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17 de Junho de 2024
  • 1º Grau
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TJSP • Procedimento do Juizado Especial Cível • Responsabilidade do Fornecedor • XXXXX-93.2016.8.26.0005 • Juizado Especial Cível - CIC Zona Leste - Foro Regional V - São Miguel Paulista do Tribunal de Justiça de São Paulo - Inteiro Teor

Tribunal de Justiça de São Paulo
há 7 anos

Detalhes

Processo

Órgão Julgador

Juizado Especial Cível - CIC Zona Leste - Foro Regional V - São Miguel Paulista

Assuntos

Responsabilidade do Fornecedor, Substituição do Produto

Juiz

Fabiana Tsuchiya

Partes

Documentos anexos

Inteiro TeorContestação - Páginas 42 - 62.pdf
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EXM.º SR. DR. JUIZ DE DIREITO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL DE SÃO MIGUEL PAULISTA/SP

PROCESSO Nº XXXXX-93.2016.8.26.0005

QBEX COMPUTADORES LTDA. , nos autos do processo supra, que lhe move SIDCLEY ROBERTO DA SILVA , por seu advogado infra firmado, constituído mediante instrumento procuratório incluso, com escritório situado no endereço constante abaixo, vem apresentar sua peça defensiva, expondo e requerendo o que se segue:

RESUMO DOS FATOS:

1. Aduz o autor haver adquirido um celular em 04/16, no valor de R$699,00, fabricado por esta acionada, o qual, supostamente, apresentou vício, sendo encaminhado para a assistência técnica, mas o reparo não teria ocorrido no prazo legal, em razão do que requer a restituição da quantia paga pelo produto, além da indenização por danos morais.

2. De início, com o fito de por fim ao litígio e de demonstrar a boa fé da acionada, propõe, a título de acordo, a substituição do produto, acrescido de R$300,00, ou a restituição do valor pago, acrescido de R$200,00, no prazo de 30 dias úteis, a contar do próximo dia útil subsequente à audiência de conciliação, sendo necessária, para tanto, a indicação de endereço atualizado, telefone e e-mail, além da nota fiscal e CPF.

DAS PRELIMINARES DE MÉRITO:

DA CARÊNCIA DE AÇÃO POR FALTA DE INTERESSE DE AGIR

3. Observa-se que não ficou evidenciado que o produto adquirido pela autora tenha permanecido por mais de trinta dias sem ter sido sanado o vício alegado, é de ser conhecida e acolhida a preliminar de falta de interesse de agir . E isto porque, para terem incidência as hipóteses contidas no art. 18, § 1º, do CDC - onde se inclui o direito de restituição do valor pago pretendido pelo demandante -, necessário é que se ultrapasse a condição ali prevista, no sentido de que o vício não seja sanado no prazo máximo de trinta dias.

4. Não há qualquer notícia de que o autor tenha buscado contato com a acionada para obter a substituição ou a restituição do valor, embora a acionada disponibilize diversos canais de atendimento ao consumidor.

5. Com efeito, a supressão da condição em comento acabaria por cercear a defesa da própria demandada, que impossibilitada ficaria de produzir prova em contrário às alegações da demandante, como, por exemplo, a inexistência do vício, a de que o mesmo se deu em situação que afasta a responsabilidade do fornecedor - como o fato exclusivo da vítima -, ou ainda a de que aquele risco não estaria coberto pela garantia, mormente quando o autor não produziu prova sequer da existência dos vícios alegados. E ainda mais quando se está diante de fato negativo em que a inversão do ônus da prova, em vez de incumbir a sua produção àquele que teoricamente teria mais condições de produzi-la, oneraria justamente aquele que teve tolhida a sua oportunidade de produção probatória.

DA INCOMPETÊNCIA EM RAZÃO DA COMPLEXIDADE DA MATÉRIA

6. Deve ser ainda reconhecida a incompetência deste juízo para julgar a presente demanda, uma vez que a mesma impõe complexidade que não se compatibiliza com os princípios norteadores da Lei 9.099/95.

7. A matéria discutida nestes autos abrange, fatalmente, a necessidade de se proceder a uma perícia técnica no aparelho objeto da lide, único procedimento capaz de esclarecer se decorreria de vício do produto ou da má utilização deste, a ser realizada por perito designado por este Juízo, o que confere extrema complexidade ao feito.

8. Desse modo, em havendo necessidade de uma perícia técnica especializada, a ser efetivada nos moldes previstos no Código de Processo Civil, torna-se inadequado o procedimento previsto na Lei 9.099/95.

