Página 99 da Seção Judiciária da Paraíba - Edição Judicial do Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF-5) de 26 de Maio de 2017

foram cometidas de forma fraudulenta de modo a potencializar algum perigo em desfavor do empreendimento. 83. Insta destacar que dado o caráter aberto do tipo de gestão fraudulenta, era imperiosa a descrição pormenorizada do ato de gestão tido por indecoroso, e cuja falta bem evidencia que o fato não se enquadra no tipo do art. da Lei 7.492/86. 84. A bem da verdade, toda a ação dos denunciados voltou-se a viabilizar a realização de operações de câmbio clandestinas, o que, como já decantado, melhor corresponde à figura típica do art. 22, parágrafo único da Lei 7.492/86 e não às condutas descritas no art. ou mesmo no art. 11 da Lei nº 7.492/86. Lavagem de Dinheiro 85. Acerca da lavagem de dinheiro, a denúncia aponta como consequência lógica da evasão de divisas, argumentando, em síntese, que a abertura da subconta BASILEIA facilitou: a uma, a ocultação dos valores nela movimentados, dificultando a persecução penal das pessoas que usaram os serviços dos doleiros para ingressar e evadir divisas; a duas, que os doleiros, que possuíam recursos no exterior evadidos e sem declaração às autoridades brasileiras, recebe dinheiro do cliente no Brasil, "limpo". 86. Veja-se portanto, que a denúncia aponta dois enfoques: primeiro, os réus teriam branqueado, mediante o sistema dólar-cabo, dinheiro deles evadido ao exterior sem declaração à autoridade brasileira; segundo, teriam contribuído para ocultar dinheiro dos clientes. 87. A lavagem de dinheiro é classificada como crime derivado, acessório ou parasitário, e que pressupõe, após a superveniência da Lei nº 12.683/2012, a ocorrência de uma infração penal anterior. Acerca da natureza e espécie dessa infração penal, é de bom alvitre salientar que até a edição da Lei nº 12.683/2012, para a configuração da lavagem de dinheiro, a Lei nº 9.613/98 apresentava um rol taxativo de delitos; hoje há uma maior amplitude para se caracterizar a lavagem de dinheiro, na medida em que qualquer infração penal pode ser considerada como fato antecedente no branqueamento de capitais. 88. No caso, quanto à existência do delito antecedente, conforme já exposto alhures, teve-se a constatação do cometimento de delito contra o Sistema Financeiro Nacional a se amoldar à configuração de lavagem de dinheiro, consoante art. , VI, da Lei nº 9.613/98, conforme redação vigente à época do fato (1997/2002). 89. Entrementes, para a caracterização da lavagem de dinheiro, além da existência de um delito antecedente, cujo capital resultante de sua prática busque-se ocultar, não se prescinde da presença do propósito do agente em dar uma aparência de licitude na utilização do capital obtido de forma ilícita. 90. Decerto, no crime de lavagem de dinheiro, a conduta do agente consiste em dar um aspecto lícito ao capital obtido de forma espúria, de modo que sem a presença desse especial fim de agir, não há que se falar em seu cometimento. 91. A conduta de "lavar dinheiro" está composta por várias fases, vários atos. Há uma complexidade de comportamentos, geralmente ligados e fracionados, direcionados à finalidade única de converter os valores e bens ilícitos em capitais ou bens plenamente disponíveis por seus titulares. Com efeito, o processo de branqueamento de capitais encadeia-se em três fases (alternativas ou cumulativas), quais sejam: a conversão, a dissimulação e a integração15. 92. Na conversão, busca-se inserir o capital no mercado, de modo a fracioná-lo, e, assim, desvinculá-lo de sua origem ilícita. Na dissimulação, por sua vez, visa se a apagar o rastro de ilicitude por meio da realização de negócios, transações, a fim de dissimular ou ocultar a proveniência espúria, tanto que essa fase é conhecida como a lavagem propriamente dita. Por fim, na integração, os ativos, após lavados, são reinseridos no sistema produtivo, e se perfazem , normalmente, pela constituição de empresas ou mesmo aquisição de bens. 93. Nesse sentido, com relação ao dinheiro dos clientes, a hipótese seria de dissimulação, ao passo que quanto ao capital próprio dos réus, a hipótese seria de integração. 