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17 de Junho de 2024
  • 2º Grau
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Tribunal de Justiça de Minas Gerais
há 9 meses

Detalhes

Processo

Publicação

Julgamento

Relator

Des.(a) Claret de Moraes

Documentos anexos

Inteiro TeorTJ-MG__11904711620238130000_2a551.pdf
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Inteiro Teor

Número do XXXXX-1/000 Númeração XXXXX-

Relator: Des.(a) Claret de Moraes

Relator do Acordão: Des.(a) Corrêa Junior

Data do Julgamento: 05/09/2023

Data da Publicação: 28/09/2023

EMENTA: EMENTA: RECURSO ADMINISTRATIVO - PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR - OFICIAL DE JUSTIÇA - MANIFESTAÇÃO PÚBLICA EM MÍDIA TELEVISIVA - IMPUTAÇÃO DE IRREGULARIDADES NO PROCESSO ELEITORAL E NA COMPUTAÇÃO DE VOTOS PELAS URNAS ELETRÔNICAS - SÚPLICA PELA SANAÇÃO INTERVENTIVA DOS VÍCIOS ALARDEADOS - DIFUNDIDA INEXISTÊNCIA DE INDÍCIOS DE VULNERAÇÃO - CARÁTER POLÍTICO, EMULATIVO E INSIDIOSO DAS CRÍTICAS - ATAQUE FRONTAL E INFUNDADO AO PODER JUDICIÁRIO - ART. 273, IV, DA LC N. 59/01 - OFENSA AO DEVER FUNCIONAL DE LEALDADE - ALEGADA OBSTACULIZAÇÃO DA GARANTIA CONSTITUCIONAL À LIVRE MANIFESTAÇÃO DO PENSAMENTO - NÃO CONFIGURAÇÃO - RESPONSABILIZAÇÃO ULTERIOR SEGUNDO AS NORMAS VIGENTES - ADVERTÊNCIA MANTIDA - RECURSO NÃO PROVIDO

- Na forma do disposto no artigo 273, IV, da Lei Complementar nº 59/2001, é dever do servidor do Poder Judiciário do Estado de Minas Gerais "ser leal ao órgão a que servir".

- Ante a convicção geral de que o agente público detém informações internas balizadoras da exteriorização de seu pensamento, as manifestações públicas do servidor devem ser orientadas pela prudência e pela temperança, eis que atreladas a sua imagem e a do ente público que integra.

- A divulgação pública de vulnerabilidades técnicas ressabidamente desprovidas de qualquer indício probatório, imputadas ao processo eleitoral e às urnas eletrônicas, por atentar contra a imagem e a credibilidade do próprio Poder Judiciário, configura a quebra do dever de lealdade disposto no artigo 273, IV, da Lei Complementar nº 59/2001.

- O conhecimento público do mister do oficial de justiça, em especial em comarcas do interior, torna desimportante a formal identificação do cargo ocupado no instante da exteriorização das informações inverídicas.

- O exercício da livre manifestação do pensamento não ilide a responsabilização do agente pela disseminação de fatos que atentam contra a disciplina funcional.

- Pena de advertência mantida. Recurso não provido.

V.V.: CONSELHO DA MAGISTRATURA - RECURSO ADMINISTRATIVO - PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR CONTRA OFICIAL DE JUSTIÇA - MANIFESTAÇÃO CONTRÁRIA AO RESULTADO DAS ELEIÇÕES DE 2022 - SUPOSTO DESCUMPRIMENTO DE DEVER FUNCIONAL - DESLEALDADE AO ÓRGÃO A QUE SERVE - INFRAÇÃO FUNCIONAL NÃO CARACTERIZADA - PENA DISCIPLINAR AFASTADA.

1. No contexto examinado em processo administrativo disciplinar, plausível concluir que o curto pronunciamento do recorrente, sem se identificar como servidor do Poder Judiciário (Oficial de Justiça Avaliador), fora do horário do expediente, sem incitar violência, sem teor agressivo, indicando sua mera insatisfação com o resultado das eleições presidenciais, no calor dos acontecimentos, ainda que tenha sido veiculada em matéria jornalística local, não revela ter o mesmo descumprido o seu dever de lealdade ao órgão a que serve, ou seja, ao Poder Judiciário (art. 273, IV, da LC 59/2001).