9. Sobre a matéria vale a transcrição dos ensinamentos do mestre Joel Dias Figueira Júnior , em sua obra "Da Competência nos Juizados Especiais Cíveis", Editora Revista dos Tribunais, pag. 59:

"Contudo, poucas não serão as vezes em que o juiz instrutor terá de valer-se não de"inquirição"de técnico, mas de verdadeira prova pericial, o que é inadmissível nos Juizados Especiais. Nestes casos, para que nos mantenhamos fiéis ao requisito constitucional da menor complexidade da causa e do princípio da simplicidade que deve orientar todo o processo, parece-nos que a solução está em o juiz declarar-se incompetente (de ofício ou mediante requerimento da parte) e remeter as partes as vias ordinárias, extinguindo o processo, sem julgamento do mérito (art. 51, inc. II), em razão da inadmissibilidade procedimental específica, diante da complexidade assumida pela demanda, após a audiência infrutífera de conciliação"

DO MÉRITO:

10. No mérito, impõe-se a improcedência dos pedidos, isto porque o autor não logrou bom êxito na demonstração dos fatos constitutivos de seu direito.

11. Não há qualquer notícia de que o autor tenha buscado contato com a acionada para obter a substituição ou a restituição do valor, embora a acionada disponibilize diversos canais de atendimento ao consumidor.

12. Ora, preleciona a doutrina pátria que os ônus representariam condutas a serem praticadas em prol de interesse próprio, cuja não desincumbência implicaria em prejuízo ao próprio onerado, sem imposição de qualquer sanção, ao contrário das obrigações, que são praticadas em favor de outrem, com estabelecimento de sanção na hipótese de descumprimento.

13. O Código de Processo Civil distribuiu o ônus da prova de forma a estabelecer igualdade entre as partes na defesa de seus próprios interesses na formação do convencimento do juiz, de tal forma que cabe ao autor a prova dos fatos constitutivos e ao réu, dos fatos impeditivos, modificativos ou extintivos de seu direito.

14. Na lição de Cândido DINAMARCO (2001:72 e 248), a síntese das disposições contidas no art. 373 do CPC consiste "na regra de que ônus da prova incumbe à parte que tiver interesse no reconhecimento do fato a ser provado (...) A alegação do fato deve ser provada pela parte a quem interessa, sob pena deste ser considerado inexistente."

15. O inciso VIII do art. do CDC possibilita a inversão do ônus probandi , com o escopo de facilitar a defesa dos direitos do consumidor. Tal inversão, contudo, não é automática - ope legis - dependendo das circunstâncias concretas preencherem os requisitos legais, de acordo com a apreciação do magistrado (ope iudicis). O ônus da prova só deve ser invertido quando o requerente tiver dificuldades para a demonstração do seu direito dentro das regras processuais comuns ditadas pelo CPC, e presentes a hipossuficiência (econômica ou técnica) ou a verossimilhança da alegação.

16. Entretanto, ainda que a lide envolva uma relação de consumo, que privilegia o consumidor através da inversão do ônus da prova, este não está dispensado de produzir mínima prova a amparar sua alegação, sob pena de afastar a verossimilhança do seu relato.

DO PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS

17. No que tange ao pleito indenizatório por danos morais, este constitui apenas meio de enriquecimento ilícito, sem qualquer amparo fático ou jurídico, já que a autora não teria demonstrado a ocorrência de nenhuma lesão extrapatrimonial passível de reparação, não havendo agasalho constitucional para a aplicação do instituto do dano moral de caráter desestimulador.

18. Tal pretensão vem fomentando o tão propalado fenômeno da "indústria do dano moral", que somente serve para desvirtuar um tão precioso instituto de foro constitucional, como também para entulhar os nossos juizados civis de processos de igual natureza.

19. A este respeito, devem-se ponderar as lições de Sérgio Cavalieri Filho, segundo o qual o dever de indenizar advém de intensa dor ou sofrimento experimentado pelo ofendido.

"Mero dissabor, aborrecimento, mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada estão fora da órbita do dano moral, porquanto, além de fazerem parte da normalidade do nosso diaadia, no trabalho, no trânsito, entre os amigos e até no ambiente familiar, tais situações não são intensas e duradouras, a ponto de romper o equilíbrio psicológico do indivíduo. Se assim não se entender, acabaremos por banalizar o dano moral, ensejando ações judiciais em busca de indenização pelos mais triviais aborrecimentos" (in programa de responsabilidade civil, 5a ED. Revista, ampliada e atualizada de acordo com o novo Código Civil, São Paulo: Malheiros editores, 2004. Pp. 149).

