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Doutrinas Essenciais - Novo Processo Civil - Processos nos Tribunais e Meios de Impugnação das Decisões Judiciais

Doutrinas Essenciais - Novo Processo Civil - Processos nos Tribunais e Meios de Impugnação das Decisões Judiciais

57. A Análise dos Recursos Excepcionais Pelos Tribunais Intermediários – O Pernicioso Art. 1.030 do Cpc e Sua Inadequação Técnica Como Fruto de Uma Compreensão Equivocada do Sistema de Precedentes Vinculantes

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Autor:

LUCAS BURIL DE MACÊDO

Doutorando em Direito Processual pela Universidade de São Paulo – USP. Mestre em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco – UFPE. Membro da Associação Norte Nordeste de Professores de Processo – ANNEP. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual – IBDP. Advogado. lucasburilmb@gmail.com

Sumário:

Área do Direito: Constitucional

Resumo: Este ensaio analisa o novo texto do art. 1.030 do CPC, modificado na primeira reforma legislativa do Código. Após demonstrar as preocupações que motivaram a sua nova redação e sistematizar o conteúdo normativo, são realizadas duas críticas. Primeira, porque ela preconiza como juízo de admissibilidade um provimento que adentra também o mérito do recurso, mediante juízos distintivos. Segunda: a sistematização acaba impedindo o STF e o STJ de cumprirem sua função constitucional de desenvolver o direito, especialmente por meio de superações. Ao fim, propõe-se uma interpretação conforme à Constituição para sanar parcialmente o problema do dispositivo normativo e, em seguida, uma proposta de modificação legislativa.Abstract: This essay analyses the new text of the rule 1.030 Brazilian Civil Procedure Code, modified in its first reform. After demonstrate the concerns that motivated the new redaction and propose the new rule meaning in a systemic approach, it makes two criticisms. First, because it preconizes as an admission decision what actually can be a decision based on merits, based on distinguishing. Second, because the impugnation circuit prevents de Brazilian Supreme Courts – Superior Tribunal de Justiça for federal legislation and Supremo Tribunal Federal for Constitution – from accomplish they constitutional role, by block the access to them in overruling discussions. The article finishes with a proposal of interpretation to the rule according to the Constitution and, after that, a proposal of statute reform.

Palavra Chave: Recurso Extraordinário - Recurso Especial - Juízo de admissibilidade - Precedentes - Superação.Keywords: Appeal - Writ of Certiorari - Admission - Precedents - Overruling.

Revista de Processo • RePro 262/187-221 • Dez./2016

1. Introdução

Recém-promulgada a Lei 13.105, de 16 de março de 2015, que instituiu o novo Código de Processo Civil, antes mesmo do transcurso de sua vacatio, a Lei 13.256, de 04 de fevereiro de 2016, alterou várias de suas disposições, modificando normas processuais de muita relevância. Até aí tudo bem, nada extraordinário que, em uma democracia, o jogo político, diante dos diversos interesses contrapostos, tenha levado à modificação da lei civil mais abrangente e uma das mais importantes. Aliás, o evento não teve como não trazer à memória a fatídica modificação que sofreu o CPC/1973 pela Lei 5.025, de 01 de outubro de 1973, igualmente antes de um ano de sua outorga.

A modificação, por si só, não é um problema. Na verdade, a revogação de normas é algo natural. É, aliás, imprescindível. E é justamente por não ter percebido isso que pecou o legislador reformista, como será demonstrado.

O Código de Processo Civil inova ao inaugurar um sistema de precedentes, que, embora esquematizado de modo concentrado nos arts. 926 e 927, impacta em vários institutos processuais. Nada obstante os dispositivos não constem do Capítulo I, do Título Único, do Livro I, da Parte Geral, pode-se afirmar com certa segurança que, ao menos pelo critério substancial, a obrigatoriedade dos precedentes – ou, simplesmente, princípio do stare decisis – é uma norma fundamental do processo civil. Isso fica claro ao passar os olhos pelo Código: a tutela de evidência (art. 311), a improcedência liminar (art. 332), a fundamentação (art. 489, § 1.º, V e VI), os poderes do relator (art. 932, IV e V) e a caução em cumprimento provisório (art. 521, IV) são algumas figuras processuais, entre tantas outras, que recebem forte influxo da sistemática de precedentes. 1

Certamente, o pretenso novo “juízo provisório de admissibilidade” dos recursos excepcionais tenta dialogar intimamente com o princípio do stare decisis. O grande problema é que, como esta pesquisa busca demonstrar, a reforma passou ao largo da compreensão adequada do sistema de precedentes. As regras estatuídas no art. 1.030 do CPC, oriundas da reforma da Lei 13.256/2016, ao tentar resgatar uma previsão contida no CPC revogado, acabaram por inserir na nova sistemática processual normas incompatíveis, um remendo deselegante e totalmente descabido. 2

