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5 de Maio de 2024

Os impactos da Lei do Ipê no Projeto Jaíba - Inconstitucionalidade

Crítica à Lei 9.743/88, alterado pela 20.308/2012.

Publicado por Luiz Felipe
há 7 anos

Introdução

O Brasil dispõe de uma legislação específica para florestas desde 1934 quando foi editado o Primeiro Código Florestal Brasileiro. Também a Constituição de 1934 foi a que primeiro considerou a proteção da natureza como princípio fundamental, atribuindo à União e aos Estados a competência para, de forma concorrente, “proteger belezas naturais e monumentos de valor histórico e artístico”. Na atual legislação ambiental, a proteção e preservação dos ecossistemas são tratados como primordiais, os fatores climáticos e desastres ambientais levam o Poder Legislativo a elaborar leis cada vez mais limitadoras à intervenção ambiental, nesse sentido deve-se analisar o contexto destas leis para que na intenção de preservar o meio ambiente, não comprometa a utilização econômica dessas área

A preservação ambiental é de fundamental importância para o equilíbrio de ecossistemas, pois interfere na preservação de espécies da fauna e flora, além de refletir principalmente em fatores climáticos. Em contrapartida, investimentos em imóveis rurais, seja na agricultura ou agropecuária requerem intervenção em vegetação nativa, desse modo a necessidade do meio ambiente ecologicamente equilibrado e a exploração econômica da propriedade devem ser harmônicos de modo que nenhum seja prejudicado. O atual Código Florestal estipula preservação de 20 a 80%, a depender da localização da propriedade, entendendo o legislador que este percentual atenderia os objetivos de preservação ambiental.

Art. 12. Todo imóvel rural deve manter área com cobertura de vegetação nativa, a título de Reserva Legal, sem prejuízo da aplicação das normas sobre as Áreas de Preservação Permanente, observados os seguintes percentuais mínimos em relação à área do imóvel, excetuados os casos previstos no art. 68 desta Lei: (Redação dada pela Lei nº 12.727, de 2012).

I - localizado na Amazônia Legal:

a) 80% (oitenta por cento), no imóvel situado em área de florestas;

b) 35% (trinta e cinco por cento), no imóvel situado em área de cerrado;

c) 20% (vinte por cento), no imóvel situado em área de campos gerais;

II - localizado nas demais regiões do País: 20% (vinte por cento). (sem grifos no original)

O presente artigo tem por objetivo expor crítica à Lei Mineira nº 9.743/1988, alterada em 2012 pela Lei 20.308/12, que no ponto de vista a seguir dissertado, interferiu diretamente na exploração econômica da propriedade. Referida Lei estabeleceu algumas particularidades de alto custo para que a supressão da árvore conhecida como “Ipê” fosse autorizada pelo órgão ambiental competente. Será exemplificada ao longo deste trabalho esta legislação aplicando-a ao Projeto Jaíba, devido a grande incidência de terras inutilizadas nesta região pelos valores para retirada dos Ipês.

Ao final do trabalho, o objetivo será demonstrar a necessidade de uma revisão na Lei, analisando os seus impactos e sua inconstitucionalidade.

A Lei no Projeto Jaíba

O Projeto de Irrigação do Jaíba é considerado como o maior projeto de irrigação da América do Sul e o segundo do mundo em área contínua irrigada, gera milhares de empregos nas cidades circunvizinhas e desenvolve o mercado regional, comercializando inclusive com o exterior. Em consequência da importância na economia e o grande benefício social, o Projeto Jaíba foi declarado de utilidade pública e interesse social através do Decreto NE Nº 395, de 9 de Julho de 2013. No ponto de vista ecológico, visando o equilíbrio ambiental, a proteção, conservação e preservação de ecossistemas, conforme dados da RURALMINAS, o Projeto Jaíba possui área total protegida de 329.781,14 hectares, situação peculiar de preservação ambiental, apesar de invasões ilegais hoje ocorrentes nestas áreas preservadas, que mesmo assim representam percentual insignificante ante a dimensão das zonas verdes.

