Página 731 do Diário de Justiça do Distrito Federal (DJDF) de 21 de Novembro de 2017

ocasião da assinatura do contrato de locação, já tivessem o conhecimento da indisponibilidade do bem decretada em razão do reconhecimento da fraude à execução, o imóvel somente passou para a esfera de direitos do arrematante na ocasião da expedição da carta de arrematação, por força do art. 901, § 1º, do Código de Processo Civil, o que se deu em agosto de 2016, conforme acima descrito. Antes disso, tinham os réus a capacidade para locar, que é aquela que se dá ao tempo da contratação. E, nas palavras da professora Maria Helena Diniz, ?a incapacidade superveniente não invalidará a locação? (In Lei de Locações de Imóveis Urbanos Comentada. Ed. Saraiva:São Paulo. 11ª ed., 2010, p. 07). Nesse contexto, não há que se falar em nulidade do contrato de locação, como pretende o autor, todavia, após a retirada da carta de arrematação (agosto de 2016), o contrato perde a sua eficácia, não havendo mais legitimidade no ato de cobrança dos alugueres, que deverá advir do novo proprietário/possuidor do bem. Portanto, a eficácia do ato se resolveu somente com a carta de arrematação do bem, antes disso, porém, não há vício ou nulidade a ser reconhecida. Bem por isso também não há que se falar na reparação de danos materiais na forma pretendida pelo autor, porque quando realizadas, o contrato em questão era válido e eficaz. Ademais, não restou evidenciado nos autos que as benfeitorias realizadas no imóvel eram necessárias, única hipótese que autorizaria o reembolso por parte do locador, consoante disposição do art. 35 da Lei nº 8.245/91. E, também por expressa disposição contratual, não tinha o locatário direito a restituição das benfeitorias realizadas, conforme se extrai da leitura das cláusulas quinta e décima segunda do contrato (ID 6943117). Passo a análise em torno do pedido de reparação por danos morais. Os pressupostos da responsabilidade civil encontram-se delineados no artigo 927 do Código Civil, determinando àquele que, por ato ilícito, causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. No mesmo sentido, o artigo 186 do mesmo Diploma Legal, impõe a quem, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. Dos citados dispositivos legais extraem-se os pressupostos para a configuração da responsabilidade, a saber: a existência da conduta, do resultado lesivo (dano), da relação de causalidade e da culpa em sentido lato. Nessa trilha, a lição de Sérgio Cavalieri Filho[1][1]: ?Sendo o ato ilícito, conforme já assinalada, o conjunto de pressupostos da responsabilidade, quais seriam esses pressupostos na responsabilidade subjetiva? Há primeiramente um elemento formal, que é a violação de um dever jurídico mediante conduta voluntária; um elemento subjetivo, que pode ser o dolo ou a culpa; e, ainda, um elemento causal-material, que é o dano e a respectiva relação de causalidade. Esses três elementos, apresentados pela doutrina francesa como pressupostos da responsabilidade civil subjetiva, podem ser claramente identificados no artigo 186 do Código Civil, mediante simples análise de seu texto (...) No caso em exame, o ponto central a ser analisado é verificar se houve descumprimento contratual apto a ensejar reparação de danos. O Código Civil de 2002 se afasta da noção individualista e privatista do antigo código e passa a regrar o sistema contratual com um novo olhar, uma forma de ver o contrato não somente como um instrumento jurídico de circulação de riquezas, mas este passa a ter uma função social, pois os contratantes são partes integrantes de uma comunidade, e a norma passa a estudar e a se preocupar com o comportamento destes sujeitos. O estudo da ética comportamental dos contratantes passa a ser um dos pilares mestres do sistema contratual. A letra fria da regra contratual escrita cede espaço para a análise comportamental. Com efeito, a entrada em vigor do Código Civil de 2002 sedimentou nas relações civis a aplicação do princípio da boa-fé, cuja observância é obrigatória em todas as fases contratuais. É o que se depreende da leitura do art. 422, que assim dispõe: ?os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé?. A boa-fé em última análise é forma que o sistema contratual encontrou para permitir que os hermeneutas estudem e analisem a ética dos contratantes. A palavra ética é extremamente estéril no nosso linguajar, ao ponto da maioria sequer compreender o que esta significa, mas de forma simples, a ética é tão somente o estudo do comportamento dos contratantes. Para tanto, o estudo da boa-fé passa pela análise dos chamados deveres anexos a informação, a lealdade e a confiança/cooperação. Ou seja, a conduta das partes deve ser analisada sob estes prismas. Neste sentido, a professora Teresa Negreiros assevera: No âmbito contratual, portanto, o princípio da boa-fé impõe um padrão de conduta a ambos os contratantes no sentido de recíproca cooperação, com consideração dos interesses um do outro em vista de se alcançar o efeito prático que justifica a existência jurídica do contrato celebrado. (Teoria do contrato: novos paradigmas. Renovar: Rio de Janeiro, 2ª ed., pag. 122/123). Frisa-se, ainda, que o princípio da boa-fé objetiva possui, basicamente, três funções, quais sejam: instrumento hermenêutico (art. 113, do CC); fonte de direitos e deveres