Página 368 da Caderno Judicial das Comarcas do Diário de Justiça do Estado do Mato Grosso (DJMT) de 29 de Outubro de 2020

regime democrático. No entanto, o ordenamento jurídico permite, de outro lado, embora de maneira excepcional, cautelosa, e de maneira a gerar a menor restrição possível, análise jurisdicional (artigo , XXXV, CF) sobre eventuais abusos em tal exercício, a exemplo de notícias que, sem base factual idônea, possam gerar danos a direitos da personalidade de terceiros, também estes erigidos ao status de direitos fundamentais resguardados por cláusula pétrea (artigo , V e X, da Constituição da República), podendo ser determinada inclusive a indisponibilidade do conteúdo, nos termos do artigo 19, caput e §§, da Lei nº 12.965/14. No caso dos autos, em análise perfunctória, observa­se que a publicação da requerida em sua rede social Facebook noticia eventuais irregularidades na cobrança de água em sua residência, imputando à Autarquia Municipal responsável pela cobrança eventual tendência ao financiamento da campanha eleitoral do seu ex diretor, ora candidato à Prefeitura. Prima facie, não há elementos de convicção hábeis a levar este Juízo à determinação liminar de exclusão do post, ultrapassando o direito à liberdade de expressão consagrado constitucionalmente, vez que para comprovação da veracidade ou não da publicação seria necessária dilação probatória, o que, se de fato caracterizado, levará à condenação da requerida em indenização em favor da autora. Não fosse apenas isso, o autor é autarquia municipal que lida com serviço público e, portanto, detém caráter público, sujeito à fiscalização de todas as searas, conforme orienta o Ministro Gilmar Mendes, no HC n.º 78.426, ao asseverar que “define tópicos que hão de balizar o complexo de ponderação, fixando­se que OS HOMENS PÚBLICOS ESTÃO SUBMETIDOS À EXPOSIÇÃO DE SUA VIDA E DE SUA PERSONALIDADE E, POR CONSEGUINTE, ESTÃO OBRIGADOS A TOLERAR CRÍTICAS QUE, PARA O HOMEM COMUM, PODERIAM SIGNIFICAR UMA SÉRIA LESÃO À HONRA. Todavia, essa orientação, segundo o Supremo Tribunal Federal, não outorga ao crítico um bill de idoneidade, especialmente quando imputa a prática de atos concretos que resvalam para o âmbito da criminalidade“. – grifou­se. A este respeito, colha­se, nesse sentido, o seguinte trecho do voto do e. Ministro Celso de Mello, no julgamento da paradigmática ADPF 130/DF, que se refere à liberdade de imprensa, face da liberdade de expressão, e aplicável à espécie: A CRÍTICA JORNALÍSTICA, DESSE MODO, TRADUZ DIREITO IMPREGNADO DE QUALIFICAÇÃO CONSTITUCIONAL, PLENAMENTE OPONÍVEL AOS QUE EXERCEM QUALQUER PARCELA DE AUTORIDADE NO ÂMBITO DO ESTADO, POIS O INTERESSE SOCIAL, FUNDADO NA NECESSIDADE DE PRESERVAÇÃO DOS LIMITES ÉTICO­ JURÍDICOS QUE DEVEM PAUTAR A PRÁTICA DA FUNÇÃO PÚBLICA, SOBREPÕE­SE A EVENTUAIS SUSCETIBILIDADES QUE POSSAM REVELAR OS DETENTORES DO PODER. Uma vez dela ausente o “animus injuriandi vel diffamandi ”, (...) a crítica que os meios de comunicação dirigem às pessoas públicas, especialmente às autoridades e aos agentes do Estado, por mais acerba, dura e veemente que possa ser, deixa de sofrer, quanto ao seu concreto exercício, as limitações externas que ordinariamente resultam dos direitos da personalidade. (...) VÊ­SE, POIS, QUE A CRÍTICA JORNALÍSTICA, QUANDO INSPIRADA PELO INTERESSE PÚBLICO, NÃO IMPORTANDO A ACRIMÔNIA E A CONTUNDÊNCIA DA OPINIÃO MANIFESTADA, AINDA MAIS QUANDO DIRIGIDA A FIGURAS PÚBLICAS, COM ALTO GRAU DE RESPONSABILIDADE NA CONDUÇÃO DOS NEGÓCIOS DO ESTADO, NÃO TRADUZ NEM SE REDUZ, EM SUA EXPRESSÃO CONCRETA, À DIMENSÃO DE ABUSO DA LIBERDADE DE IMPRENSA, NÃO SE REVELANDO SUSCETÍVEL, POR ISSO MESMO, EM SITUAÇÕES DE CARÁTER ORDINÁRIO, À POSSIBILIDADE DE SOFRER QUALQUER REPRESSÃO ESTATAL OU DE SE EXPOR A QUALQUER REAÇÃO HOSTIL DO ORDENAMENTO POSITIVO (...). Com efeito, a pedra de toque para aferir­se LEGITIMIDADE NA CRÍTICA JORNALÍSTICA É O INTERESSE