2. Em nome de uma pretensa defesa de uma lealdade ao órgão a que o recorrente serve, que não foi afetada, não se pode amordaçar o cidadão, impedindo-o de exercer a liberdade de manifestação do pensamento, direito assegurado constitucionalmente (art. 5º, inciso IV, CRFB).

REC ADM DISCPLIN SERVIDOR Nº 1.0000.23.119047-1/000 - COMARCA DE CARATINGA - REQUERENTE (S): JONATAS DA COSTA E SOUZA SERVIDOR DA 1a INSTÂNCIA OFICIAL JUDICIÁRIO (OFICIAL DE JUSTIÇA AVALIADOR) COMARCA DE CARATINGA

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, o CONSELHO DA MAGISTRATURA do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, por maioria, vencido o Relator, em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO.

DES. CLARET DE MORAES

RELATOR.

DES. CORRÊA JUNIOR

RELATOR PARA O ACÓRDÃO

DES. CLARET DE MORAES (RELATOR)

Recurso Administrativo interposto por JONATAS DA COSTA E SOUZA, servidor da 1a Instância, oficial judiciário (oficial de justiça avaliador) da Comarca de Caratinga/MG, contra decisão do MM. Juiz Max Wild de Souza, Diretor do Foro da Comarca de Caratinga/MG, nos autos de Processo Administrativo Disciplinar instaurado contra o recorrente, o condenou à pena de advertência por descumprimento do dever previsto no artigo 273, IV, da Lei Complementar Estadual nº 59/2001, nos seguintes termos finais:

Em suas razões recursais, sustenta, em síntese, ser indevida a penalidade que lhe foi imposta; a decisão tem cunho subjetivo, ignora as razões da sua defesa e a prova dos autos; não houve excesso ou abuso de direito de sua parte ao dar a entrevista em reportagem jornalística durante manifestação em Caratinga/MG contra resultado das eleições presidenciais; não questionou "os atores do processo eleitoral"; não descumpriu dever funcional, não se identificou como servidor ao proferir as palavras que foram veiculadas na matéria jornalística, não sendo desleal ao TJMG em sua entrevista que se deu fora do âmbito do trabalho; "não duvidou ou questionou o processo eleitoral", defendendo o Estado Democrático de Direito. Faz registros acerca da oitiva de testemunhas, considerações acerca da liberdade de expressão e apontamentos quanto a princípios constitucionais. Argumenta que jamais agiu de forma a violar normas do TJMG e da LC 59/2001, não havendo motivo para sua penalização. Requer o provimento do recurso, com a reforma da decisão, para que seja afastada sua punição.

A douta Procuradoria-Geral de Justiça se absteve de opinar (ordem nº 5).

É o relatório.

Recurso administrativo interposto antes de vencido o prazo de 10 (dez) dias previsto no art. 20 da Resolução nº 651/2010, do Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais.

Dele conheço, porque atendidos os pressupostos de admissibilidade, sendo atribuição do Conselho da Magistratura o julgamento de recurso contra decisão proferida pelo Desembargador Corregedor-Geral de Justiça (art. 40, inciso I do RITJMG) ou por Juiz

(íza) de Direito mediante delegação daquele, como no caso em apreço.

Procedimento Administrativo Disciplinar instaurado por meio de decisão do MM. Juiz Max Wild de Souza, Diretor do Foro da Comarca de Caratinga/MG, de 02 de janeiro de 2023, contra o ora recorrente, na condição de oficial de justiça da Comarca de Caratinga/MG, para apuração de eventual responsabilidade funcional por suposta violação ao dever estatuído no artigo 273, IV, da Lei Complementar Estadual nº 59/2001, que assim estabelece:

"Título V

Do Regime Disciplinar dos Servidores do Poder Judiciário

Capítulo I

Dos Deveres

Art. 273 - São deveres comuns aos servidores dos órgãos auxiliares dos Tribunais e da Justiça de Primeira Instância:

(...)

