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3 de Maio de 2024

A Mediação Familiar

Como Instrumento Efetivo De Inibição Da Alienação Parental.

Publicado por Gonzalez e Silva
há 3 anos



Cátia da Silva ²


RESUMO: A presente pesquisa tem como escopo analisar a mediação familiar como um instrumento inibidor da prática da alienação parental. Tal abordagem se justifica diante da vulnerabilidade das decisões judiciais em casos de alienação parental, as quais não possuem eficácia e acabam por aumentar o conflito entre os genitores, desta forma surge a necessidade de busca por métodos alternativos para resolução dos conflitos familiares. O objetivo deste trabalho é demonstrar a importância da mediação familiar como instrumento eficaz de inibição da prática da alienação parental e disseminar uma cultura de diálogo entre as partes. O presente estudo evidencia que a mediação familiar se apresenta como ferramenta para a solução adequada de diversos conflitos, principalmente nos casos de alienação parental, contribuindo para o bem-estar do menor envolvido no conflito e diminuindo os danos psicológicos experimentados pelas partes.

Palavras-chaves: Alienação Parental. Cultura de Paz. Mediação Familiar.

1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Diariamente acontecem casos de dissolução de casamento, união estável, ou simplesmente namoros que terminam, sendo que dessas relações resultam filhos, desejáveis ou não. Independentemente do desejo dos pais, esses filhos nascem, crescem, desfrutam a infância, a adolescência, tornam-se jovens, pais, avós, enfim, o ciclo das relações familiares não para, há sempre uma nova geração, um novo afeto, um novo parentesco.

Ocorre que nem sempre a relação familiar é a desejável para a criança ou adolescente, pois pelo fato dos pais serem separados, o poder familiar, às vezes não é exercido por ambos os genitores, ficando inúmeras vezes à prole em situação de vulnerabilidade.

Nesse contexto, primeiramente será feita uma abordagem acerca do poder familiar e a conflitualidade, as quais envolvem aspectos sociais, emocionais, psicológicos, psicanalíticos da criança e do adolescente, além do aspecto legal, jurídico, envolve um dos maiores valores, sendo este o bem mais precioso: o ser humano em sua concepção, atingindo a criança e adolescente, cujos direitos tem prioridade, principalmente em questão constitucional. .

Ocorre, que mesmo que careça haver a prevalência do melhor interesse da criança e do adolescente, por vezes a separação dos genitores acaba abrangendo inúmeros conflitos, e muitos deles difíceis de serem superados, ocorrendo assim uma grande beligerância por parte dos pais, dificultando a convivência e o exercício do poder familiar.

Esses conflitos acabam ultrapassando os limites e passam a prejudicar os filhos. Essa prática ocorre quando um dos genitores passa a desmoralizar a imagem do outro genitor perante o filho, e o que era apenas para ser uma pequena desavença, acaba por ocasionar um caso de alienação parental. E justamente por haver inúmeros casos da prática de alienação parental é que essa passa a ser abordada no segundo ponto da pesquisa, com análise do conceito, características, e principalmente as consequências dessa prática para os filhos.

Por fim, no último momento da presente pesquisa será analisada a mediação familiar, a qual é vista como um instrumento que facilitará a construção de um entendimento entre as partes, possibilitando o reestabelecimento do diálogo, sendo efetiva para solucionar os casos de alienação parental.

2. PODER FAMILIAR E CONFLITUALIDADE

Formar uma família é como pular de cabeça em águas inexploradas e de profundidade insondável. Como bem esclarece o original e perspicaz sociólogo Zygmunt Bauman, ter filhos é, certa e comprovadamente, a decisão com maiores consequências e de maior alcance que existe, e, portanto também a mais angustiante e estressante. (2004, p.61).

Assim surge o poder familiar, pois a partir do momento em que há a decisão de ter filhos, que inicia a relação de pais e filhos, criando um parentesco de primeiro grau e em linha reta, formando o vínculo denominado paternidade e maternidade.

Ocorre, nem sempre foi assim, pois “o elenco dos direitos do homem se modificou, e continua a se modificar, com a mudança das condições históricas, ou seja, dos carecimentos e dos interesses, das classes no poder, dos meios disponíveis para a realização dos mesmos, das transformações técnicas, etc.” (BOBBIO, 2004, p.18).