20. A jurisprudência das Turmas Recursais tem-se posicionado no sentido de entender a inocorrência de danos morais nas hipóteses de vício de produto que não envolva abalo psicológico, como também de não dar guarida à vulgarização do referido instituto, conforme se lê de um de seus acórdãos:

"COMPRA PELA INTERNET-CLIMATIZADOR DE AR-FRUSTRACAO

DE EXPECTATIVA-PROPAGANDA ENGANOSA-VíCIO DO PRODUTO-AUSENCIA DE COMPROVACAO

Ementa: Recurso Inominado Conhecido, eis que preenchidos os requisitos de admissibilidade e no mérito Provido. Reforma in totum da respeitável sentença recorrida. Após analisar as manifestações das partes, os documentos e a sentença impugnada, estou convencido de que a mesma merece ser reformada. Preliminar de nulidade de citação que se rejeita. A citação chegou ao conhecimento do Recorrente, conforme se pode constatar da cópia acostada no recurso as fls. 88/89. Aplicação da teoria da aparência. A Corte Especial do STJ já firmou entendimento no sentido de que é válida a citação de pessoa jurídica feita em pessoa que se apresenta como representante legal da empresa e recebe a citação sem ressalva quanto à inexistência de poderes de representação em juízo (AgRg nos EREsp XXXXX/PR, Rel. Min. ELIANA CALMON, CORTE ESPECIAL). A revelia caracterizada pela ausência de contestação ou a apresentação intempestiva desta, não conduz à procedência do pedido deduzido na demanda salvo se verificado pelo magistrado que, do exame das provas colacionadas aos autos suficientes ao seu convencimento, resulte a presunção de veracidade, o que não ocorreu na hipótese em análise. Orientação firme do STJ nesse sentido: Relator o Senhor Ministro Ruy Rosado de Aguiar, decidiu a Quarta Turma, que o" efeito da revelia não dispensa a presença, nos autos, de elementos suficientes para o convencimento do juiz "(REsp nº 261.310?RJ, DJ de 27?11?00). A mesma Quarta Turma, Relator o Senhor Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, assentou que a"presunção de veracidade dos fatos afirmados na inicial, em caso de revelia, é relativa, devendo o juiz atentar para a presença ou não das condições da ação e dos pressupostos processuais e para a prova de existência dos fatos da causa. Desse modo, pode extinguir o feito sem julgamento de mérito ou mesmo concluir pela improcedência do pedido, a despeito de ocorrida a revelia"(REsp nº 211.851?SP, DJ de 13?9?99). Neste último precedente, há referência a um outro precedente da Terceira Turma, Relator o Senhor Ministro Eduardo Ribeiro, indicando que a" falta de contestação, quando leve a que se produzam os efeitos da revelia, exonera o autor de provar os fatos deduzidos como fundamento do pedido e inibe a produção de prova pelo réu, devendo proceder- se ao julgamento antecipado da lide ", e, ainda, que se," de documentos trazidos com a inicial se concluir que os fatos se passaram de forma diversa do nela narrado, o juiz haverá de considerar o que deles resulte e não se firmar em presunção que se patenteia contrária à realidade "(REsp nº 60.239?SP, DJ de 05?8?96). Situação descrita nos autos que não reflete vício do produto. Conforme se pode observar dos documentos acostados aos autos (fls. 20/33 e fls. 35/37), o autor adquiriu um climatizador e umidificador, que não se confunde com um condicionador de ar. Em outras palavras, o climatizador não tem as mesmas características e funcionalidades do ar-condicionado, se aproxima do ventilador, com a diferença básica de umidificar o ambiente. Assim, não se pode esperar do produto o mesmo resultado que o ar-condicionado. O climatizador funciona com base no fato de que a evaporação da água é um processo endotérmico, ou seja, só se dá se algo der calor à água. No caso do climatizador esse algo é o ar. O climatizador funciona de forma a fazer circular o ar sobre a água, forçando a evaporação, o que faz com que o ambiente fique umidificado. Desta forma, quanto mais úmido o ar, tanto mais difícil será fazer a água evaporar, logo, ambientes onde o ar for mais seco, serão mais beneficiados, com uma redução maior de temperatura. Assim, ao contrário do ar condicionado, ele aumenta a umidade relativa do ar. Devido ao processo evaporativo, a eficiência do equipamento, portanto, dependente das condições climáticas ambientais. Quanto mais seco o ar maior a eficiência, e de outro lado, quanto mais úmido o ar menor é a eficiência. De qualquer forma, repita-se, não se trata de um aparelho de ar-