IV - ser leal ao órgão a que servir;"

Nos termos da decisão recorrida, o MM. Juiz, contrariamente ao sugerido pela Comissão Processante, concluiu ter ficada configurada a falta funcional por parte do servidor processado, ao dar entrevista a canal televisivo local, durante manifestação em frente ao local "Tiro de Guerra", em Caratinga/MG, quando proferiu os seguintes dizeres:

O ilustre magistrado concluiu que o servidor processado, ao expor, por meio da entrevista, sua insatisfação com o resultado das urnas e ao questionar a lisura e transparência do processo eleitoral, teria sido desleal com o órgão a que serve, no caso o Poder Judiciário.

Fundamenta:

E mais:

Em razão de tais fundamentos, o Juiz Diretor do Foro impôs ao recorrente a penalidade de advertência (art. 281, I, c/c 283 da LCE 59/2001).

A matéria jornalística publicada nas redes sociais revela uma mera manifestação por parte do ora recorrente, quando se encontrava na porta do quartel do "Tiro de Guerra" de Caratinga/MG, juntamente com outras pessoas, externando sua insatisfação pessoal com o resultado das eleições presidenciais de 2022, no calor dos acontecimentos e paixões que marcaram a disputa à Presidência da República.

Suas palavras, sem conteúdo de infidelidade ao órgão a que serve, foram proferidas fora do horário de trabalho e sem que ele se identificasse como servidor público do Poder Judiciário, sendo divulgadas por uma emissora local, mas sem notícia de que tenham ocorrido maiores repercussões fora do âmbito do presente PAD.

Seu pronunciamento, sem teor agressivo, não carregou elementos que fossem capazes de configurar típica deslealdade ao órgão a que serve. Ele não buscou, de forma consciente e desrespeitosa, direcionar opinião sobre assuntos internos ou críticas ao órgão no qual trabalha.

Contextualmente, fez uso de sua liberdade de expressão, nos limites do aceitável em um Estado Democrático de Direito, numa "sociedade aberta dos intérpretes da Constituição" - enquanto "fenômeno cultural" -, em que os direitos se encontram reciprocamente condicionados, em sua função social, conforme Peter Häberle (in La Liberdad Fundamental em el Estado Constitucional; in Hermenêutica constitucional: a sociedade aberta dos intérpretes da constituição: contribuição para a interpretação pluralista e "procedimental" da constituição).

Essa liberdade pode ser exercida nos limites da razoabilidade e proporcionalidade, com bom senso, próprio da vida em sociedade.

Lembrando que, por um lado, a comunidade inteira fica afetada quando se impede a um concidadão o exercício de um direito fundamental (Ronald Dworkin, "Levando Direitos a Sério", capítulo 7). Por outro, deve-se ter cautela para que visões estritamente liberal e, acima de tudo, unilateral não avalizem a prática de excessos no exercício desse direito fundamental, em detrimento de direitos fundamentais alheios.

É plausível que a interpretação do fato analisado sob a ótica constitucional busque harmonia com a ideia de que direitos fundamentais devem ser considerados como parte integrante de um sistema de correlações e de que todo exercício de um direito fundamental é, essencialmente, forma de manifestação de uma atividade social.

Tal exercício deve se dar com equilíbrio e parcimônia, sem ofender direitos individuais e coletivos e, no caso de um servidor público, sem constituir ato de improbidade que, para tanto, reúna elementos de ilegalidade, imoralidade e deslealdade, em detrimento de direitos fundamentais alheios.

Tendo isso em mente e na linha do relatório final da Comissão Processante, ainda que se pudesse recomendar ao ora recorrente mais prudência quanto à sua adesão, em tese, a ondas ideológicas e aos decorrentes tons de críticas mais efusivas ao sistema eleitoral brasileiro nos tempos de eleição, ele não chegou a incorrer em ato ímprobo de vulneração de seu dever moral de lealdade ao Poder Judiciário.