Em face dessas mudanças e transformações, o direito de família também teve modificações, e algumas denominações, conceitos e concepções ficaram no passado. Uma das mudanças perceptíveis se deu em relação ao poder familiar, que durante a vigência do Código Civil de 1916, era denominado pátrio poder. Sobre isso acrescenta Silvio Rodrigues:

Comparando o pátrio poder na forma como se apresentava na Roma antiga com o mesmo instituto na roupagem que hoje o reveste com a nomenclatura de poder familiar, nota-se tão profunda a modificação em sua estrutura que não se pode acreditar que se tarte da mesma instituição. Com efeito, a ideia que se tem é a de que o tempo provocou uma evolução tão radical em seu conceito que afetou a própria natureza do poder paternal. (2008, p.353).

Esta expressão de pátrio-poder induzia a uma noção de poder do pai sobre os filhos, a qual é incoerente com o reconhecimento da igualdade jurídica dos cônjuges e dos companheiros, bem como o princípio da paternidade responsável e planejamento familiar. Diante da necessidade da comunhão de direitos e deveres entre os genitores, surgiu a necessidade de mudança para poder familiar, com a ideia de autoridade, tanto pessoal como patrimonial, advinda de ambos os pais em relação aos seus filhos. (RODRIGUES, 2008, p. 353).

Hoje, a expressão “poder familiar” é utilizada e sobre esta se destacam algumas definições, necessárias e compreensíveis para o presente estudo. Poder familiar é um conjunto de direitos e obrigações, quanto à pessoa e aos bens do filho menor não emancipado, exercido, conjuntamente e em igualdade de condições, por ambos os pais, para que possam desempenhar os encargos que a norma jurídica lhes impõe, tendo em vista o interesse e a proteção do menor. (DINIZ, 2010, p.456).

São muitas as características do poder familiar, pois é um poder atribuído aos pais e que faz parte do estado das pessoas. Desta maneira, trata-se de um poder em que o estado fixa normas de exercício, para que haja sempre bom desempenho, constituindo um múnus público.

Conforme, Carlos Roberto Gonçalves (2013, p. 417), “o poder familiar não pode ser alienado nem renunciado, delegado ou substabelecido, sujeitando os filhos, independente da natureza da filiação, enquanto forem menores, de acordo com o art. 1630 do Código Civil.” Entretanto, aqueles que nascerem fora do casamento só estarão sujeitos a ele os que forem legalmente reconhecidos, pois como para aqueles filhos só o reconhecimento estabelece, juridicamente, o parentesco, é inconfundível que sem aquele não se pode falar em poder familiar.

Nesse sentido, acentuou o art. 21 do Estatuto da Criança e do adolescente “o poder familiar será exercido, em igualdade de condições, pelo pai e pela mãe, na forma do que dispuser a legislação civil, assegurado a qualquer deles o direito de, em caso de discordância, recorrer à autoridade judiciária competente para a solução da diferença.”

Ocorre que na maioria da vezes ao se recorrer ao judiciário o conflito passa a ter reações negativas que são interiorizadas pelo indivíduo, tornando-se uma ‘guerra fria”, sendo que as causas originárias passam a ser secundárias e o que interessa para as partes é a “batalha judicial.”

Na definição de Fabiana Spengler (2016, p. 109), “o conflito é uma maneira de ter razão independentemente dos argumentos racionais. É um procedimento contencioso no qual os antagonistas se tratam como adversários ou inimigos.”

Para os sujeitos envolvidos, o conflito é negativo, pois sempre vem revestido de sentimentos de violência, tristeza, raiva, perda, que se transformam em espirais do conflito. As espirais de conflito ocorrem quando há uma progressiva escalada conflituosa, resultante de um círculo de ação e reação. (AZEVEDO, 2016.)

O conflito trata de romper a resistência do outro, pois consiste no confronto de duas vontades, quando uma busca dominar a outra com a expectativa de lhe impor a sua solução. Essa tentativa de dominação pode se concretizar através da violência direta ou indireta, através da ameaça física ou psicológica.

Assim, podemos definir conflito no âmbito familiar como sendo um fenômeno Jurídico negativo que quando não tratado adequadamente pode ocasionar violência e danos físicos e psicológicos às partes, em especial aos menores envolvidos no conflito, tornando-se um imbróglio social.