condicionado e isto não é dito em nenhum momento na peça publicitária ou no manual. Discussão quanto à eficiência ou não da climatização e umidificação demandaria perícia técnica, o que foge da competência do Juizado. Ausência de comprovação do vício doproduto e de propaganda enganosa de modo a possibilitar a condenação em dano moral. É certo que o mero dissabor não pode ser alçado ao patamar do dano moral, mas somente aquela agressão que exacerba a naturalidade dos fatos da vida, causando fundadas aflições ou angústias no espírito de quem ela se dirige. Lembremos, aqui, a lição de eminente Des. SÉRGIO CAVALIERI FILHO, em seu" Programa de Responsabilidade Civil "(São Paulo: Malheiros Editores Ltda., 1996, p. 76), citando Antunes Varela, pela qual" a gravidade do dano há de medir-se por um padrão objetivo (conquanto a apreciação deva ter em linha de conta as circunstâncias de cada caso), e não à luz de fatores subjetivos (de uma sensibilidade particularmente embotada ou especialmente requintada) ", e" o dano deve ser de tal modo grave que justifique a concessão de uma satisfação de ordem pecuniária ao lesado ". Por isso é que,"nessa linha de princípio, só deve ser reputado como dano moral a dor, vexame, sofrimento ou humilhação que, fugindo à normalidade, interfira intensamente ao comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe aflições, angústias e desequilíbrio em seu bem-estar. Mero dissabor, aborrecimento, mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada estão fora da órbita do dano moral". Apoiado nessas premissas é certo que o desgaste que o Autor, ora recorrido, alega ter sofrido em virtude do alegado (e não comprovado) defeito apresentado no produto está mais próximo do mero aborrecimento do que propriamente de gravame à sua honra. É preciso estancar a idéia de que todo e qualquer aborrecimento seja fonte de indenização (rectius: compensação) por danos morais, fato que vem causando o abarrotamento do Poder Judiciário com demandas geradas, na maioria das vezes, por um simples mal-estar ou o mais comezinho transtorno. O dano moral é

devido quando haja intensa interferência psicológica que afete os sentimentos íntimos do indivíduo, o que não se verifica na hipótese em questão, tendo em vista que as provas demonstram de forma clara e inequívoca que recorrido não sofreu nenhuma violação grave a sua honra ou que violasse de forma grassa a sua dignidade (atingindo por via de conseqüência o princípio da dignidade da pessoa humana, que possibilitaria a compensação por dano moral). Os fatos não passam de um mero aborrecimento cotidiano. O que de concreto existe nos autos é uma alegada propaganda enganosa, que conforme demonstrado acima, não restou comprovada nos documentos juntados nos autos. Ademais, certo é que não se deve deferir a compensação por dano moral por qualquer contrariedade. Caso contrário, além do enriquecimento indevido, estar-se-ia colaborando com a vulgarização do dano moral, especialmente com a chamada" indústria do dano moral ", tão combatida por nossos Tribunais . Posto isso, conheço do recurso e VOTO no sentido de reformar totalmente a sentença, para JULGAR IMPROCEDENTES OS PEDIDOS FORMULADOS NA PETIÇÃO INICIAL. Sem condenação em sucumbência. Rio de Janeiro, 15 de março de 2011. FÁBIO RIBEIRO PORTO Juiz de Direito"

21. Por outro lado, o infelizmente tão propalado dano moral punitivo ou inibidor, que tem servido de esteio a esta sua banalização, não possui amparo constitucional ou doutrinário.

22. Conforme leciona a doutrina tradicional, a responsabilidade civil tem por função restabelecer a situação anterior à ofensa, tal como se infere das lições de CAVALIERI Filho [2008, p. 13]:

"O anseio de obrigar o agente, causador do dano, a repará-lo inspira-se no mais elementar sentimento de justiça. O dano causado pelo ato ilícito rompe o equilíbrio jurídico-econômico anteriormente existente entre o agente e a vítima. Há uma necessidade fundamental de se restabelecer esse equilíbrio, o que se procura fazer recolocando o prejudicado no status quo ante. Impera neste campo o princípio da restitutio in integrum, isto é, tanto quanto possível, repõe-se a vítima à situação anterior à lesão. Isto se faz através de uma indenização fixada em proporção ao dano."