Diferentes graus da reprovabilidade que se poderia atribuir, informal e subjetivamente, às suas palavras se situam no contextual "calor" das opiniões contrapostas acerca do agitado processo eleitoral brasileiro de 2022; mas, dada a inofensividade de seu teor e de sua exposição,os termos usados pelo recorrente não respaldam a sua penalização neste PAD.

No contexto examinado neste processo administrativo disciplinar, enfim, é plausível concluir que o curto pronunciamento do recorrente, sem se identificar como servidor do Poder Judiciário (oficial de justiça avaliador), fora do horário do expediente, sem incitar violência, sem teor agressivo, sugerindo sua mera insatisfação com o resultado das eleições presidenciais de 2022, no calor dos acontecimentos, ainda que tenha sido veiculada em matéria jornalística local, não revela ter o mesmo descumprido o seu dever de lealdade ao órgão a que serve, ou seja, ao Poder Judiciário (art. 273, IV, da LC 59/2001).

Em nome de uma pretensa defesa de uma lealdade ao órgão a que o recorrente serve, que não foi afetada, não se pode amordaçar o cidadão, impedindo-o de exercer a liberdade de manifestação do pensamento, direito assegurado constitucionalmente (art. 5º, inciso IV, CRFB).

Em síntese, o fato narrado neste Processo Administrativo Disciplinar não configura infração disciplinar, devendo ser este arquivado, nos termos do art. 292, Parágrafo único, da Lei Complementar Estadual de MG nº 59/2001.

DISPOSITIVO

À luz do exposto, dou provimento ao recurso, reformo a decisão recorrida, proferida pelo MM. Juiz Diretor do Foro da Comarca de Caratinga, acolho o parecer da Comissão Processante e determino o arquivamento do Processo Administrativo Disciplinar nº 02/2023 instaurado contra o recorrente.

Sem custas.

É como voto.

DES. CORRÊA JUNIOR (RELATOR PARA O ACÓRDÃO)

VOTO

Com a vênia devida ao convencimento motivado externado, divirjo do ilustrado voto proferido pelo eminente Relator.

Cuida-se de recurso administrativo contra a aplicação, pelo Juiz de Direito Diretor do Foro da comarca de Caratinga, de pena de advertência ao recorrente, que ocupa o cargo oficial de justiça e propalou publicamente, em rede de televisão local, menções pejorativas à higidez da atuação da Justiça Eleitoral e à segurança de seus equipamentos.

De acordo com as ilações propaladas, o recorrente, durante ato coletivo visando a concitar, sem qualquer amparo constitucional, a intervenção do Exército Brasileiro, sob a pretensa justificativa de "defender o Brasil" do resultado eleitoral contrário à sua ideologia política, irrogou publicamente, por meio de instrumento de mídia televisiva, infundadas dúvidas acerca da lisura do processo eleitoral e da transparência das urnas eletrônicas.

Sem embargo de outras possíveis repercussões jurídicas advindas da conduta perpetrada, é certo que, à luz do específico enfoque funcional atinente à atuação correcional em espeque, sobressai de modo clarividente a configuração de patente e deliberada intenção de atentar contra a imagem do Órgão Jurisdicional a que vinculado o recorrente.

Na forma do disposto no artigo 273, IV, da Lei Complementar nº 59/2001, é dever do servidor do Poder Judiciário do Estado de Minas Gerais "ser leal ao órgão a que servir".

O conceito de lealdade deve ser compreendido de modo a ensejar, como balizamento de conduta, a exteriorização de respeito irrestrito à instituição a que integra o próprio recorrente.

Ao propalar infundadas palavras atentatórias à higidez da atuação do Poder Judiciário, máxime ante o caráter umbilical desta Corte da Justiça com os atos materiais e judiciais adjacentes ao processo eleitoral no âmbito do território mineiro, ressoa indene de dúvidas o intencional intuito do oficial de justiça de desqualificar a atuação institucional, com vistas à instalação de ambiente de insegurança consentâneo com a disrupção do Estado Democrático de Direito colimada pela manifestação.