Neste sentido, é necessário pensar nos sujeitos, entender que cada conflito possui uma particularidade não podendo uma sentença ser aplicável a uma gama de conflitos, como ocorre hoje no Judiciário, é preciso pensar o direito de forma personificada, permitindo se avaliar além daquilo que está no processo.

Assim, Bauman (2004, p.61), refere que “ter filhos significa avaliar o bem-estar de outro ser, mais fraco e dependente, em relação ao nosso próprio conforto. A autonomia de nossas preferências tende a ser comprometida, e continuamente: ano após ano, dia após dia.”

2 ALIENAÇÃO PARENTAL

Na década de 80 surge a expressão alienação parental, em razão de estudos realizados pelo Dr. Richard Gardner sendo ainda hoje observada e estudada, pois se trata de um fenômeno que ocorre com frequência na sociedade.

A alienação parental é perceptível quando há separação dos guardiões dos filhos, e estes passam a tornar-se-ão “inimigos”, criando um ambiente impróprio e conflituoso entre os pais e os filhos. Representa uma grave situação que ocorre, normalmente, “nas relações familiares, após o término da vida conjugal, quando a mãe, o pai, ou o responsável manipulam a criança e/ou adolescente, a fim de romper os laços afetivos com um dos genitores, de modo a prejudicar a convivência familiar.” (SOUZA, 2014, p.103).

Para Carlos Roberto Gonçalves (2013, p.306), a situação é bastante comum no cotidiano dos casais que se separam: um deles, magoado, com o fim do casamento e com a conduta do ex-cônjuge, procura afastá-lo da vida do filho menor, denegrindo a sua imagem perante este e prejudicando o direito de visita. Cria-se, nesses casos, em relação ao menor, a situação conhecida como “órfão de pai vivo”.

Nas ilustres palavras de Silvio de Salvo Venosa:

Os filhos são tidos como um joguete na separação dos pais. O ranço do rompimento pode traduzir-se numa atitude beligerante em relação ao outro genitor, geralmente aquele que não tem a guarda, embora isso não seja uma regra. Mesmo aquele que só recebe os filhos nos finais de semana e em datas específicas pode ter conduta de alienação parental. O guardião, em geral, seja ele divorciado ou fruto de união estável desfeita, passa a afligir a criança com ausência de desvelo com relação ao outro genitor, imputando-lhe má conduta e denegrindo sua personalidade sob as mais variadas formas. Nisso o alienador utiliza todo tipo de estratagemas. Trata-se de abuso emocional de consequências graves sobre a pessoa dos filhos. Esse abuso traduz o lado sombrio da separação dos pais. O filho é manipulado para desgostar ou odiar o outro genitor. (2013, p. 332)

Nesse sentido, a alienação parental advém do afastamento entre um genitor e o (s) filho (s), do qual o outro genitor passa a ter um comportamento doentio, programando o filho para que passe a odiar o outro genitor sem nenhuma justificativa. (SILVA, 2015, p.151).

Tal realidade, em algumas famílias, se deve às novas formas de estrutura familiar, pois anteriormente a guarda cabia apenas à mãe e o pai era detentor de visitas, mas hoje isto não é regra, pois os pais passaram a disputar a guarda da prole, algo que era impensável.

Segundo Dias (2015, p.545), a alienação parental é uma “lavagem cerebral”, feita pelo genitor alienador no filho, de modo a denegrir a imagem do outro genitor, narrando maliciosamente fatos que não ocorreram ou que não aconteceram conforme a descrição dada pelo alienador.

Quando um dos genitores passa a utilizar deste meio para denegrir a imagem do outro, não tem conhecimento dos danos futuros, além dos presentes que poderá causar à criança e ao adolescente. Como é sabido, os genitores têm que zelar e se responsabilizar pelos filhos, para que estes não se tornem pessoas problemáticas e infelizes. (FREITAS, 2015, p.26).

Ocorre que, por vezes, a conduta do alienador é intencional, mas muitas vezes não é sequer percebida por ele, pois se confunde com o direcionamento equivocado das frustações decorrentes do rompimento afetivo com o outro genitor, além de outras causas que possam causar esta má interpretação.

