Declarada inconstitucionalidade de lei municipal que previa doações de imóveis públicos
Em sessão de julgamento, os desembargadores do Órgão Especial, por unanimidade, julgaram procedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade, com pedido de medida cautelar, requerida pelo Procurador-Geral de Justiça do Estado em desfavor de um município do interior, bem como de sua Câmara Municipal. A ação tem o objetivo de declarar nula a Lei Municipal nº 617/2015 que dispõe sobre doações de imóveis de propriedade do município requerido.
Alega o requerente que a referida lei viola o artigo 25 da Constituição Estadual, pois está em desacordo com o artigo 73,§ 10, da Lei nº 9.504/97, cuja execução da norma debatida se daria em pleno ano eleitoral. Dessa forma, a citada lei não pode ser usada como fundamento para distribuição arbitrária de bens públicos aos munícipes, o que afronta os princípios da moralidade administrativa, impessoalidade, igualdade e legalidade por conta de vício material na motivação da edição da lei.
Aponta que tal erro material se deu porque após três anos de mandato do prefeito e dos vereadores o projeto de lei foi enviado à Câmara com a solicitação de regime de urgência por haver “interesse pessoal”, uma vez que o atual gestor municipal está em seu primeiro mandato, estando apto a concorrer a reeleição. Logo, a urgência foi declarada com o objetivo de se furtar à restrição imposta pela legislação eleitoral, mais especificamente à proibição de doação de bens públicos prevista no artigo 73, § 10 da Lei nº 9.504/97.
Em seu voto, o relator do processo, Des. Fernando Mauro Moreira Marinho, entende que entre os atos administrativos permitidos ao ente público está o ato de doação de bens móveis ou imóveis, desde que tal ato tenha motivo consistente nos pressupostos de direito para ensejar a prática, levando em consideração a necessidade de formalidade como a obediência ao interesse público e aos princípios norteadores da administração pública. Aponta que, dessa forma, a doação de bens públicos está sujeita à obediência de critérios estabelecidos em lei para evitar a alienação indiscriminada e dilapidação do patrimônio público.
Explica o relator que a Lei de Licitação nº 8.666/93, no seu artigo 17, estabelece a permissão de doações de bens públicos pela administração, desde que observada autorização legislativa, prévia avaliação, observância do interesse público, estabelecendo os encargos e as obrigações assumidas e o prazo para seu cumprimento, logo, as doações em questão deveriam observar tais aspectos.
Salienta que há irregularidades nas doações, pois não houve a avaliação prévia dos imóveis, inexistindo ainda o loteamento devidamente registrado, isto é, tais concessões estão de forma genérica, sem estabelecer a corporificação do imóvel e omissão quanto à formalização pelos instrumentos com os requisitos da legislação civil. Também afirma que tal ato pode causar a redução no patrimônio público. Conforme dispõe o art. 1º da norma municipal impugnada: "doar imóveis de sua propriedade, dentro dos limites deste Município, devidamente registrados em órgão competente, e mediante Projeto de Loteamento de Interesse Social, com a finalidade específica de proporcionar acesso à moradia aos beneficiários selecionados em programas habitacionais do município de Anaurilândia", o que afronta o princípio da legalidade estatuída na Lei de Licitação nº 8.666, no art. 17, que se exige a individualização do imóvel a ser doado e sua avaliação prévia para proceder também a realização das baixas contábeis e patrimoniais dos bens no órgão doador e em contrapartida as incorporações no patrimônio dos donatários, inexistindo na lei objurgada menção sobre a descrição dos bens a serem doados.
O Desembargador conclui sua argumentação dizendo que está configurado o vício material da lei por violação ao princípio da legalidade contido no artigo 25 da Constituição Estadual, confirmando assim a tese alegada pelo autor de ter havido franqueamento de doação de imóveis de forma genérica, sem observar as exigências de avaliação e autorização legal específica.
“Logo, conclui-se que nessa ação declaratória de inconstitucionalidade resta demonstrada a ocorrência de vício material no conteúdo da norma referente à ausência de critérios definidos quando à especificação do loteamento devidamente registrado, individualização dos imóveis a serem doados e sua avaliação prévia, requisitos exigidos na Lei de Licitação (art. 17), o que afronta o princípio da legalidade”.
Processo nº 2000002-67.2016.8.12.0000
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