Incutindo nos cidadãos e cidadãs a falsa ideia - porquanto ressabidamente inexistentes os indícios de falibilidade dos equipamentos eleitorais - de que vulneráveis as urnas eletrônicas, o oficial de justiça desacreditou a própria instituição, em manobra patentemente gravada pela deslealdade para com o Poder em que labora.

E não se pode olvidar que os impropérios infundadamente ecoados pelos irresignados com a vontade declinada pela maioria dos eleitores tomam contornos de ainda maior gravidade quando propalados, como no caso corrente, por servidores inseridos na estrutura administrativa do Órgão Público afetado ao processo eleitoral.

Ora, alardeada a infundada insegurança técnica por agente

público identificado pelos destinatários leigos como atuante na própria atividade menoscabada, a ilação maliciosa adquire a falsa imagem de plausibilidade e granjeia a crença daqueles que identificam o oficial de justiça como conhecedor das imaginárias manipulações ocorridas na fase interna da apuração dos votos.

Logo, a intencional difusão da ideia de insegurança por agente identificável como inserido na própria atividade desacreditada configura a deslealdade tipificada nas normas funcionais como dever ínsito ao servidor público.

Não desnatura a conclusão alcançada, com a redobrada vênia devida, a ausência de explícita identificação da condição de servidor da justiça no instante da manifestação.

Emerge da própria designação "cargo público" que a função desempenhada por seus ocupantes se traduz na representação, pelo particular investido, da imagem e da vontade do Estado.

Ao exercitar o seu mister na busca pela consecução do interesse público, o servidor se apresenta perante a sociedade como agente personificador do Ente Estatal, do que deságua a indissociação de seus atos e de sua imagem à ideia de Poder Público incutida na compreensão dos demais particulares.

A constatação que se alcança é ainda mais reforçada à luz das atividades laborais do oficial de justiça, que, na qualidade de "longa manus" da atuação jurisdicional, é deveras conhecido e transita perante a sociedade com a inafastável imagem do Poder judiciário, máxime em comarcas do interior.

Destarte, a aparição televisiva de grande difusão na esfera regional de atuação tem como irrespondível consequência o atrelamento da imagem e da mensagem do recorrente à instituição que ostensivamente representa, independentemente da formal indicação de seu cargo na aparição pública ora em voga.

Via de consequência, a imperiosa observância do dever funcional de lealdade ao Judiciário impõe ao servidor a temperança e a prudência em suas manifestações e aparições públicas, posto que sempre atreladas à imagem do Poder Público que representa.

Não se obstaculiza, com a imposição do comentado dever, o legítimo exercício da garantia constitucional à liberdade da manifestação do pensamento, que, assim como todas as salvaguardas constitucionais, não ostenta o caráter absoluto e faz disparar, quando de seu indevido exercício, a busca pela correspondente responsabilização legal.

A partir da publicamente patente inexistência de elementos de prova, mesmo que meramente indiciários, denotadores da vulnerabilidade das urnas eletrônicas e da indevida atuação judiciária na condução do processo eleitoral, a irresponsável propagação das ilações em exame toma contornos de patente infração funcional, diante da configuração de ataque direto e infundado à própria instituição em que inserido o agente público manifestante.

Não há que se falar, portanto, em impedimento ao livre exercício do direito vindicado; ao contrário, está-se diante da correspondente responsabilização legal, haja vista o caráter emulativo, insidioso e desleal das inverdades propaladas.

Pelo exposto, divirjo respeitosamente do ilustrado voto de relatoria e nego provimento ao recurso.

É como voto.

DESA. VALERIA RODRIGUES

Peço vênia ao e. Relator para acompanhar a divergência inaugurada pelo

e. Desembargador Corrêa Júnior.

DES. DIRCEU WALACE BARONI

De acordo com o (a) Relator (a).