Por outro lado, muitas vezes é necessário que, quando ocorre alienação, o filho seja retirado do convívio do alienante, mas os atrasos e o excessivo formalismo dos tribunais contribuem para que o problema seja agravado.

Assim, caso não ocorra a percepção da alienação fará com que o filho seja levado a odiar e rejeitar um genitor do qual deveria haver amor, e do qual necessita. Com isso, o vínculo entre os dois será irremediavelmente destruído, pois, com efeito, não se pode reconstituir o vínculo entre a criança e o genitor alienado, se houver um hiato de alguns anos.

Assim, segundo Douglas Phillips Freitas (2015, p.26), a psicologia, a psicanalise e áreas afins buscam, na interdisciplinaridade com o direito, a construção de indícios identificadores da alienação parental, no fito de auxiliar todos os operadores envolvidos (juízes, promotores, advogados, peritos e partes) na identificação e gradação da alienação objeto da ação.

2.1 CONSEQUÊNCIAS DA ALIENAÇÃO PARENTAL

Toda ação tem um efeito e todo efeito poderá ocasionar uma consequência, o que não é diferente com a alienação parental que, com o decorrer do tempo, causará consequências nas crianças e adolescentes que serão difíceis de serem superadas.

Segundo Ana Carolina Carpes Madaleno e Rolf Madaleno (2015, p.54): “a consequência mais evidente é a quebra da relação com um dos genitores. As crianças crescem com o sentimento de ausência, vazio, e ainda perdem todas as interações de aprendizagem, de apoio e de modelo.”

Na alienação parental, a criança é levada a odiar e rejeitar um dos genitores, como visto anteriormente, o que acaba rompendo laços importantes entre o genitor e os filhos. Diante das maléficas consequências que a alienação parental pode causar a todos os envolvidos, a criança é, indubitavelmente, a principal vítima, pois ela tem menos ferramentas de defesa e de auto imunidade.

No mesmo sentido, o fato de tal prática ser levada ao poder judiciário fará com que as visitas entre o filho e o genitor alienado sejam suspensas e assim, segundo Dias (2015):

O juiz não encontra outra saída senão suspender qualquer contato entre ambos e determinar a realização de estudos psicossociais para aferir a veracidade do que lhe foi noticiado. Como esses procedimentos são demorados, durante todo este período, cessa a convivência do pai com o filho. Inúmeras são as sequelas que a abrupta cessação das visitas pode trazer, bem como os constrangimentos gerados pelos testes e entrevistas a que a vítima é submetida na busca da identificação da verdade.

Além das consequências relacionadas ao relacionamento do genitor alienado e a criança ou adolescente, há também as consequências psicológicas que o filho poderá desenvolver, ocasionando até transtornos psiquiátricos para o resto da vida.

Para Juliana Rodrigues Souza (2014, p.135), as consequências da alienação parental poderão apresentar divergências em função da idade dos filhos, da intensidade e frequências das manipulações, do tipo de relação que a criança possuía com os pais, entre outros fatores.

Por outro lado, a ocorrência da alienação parental poderá ocasionar outro fenômeno, o que aumentará as consequências e efeitos na formação da criança e adolescente, conhecido pela síndrome da alienação parental.

A síndrome da alienação parental (SAP) não se confunde com alienação parental, pois decorre desta. Nesse sentido que Dias (2015), explica que certamente todos que se dedicam ao estudo dos conflitos familiares e da violência no âmbito das relações interpessoais já se depararam com um fenômeno que não é novo, mas que vem sendo identificado por mais de um nome. Uns chamam de “síndrome de alienação parental”; outros, de “implantação de falsas memórias”.

“Considera-se esse um transtorno psicológico caracterizado por um conjunto sintomático e agravado da alienação parental, pelo qual um genitor, denominado cônjuge alienador, modifica a consciência de seu filho, por meio de estratégias de atuação e malicia.” (FREITAS, 2015, p.26). Assim, apenas ocorre a síndrome da alienação parental após haver um ininterrupto programa promovido pelo alienador para que a criança odeie e despreze o outro genitor.

Nas palavras de Caetano Lagrasta (2012, p.34), pessoas com a SAP mostram-se propensas a atitudes antissociais, violentas ou criminosas; depressão, suicídio, e na maturidade, quando atingida, revela o remorso de ter alienado e desprezado um genitor ou parente, assim padecendo de forma crônica de desvio comportamental ou moléstia mental, por ambivalência de afetos.

