Busca sem resultado
jusbrasil.com.br
17 de Junho de 2024
  • 1º Grau
Entre no Jusbrasil para imprimir o conteúdo do Jusbrasil

Acesse: https://www.jusbrasil.com.br/cadastro

TJSP • Ação Penal - Procedimento Ordinário • Corrupção ativa • XXXXX-65.2015.8.26.0268 • 3ª Vara do Tribunal de Justiça de São Paulo - Inteiro Teor

Tribunal de Justiça de São Paulo
há 5 anos

Detalhes

Processo

Órgão Julgador

3ª Vara

Assuntos

Corrupção ativa

Juiz

Guilherme Cavalcanti Lamêgo

Partes

Documentos anexos

Inteiro Teor47949335%20-%20Condena%C3%A7%C3%A3o%20%C3%A0%20Pena%20Privativa%20de%20Liberdade%20e%20Multa%20SEM%20Decreta%C3%A7%C3%A3o%20da%20Pris%C3%A3o.pdf
Entre no Jusbrasil para imprimir o conteúdo do Jusbrasil

Acesse: https://www.jusbrasil.com.br/cadastro

SENTENÇA

Processo Digital nº: XXXXX-65.2015.8.26.0268

Classe - Assunto: Ação Penal - Procedimento Ordinário - Corrupção ativa

Réu: KAIQUE MORAES MESSIAS e outro

Juiz de Direito: Dr. GUILHERME DE SIQUEIRA PASTORE

Edilson Ferreira de Oliveira e Kaique Moraes Messias , qualificados nos autos, foram denunciados e processados como incursos nas penas do art. 333 do Código Penal, porque em 6 de junho de 2015, no Centro de Detenção Provisória situado na Rua Ferreira Guedes, n.º 405, nesta cidade e Comarca de Itapecerica da Serra, teriam oferecido vantagem indevida ao servidor público Wellington Prates dos Santos, agente de segurança penitenciária, consistente na entrega de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), a fim de obterem transferência para estabelecimento prisional diverso daquele em que se encontravam custodiados.

Recebida a denúncia em 18/05/2016 (fls. 72/73), os réus foram citados (fls. 84 e 103/104) e, apresentadas respostas à acusação por defensores nomeados (fls. 109/112 e 114/116), foi ratificado o recebimento da denúncia (fl. 117).

Em audiência de instrução, foi ouvida uma testemunha e interrogado o réu Kaique (fls. 215/218). A inquirição de outra testemunha e o interrogatório do corréu Edilson foram deprecados a outros Juízos (fls. 238/261).

Em memoriais, o Ministério Público pediu a condenação dos réus nos termos da denúncia, com incrementos de pena em função da culpabilidade e das circunstâncias, bem como da reincidência; e as Defesas postularam a absolvição dos réu por inexistência de prova de autoria e insuficiência do conjunto probatório (fls. 294/29 e 298/300).

Este o relatório, passo a decidir.

Preliminarmente, consigno que a audiência de instrução foi presidida por magistrado removido, a pedido, para Comarca e Circunscrição Judiciária diversas, assim fazendo cessar a a vinculação para o julgamento; do que não resulta necessidade de repetição da prova, dada a fidelidade do registro audiovisual.

A pretensão acusatória comporta integral acolhida, uma vez que a prova produzida sob o crivo do contraditório confirmou os elementos informativos constantes de sindicância e inquérito policial, demonstrando a confluência de todas as elementares do delito, sem espaço para

XXXXX-65.2015.8.26.0268 - lauda 1

dúvida quanto à coautoria.

Os agentes penitenciários Rodrigo, diretor de serviço do núcleo de segurança e disciplina do turno I, a quem foi oferecida a soma em dinheiro, e Wellington, que presenciou a oferta, exibiram conduta escorreita desde a ocorrência do fato criminoso, comunicando o fato às chefias mediatas e imediatas, conforme o depoimento então colhido (fl. 62), e também à direção superior (fl. 9), que, a par de instaurar procedimento disciplinar (fl. 49), os encaminhou à Autoridade Policial para a lavratura da ocorrência (fl. 8).