PÚBLICO, OBSERVADA A RAZOABILIDADE DOS MEIOS E FORMAS DE DIVULGAÇÃO DA NOTÍCIA. No caso concreto, o interesse público mostra­se extreme de dúvidas, porquanto ­ ao reverso do que pretendeu demonstrar o autor ­ a matéria jornalística não revela qualquer ânimo de injuriar ou difamar a pessoa em si, mas, essencialmente, de dar publicidade acerca de desvios de conduta perpetrados por agente público. (...) ”. –destacou­se. Ora, evidente o debate público estabelecido em torno da questão sub judicie (eventual irregularidade na prestação de serviço público), debate este saudável, devendo ser orientado apenas pela razoabilidade de termos, urbanidade e proibição do anonimato, constitucionalmente vedado. Com feito, retirar de circulação a publicação objurgada e proibir a discussão acerca do tema constituiria censura indevida ao direito de expressão e, portanto, ataque nefasto ao Estado Democrático de Direito, estabelecido na Constituição da República de 1988 após anos e anos de escuridão da ditadura, razão pela qual o indeferimento da pretensão de urgência concernente na exclusão da publicação é medida que se impõe. Nesse sentido: APELAÇÃO CÍVEL. CIVIL. ABUSO DO DIREITO DE LIBERDADE DE EXPRESSÃO. AUSENTE. DANO MORAL. NÃO CONFIGURADO. RETIRADA DA MATÉRIA. IMPROCEDÊNCIA. 1. No julgamento da ADPF nº 130 (Rel. Ministro Carlos Britto), o Supremo Tribunal Federal, em interpretação ao art. 220 da Constituição Federal, confrontado ao art. 5º da Carta, já decidira que os direitos de personalidade relacionados à plena liberdade de atuação da imprensa (liberdade de pensamento, criação, expressão e informação), inclusive pela Internet, têm precedência sobre os demais direitos da personalidade, entre eles, os de intimidade, vida privada, imagem e honra. 2. No caso, não sobressai excesso no direito de liberdade de expressão, porquanto não foi além do direito de crítica e do dever de informação, bem como não assumiu postura ofensiva e difamatória na publicação, a ponto de atingir a honra do agente público e justificar a retirada da matéria dos veículos de comunicação. 3. Apelação conhecida e não provida. (TJ­DF 07146129720188070001 DF 0714612­97.2018.8.07.0001, Relator: FÁBIO EDUARDO MARQUES, Data de Julgamento: 19/02/2020, 7ª Turma Cível, Data de Publicação: Publicado no PJe : 30/03/2020 . Pág.: Sem Página Cadastrada.) AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER CC INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. Retirada de conteúdo publicado na rede social facebook e pedido indenizatório pelos danos morais relativo às publicações. Sentença de procedência. Inconformismo do réu, arguindo cerceamento de defesa. Inocorrência. Cerceamento de defesa afastado. Mérito. Liberdade de manifestação do pensamento e de expressão. Exercício abusivo de direito. Não ocorrência. Autor que exerce função de prefeito do Município de Sorocaba/SP. Conduta do réu que não configurou excesso em relação aos limites da liberdade de expressão. Postagens que não caracterizaram ofensas pessoais ao autor ou mesmo a imputação a este de condutas que configurem crime. Autor que está sujeito a questionamentos dos munícipes em razão da função política que exerce. Situação que, apesar de desconfortável, caracteriza­se como mero aborrecimento cotidiano. Não caracterizado dano moral indenizável. Efetiva lesão aos direitos da personalidade não demonstrada. Não restou comprovada a repercussão negativa na vida do autor, Sentença reformada. RECURSO PROVIDO. (TJ­ SP ­ AC: 10009489820198260602 SP 1000948­98.2019.8.26.0602, Relator: Ana Maria Baldy, Data de Julgamento: 24/07/2020, 6ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 24/07/2020). De outro norte, o direito de resposta é assegurado pela Constituição Federal, art. , inciso V, sendo proporcional ao agravo. É da jurisprudência que cabe ao usuário responsável pelo perfil no Facebook a publicação de resposta de ofendido por algum tipo de conteúdo ilícito divulgado na rede social: CIVIL E CONSTITUCIONAL. AÇÕES CAUTELAR E DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. JULGAMENTO CONJUNTO. SENTENÇA ÚNICA. DUPLO RECURSO. NÃO CONHECIMENTO. PROVEDOR DE SERVIÇOS DE INTERNET. REDE SOCIAL. FACEBOOK. INEXISTÊNCIA DE CONTROLE EDITORIAL. LEI Nº 13.188/2015. DIREITO DE RETRATAÇÃO. AUSÊNCIA. § 1º DO ART. 19 DA LEI Nº 12.965/2014. INDICAÇÃO DA URL E DECISÃO JUDICIAL ESPECÍFICA. NECESSIDADE. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. 1 ­ Não se conhece de recurso reproduzido em autos de ação conexa, se a sentença proferida é única para ambos os Feitos. 2 ­ A lei nº 12.965/2014 (“Marco Civil da Internet“) estabeleceu em seu artigo 19 que o provedor de internet somente pode ser civilmente responsabilizado por danos gerados por terceiros quando, após ordem judicial específica, não tomar providencias para tornar indisponível o conteúdo ofensor. 3 ­ O § 2º do art. da Lei 13.188/2015 exclui do termo “matéria“ os comentários realizados por usuários de internet nas páginas dos veículos de comunicação social, no caso em análise. A seu turno, o Superior Tribunal de Justiça possui entendimento de que a responsabilidade dos provedores de internet depende da existência de controle na publicação do material gerado pelos usuários. 4 ­ O Réu FACEBOOK não possui o dever de publicar, no perfil dos usuários apontados na inicial, vídeo de retratação, tendo em vista que, o vídeo não se enquadra no conceito de “matéria“, porque não se pode criar responsabilidade para o provedor de conteúdo de internet, quando este não possui controle do conteúdo “postado“ por seus usuários, destacando­se que caberia ao Autor atribuir diretamente às pessoas que indicou na petição inicial a responsabilidade de publicar o vídeo de retratação. 5 ­ Não pode o Juiz determinar que sejam indicadas URLs administrativamente e sem decisão judicial específica para fins de exclusão vídeo de perfis de usuários, quando a própria lei regente da matéria (§ 1º do artigo 19 da Lei nº 12.965/2014) determina que tal informação deverá constar na própria decisão judicial. Apelação Cível interposta nos Autos nº 2015.01.1.109107­6 não conhecida. Apelação Cível interposta nos Autos nº 2015.01.1.071659­3 provida. (TJ­DF 20150110716593 DF 0020959­95.2015.8.07.0001, Relator: ANGELO PASSARELI, Data de Julgamento: 08/11/2017, 5ª TURMA CÍVEL, Data de Publicação: Publicado no DJE : 24/11/2017 . Pág.: 384/386) Desse modo, é o caso de deferimento liminar do direito de resposta à autarquia Águas do Pantanal, proporcional ao agravo, a ser feita pela rede social da requerida, com prazo de permanência de, no mínimo, 15 (quinze) dias. ISSO POSTO, e por tudo mais que dos autos consta, DECIDO: a) RECEBER A PEÇA INICIAL, eis que preenche os requisitos legais previstos no art. 319 e não incide em nenhum dos defeitos do art. 330 do CPC ; b) DEFERIR PARCIALMENTE o pedido de TUTELA DE URGÊNCIA, forte no art. 300 CPC, conceder o DIREITO DE RESPOSTA e determinar à requerida SILVIANE APARECIDA ROSSI DA SILVA que promova a publicação, na mesma página do Facebook onde ocorreu a ofensa , de texto esclarecedor a ser fornecido pela Requerente Águas do Pantanal, sendo mantida pelo período mínimo de 15 (quinze) dias; c) Intime­se pessoalmente a requerida da presente decisão, devendo comprovar nos autos o seu cumprimento até 05 (cinco) dias após a disponibilização do texto pela autora; d) Encaminhe­se o feito ao CEJUSC para designar audiência de conciliação, conforme art. 334 § 1.º CPC ; e) Intime­se o autor do ato de conciliação; f) Cite­se o réu da presente ação e intime­se para comparecer à audiência de conciliação, ciente de que o prazo para contestar flui nos termos do art. 335 NCPC; g) Intimem­ se as partes. Às providências. Cumpra­se.

Intimação Classe: CNJ­46 PROTESTO

Processo Número: 1003346­43.2020.8.11.0006

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