Com relação a este fenômeno, sua identificação e o poder judiciário, Dias acrescenta:

Diante da dificuldade de identificação da existência ou não dos episódios denunciados, mister que o juiz tome cautelas redobradas: deve buscar identificar a presença de outros sintomas que permitam reconhecer que está diante da síndrome da alienação parental e que a denúncia do abuso foi levada a efeito por espírito de vingança, como meio de acabar com o relacionamento do filho com o genitor. Para isso, é indispensável não só a participação de psicólogos, psiquiatras e assistentes sociais, com seus laudos, estudos e testes. Mister que também o juiz se capacite para poder distinguir o sentimento de ódio exacerbado que leva ao desejo de vingança a ponto de programar o filho para reproduzir falsas denúncias com o só intuito de afastá-lo do genitor. (2015, p. 547)

Nesse contexto, segundo Madaleno, “Devem ser priorizadas decisões judiciais capazes de preservar com rapidez a estabilidade emocional e a formação espiritual de filhos, vítimas inocentes e indefesas da síndrome de alienação parental” (2013, p. 465).

3. A MEDIAÇÃO FAMILIAR COMO FERRAMENTA PARA INIBIR A ALIENAÇÃO PARENTAL

Com o objetivo de analisar a mediação familiar, far-se-á necessário primeiramente buscar compreender este instituto, esta espécie de equivalente jurisdicional.

Segundo Roberto Portugal Baccelar (2012, p. 108), mediação, pode-se dizer que, além de processo, é arte e técnica de resolução de conflitos intermediada por um terceiro mediador (agente público ou privado) – que tem por objetivo solucionar pacificamente as divergências entre pessoas, fortalecendo suas relações (no mínimo, sem qualquer desgaste ou com o menor desgaste possível), preservando os laços de confiança e os compromissos recíprocos que os vinculam.

Em poucas palavras, é um meio amigável de gestão de conflitos baseado fundamentalmente na livre autodeterminação das pessoas que, de maneira conjunta, constroem possíveis caminhos e soluções que melhor atendam a seus interesses e necessidades. A estrutura proposta pela mediação oferece aos indivíduos um espaço para se diferenciar por meio do procedimento de construção e reconstrução de regras e de contextos, sobretudo mediante procedimentos de responsabilização.

A mediação é um procedimento autocompositivo que pode ser aplicado em diversas áreas em conflito, minimizando os danos. Para Christopher W. Moore (1998, p. 28) a mediação é definida como:

A interferência em uma negociação ou em um conflito de uma terceira parte aceitável, tendo um poder de decisão limitado ou não-autoritário, e que ajuda as partes envolvidas a chegarem voluntariamente a um acordo, mutuamente aceitável com relação as questões em disputa. Além de lidar com questões fundamentais, a mediação pode também estabelecer ou fortalecer relacionamentos de confiança e respeito entre as partes ou encerrar relacionamentos de uma maneira que minimize os custos e os danos psicológicos.

A mediação possui como objetivo o desenvolvimento da comunicação entre as partes, permitindo a aproximação dos litigantes para que de forma eficiente encontrem um caminho para o conflito.

Importante salientar que ao contrário do que muitos pensam, o foco da mediação não é a busca de um acordo entre as partes, mas sim a oportunidade de diálogo entre os sujeitos envolvidos, mesmo que isso não coloque fim ao conflito naquela momento. A ideia é disseminar a cultura da paz, buscar interação e cooperação entre as partes, por meio do uso de técnicas que são desenvolvidas e introduzidas no procedimento da mediação através do terceiro, que tem como papel auxiliar as partes para que sozinhos possam chegar a uma solução satisfatória para o conflito.

O que a mediação propõe é um modelo de justiça que foge da determinação rigorosa das regras jurídicas, abrindo-se à participação e a liberdade de decisão entre as partes, à comunicação de necessidades e de sentimentos.

Dada à complexidade do conhecimento teórico da mediação, ela não pode ser reduzida a um meio alternativo de solução de controvérsias, próprio da conciliação. A mediação visa a comunicação entre pessoas, com técnicas adequadas para promover a escuta mútua dos protagonistas, o que pode resultar no conhecimento de seus respectivos sofrimentos, criando espaço para uma nova dinâmica. (BARBOSA, 2014, p.29).