Desde o primeiro momento, prestaram depoimentos firmes, harmoniosos e, do que se pode aferir pelo contato com a prova oral registrada em meio audiovisual na fase judicial, também serenos e convictos.

O ASP Rodrigo, ouvido por carta precatória, narrou que os réus, que se encontravam em isolamento em Regime de Cela Disciplinar por falta anterior, teriam chamado por ele de dentro da cela, pedindo atenção. Afirmou que, ao se aproximar, na companhia do ASP Wellington, teria ouvido deles que a situação no CDP não seria "favorável" e que, se lhes informasse seus dados bancários e conseguisse a sua transferência para outra unidade prisional, providenciariam transferência em seu favor, no importe de R$ 30.000,00 (trinta mil reais).

Já o ASP Wellington, inquirido em audiência, esclareceu que era o responsável pelo Regime de Cela Disciplinar na data dos fatos e que os réus lhe pediram a atenção do chefe de plantão, que era o ASP Rodrigo. Afirmou que repassou a informação a Rodrigo, que se dirigiu até ali, e presenciou a oferta de dinheiro, não se lembra ao certo o valor, para que o chefe conseguisse a sua transferência para outra unidade prisional. Indagado, negou expressamente qualquer tipo de inimizade com os réus, reforçando que sempre adotou tratamento formal.

A tais depoimentos se contrapõem apenas as alegações dos réus em autodefesa, que oscilaram substancialmente no curso da persecução e se mostram inteiramente carentes de elementos mínimos de corroboração.

O réu Edilson, interrogado pelo Juízo deprecado, afirmou laconicamente que a testemunha Rodrigo os perseguia, transferindo-os de pavilhão e colocando-os no castigo; e, sobre a data dos fatos, que o servidor teria ido até as celas disciplinares, em dia de visita, apenas para "perguntar se estava tudo bem, tudo tranquilo", embora afirme, na sequência, que não o viu e que estava dormindo.

Já o corréu Kaique, em audiência, acusou uma intrincada perseguição iniciada pelo

XXXXX-65.2015.8.26.0268 - lauda 2

agente Rodrigo desde o dia em que foi recolhido ao CDP de Itapecerica da Serra, afirmando que o servidor o "arrastou, covardeou e abaixou sua alta moral" ( sic ); que "o espancava e agredia direto"; promovia sucessivas transferências, tendo antes de uma delas dito ao réu que "agora eu vou acabar com a sua vida"; tudo isso sem motivação aparente. Reforçou, quando indagado pelo Ministério Público, que o Agente Rodrigo "perturbava todos os pavilhões, colocava situação onde não existia, prejudicava todo o mundo"; inclusive o buraco na cela que motivou a sua sanção disciplinar, que teria sido "implantado" pelos servidores da unidade. Alega que, por abusivo o tratamento que recebia da testemunha, ele teria sido questionado por outro agente. Negou o oferecimento de valores, de que afirma não dispor, e acrescentou que o agente Wellington não estava presente no momento da conversa que teve com o ASP Rodrigo.

As narrativas assim apresentadas se mostram contraditórias - em especial, a narrativa por Edilson dos fatos ocorridos enquanto estava dormindo -, carentes de concretude que lhes confira credibilidade e permita a sua apuração e, de resto, pouco verossímeis, contrariadas pelo contexto probatório.

Não há nenhum registro de qualquer forma de abuso ou animosidade em relação aos réus ou a terceiros. Não há registro de pedido formal ou reclamação, tampouco de atendimento médico ou testemunho que pudesse corroborar a mirabolante hipótese de que diversos servidores da administração penitenciária, em conluio, se prestassem a fazer falsas comunicações de crime, prestando depoimentos falsos em Juízo, com o fito de prejudicar pessoas desconhecidas, sem nenhuma motivação para tanto.

