A função social da propriedade é tema em artigo de juiz mineiro
Com o artigo A repercussão da Função Social da Propriedade nas Ações Possessórias o juiz Renato Luís Dresch colaborou na edição do livro A Lei Agraria Nova, lançado na semana passada (29.8.2006) por ocasião do 12º Seminário Nacional de Direito Agrário, realizado em Boa Vista, Roraima. O livro, publicado pela Academia Brasileira de Letras Agrárias, é da editora Juruá de Curitiba e tem como organizadores os juristas Lucas Abreu Barroso, Elisabete Maniglia e Alcir Gursen de Miranda. No livro, o juiz comenta sobre a evolução do direito de propriedade nos ordenamentos jurídicos e mais detidamente à visão constitucional brasileira da função da propriedade. O magistrado explica que, antigamente, o direito à propriedade era considerado inviolável e com o tempo esse conceito foi sendo flexibilizado. Segundo ele, do séc. XIII ao XIX a igreja não se manifestava a respeito da função social da propriedade por ser uma das maiores proprietárias de terras do mundo. Somente no final do séc. XIX, as encíclicas papais retrataram uma mudança, preocupando-se com a propriedade numa visão social. João Paulo II, em 1979, no México, afirmava que existia uma hipoteca social sobre o direito da propriedade. No Brasil, o problema agrário agravou-se, ainda mais, com a abolição da escravatura, porque, naquele momento, os negros libertos não receberam terras e, como não possuíam condições de comprá-las, sofreram uma segunda escravidão, dessa vez voluntária. A partir de então, a situação foi se agravando e nunca tivemos uma verdadeira reforma agrária, afirma o juiz. O escritor comenta também que o Código Civil Brasileiro de 1916, influenciado pelo Código Civil Napoleônico, ao tratar do direito de propriedade, foi editado na contramão da história, pois, na Europa, as codificações já acolhiam a função social da propriedade. Nesse sentido, ele destacou a Constituição Mexicana de 1917 e a Constituição de Weimar, na Alemanha, em 1919. O juiz Dresch menciona a evolução histórica que o tema sofreu também nas legislações brasileiras. Ele explicou que, apesar da Constituição de 1934 ser a primeira a tratar da função social da propriedade, foi a Constituição Federal de 1988 que disciplinou mais especificamente a matéria. O tema foi objeto de palestras proferidas pelo magistrado em vários Estados da Federação, inclusive no Curso de Formação de Juízes da EJEF, dando destaque a nova concepção do direito de propriedade em razão no requisito atinente a função social da terra. Função Social da Terra O art. 5º , XXII e XXIII , da Constituição Federal de 88, assegurou o direito à propriedade desde que ela cumpra seu aspecto social. Mas o que vem a ser a função social da propriedade? Para explicar essa questão, o articulista recorreu ao art. 186 , também da CF , que prevê a propriedade social como sendo aquela que atenda aos seus aspectos econômico (que é a produtividade), ambiental (respeito ao meio ambiente), e social (respeito às relações de trabalho, visando ao bem-estar de proprietários e trabalhadores). Para o juiz, a propriedade que não observa os referidos requisitos não deve ter proteção possessória. E, apesar de ninguém defender a invasão de terras, a ocupação de propriedades que não cumprem a função social é legítima. Entretanto, segundo o magistrado, ainda hoje temos uma visão civilista, individualista e absolutista da propriedade, sem se preocupar com o bem-estar social. Aliás, há uma sobreposição pelos operadores do direito da legislação ordinária em detrimento da Constituição Federal . A idéia de propriedade é sempre: comprei, paguei, então faço o que eu quiser. Dessa forma, ao contrário da Europa, mantemos a concentração de terras, enfatiza. Nesse sentido, Renato Dresch fez considerações no livro sobre a necessidade de serem aplicadas as normas constitucionais ao direito agrário e minimizar o problema disputa por terras no Brasil. De acordo com sua experiência adquirida enquanto esteve à frente da vara agrária de Minas Gerais, o juiz observou que os sem-terra são pessoas que buscam a dignidade plena garantida pela CF . Ensina que a questão agrária deve ser tratada como um conflito social, e não como uma questão criminosa, pois estaríamos excluindo ainda mais a pobreza. Por fim, o magistrado observa que é preciso ter uma nova visão por parte do Poder Judiciário, agregando essa nova realidade apresentada dentro de uma justiça humanitária. Conclui, com base no art. 3º da Constituição Federal , que na atuação jurisdicional cabe ao juiz a tarefa de construção de uma sociedade livre, justa e solidária, com a erradicação da pobreza e da marginalização, com a redução das desigualdades sociais e regionais, e ainda promovendo o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. Como novidade, o livro possui um blog, diário eletrônico na internet, para quem quiser obter mais informações. O endereço é www.delegeagraria.blogspot.com.
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