DES. ALBERTO VILAS BOAS

Na espécie em exame, não comungo da argumentação do e. Relator.

Com efeito, o recorrente é servidor do Poder Judiciário na comarca de Caratinga, e, após o resultado das últimas eleições presidenciais, participou de entrevista a um canal de televisão regional, ocasião em que questionou a lisura do pleito e o fato de seu pretenso candidato não ter sido reeleito.

Malgrado não tenha se identificado como servidor do Tribunal de Justiça, torna-se possível admitir que o exercício de seu direito de expressão significou menosprezo evidente a todo o esforço institucional desenvolvido pelo Poder Judiciário para gerar confiabilidade quanto ao resultado das eleições presidenciais de 2022.

Por certo, ele não foi leal a uma instituição que objetiva garantir a licitude do processo democrático mediante eleições nas quais todos os candidatos são tratados de forma igualitária e sem sectarismos de qualquer ordem.

Outrossim, ao sinalizar que as urnas não eram transparentes e que o resultado eleitoral não traduziu a lisura que dele se esperava, é certo que o servidor-recorrente desenvolveu conduta que objetivava deixar claro que o Poder Judiciário atuou de forma ilícita e conduziu-se de modo a forjar um resultado que, sob sua ótica, não seria condizente com o interesse de parte do país.

Se o Poder Judiciário é o maior fiador das liberdades constitucionais, não é admissível que o servidor que o integra faça uso inapropriado do direito de expressão para criar, no imaginário das pessoas, a falsa ideia de que houve alguma forma ilegal de agir da instituição que ele integra e com a qual colabora para que os direitos fundamentais sejam garantidos.

Fundado nessas razões, acompanho a divergência inaugurada pelo Corregedor-Geral de Justiça, data venia do Relator e nego provimento ao recurso.

DES. MOACYR LOBATO

No caso dos autos, com a devida vênia ao e. Relator, acompanho a divergência inaugurada pelo e. Desembargador Corrêa Júnior.

DESA. ANA PAULA CAIXETA

Estabelecida a divergência entre meus pares, peço vênia ao eminente Relator, Desembargador Ronaldo Claret de Moraes, para acompanhar a divergência instaurada pelo ilustre Vogal, Desembargador Luiz Carlos de Azevedo Corrêa Junior.

DES. PAULO CALMON NOGUEIRA DA GAMA

Peço vênia para acompanhar a divergência, fazendo-o na esteira do r. voto do em. Des. Corrêa Júnior.

A liberdade de pensamento, claro, é absoluta em seu aspecto íntimo. Contudo, sua exteriorização (e os atos dela decorrentes)é que encontra limitações, exatamente em preceitos e deveres jurídicos, morais, éticos... A assunção e exercício de cargo e função pública trazem bônus e ônus, direitos e obrigações.

Viola o dever ético-institucional aquele que, em comportamento

ativista, exterioriza crítica rasa, sem lealdade e sem competência para auditar determinada função desempenhada por colegas, fazendo-o em contrariedade aos árduos trabalhos institucionais e à credibilidade das atividades por eles desenvolvidas. Já bastam ao Judiciário os questionamentos, não raramente indevidos e parciais, dos próprios contendores políticos e seus apoiadores; uma crítica de servidor da ativa (mais do que a do cidadão comum), notadamente aquele que não tem atribuição para aperfeiçoar os pontos que critica, transforma-se em indevido "argumento de autoridade" àqueles que buscam desacreditar o processo levado a efeito pela Instituição, haja ou não razão legítima para tanto.

Direito sancionatório possui tipologia aberta, a conduta bem se amolda ao preceito invocado, sendo que a pena em questão se mostra adequada e não excessiva.

Voto de acordo COM A DIVERGÊNCIA.

DES. RENATO DRESCH

Trata-se de Recurso Administrativo interposto por JONATAS DA COSTA E SOUZA contra o resultado de Processo Administrativo Disciplinar (PAD) que culminou em sua condenação à pena de advertência, por ofensa ao dever previsto no art. 273, IV, da Lei Complementar estadual (LCe) nº 59/2001.

