Busca sem resultado
jusbrasil.com.br
24 de Junho de 2024
  • 1º Grau
Entre no Jusbrasil para imprimir o conteúdo do Jusbrasil

Acesse: https://www.jusbrasil.com.br/cadastro

TJSP • Embargos de Terceiro Cível • XXXXX-02.2015.8.26.0604 • 2 do Tribunal de Justiça de São Paulo - Inteiro Teor

Tribunal de Justiça de São Paulo
há 2 anos

Detalhes

Processo

Órgão Julgador

2

Juiz

Andre Pereira de Souza

Partes

Documentos anexos

Inteiro Teor3513cf1069f741bad2fe69e07e82457b.pdf
Entre no Jusbrasil para imprimir o conteúdo do Jusbrasil

Acesse: https://www.jusbrasil.com.br/cadastro

SENTENÇA

Processo Digital nº: XXXXX-02.2015.8.26.0604

Classe - Assunto Embargos de Terceiro Cível - Posse

Embargante: Michelle Olivia de Oliveira e outro

Embargado: Iracema Santana dos Santos e outro

Justiça Gratuita Juiz (a) de Direito: Dr (a). ANDRE PEREIRA DE SOUZA

Vistos.

Trata-se de embargos de terceiros ajuizados por MICHELLE OLIVIA DE OLIVEIRA JESUS e MARIA DE FÁTIMA MARTINS DE SOUZA contra IRACEMA SANTANA DOS SANTOS representada por IVONE SANTANA DOS SANTOS, alegando, em síntese, ter adquirido 50% do imóvel descrito na matrícula nº 47916 do Registro de Imóveis de Sumaré/SP, cuja propriedade se discute nos autos XXXXX-58.2015.8.26.0604

Tutela de urgência concedida a fls. 54.

Citada para os termos da demanda, a parte embargada contestou a fls. 59/92. Alegou preliminarmente ilegitimidade ativa da segunda autora. No mérito, pugnou pela improcedência do pedido, afirmando que a transferência dos imóveis à autora se deu de forma fraudulenta, pois não teria assinado o contrato de venda e compra.

Réplica encartada às fls. 150/159.

Determinada a realização de perícia grafotécnica e perícia médica, os laudos foram juntado a fls. 438/443 e 475/483 (médica) e 572/585 e 603/613 (grafotécnica).

As partes se manifestaram as fls. 616/628 (embargada), fls. 629/630 (embargante) e 635/639 Ministério Público.

É o relatório. Fundamento e decido.

O feito prescinde de outras provas, pois as existentes nos autos são bastantes à formação da convicção do julgador. Na medida em que remanescem apenas questões de direito, passo ao julgamento da lide no estado em que se encontra o processo, na forma do artigo 330, inciso I, do Código de Processo Civil.

Acolho a preliminar de ilegitimidade ativa da segunda autora, MARIA DE FÁTIMA MARTINS DE SOUZA, diante da falta de qualquer documento que comprove seu interesse no deslinde da presente demanda, uma vez que o contrato foi firmado entre a primeira requerente e o requerido nos autos principais, Sr. Lourival Lopes de Brito .

E, por perfilhar a corrente da teoria da asserção, entendo com relação às requeridas que a ação deve ser julgada improcedente.

XXXXX-02.2015.8.26.0604 - lauda 1

Explico.

Em regra, as questões são processuais ou de mérito. Contudo, alguns autores dividem em questões processuais, de mérito e de condições da ação (v.g., Liebmann; porém, o próprio autor mencionado acaba por reconhecer que as condições da ação são processuais).

Não obstante, existe grande dificuldade em se separar as condições da ação do mérito da causa.

A crítica é feita de forma generalizada pela doutrina, e tem importância porque, a depender da teoria adotada, a carência da ação não faria coisa julgada, possibilitando a repropositura da ação.

Para Liebmann o preenchimento das condições da ação tem de ser objeto de prova,isto é, as partes têm de provar que preencheram as condições da ação (documental, pericial, testemunhal,etc., por qualquer meio de prova). Isso permite que o controle das condições da ação se dê a qualquer tempo.