A Lei do Estado de Minas Gerais 9.743/1988 estabeleceu alguns critérios para que a supressão da árvore Ipê fosse autorizada, um deles é o empreendimento estar localizado em projeto de utilidade pública, situação ocorrente no Projeto Jaíba, in verbis:

Art. 2º A supressão do ipê-amarelo só será admitida nos seguintes casos:

I – quando necessária à execução de obra, plano, atividade ou projeto de utilidade pública ou de interesse social, mediante autorização do órgão ambiental estadual competente; (sem grifos no original)

II – em área urbana ou distrito industrial legalmente constituído, mediante autorização do Conselho Municipal de Meio Ambiente ou, na ausência deste, do órgão ambiental estadual competente;

III – em área rural antropizada até 22 de julho de 2008 ou em pousio, quando a manutenção de espécime no local dificultar a implantação de projeto agrossilvipastoril, mediante autorização do órgão ambiental estadual competente.

Para utilização das áreas exploráveis de uma propriedade, o interessado, além de respeitar Áreas de Preservação Permanente e de Reserva Legal, deve ainda pagar taxas conforme o rendimento lenhoso das árvores a serem derrubadas, alternando de valor conforme a importância econômica e ambiental de cada árvore, entretanto situação diferente ocorre na árvore Ipê, uma vez que o empreendedor deve recompor as árvores a serem suprimidas ou realizar pagamento de taxas, conforme determina o texto legal:

§ 1º Como condição para a emissão de autorização para a supressão do ipê-amarelo, os órgãos e as entidades a que se referem os incisos do caput deste artigo exigirão formalmente do empreendedor o plantio de uma a cinco mudas catalogadas e identificadas do ipê-amarelo por árvore a ser suprimida, com base em parecer técnico fundamentado, consideradas as características de clima e de solo e a frequência natural da espécie, em maior ou menor densidade, na área a ser ocupada pelo empreendimento. (sem grifos no original)

§ 2º O empreendedor responsável pela supressão do ipê-amarelo nos termos do inciso I do caput deste artigo poderá optar, alternativamente à exigência prevista no § 1º, pelo recolhimento de 100 Ufemgs (cem Unidades Fiscais do Estado de Minas Gerais), por árvore a ser suprimida, à Conta Recursos Especiais a Aplicar de que trata o art. 50 da Lei nº 14.309, de 19 de junho de 2002.(sem grifos no original)

Um fator que causa maior impacto desta Lei no Projeto Jaíba é a grande incidência desta espécie de árvore na região, motivo que eleva os custos seja para pagamento de taxa, seja para reposição florestal, únicas alternativas dispostos na Lei.

Em consulta pública realizada no site da Superintendência Regional de Meio Ambiente (SUPRAM), um empreendedor protocolou processo para intervenção ambiental em uma área de 50ha, e após levantamento florestal realizado por profissional específico, contabilizou-se 4550 unidades de Ipês no imóvel, portanto, a autorização para supressão de vegetação estaria vinculado à opção do Empreendedor no pagamento das taxas ou reposição florestal, no primeiro caso, o valor da taxa a ser pago ultrapassaria R$ 1.300.000,00 (Um milhão e trezentos mil reais), já na situação da compensação ambiental, o valor estimado também seria alto, uma vez que o órgão ambiental autorizativo optaria na proporção de 1 a 5 mudas por árvore a ser suprimida, devendo obedecer alguns requisitos:

3º Caberá ao responsável pela supressão do ipê-amarelo, com o acompanhamento de profissional legalmente habilitado, o plantio das mudas a que se refere o § 1º e, pelo prazo mínimo de cinco anos, o monitoramento do seu desenvolvimento e o plantio de novas mudas para substituir aquelas que não se desenvolverem.

§ 4º O plantio a que se refere o § 1º será efetuado na mesma sub-bacia hidrográfica em que se localiza o empreendimento, em sistema de enriquecimento florestal ou de recuperação de áreas antropizadas, incluindo áreas de reserva legal e preservação permanente, ou como recuperação de áreas no interior de unidades de conservação de domínio público, conforme critérios definidos pelo órgão ambiental estadual competente.

Portanto as condicionantes dispostas no texto legal para a situação da reposição florestal elevam os custos para tal equiparadamente ao pagamento da taxa, superior ao próprio valor do imóvel.

