas e atores judiciários.

  • Publicações5506
  • Seguidores11601
Detalhes da publicação
  • Tipo do documentoArtigo
  • Visualizações85470
De onde vêm as informações do Jusbrasil?
Este conteúdo foi produzido e/ou disponibilizado por pessoas da Comunidade, que são responsáveis pelas respectivas opiniões. O Jusbrasil realiza a moderação do conteúdo de nossa Comunidade. Mesmo assim, caso entenda que o conteúdo deste artigo viole as Regras de Publicação, clique na opção "reportar" que o nosso time irá avaliar o relato e tomar as medidas cabíveis, se necessário. Conheça nossos Termos de uso e Regras de Publicação.
Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/artigos/o-decreto-9785-19-e-as-armas-de-fogo-de-uso-restrito/710180304

Informações relacionadas

Rafael Salamoni Gomes, Advogado
Modeloshá 4 anos

[Modelo] - Pedido de Revogação de Prisão Preventiva

Pedro Magalhães Ganem, Advogado
Artigoshá 8 anos

Traficante ou usuário de drogas?

Fátima Miranda, Estudante de Direito
Artigoshá 9 anos

Passo a passo para o cidadão “comum” que deseja adquirir uma arma de fogo para defesa pessoal

Guilherme Schaun, Advogado
Artigoshá 5 anos

Definindo arma de fogo, acessório, munição, calibre, uso permitido, uso restrito, etc

A tornozeleira eletrônica é obrigatória durante a saidinha?

27 Comentários

Faça um comentário construtivo para esse documento.

Não use muitas letras maiúsculas, isso denota "GRITAR" ;)

É muita desonestidade intelectual fazer a afirmação destacada abaixo, num país em que bandidos portam fuzil.
"Sem falar que, com a maior circulação legal de armas como essas, com maior potência, aumentará o número delas no mercando clandestino, ou seja, teremos mais “bandidos” portando armas 9mm, .40 e até mesmo .44 Magnum por aí." continuar lendo

Estatisticamente esta afirmação que você destacou esta correta. Quanto maior a quantidade, maior a chance de ocorrer um resultado provável (extravio, roubo, mercado negro, etc). continuar lendo

Desonestidade intelectual?!

Se aumenta o número de armas legais, é fato que aumentará o número de armas ilegais, seja em decorrência de subtrações, extravios, venda ilegal, ...

É um fato. Repare que não disse quanto aumentaria, apenas disse que aumentará.

Quando você diz que "bandidos" portam fuzil, demonstra desconhecer a realidade do uso ilegal de arma de fogo. O uso de fuzil é a exceção, a regra é a utilização de revólver e pistola, a maioria de calibre permitido (38), sendo grande a quantidade de 9mm e .40, armas de uso restrito que vão para a ilegalidade de alguma forma (subtração/extravio), destino que as demais armas (que agora também são de uso permitido) terão.

Basta ver que, de acordo com a lei da oferta e procura, teremos um aumento da produção dessas armas, em vista da procura que teremos, logo, a probabilidade delas irem parar no mercado clandestino é muito grande.

Antes de falar em desonestidade intelectual, busque refletir melhor sobre a afirmação feita no texto e sobre todo o contexto que ela se encontra.

Um grande abraço! continuar lendo

Concordo contigo... não há estatísticas que comprovem a quantidade de armas legais que vão parar no mercado ilegal, então, fazer uma afirmação da forma que foi feita é afirmar algo sem um fato probatório, o que me parece leviano.
O criminoso não depende do mercado legal para obter armas, pois ele as obtém através do contrabando e tráfico de armas. Mais armas na mão do cidadão de bem não significa mais armas nas mãos de criminosos... significa mais pessoas preparadas para defender a sua própria vida e da sua família.
Devemos parar com o discurso contrário ao cidadão de bem estar armado... precisamos gastar energia para focar no real problema: o bandido armado!

Veja o caso recente do Serial Killer Lázaro Barbosa... entra na casa que ele quer e mata a família toda, e o cidadão de bem assiste ao terror sem poder fazer nada. Se tivéssemos uma população armada, casos como esse não aconteceriam. continuar lendo

para um pais que vive com um numero de mortes por armas de fogo maior que no oriente médio (em gerra) e lembrando que os criminosos tem calibres que ate as forças armada desconhece , eu mesmo já foi assaltado por um adolescente com um 357 Magnum (arma usada para abater elefantes ...) o texto perde total proposito ,pois nem policia e muito menos justiça faz, qualquer coisa para inibir o uso de armas , mas a liberação para nos pessoas de bem , para podermos nos defender destes abusos vai reduzir em médio prazo o numero de mortes sim ...pois os criminosos vão ficar com medo de levar tiros de volta ... continuar lendo

Mas o texto faz alguma consideração acerca do porte lícito de arma e suas implicações?

Ou fala sobre a modificação da classificação das armas de uso permitido e restrito? continuar lendo

O raciocínio de advogado estava correto até quando o articulista passa a fazer considerandos da confecção do Decreto extrapolou o mister da sua profissão e partiu para um terreno que em nada agrega no terreno da jurisprudência e sim no terreno da conjectura e da discussão politizada. As perguntas: "Será que o presidente pensou nisso antes de editar o Decreto? Logo ele que é totalmente contrário a qualquer tipo de “benefício” a réus de ações penais?" demonstram claramente um viés ideológico. Melhor seria que tal artigo estivesse em outro site que não este. continuar lendo

Mas o questionamento é válido, pois o presidente tem nítidos discursos contra direitos humanos e pessoas que são intituladas de "bandidos".

Ou estou errado?

Logo, se ele é contrário a assegurar direiros a "bandidos", será que ele pensou que o seu decreto poderia beneficiá-los? continuar lendo

Gostei. Muito claro as colocações. Parabéns. De forma simples explicou o decreto e de forma mais elucidativa ainda suas implicações. continuar lendo