O principal objetivo da mediação é a liberdade dada às partes para chegarem a uma solução consensual do seu conflito, auxiliando no estabelecimento e fortalecimento do respeito e confiança entre elas. Além disto, a mediação pode encerrar relacionamentos de forma a minimizar os danos psicológicos e os custos de um processo judicial. É baseada na cultura do diálogo, onde há solidariedade e participação, sendo que as partes saem satisfeitas com o resultado, diferente do que ocorre na sentença judicial.

No ambiente familiar, nas relações familiares, inclui fidelidade, respeito, compreensão, atenção e uma série de detalhes pessoais. Assim, o cônjuge passa a ter uma expectativa em relação ao comportamento do outro cônjuge e dos filhos e vice-versa. Quando há violação dessas expectativas surgem frustrações e ressentimentos.

Por estas frustações e ressentimentos que nas causas de família a mediação ganha especial relevo, tendo em vista que nelas há uma maior dificuldade de se impor uma solução, já que as relações familiares são sempre permeadas pelo desejo, aspecto subjetivo que qualifica o litigio.

Dessa forma, conforme Giselle Câmara Groeninga (2008, p.36-37), a mediação visa o estabelecimento ou restabelecimento da comunicação, o empoderamento da família e sua responsabilização, e não à culpabilização, propiciando assim, um espaço de não-julgamento e de redimensionamento e planejamento do futuro da vida familiar. Poderia dizer que é a oportunidade de ampliação da consciência do significado e importância da responsabilidade parental, fomentando a empatia e a cooperação.

Assim, pode-se entender que “a mediação é um método disponível para prestar apoio aos pais na busca de um modelo ideal de compartilhamento do convívio com os filhos, após a ruptura da célula familiar” (SILVA, 2015, p.162). Sendo, certamente, o método mais recomendável nas situações crônicas, com elevado envolvimento emocional e necessidade de preservar os relacionamentos.

Nesse contexto, é nas relações familiares, que a mediação ganha os principais contornos e segundo Fernanda Rocha Lourenço Levy:

É o meio adequado para o tratamento de conflitos entre pessoas que possuam vínculos duradouros, proporciona um espaço seguro e acolhedor para a complexidade das relações familiares. A mediação familiar possibilita o restabelecimento da comunicação entre os mediandos, a reavaliação dos pontos divergentes e convergentes e o desenvolvimento da coparticipação nas decisões tomadas e corresponsabilidade pelas escolhas feitas. (2016, p.131)

Igualmente, as questões psicológicas permeiam as questões jurídicas, e muitas vezes são de difícil solução justamente por encontrarem uma barreira no âmbito psicológico. “A família está doente e o auxílio profissional é muito eficaz para restabelecer o equilíbrio das emoções e, consequentemente, a paz nas relações jurídicas.” (LEVY, 2016, p. 133)

Pode-se assim dizer, que com a utilização da mediação nas disputas de alienação parental, estaríamos diante de um novo parâmetro, uma nova forma de evitar às consequências que uma disputa judicial traz para os filhos, assim como para os pais e demais envolvidos, a mediação surge então, para evitar o modelo conflituoso utilizado no Poder Judiciário.

Busca-se com este modelo, o deslocamento do trabalho multidisciplinar para um trabalho interdisciplinar, ou seja, um trabalho realizado de forma conjunta e não de forma isolada como ocorre no primeiro. Ocorre que ultrapassar a zona de conforto e caminhar em direção a um novo espaço requer o desprendimento de dogmas e a capacidade de assumir novas linguagens e de aceitar novos horizontes.

Sobre a mediação e a aceitação dos juízes, Silva (2015, p.165) acrescenta:

Os juízes frequentemente se questionam a respeito de seu papel e de seus limites na resolução dos conflitos familiares. São cada vez mais em maior número os que recorrem a essa via duradoura de pacificação de conflitos, que é a mediação, complemento indispensável à missão da justiça familiar de hoje: promover a coparentalidade e responsabilizar os jurisdicionados.