Com efeito, o réu Kaique, quando foi ouvido na sindicância, assistido por advogado constituído, não se queixou da alegada perseguição. Ao contrário, consignou que "não possui desavenças com os funcionários ou diretores desta Unidade Prisional, tampouco qualquer indisposição com o servidor Rodrigo" (fls. 58/60). Evidente, assim, o oportunismo das alegações de perseguição construídas na instrução judicial.

Anoto que o ASP Rodrigo tem histórico funcional rigorosamente ilibado (fls. 80/82) e que não se colhe alegação semelhante nos demais processos em que figura como testemunha. Já o ASP Wellington, que o réu Kaique afirma que não estava no local, era reconhecidamente o responsável pelo setor em que os réus estavam recolhidos, e figurou em todos os atos de investigação e disciplina desde a ocorrência.

Assim, na absoluta ausência de qualquer mínimo indicativo de que os seus depoimentos não sejam digno de fé, o relato das testemunhas é suficiente a isolar as alegações

XXXXX-65.2015.8.26.0268 - lauda 3

defensivas e sustentar o juízo definitivo de culpabilidade.

Bem demonstrada, então, a promessa de vantagem indevida, realizada em concurso por ambos os réus, para que os agentes de segurança penitenciária praticassem ato de ofício com motivação viciada, fica caracterizada a infração ao art. 333 do Código Penal, pelo que a condenação é medida que se impõe. Passo a dosar as penas que aos réus serão impostas.

Dentre os referenciais elencados no art. 59 do Código Penal, despontam como vetores negativos, no caso dos autos, os antecedentes, a culpabilidade, as circunstâncias e a personalidade dos agentes.

Os antecedentes são desabonadores porque Kaique registra condenação definitiva por crime de roubo majorado, nos autos do processo n.º XXXXX-90.2014.8.26.0268, da 3a Vara da Comarca de Itapecerica da Serra (fl. 176; com trânsito em julgado posterior à certidão, verificado nesta oportunidade nos autos digitais da respectiva execução, n.º XXXXX-58.2018.8.26.0509, do DEECRIM/UR2); e Edilson foi definitivamente condenado por roubo tentado em concurso, no processo XXXXX/2014, da 3a Vara da Comarca de Embu das Artes (fl. 213).

Ambos os fatos ocorreram em 2014 - antes, portanto, dos apurados nestes autos -, mas tiveram o trânsito em julgado em momento posterior. Aplica-se, assim, o entendimento consolidado no âmbito do colendo Superior Tribunal de Justiça, de que "a condenação definitiva por fato anterior ao crime descrito na denúncia, mas com trânsito em julgado posterior à data do ilícito penal, ainda que não sirva para configurar reincidência, pode caracterizar maus antecedentes, pois diz respeito ao histórico do acusado" (STJ, 5a Turma, REsp XXXXX/RJ, rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 23/08/2018, DJe 31/08/2018).

As circunstâncias , a seu turno, são severamente desfavoráveis porque praticada a infração no interior de estabelecimento prisional, com o intuito de romper com a isonomia e a ordem, colocando a serviço dos presos o agente encarregado da sua disciplina, almejando tratamento diferenciado dos demais internos.

Já a culpabilidade , entendida como a censurabilidade em concreto da conduta criminosa, se mostra exacerbada pelo vulto da vantagem oferecida - R$ 30 mil -, que supera em muito a renda mensal dos agentes penitenciários e assim tem extraordinária aptidão para, na falta de fortaleza moral do destinatário da oferta, determinar a prática do ato almejado.

A personalidade , de resto, se examina a partir do atrevimento e ousadia, reveladores de postura infensa à correção e reflexão objetivadas com a terapêutica penal,

XXXXX-65.2015.8.26.0268 - lauda 4

pretendendo, ao invés de se emendar, ditar os rumos das próprias reprimendas conforme a sua conveniência.