94. Ocorre que, quanto ao dinheiro dos clientes, não houve nenhuma diligência de investigação, neste inquérito, para apurar a origem supostamente espúria do numerário enviado e/ou ingressado no país. Tome-se o caso da testemunha Gerhard Kune, o qual informou que usou dos serviços dos doleiros para trazer para o Brasil mais de uma centena de milhares de dólares, mas a autoridade policial sequer indagou qual seria a fonte deste numerário na Alemanha. 95. A denúncia menciona, ainda, outros clientes com movimentação superior a cem mil dólares, e relacionamento com subcontas da BEACON HILL e BANESTADO, mas não foi aprofundada a investigação neste inquérito para tentar demonstrar a eventual origem ilícita do numerário. 96. Compreende-se que tamanha investigação acabaria por inviabilizar o objetivo do presente inquérito, sendo conhecimento que outros16 inquéritos foram instaurados com tal finalidade. 97. Num segundo aspecto, o sistema cabo serviria para branquear dinheiro ilicitamente enviado ao exterior pelos réus. 98. Ocorre que não me parece que o intuito dos acusados tenha sido o de repatriar dinheiro ilicitamente enviado ao exterior. A uma, se assim o fosse, não teriam atuado, mediante anos a fio - comprovadamente de 1997 a 2005; mas possivelmente desde 1994, conforme já mencionado - como doleiros. Ora, se o intuito fosse o de trazer de volta dinheiro para o Brasil, tão logo se fizesse a operação correspondente, a atividade de cabo teria sido encerrada, e não prolongado de forma "profissional". 99. A duas, a própria denúncia afirma que os doleiros (genericamente falando, e não os réus) aproveitaram-se, no período de 1996/2002, da brecha normativa17 no uso das contas CC-5 para envio das divisas ao exterior para formação do "estofo" em contas no exterior para operar dólar cabo; a rigor, portanto, não havia proibição de tal remessa, embora o uso de tal modalidade de conta possa ter ocorrido com desvio de finalidade. 100. De toda sorte, também não se identificou nos autos como se deu a "alimentação" inicial da BASILEIA, não podendo se descartar a hipótese mais possível da própria BEACON HILL ter efetuado o controle de créditos na BASILEIA, em compensação aos débitos solicitados pelos réus do Brasil. Cogita-se, nesta hipótese, de dinheiro ilícito ter entrado nesta câmara de compensação, mas esta desdobramento teria que ser minimamente trabalhado na investigação, o que não foi o caso. 101. Em síntese, não há prova de que a conduta dos réus tenha tido por escopo ocultar ou dissimular a origem do capital por eles movimentado, mas sim promover operações de câmbio de forma clandestina e em desconformidade à legislação. Os elementos probatórios colhidos nos autos não comprovam o especial fim de agir exigido para a condenação pelo crime de lavagem de dinheiro, qual seja, o intuito de ocultar ou dissimular a utilização de bens, direitos e valores provenientes dos crimes antecedentes. 102. Assim, quanto à imputação art. , VI, § 1º, I e II, § 2º, I e II, e § 4º da Lei nº 9.613/98, devem os acusados ser absolvidos. Contabilidade Paralela 103. Defende o MPF a ocorrência do crime do art. 11 da Lei 7.492/86, porque os réus teriam movimentado recursos paralelamente à contabilidade oficial das empresas que administravam, notadamente PB CAMBIO e PENA BRANCA. 104. Primeiro, quanto à PB CÂMBIO, empresa usada durante a operação do sistema de dólar-cabo, considero que a contabilidade paralela era meio necessário para prática de evasão de divisas mediante dólar-cabo, não se configurando crime autônomo. Com efeito, para que os acusados lograssem o intuito de viabilizar remessas internacionais de divisas, sem conhecimento das autoridades de fiscalização, necessariamente tais operações não poderiam constar da contabilidade oficial. 105. Quanto às demais empresas do grupo, a alegação da denúncia não se sustenta por ser demasiado genérica. D I S P O S I T I V O 106. Diante do exposto, julgo parcialmente procedente a pretensão punitiva estatal deduzida na denúncia para: * CONDENAR ADALBERTO JÚNIOR PRESTES ROCHA, LUÍS FELIPE PRESTES ROCHA, E VICTOR HUGO PRESTES ROCHA, nas penas do crime previsto no art. 22, parágrafo único, da Lei n. 7.492/86 * ABSOLVER ADALBERTO JÚNIOR PRESTES ROCHA, LUÍS FELIPE PRESTES ROCHA, E VICTOR HUGO PRESTES ROCHA, com fulcro no art. 386, II, do

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