Pois é sabido que o conflito no âmbito familiar é um dos mais delicados, pois seus protagonistas estão ligados por laços sentimentais. Amor, ódio, indiferença, ciúmes, apego e medo são ingredientes que quase sempre estão presentes nas fraturas familiares. (LEVY, 2016, p.138).

E quando há esses sentimentos negativos, a prática muitas vezes da alienação parental torna-se inevitável, pois esta será inserida em um ambiente frágil e já com fraturas, o que dificultará o restabelecimento da relação familiar. Mas busca-se nesse momento a mediação, a qual por propiciar o diálogo, a discussão e o desdobramentos de possibilidades amigáveis de relação, colabora para solucionar o conflito.

Por fim, entendem-se que a utilização da mediação apresenta-se como ferramenta eficaz para solução dos conflitos familiares, visto todos desdobramentos que este traz, beneficiando e concretizando a permanência do relacionamento familiar entre pais e filhos, e consequentemente evitando casos de alienação parental no ambiente familiar.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

As relações familiares modificaram, com o decorrer do tempo, princípios, conceitos, paradigmas, o mesmo ocorrendo com o Direito de Família. Como demonstrado no primeiro ponto da pesquisa, o poder familiar sofreu modificação, uma vez que o Código Civil de 1916 atribuía o pátrio-poder à autoridade do pai sobre os filhos, enquanto o Código Civil de 2002 estabelece que essa atribuição, ou melhor, essa função passa a ser exercidas por ambos os genitores, cabendo a esses cuidar, zelar e manter a autoridade parental sobre os filhos.

No decorrer da pesquisa, foi feita a análise da alienação parental, a qual ocorre quando um dos genitores passa a programar a criança ou adolescente, seu filho, a odiar o outro genitor. Sendo que esse tipo de conduta inicialmente começa imperceptível, com simples “fofocas” de um genitor para com o outro, mas que com o decorrer do tempo pode agravar-se e poderá tornar a Síndrome da Alienação Parental, quando a continuidades dessas condutas passa a trazer consequências irreversíveis ao olhar e pensamento dos filhos, ou até mesmo reversível, mas que necessitará de um longo tratamento psicológico, com psiquiatras, terapeutas, e psicólogo.

Nesse sentido, as crianças e adolescentes são a parte vulnerável da relação familiar, sendo dever dos pais dar amor, carinho, cuidar, zelar para um crescimento saudável. São esses os responsáveis pelos atos e vida dos filhos, até que atinjam a maioridade civil. Em outras palavras, os pais devem buscar sempre o melhor interesse da criança e do adolescente, pois esses são vulneráveis e estão em desenvolvimento físico e mental.

Relacionada justamente à questão da vulnerabilidade, do melhor interesse da criança e adolescente, é no objetivo de sempre garantir tal proteção, tais direitos, é que a mediação, analisada no último ponto da pesquisa, surge como uma ferramenta para alcançar esse objetivo, pois propicia o diálogo entre os pais, podendo prevenir e inibir a alienação parental.

Assim, revela-se fundamental o bom senso dos genitores, dos juízes e demais pessoas envolvidas no conflito, devendo-se primordialmente utilizar-se da mediação, propiciando o diálogo e a concordância dos genitores, e consequentemente evitará qualquer possiblidade de estabelecer-se no ambiente familiar a prática da alienação parental.

Deve assim, haver uma análise crítica, sistemática e particular, pois indispensável e inevitável é que sempre prevaleça o melhor interesse para a criança ou adolescente e que esse cresça em um ambiente agradável e saudável para seu desenvolvimento físico e mental.

Conforme proposto, este artigo teve por objetivo tecer alguns comentários acerca da necessidade de repensarmos a conflitualidade familiar, pois tendo em vista a sua complexidade, o Estado não consegue solucionar com eficácia com litígios que chegam ao Judiciário.

Este trabalho não esgota o assunto aqui tratado, tendo o objetivo de fomentar o discurso sobre o assunto, o qual possui tamanha relevância na atualidade, cabendo à comunidade discutir medidas que possam auxiliar na construção de uma sociedade baseada no diálogo.

REFERÊNCIAS

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_______. Lei nº 12.318, de 26 de Agosto de 2010. Dispõe sobre a alienação parental e altera o art. 236 da Lei no 8.069, de 13 de julho de 1990. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2010/lei/l12318.htm>. Acesso em: 10 de jan. 2016.

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