Página 331 da Caderno Jurisdicional do Tribunal de Justiça do Diário de Justiça do Estado de Santa Catarina (DJSC) de 5 de Março de 2018

concernente a condição do periciado é de total interesse deste colaborar. (...) Sua condição atual não lhe incapacita ao labor, devendo guardar os devidos cuidados ergonômicos inerentes a qualquer indivíduo.” 3. A partir daí, o que se tem é que as alegadas sequelas físicas relacionadas ao trauma não comprometam a atividade profissional pela postulante. A autora não está incapacitada plenamente para o trabalho, tampouco teve reduzida sua aptidão para o labor. Muito embora faça referência os exames médicos particulares, é impossível desconsiderar a posição técnica imparcial, feita a partir de exposição fundamentada, ainda que não exaustiva. O perito reconheceu a inexistência de incapacidade atual e afastou a retroação à data em que cessado o benefício administrativo, o que não derroga, necessariamente, a temporariedade que acompanhou o padecimento. Em outros termos, naquele período reconhecido pela autarquia a autora estava inapta, tanto que se justificou o auxílio-doença; hoje, todavia, pode retornar ao trabalho. A prova pericial realmente não vincula o juízo quanto às suas conclusões fáticas. Só que muito menos se pode meramente desconsiderá-la. Ainda que o juiz fosse versado na mesma ciência do perito, não poderia se substituir a ele. A missão do magistrado é apreciar valorativamente o laudo; pesar as demais provas, medir o enquadramento jurídico, refletir sobre o fato e o direito simultaneamente. No caso, a prova é contundente quanto à ausência de incapacidade e não existe dúvida razoável que sugira outro caminho. O essencial, enfim, é o diagnóstico no sentido de que existe a aptidão para o labor. 4. Não se justifica, igualmente, o pleito para que a perícia seja renovada. O que se vê, em outros termos, é somente um inconformismo com o resultado da perícia, pretendendo-se que, por desinteressante o exposto pelo perito, haja uma segunda prova. Haveria, por assim dizer, um direito de veto; o litigante descontente teria o direito potestativo de pretender a renovação dos levantamentos técnicos, quem sabe até encontrar uma visão que lhe ampare. De maneira equivalente, a sentença, ainda que não esteja premida às conclusões fáticas da perícia, muito menos pode ser considerada irregular se meramente aplicou o direito à espécie, referendando toda a prova que racionalmente foi interpretada. Ainda que a autora tenha sido diagnosticada com lesões na região lombar, nada indica que foram de tal magnitude que fossem incuráveis. O INSS deferiu a proteção temporária de praxe, o auxílio-doença, mas não viu a permanência de dano. A prova pericial foi nesse sentido, nada constando de real que desacredite essa versão - versão, aliás, em termos processuais, unívocas. 5. Por outro lado, e agora me refiro ao recurso da autarquia, a sentença de improcedência conduz ao dever de devolver os valores recebidos por força de tutela antecipada precipitadamente deferida. Cuida-se, inclusive, de um efeito automático da sentença, que não reclamaria - bem por isso - prévio pedido da parte ré. O STJ fixou a tese da restituição pela sistemática dos recursos repetitivos (REsp 1.401.560/MT). Destaco do voto proferido pelo Min. Ari Pargendler: O Código de Processo Civil de 1939 só autorizava a execução de sentença transitada em julgada, ou de sentença cujo recurso não tivesse efeito suspensivo. As ações cautelares de então eram típicas, isto é, expressamente previstas em lei, e só visavam preservar o objeto do processo. O Código de Processo Civil de 1973, na sua feição originária, não alterou esse quadro, salvo quanto ao poder cautelar geral do juiz, a autorizar que a tutela preventiva fosse além das medidas cautelares típicas. Comum a todas era a provisoriedade, tal como ocorria no mandado de segurança, e por isso sua eficácia não subsistia além da sentença, de que é exemplo a Súmula nº 405 do Supremo Tribunal Federal. O grande número de ações, e a demora que disso resultou para a prestação jurisdicional, levou o legislador a antecipar a tutela judicial naqueles casos em que, desde logo, houvesse, a partir dos fatos conhecidos, uma grande verossimilhança no direito alegado pelo autor. O pressuposto básico do instituto é a reversibilidade da decisão judicial. Havendo perigo de irreversibilidade, não há tutela antecipada (CPC, art. 273, § 2º). Por isso, quando o juiz antecipa a tutela, está anunciando que seu decisum não é irreversível. Mal sucedida a demanda, o autor da ação responde pelo recebeu indevidamente. O