O eminente Relator, Des. Claret de Moraes, dá provimento ao recurso, para afastar a penalidade e determinar o arquivamento do PAD.

A seu turno, o Des. Corrêa Júnior inaugura divergência para negar provimento ao recurso e, assim manter a sanção.

Peço vênia ao eminente Relator para divergir de seu voto pelos motivos que passo a expor.

O dispositivo apontado ofendido tem a seguinte redação:

Art. 273 - São deveres comuns aos servidores dos órgãos auxiliares dos Tribunais e da Justiça de Primeira Instância:

(...)

IV - ser leal ao órgão a que servir;

Na espécie, embora o autor do fato não tenha se manifestado publicamente de maneira expressa contra o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), órgão ao qual vinculado, consabido que o Poder Judiciário é uno, compreendendo também as demais instituições, entre elas a Justiça Eleitoral.

Assim, o questionamento infundado sobre a atuação dela no processo eleitoral pode ser considerado atentatório ao Poder Judiciário e, por isso, caracterizar deslealdade.

De outro lado, mesmo que o exercício da livre manifestação de opiniões e pensamento - nisso compreendidos aqueles de orientação política, religiosa, etc. - seja garantia constitucional das mais importantes, tal não pode desbordar para excessos, com viés antidemocrático, em desapreço às instituições. E aqui o contexto importa, pois as dúvidas sobre o regular funcionamento do sistema eleitoral foram levadas às "proximidades do Tiro de Guerra local" e em relação ao resultado do pleito.

Além, ganha maior gravidade sua veiculação em matéria jornalística televisiva, com razoável divulgação local em redes sociais, em entrevista prestada por pessoa conhecida no meio como servidor público dos quadros do Poder Judiciário.

Não se cuida, destarte, de censurar a orientação política de quem

quer que seja, nem de impor penalidade por essa escolha, mas de trazer o servidor público à sua responsabilidade, enquanto agente político (lato senso).

Sobre a interpretação que deve ser dada ao art. 5º, IV, da CF, colaciono excerto de julgados do Supremo Tribunal Federal (STF):

A Democracia não existirá e a livre participação política não florescerá onde a liberdade de expressão for ceifada, pois esta constitui condição essencial ao pluralismo de ideias, que por sua vez é um valor estruturante para o salutar funcionamento do sistema democrático. A livre discussão, a ampla participação política e o princípio democrático estão interligados com a liberdade de expressão, tendo por objeto não somente a proteção de pensamentos e ideias, mas também opiniões, crenças, realização de juízo de valor e críticas a agentes públicos, no sentido de garantir a real participação dos cidadãos na vida coletiva. São inconstitucionais os dispositivos legais que tenham a nítida finalidade de controlar ou mesmo aniquilar a força do pensamento crítico, indispensável ao regime democrático. Impossibilidade de restrição, subordinação ou forçosa adequação programática da liberdade de expressão a mandamentos normativos cerceadores durante o período eleitoral. Tanto a liberdade de expressão quanto a participação política em uma Democracia representativa somente se fortalecem em um ambiente de total visibilidade e possibilidade de exposição crítica das mais variadas opiniões sobre os governantes. O direito fundamental à liberdade de expressão não se direciona somente a proteger as opiniões supostamente verdadeiras, admiráveis ou convencionais, mas também aquelas que são duvidosas, exageradas, condenáveis, satíricas, humorísticas, bem como as não compartilhadas pelas maiorias. Ressalte-se que, mesmo as declarações errôneas, estão sob a guarda dessa garantia constitucional. Ação procedente para declarar a inconstitucionalidade dos incisos II e III (na parte impugnada) do artigo 45 da Lei 9.504/1997, bem como, por arrastamento, dos parágrafos 4º e 5º do referido artigo. ( ADI 4.451, Rel. Min. Alexandre de Moraes, j. 21/06/2018, pub. 06/03/2019) (destaquei)