Entretanto, nasceu na doutrina uma corrente que busca rever este posicionamento, segundo a qual o preenchimento das condições da ação não deve ser objeto de prova, pois será verificado a partir da afirmação que a parte fez. Assim, a verificação se dá a partir das assertivas da parte autora. Se as afirmações forem realmente verdadeiras, as condições foram preenchidas; se depois não forem comprovadas o pedido deve ser rejeitado em seu mérito (improcedência). É a chamada teoria da asserção.

Transportando a teoria da asserção para o presente caso, a demanda deve ser julgada improcedente, a despeito da ausência de interesse processual da embargante Maria de Fátima e não extinta sem resolução do mérito.

No mérito, a ação é procedente.

Narra a autora que adquiriu 50% do imóvel descrito da inicial do Sr. Lourival Lopes de Brito, em 19/09/2007, através de Contrato Particular de Compromisso de Venda e Compra, estando desde então na posse do bem.

Contou que o vendedor o havia adquirido da embargada Iracema, também através de contrato particular, juntado a fls. 19/20 e que pagou, através de dois cheques, ao vendedor, o valor total de R$ 18.000,00 pelo imóvel.

A requerida, por sua vez, defende a nulidade do contrato firmado com o vendedor, afirmando que jamais teria vendido o imóvel e que se recorda de assinar, tão somente, um documento em branco, não sabendo se tratar da venda do imóvel.

XXXXX-02.2015.8.26.0604 - lauda 2

Conta que sofre de diversas moléstias psíquicas e que, pouco antes da venda estava internada e, ainda, foi interditada no ano de 2013.

A fim de dirimir a controvérsia, foi determinada a realização de perícia médica, a fim de se verificar se, à época da assinatura do contrato, a embargada tinha capacidade para exercer atos da vida civil, bem como grafotécnica, para confirmação da veracidade da assinatura aposta no contrato firmado entre a embargada e o Sr. Lourival.

A perícia médica realizada assim concluiu: "Pela observação durante o exame, confrontando com o histórico, antecedentes, exame psíquico e o colhido das peças dos autos, conclui-se que a pericianda apresenta diagnóstico de Transtorno depressivo recorrente episódio atual de intensidade leve (CID 10: F33.0) b) Em que pesem as dificuldades e limitações inerentes à análise indireta de capacidade civil, os dados analisados nos permitem a conclusão de que não há elementos que nos indiquem incapacidade de discernimento da mesma à épica da celebração do contrato"

Assim, a despeito do histórico médico da embargada, que, de fato esteve internada pouco tempo antes de vender o imóvel, no momento em que assinou o contrato firmado com o Sr. Lourival, não havia qualquer incapacidade que impossibilitasse a embargada de compreender a negociação havida.

Importante aqui ressaltar, também, que a venda foi realizada no ano de 2007 e a embargada somente foi interditada a partir de 07/05/2013, conforme documento de fls. 125/129.

Já em relação à assinatura aposta no contrato, assim concluiu o Sr. Perito: "Diante de todo o exposto e com empenho, cuidados e cautelas de praxe, efetuadas no cotejo (comparação) grafoscópico entre as peças padrões e as suspeitas, exames óptico-oculares, ilustrações de gramas, com a finalidade de subsidiar na elucidação do litígio reinante no documento objeto da análise, este Pesquisador tem por VEROSSÍMEL VINCULAR a assinatura apostada No CONTRATO PARTICULAR DE COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA em questão, porque foi atestado neste estudo que foram produzidas e lançadas pelo punho escritor da Sra. IRACEMA SANTANA DOS SANTOS ."

Afirmou, ainda que o estudo grafotécnico foi realizado com a inclusão da ficha de autógrafos do cartório, não sendo observado elementos morfológicos a indicar que outra pessoa pudesse ter adulterado os documentos da embargada, se passando por ela, com a finalidade de assinar o documento de fls. 19/20 em Cartório.

Respondeu, ainda que o reconhecimento de firma por semelhança tem fé pública,

XXXXX-02.2015.8.26.0604 - lauda 3

o estudo realizado não sustenta elementos para supor que o cartão de autógrafos e o documento de venda do imóvel teriam sido assinados por terceiro.

Afirmou ainda que, a despeito de não ter sido apresentado o contrato original, "a perícia está convencida no estudo já realizado no documento apresentado sob suspeita ." e, que "apesar da análise ser sobre uma cópia, conforme o laudo esclarece, ali foi identificado elementos suficientes para a conclusão ."