Função Social da Propriedade

Em se tratando de imóveis rurais, aplica-se claramente a Função Social da propriedade, uma vez que faz parte da função social a utilização econômica da propriedade e o meio ambiente ecologicamente equilibrado, semelhante ao que acontece com a destinação da Reserva Legal, em que o meio ambiente e a exploração da propriedade coexistem, conforme determina a CF/88:

Art. 186. A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos:

I - aproveitamento racional e adequado;

II - utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente;

III - observância das disposições que regulam as relações de trabalho;

IV - exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores. (sem grifos no original)

No Projeto Jaíba, a aplicação da Lei 9.743/88 interfere negativamente na função social da propriedade, uma vez que, centenas de hectares irrigáveis deixam de ser explorados e de gerar emprego e renda. A exemplo, diversos imóveis adquiridos da RURALMINAS na Licitação 001/2012 encontram-se sem nenhuma destinação, permanecendo com a vegetação nativa.

O Princípio da Função Social da Propriedade, segundo Borges (2009, p.63): “a função social está intimamente ligada ao fato de que a propriedade imóvel é essencial e indispensável à segurança alimentar da sociedade no interesse do Estado, inclusive, da própria humanidade.”.

Conclusões

Importante ressaltar que não é objetivo do presente artigo a crítica à preservação ambiental, mas sim ressaltar a importância em coexistir com a exploração econômica na propriedade, de modo que uma não interfira na outra, pois certamente, alguma seria prejudicada, já que faz parte da função social da propriedade a atenção a ambos os princípios.

O Agronegócio tem fundamental importância na economia nacional, logo, deve-se adotar meios que estimulem o investimento desse setor, sem entretanto, como exaustivamente ressaltado, sem comprometer o meio ambiente. No Projeto Jaíba, na possibilidade de supressão de vegetação nativa para uso comercial do imóvel, o Meio Ambiente encontra-se ecologicamente equilibrado, pois a RURALMINAS destinou uma grande área para preservação ambiental como medida compensatória ao impacto ambiental que um Projeto de tamanha magnitude causa.

A CF/88, em seu artigo 186 é claro no sentido de que a função social da propriedade somente será cumprida se atender simultaneamente a todos os seus incisos, entretanto, da forma disposta na Lei 9.743/88, apesar de não proibir a supressão do ipê, adota metodologias de cobrança e compensação que inviabilizam o investimento, tornando-se condutas equiparadas, portanto, inconstitucional.

Diante dos fatos apresentados, demonstra-se necessário a revisão da Lei à luz do princípio da função social da propriedade de modo que o Projeto Jaíba retome o crescimento, ampliando suas áreas de cultivo e as terras tenham proveito social, desenvolvendo ainda mais esta região, pois seguramente permanecer com as terras improdutivas inutiliza um Projeto que houve grande incentivo pelo Governo e que desenvolve uma importante região do país.

Referências

BORGES, Antonino Moura. Curso Completo de Direito Agrário. 3. Ed. São Paulo: CL Edijur, 2009. 1024 p.

BRASIL. Lei nº 9.743, de 15 de Dezembro de 1988. Declara de interesse comum, de preservação permanente e imune de corte o ipê amarelo e dá outras providências. Diário do Executivo. Belo Horizonte, MG, 28 de Julho de 2012, Pág. 1 Col. 2

BRASIL. Lei nº 20.308, de 27 de Julho de 2012. Altera a Lei nº 9743, de 15 de Dezembro de 1988, que declara de interesse comum, de preservação permanente e imune de corte o ipê-amarelo. Diário do Executivo. Belo Horizonte, MG, 28 de Julho de 2012, Pág. 1 Col. 2

FIORILLO, Celso Antônio Pacheco. Curso de Direito Ambiental Brasileiro. 15. Ed. São Paulo: Saraiva, 2014. 1005 p.

FUNDAÇÃO RURAL MINEIRA – RURALMINAS. Jaíba. Projeto Jaíba. Disponível em <http://www.ruralminas.mg.gov.br/jaiba>

SECRETARIA DE ESTADO DE MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL – SEMAD. Arquivos. Processos Autorizados. Disponível em <http://www.meioambiente.mg.gov.br/copam/copa/1540>

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