A intenção deste trabalho é demonstrar o grave problema que a “novidade” no “juízo de admissibilidade dos recursos excepcionais” traz. Para isso, a mudança legislativa será inicialmente analisada de modo expositivo, para, em seguida, serem feitas considerações teóricas que demonstram os erros da nova regra e trazem um prognóstico irremediavelmente pessimista em relação à sua aplicação e efeitos perniciosos. No entanto, a fim de viabilizar o funcionamento constitucionalmente válido do circuito recursal positivado, é feita uma proposta interpretativa, de lege lata, e, finalmente, uma recomendação de lege ferenda.

2. O art. 1.030 do CPC/2015 – Breve histórico legislativo

Quando o Código de Processo Civil de 2015 veio a lume, entre as suas novidades estava a extinção do juízo de admissibilidade realizado pelo órgão a quo. Tanto a apelação como os recursos excepcionais, bem como o recurso ordinário, deixariam de ter o juízo de admissibilidade provisório, realizado pela instância inferior, que era feito por força dos arts. 541 e 542 do CPC/1973, de modo geral, e arts. 543-A, § 5.º, para a repercussão geral, 543-B, § 3.º, para recursos extraordinários repetitivos, e 543-C, § 7.º, para os recursos especiais repetitivos.

A mudança realizada pelo Código, no entanto, não agradou, especialmente aos ministros do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça. Com muita brevidade, então, passou-se a falar em necessidade de reforma do Código, para evitar efeitos maléficos à distribuição de justiça. Passou, então, a tramitar o PL 2.384 de 2015, de autoria do Deputado Federal Carlos Mandato (SD/ES), que viria a se tornar, posteriormente, e com várias modificações implementadas no processo legislativo, a Lei 13.256/2016. O então projeto de lei veio acompanhado da seguinte justificativa:

“Este projeto tem por objetivo reestabelecer e aprimorar a sistemática do juízo prévio de admissibilidade do recurso especial e extraordinário, suprimida pelo Novo Código de Processo Civil (Lei n. 13.105, de 16 de março de 2015). Tal medida se justifica em função da relevante função de filtro preclusivo do exame de admissibilidade nos tribunais locais.

A título de exemplo, no mecanismo atual, segundo informações do Superior Tribunal de Justiça, 48% (quarenta e oito por cento) dos recursos especiais interpostos na origem não foram remetidos àquela corte. Isso significa que de 452,7 mil recursos especiais, 78 mil foram admitidos, mas 146,8 mil foram trancados ainda nos tribunais locais e sem a interposição de agravo.

No Senado Federal, o projeto foi processado como Projeto de Lei da Câmara (PLC) 168, e o histórico legislativo mostra interessante manifestação da Comissão designada pelo Pleno do Superior Tribunal de Justiça para acompanhar a tramitação do referido projeto de lei. Neste arrazoado, assinado pelos Ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Isabel Gallotti e Marco Buzzi, há um enfático apelo à modificação do art. 1.030 do CPC, “a fim de reavivar o juízo de admissibilidade dos recursos especial e extraordinário”, apontando a relevância que desempenha para o funcionamento do STF e do STJ, sob pena de, diz a Comissão, “entulhar as Cortes Superiores com milhares e milhares de recursos manifestamente descabidos, fato que deporá contra a celeridade que se requer dessas instâncias extraordinárias no novo cenário de valorização da jurisprudência pelo novo Código”. 3

Se, de um lado, estranha que uma lei recém-aprovada precisasse de mudança, especialmente quando a sua tramitação foi dotada de tanta publicidade e de larga abertura à participação de interessados; noutro giro, é estarrecedor perceber que a mais abrangente lei cível foi confeccionada, no mínimo no tocante ao juízo de admissibilidade dos recursos excepcionais, sem qualquer preocupação com dados empíricos, sobretudo os que demonstram a gritante relevância do juízo de admissibilidade realizado pelo órgão a quo, e sem qualquer consideração à situação já caótica dos tribunais superiores. 4

Nesse ponto, fica claro que a processualística brasileira não aprendeu com as lições do passado. A mudança implementada pelo CPC poderia ocasionar um grave prejuízo – ou mesmo a inviabilização a médio prazo – da distribuição de justiça no Superior Tribunal de Justiça e no Supremo Tribunal Federal. 5 O alerta de Barbosa Moreira, realizado no início do século, de que são fundamentais os estudos empíricos para a adequada compreensão dos problemas práticos e, por conseguinte, para a sua solução eficaz, foi sumariamente ignorado e, consoante justificou o …

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25 de Maio de 2024
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