.

Fica, portanto, claro que a embargada era plenamente capaz de assinar o contrato de venda e compra, como também não resta dúvidas quanto à autenticidade da assinatura aposta no documento.

Importante ressaltar aqui que as conclusões da perícia podem ser conferidas pelo minucioso laudo, que merece total acolhimento, por estar bem fundamentado e suficientemente esclarecedor, não havendo qualquer desmerecimento ao trabalho realizado.

Por outro lado, não há qualquer elemento que afaste a lisura do negócio firmado entre a embargante e o vendedor, Sr. Lourival.

As partes firmaram contrato de venda e compra, juntado a fls. 21/22, a embargante comprovou o pagamento, através dos cheques juntados a fls. 200/203 e, apesar de o vendedor ter feito o saque do valor dos cheques diretamente no banco emissor, é possível verificar o depósito de valor muito próximo ao da transação no dia seguinte ao da assinatura do contrato.

Some-se a isso os diversos documentos juntados a fls. 28/43 que indicam a titularidade da autora sobre aquela parte do imóvel que consta do contrato, havendo, portanto, elementos suficientes a comprovar a aquisição, de boa-fé, pela embargante.

Deste modo, como bem demonstrada a legitimidade do negócio firmado entre a embargada e o Sr. Lourival e entre esse e a embargante e não havendo qualquer indício de má-fé na aquisição do imóvel, a procedência da demanda é medida que impõe.

Vale também ressaltar que a ausência de transcrição da alienação do bem imóvel havida em 2007 no registro competente não impede que o possuidor de boa-fé que o adquiriu mediante contrato regular de compra e venda defenda seus direitos por meio da ação de embargos de terceiro.

Embora reste reconhecido que o registro da escritura da transação é elemento essencial para caracterizar a cessão dos direitos de posse e propriedade, também é fato que o compromisso de compra e venda, ainda mais quando somado a outros elementos, efetivamente

XXXXX-02.2015.8.26.0604 - lauda 4

prova a existência de negócio entre as partes contratantes.

Por vislumbrar tal situação o Superior Tribunal de Justiça, por meio da Súmula 84 estabelece que "É admissível a oposição de embargos de terceiro fundada em alegação de posse advinda do compromisso de compra e venda de imóvel, ainda que desprovido do registro".

Assim, embora seja certo que a transmissão da posse e propriedade do imóvel faz- se a partir do competente registro, tratando-se este de elemento essencial, não se pode perder de vista o conhecimento do que de fato ocorre em casos como o dos presentes autos.

Os chamados contratos de gaveta, vale dizer, aqueles que não foram objeto de registro, não têm base na lei, mas não podem ser desmerecidos, já que espelham a vontade das partes contratantes.

Diante de todo o exposto, julgo IMPROCEDENTE a ação, com relação a MARIA DE FÁTIMA MARTINS DE SOUZA, e PROCEDENTES os Embargos de Terceiro opostos por MICHELLE OLIVIA DE OLIVEIRA JESUS para tornar definitiva da determinação de reintegração de posse sobre 50% do imóvel matriculado sob nº 47916 do Registro de Imóveis de Sumaré/SP, consolidando, definitivamente, a posse em nome da parte embargante, e extinto o feito, com julgamento de mérito, nos termos do artigo 487, I do CPC.

Em razão da sucumbência da requerente Maria de Fátima, condeno-a ao pagamento das custas e despesas processuais e honorários advocatícios que fixo em 10% sobre o valor da causa, nos termos do artigo 85, § 2º do Código de Processo Civil, devendo ser observada a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, como dispõe o artigo 98, § 3º, do mesmo Diploma processual.

Por outro lado, diante da sucumbência, condeno a embargada ao pagamento de custas e despesas processuais, bem como honorários advocatícios, que fixo em 10% sobre o valor da causa, nos termos do artigo 85, § 2º do Código de Processo Civil, devendo ser observada a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, como dispõe o artigo 98, § 3º, do mesmo Diploma processual.

Após o trânsito em julgado, certifique-se nos autos principais, trasladando-se cópia dessa decisão e, procedidas as anotações e comunicações de praxe, arquivem-se os autos.

P.I.C.

Sumare, 24 de dezembro de 2021.

Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/tj-sp/1966488969/inteiro-teor-1966488982