23. Assim, sem ofensa efetiva e sem o dano não há o que ser reparado, tendo a responsabilidade civil a função única de reparar o dano efetivo, restabelecendo a situação anterior ou compensando a perda sofrida.

24. Já o dano moral não tem propriamente a função de restabelecer o estado anterior, mas de servir de compensação ou de satisfação ao sujeito prejudicado, conforme disciplina CAVALIERI Filho [2002, p. 96]:

"Com efeito, o ressarcimento do dano moral não tende à restitutio in integrum do dano causado, tendo mais uma genérica função satisfatória, com a qual se procura um bem que recompense, de certo modo, o sofrimento ou a humilhação sofrida. Substitui-se o conceito de equivalência, próprio do dano material, pelo de compensação, que se obtém atenuando, de maneira indireta, as consequências do sofrimento. Em suma, a composição do dano moral realiza-se através do conceito - compensação -, que, além de diverso do ressarcimento, baseia-se naquilo que Ripert chamava ‘substituição do prazer, que desaparece, por um novo."

25. O inadimplemento contratual e os dissabores e contratempos da vida em sociedade não são ensejadores de danos passíveis de serem reparados, tal como defende o afamado jurista Sérgio BERMUDES, em um de seus manifestos, onde verbera:

"(...) Incentiva a indústria do dano moral, não apenas o julgamento que estabeleço com exagero o valor da sua reparação. Também fomenta esse descalabro a decisão que vê dano moral em qualquer desse inevitáveis contratempos da vida na sociedade. Ainda quando irritem e tragam desconforto, esses superáveis percalços quotidianos não produzem o dano moral, cuja configuração depende também de uma duradoura conturbação emotiva."

26. Nesta esteira vem apontando as recentes decisões da Corte Superior de Justiça, como se lê do acórdão transcrito:

"AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. RESCISÃO DE COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. IMPONTUALIDADE. DANO MORAL.INEXISTÊNCIA.

1. O mero inadimplemento contratual não enseja, por si só, indenização por dano moral."Salvo circunstância excepcional que coloque o contratante em situação de extraordinária angústia ou humilhação, não há dano moral. Isso porque o dissabor inerente à expectativa frustrada, decorrente de inadimplemento contratual, se insere no cotidiano das relações comerciais e não implica lesão à honra ou violação da dignidade humana"( REsp n. 1.129.881/RJ,relator Ministro MASSAMI UYEDA, 3a Turma, unânime, DJe 19.12.2011). 2. Agravo regimental a que se nega provimento.

(STJ , Relator: Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, Data de Julgamento: 03/05/2012, T4 - QUARTA TURMA)"

27. Por conseguinte, sem a ocorrência de dano ou pelo menos de dano reparável, não há que se falar em indenização, muito menos de natureza extrapatrimonial.

28. A ideia do caráter punitivo e desestimulador da reparação civil, utilizada de forma totalmente acrítica e descontextualizada, tem sua origem em países que adotam o C ommon Law , a exemplo dos Estados Unidos, onde é denominado de punitive damage ou exemplary damage .

29. Em tais países, esta forma de reparação constitui uma indenização extra, oferecida às pessoas vítimas de fatos danosos de natureza grave, estabelecida pelo Tribunal do Júri, obedecendo a parâmetros objetivos na sua fixação, além dos precedentes judiciais, não constituindo direito subjetivo do ofendido e aplicando-se apenas nas hipóteses de responsabilidade aquiliana.

30. Observa-se, assim, que a aplicação deste instituto no Brasil é completamente destoante daquela empregada nos países que lhe deram origem.

31. Inicialmente, não se trata de um direito subjetivo da parte ofendida, já que se trata de um plus à sua reparação e sua concessão depende de uma avaliação criteriosa do Tribunal do Júri, somente sendo deferido em situações gravíssimas, que envolvam dolo elevado, como afirma Judith MARTINS-COSTA [2005, p. 19]:

"Em outras palavras, os punitive damages só podem ser concedidos na relação extracontratual quando provadas circunstâncias subjetivas que se assemelham à categoria continental do dolo, quais seja: malice, wantonness, willfulness, opresion, fraud, entre outras."