"Marcha da Maconha". Manifestação legítima, por cidadãos da República, de duas liberdades individuais revestidas de caráter fundamental: o direito de reunião (liberdade-meio) e o direito à livre expressão do pensamento (liberdade-fim). (...) Vinculação de caráter instrumental entre a liberdade de reunião e a liberdade de manifestação do pensamento. (...) A liberdade de expressão como um dos mais preciosos privilégios dos cidadãos em uma república fundada em bases democráticas. O direito à livre manifestação do pensamento: núcleo de que se irradiam os direitos de crítica, de protesto, de discordância e de livre circulação de ideias. Abolição penal (abolitio criminis) de determinadas condutas puníveis. Debate que não se confunde com incitação à prática de delito nem se identifica com apologia de fato criminoso. Discussão que deve ser realizada de forma racional, com respeito entre interlocutores e sem possibilidade legítima de repressão estatal, ainda que as ideias propostas possam ser consideradas, pela maioria, estranhas, insuportáveis, extravagantes, audaciosas ou inaceitáveis. O sentido de alteridade do direito à livre expressão e o respeito às ideias que conflitem com o pensamento e os valores dominantes no meio social. Caráter não absoluto de referida liberdade fundamental ( CF, art. 5º, IV, V e X; Convenção Americana de Direitos Humanos, art. 13, § 5º). A proteção constitucional à liberdade de pensamento como salvaguarda não apenas das ideias e propostas prevalecentes no âmbito social, mas, sobretudo, como amparo eficiente às posições que divergem, ainda que radicalmente, das concepções predominantes em dado momento histórico-cultural, no âmbito das formações sociais. O princípio majoritário, que desempenha importante papel no processo decisório, não pode legitimar a supressão, a frustração ou a aniquilação de direitos fundamentais, como o livre exercício do direito de reunião e a prática legítima da liberdade de expressão, sob pena de comprometimento da concepção material de democracia constitucional. A função contramajoritária da jurisdição constitucional no Estado Democrático de Direito. Inadmissibilidade da "proibição estatal do dissenso". Necessário respeito ao discurso antagônico no contexto da sociedade civil compreendida como espaço privilegiado que deve valorizar o conceito de "livre mercado de ideias". O sentido da existência do free marketplace of ideas como elemento fundamental e inerente ao regime democrático ( AC 2.695 MC/RS, rel. min. Celso de Mello). A importância do conteúdo argumentativo do discurso fundado em convicções divergentes. A livre circulação de ideias como signo identificador das sociedades abertas, cuja natureza não se revela compatível com a repressão ao dissenso e que estimula a construção de espaços de liberdade em obséquio ao sentido democrático que anima as instituições da República. As plurissignificações do art. 287 do CP: necessidade de interpretar esse preceito legal em harmonia com as liberdades fundamentais de reunião, de expressão e de petição. Legitimidade da utilização da técnica da interpretação conforme à Constituição nos casos em que o ato estatal tenha conteúdo polissêmico. ( ADPF 187, Rel. Min. Celso de Mello, j. 15/06/2011, pub. 29/05/2014) (destaquei)

Ou seja, ao agente público é dado manifestar-se, na condição de cidadão, defendendo a linha de pensamento que melhor lhe aprouver, sempre em respeito às instituições a aos entendimentos distintos ou até opostos. Mas não lhe é dado criticar, enquanto servidor e sem elementos plausíveis, os fundamentos da república, dentre eles o próprio pluralismo político, assegurado pelos órgãos do Poder Judiciário.

Diante disso, reputo enquadrado o fato naquela conduta típica e, por isso, punível.

Ademais, tem-se que a penalidade aplicada foi a mínima prevista na legislação, nisso proporcional à falta cometida, tão somente para o fim de orientação ao servidor para que permaneça atento a práticas semelhantes.

Com essas considerações, voto por negar provimento ao recurso administrativo.

É como voto.

SÚMULA: "RECURSO NÃO PROVIDO, POR MAIORIA"

Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/tj-mg/1984141713/inteiro-teor-1984141719

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