Todos esses fatores determinam a fixação das penas-base em patamar substancialmente superior ao mínimo legal, para o que reputo suficiente e adequada a quantidade de 4 (quatro) anos de reclusão e 20 (vinte) dias-multa, ainda distante, em atenção aos contornos do caso concreto, do teto e dos parâmetros consagrados na jurisprudência, a exemplo da fração de 1/8 para cada circunstância "sobre o intervalo de pena em abstrato" (STJ, 5a Turma, HC XXXXX/RJ, rel. Min. Ribeiro Dantas, julgado em 16/08/2018, DJe 24/08/2018).

Torno estas penas definitivas, uma vez que não se cogita de reincidência, na falta de condenação ou de trânsito em julgado nos demais processos a que os réus responderam ou respondem (fls. 202, 203, 205 e 177/178); nem de outras circunstâncias agravantes ou atenuantes, tampouco de causas de aumento ou diminuição.

O regime inicial para cumprimento da pena privativa de liberdade é o fechado, conforme determina o art. 33, § 3º, do Código Penal, à vista das circunstâncias judiciais extensamente desfavoráveis, que igualmente impedem a sua substituição ou suspensão.

Na ausência de indicativos seguros da capacidade econômica dos réus, arbitro o dia-multa no mínimo legal, de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos, o que determina as penas de multa em R$ 525,34, a serem atualizados de junho de 2015 até o efetivo pagamento segundo o INPC/IBGE, refletido na Tabela Prática para Cálculo de Atualização Monetária dos Débitos Judiciais divulgada pelo egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.

Diante do exposto, julgo procedente a pretensão acusatória deduzida na denúncia para CONDENAR os réus Edilson Ferreira de Oliveira e Kaique Moraes Messias , qualificados nos autos, por infração ao art. 333 do Código Penal, às penas de 4 (quatro) anos de reclusão, em regime inicial fechado, e 16 (dezesseis) dias-multa , correspondentes a R$ 525,34 (quinhentos e vinte e cinco reais e trinta e quatro centavos), a serem atualizados desde junho de 2015, na forma da fundamentação.

Condeno os réus, ainda, ao recolhimento das custas do processo, no importe de 100 (cem) Unidades Fiscais do Estado de São Paulo (art. 4º, § 9º, alínea a, da Lei Estadual n.º 11.608, de 29 de dezembro de 2003).

Não demonstrada a caracterização dos requisitos da prisão cautelar, faculto aos

XXXXX-65.2015.8.26.0268 - lauda 5

réus, que não tiveram decreto prisional nestes autos até o momento, o recurso em liberdade.

Considerando a prática, em tese, de crime contra a honra de funcionário público, encaminhe-se ao agente de segurança penitenciária Rodrigo Aparecido Aria da Silva cópia do registro audiovisual do interrogatório do réu Kaique, para as providências que entender cabíveis.

Transitada em julgado, expeçam-se mandados de prisão e, com o seu cumprimento, guias de recolhimento definitivas; e intimem-se para pagamento das custas e da pena de multa em dez dias, sob pena de inscrição em dívida ativa.

Após, feitas as anotações e comunicações necessárias, em especial ao Instituto de Identificação Ricardo Gumbleton Daunt - IIRGD e ao colendo Tribunal Regional Eleitoral, para os fins do art. 15, inc. III, da Constituição da Republica, arquivem-se os autos.

Sentença publicada nesta data, com a liberação nos autos digitais. Intimem-se. Itapecerica da Serra, 31 de janeiro de 2019.

DOCUMENTO ASSINADO DIGITALMENTE NOS TERMOS DA LEI 11.419/2006,

CONFORME IMPRESSÃO À MARGEM DIREITA

XXXXX-65.2015.8.26.0268 - lauda 6

Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/tj-sp/1859562141/inteiro-teor-1859562143