argumento de que ele confiou no juiz ignora o fato de que a parte, no processo, está representada por advogado, o qual sabe que a antecipação de tutela tem natureza precária. Para essa solução, há ainda o reforço do direito material. Um dos princípios gerais do direito é o de que não pode haver enriquecimento sem causa. Sendo um princípio geral, ele se aplica ao direito público, e com maior razão neste caso porque o lesado é o patrimônio público. O art. 115, II, da Lei nº 8.213, de 1991, é expresso no sentido de que os benefícios previdenciários pagos indevidamente estão sujeitos à repetição. Uma decisão do Superior Tribunal de Justiça que viesse a desconsiderá-lo estaria, por via transversa, deixando de aplicar norma legal que, a contrario sensu, o Supremo Tribunal Federal declarou constitucional. Com efeito, o art. 115, II, da Lei nº 8.213, de 1991, exige o que o art. 130, parágrafo único na redação originária (declarado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal - ADI 675), dispensava. “Quando a Constituição, no artigo , XXXV,” - lê-se no voto do Ministro Moreira Alves ao julgar a ADI 675 - “declara que ‘a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito’, isso importa dizer que não pode a lei impedir que a prestação jurisdicional seja completa, e que, portanto, a decisão definitiva do órgão judiciário que reconhece a lesão ao direito esteja impedida de alcançar os efeitos pretéritos a ela, e que também foram submetidos à apreciação judicial, pelo fato de haver decisão intermediária - que, por isso, mesmo, não esgota a prestação jurisdicional - em sentido contrário”. Orientação a ser seguida nos termos do art. 543-C do Código de Processo Civil: a reforma da decisão que antecipa a tutela obriga o autor da ação a devolver os benefícios previdenciários indevidamente recebidos. Voto, por isso, no sentido de conhecer do recurso especial, dando-lhe provimento para expungir da parte dispositiva do voto condutor do acórdão impugnado o seguinte trecho: “dispensando a autora da repetição das parcelas recebidas até a cessação dos seus efeitos” (e-stj, fl. 128). Penso, aliás, da mesma forma. Decisão havida em cognição sumária não pode se sobrepor à cognição exauriente; liminar não pode valer mais do que sentença. Há contradição entre preservar os efeitos de tutela antecipada se é proclamado que o autor não tem razão. O provimento de urgência (ou de evidência) depende de requerimento da parte justamente porque envolve riscos. Cassado, há responsabilidade objetiva quanto à reparação dos prejuízos (art. 302 do NCPC; art. 801 do CPC de 1973). Não fosse assim, os pedidos de liminar seriam inconsequentes no campo previdenciário. Não somente, é efeito automático da decisão que julga improcedente o pedido a imposição ao autor dos prejuízos derivados do cumprimento da tutela provisória depois cassada. Por isso, inclusive, que o beneficiário não se desobriga do dever de devolução sob o argumento de que agia movido pela boa-fé ou de que a verba possui nítido caráter alimentar (teses defendidas pela autora). Aqui há a precariedade da decisão, cujos efeitos não perduraram com a sentença, já que imediatamente revertidos. Aliás, não se pode sequer cogitar, no caso, de reconhecer que a autora faria jus - em face da liminar - pelo menos ao gozo limitadamente de auxílio-doença acidentário, de sorte a impedir a restituição. Seria, na linha do postulado nas contrarrazões, uma forma de conceder uma procedência em parte. É que na falta de nexo causal não se pode deferir a tutela de natureza especial, a acidentária. O caminho natural será fazer esse encontro de contas administrativamente, o que imporá que se sigam as limitações regulamentares comuns (limitada a certa fração dos proventos), na linha do que busca a apelada. Mas isso não significa que os efeitos da revogação da liminar possam ser mitigados caso a autora não tenha crédito perante a autarquia. Não se está aqui falando de um direito a compensação, mas antes de tudo à devolução. Caberá ao INSS, se desejar, migrar pelas vias ordinárias (ainda que sabida da improbabilidade de êxito em face das restrições à possibilidade de penhora). Só que é possibilidade que não pode ser descartada. 6. Assim, conheço de ambos os recursos e, nos termos art. 932 do NCPC, nego provimento ao recurso da autora. Em contrapartida, dou provimento ao recurso do INSS para condenar a demandante a ressarcir os valores pagos a título de benefício de auxílio-doença por oportunidade da tutela de urgência. Tais valores serão atualizados

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