32. A aplicação do punitive damage envolve ainda a análise dos precedentes, de grande peso nos países que adotam o common law, nem de longe se aproximando do nosso sistema, estando ainda atrelados a alguns critérios previamente definidos, como os citados por Judith MARTINS-COSTA [2005, p. 19]:

"I - O grau de reprovabilidade da conduta do réu. Contudo, para medir o grau dessa reprovabilidade é necessário atentar para alguns fatores, a saber: a) se o prejuízo causado foi físico ou econômico, b) se o ato ilícito foi praticado com indiferença ou total desconsideração com saúde ou a segurança dos outros, 3) se o alvo da conduta é uma pessoa com vulnerabilidade financeira, d) se a conduta envolveu ações repetidas ou foi um incidente isolado, e) se o prejuízo foi o resultado de uma ação intencional ou fraudulenta, ou mero acidente.

II - a disparidade entre o dano efetivo ou potencial sofrido pelo autor e os punitive damages;

III - a diferença entre os punitive damages concedidos pelo júri e as multas civis autorizadas ou impostas em casos semelhantes."

33. Um caso emblemático de aplicação do punitive damage nos Estados Unidos ocorreu no episódio da explosão do tanque de combustível de um veículo fabricado pela Ford, ocorrido em 1981, matando três de seus ocupantes, onde a empresa foi condenada a uma alta indenização por considerar o Júri que o acidente ocorreu em razão da localização do tanque de combustível, com a agravante de que era instalado propositalmente na traseira do veículo pelo fato da empresa economizar U$15,00 por veículo.

34. Ou seja, a empresa preferia economizar quinze dólares por veículo a garantir a segurança de seu usuário.

35. Além disto, não se aplica em situações de quebra ou descumprimento de contrato, mas apenas em relação à responsabilidade extracontratual.

36. O mais grave de tudo é que a transposição desse instituto confunde a reparação civil com a penal, impondo uma sanção penal sem a devida previsão legal, contrariando frontalmente o princípio constitucional da legalidade, segundo o qual não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal, como também o princípio do devido processo legal.

37. Neste sentido apontam as lições de W. Melo da SILVA [1998, p. 573]:

"Para que haja pena, mister se torna, em cada caso, um texto legal expresso que a comine e um delito que a justifique", ou seja, "nulla poena sine lege". Para que haja dano basta a simples infringência da ampla regra do "neminem laedere". No delito, o dano é apenas o fato gerador, a circunstância determinante dele. E o que no juízo cível se busca ressarcir é apenas a conseqüência do delito, ou seja, o dano (...) Mira-se, na responsabilidade civil, a pessoa do ofendido e não a do ofensor; a extensão do prejuízo, para a graduação do quantum reparador, e não a culpa do autor".

38. Ora, se o objetivo que se almeja é a punição, já possuímos em nosso ordenamento jurídico as sanções administrativas aplicadas pelos PROCONS e o fato de buscar esta indenização-sanção através da justiça deixa claro que somente se está a buscar o enriquecimento ilícito.

39. O saudoso mestre J. J. Calmon de Passos já alertava para esta deturpação do Direito:

"(...) Nada mais suscetível de subjetivar-se que a dor, nem nada mais fácil de ser objeto de mistificação.

"Assim, como existiam carpideiras que choravam a dor dos que eram incapazes de chorá-la, porque não a experimentavam, também nos tornamos extremamente hábeis em nos fazermos carpideiras de nós mesmos, chorando, para o espetáculo diante dos outros, a dor que em verdade não experimentamos. A possibilidade, inclusive, de retirarmos proveitos financeiros dessa nossa dor oculta, fez-nos atores excepcionais e meliantes extremamente hábeis, quer como vítimas, quer como advogados ou magistrados."

40. Por fim, na esdrúxula hipótese de acolhimento do pleito indenizatório, pugna para que seja arbitrado obedecendo o critério da razoabilidade, a fim de que não constitua estímulo à aventura jurídica ou ao enriquecimento ilícito.

DIANTE DO EXPOSTO , requer sejam acolhidas as preliminares apontadas, extinguindo o processo sem julgamento do mérito, e, vencidas estas, sejam julgados improcedentes os pedidos de restituição do valor do produto e de indenização por danos morais, posto que não ocorreu nenhuma situação de anormalidade que pudesse ensejar pedidos desta natureza, considerando que não há qualquer notícia de que o autor tenha buscado contato com a acionada para obter a substituição ou a restituição do valor, embora a acionada disponibilize diversos canais de atendimento ao consumidor.

Ressalte-se que a condenação em custas e honorários, no âmbito dos juizados, ocorre, em regra, na fase recursal.

Protesta por todos os meios de prova admitidos em Direito, em especial a realização de perícia técnica, imprescindível para esclarecimento dos fatos.

P. deferimento. Salvador, 5 de abril de 2017.

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