jurídicos (art. 421, do CC); e limite ao exercício de direitos subjetivos (art. 187, do CC). Dentro deste contexto, tenho que os requeridos agiram com deslealdade contratual, violando um dever anexo da boa-fé. Passo a explicar. Nos termos acima alinhavados, foi possível concluir, após análise detida dos autos, que na ocasião da assinatura do contrato de locação do imóvel, os réus tinham conhecimento do embaraço que recaía sobre o bem e que, em um futuro próximo, certamente perderiam a sua livre disposição. Faltaram os réus com o dever de informação, porque, ainda que não houvesse óbice para a sua locação naquele momento, sabiam que o locador poderia ser obrigado a desocupar o imóvel ainda na vigência do contrato. Se assim tivessem procedido, teriam evitado o evidente constrangimento do autor perante a vizinhança e sua família com a ordem de desocupação do imóvel. Assim, há elementos suficientes nos autos para o reconhecimento de que a parte requerida, em flagrante deslealdade contratual, falseou informações no ato da contratação com o objetivo de auferir vantagem na locação. A toda evidência, os réus agiram de forma desleal, ofendendo ao princípio da boa-fé objetiva, de observância obrigatória nas relações contratuais. Desse modo, a responsabilidade deve ser imputada aos requeridos, porque deram causa ao ato ilícito, inobservando o dever de informação, extrapolando os fins a que se destina, tal como preceitua o art. 187 do Código Civil. Senão vejamos: Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes. Assim, presentes os pressupostos da responsabilidade civil ao caso em questão, ou seja, a conduta, o nexo causal e o dano, aliado à culpa daqueles que praticaram o ato ilícito. Dessa forma, constatado o fato que gerou o dano, porquanto afastada qualquer hipótese de legitimidade do ato, caberá ao responsável a sua reparação. Em relação ao dano moral, este é a violação do patrimônio moral da pessoa, patrimônio este consistente no conjunto das atribuições da personalidade. É a ?lesão de bem integrante da personalidade, tal como a honra, a liberdade, a saúde, a integridade psicológica, causando dor, sofrimento, tristeza, vexame e humilhação à vítima? (CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. São Paulo. Editora Malheiros, 2000, pág. 74). Tal dano, na forma do art. , inciso X, da Constituição Federal é passível de indenização. Dentre os casos que configuram o dano moral indenizável se encontra a integridade moral, em face do constrangimento vivenciado pelo autor ao se deparar, de inopino, com um mandado de desocupação do imóvel sem que tivesse qualquer conhecimento acerca do embaraço que recaía sobre o bem. Tivessem os réus informado o autor antes da contratação acerca do imbróglio, certamente o requerente não teria experimentado as agruras acima narradas. Assim, devem os réus responder por tais danos. Não há critérios legais para a fixação da indenização, razão pela qual, com esteio na doutrina, devo considerar vários fatores, que se expressam em cláusulas abertas como a reprovabilidade do fato, a intensidade e duração do sofrimento, a capacidade econômica de ambas as partes (CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. São Paulo. Editora Malheiros, 2000, pág. 81). Nesses casos, os sentimentos e o sofrimento atingem os mais íntimos direitos da personalidade. Não se pode, entretanto, esquecer que o principal fundamento para a indenização por danos morais é o caráter pedagógico da indenização. É relevante, neste caso, o valor de desestímulo para a fixação do dano moral, que representa o caráter pedagógico da reparação. É que, além do aspecto compensatório, o dano moral tem um efeito preventivo que é observado pela teoria do valor de desestímulo: ?a função presente na teoria do valor do desestímulo do espírito lesivo do agente, exerce papel de relativa importância nos futuros atos que venham a ser praticados pelo ofensor no meio social? (REYS, Clayton. Os novos rumos da indenização do dano moral. Rio de Janeiro. 2003, pág. 162). Esta tendência é verificável também na jurisprudência, conforme já sinalizou o Superior Tribunal de Justiça: ?... Ademais, a reparação deve ter fim também pedagógico, de modo a desestimular a prática de outros ilícitos similares...? (RESP 355392 Min. NANCY ANDRIGHI) Atento a tais diretrizes, entendo uma indenização de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) ser suficiente como resposta para o fato da violação do direito. DO DISPOSITIVO Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE, em parte, os pedidos e DECLARO a inexistência de débitos relativamente aos aluguéis vencidos em setembro, outubro e novembro de 2016 referentes ao contrato de locação entabulado entre as partes e CONDENO os requeridos, solidariamente, a pagar ao autor a importância de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) a título de danos morais, quantia que deve ser acrescida de juros de 1% ao mês, a contar da citação, e correção monetária pelo INPC a partir do arbitramento, nos termos da súmula 362 do Superior Tribunal de Justiça. Em conseqüência, resolvo o mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil. Considerando as novas regras previstas no artigo 85 e seus parágrafos do Código de Processo Civil, em face da sucumbência recíproca, mas

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