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5 de Maio de 2024

É possível a impetração de habeas corpus em favor de pessoa jurídica que pratique crime ambiental?

Publicado por Flávia Ortega Kluska
há 8 anos

Segundo a CF/88, é possível a responsabilidade penal da pessoa jurídica por crimes ambientais (art. 225, § 3º). Este é o entendimento majoritário na doutrina e a posição solidificada na jurisprudência do STJ e STF.

Quanto à possibilidade de impetração de HC em favor de pessoa jurídica que pratique crime ambiental, existem duas posições na jurisprudência:

1ª corrente: Não é possível que a pessoa jurídica seja paciente de habeas corpus em nenhuma hipótese, considerando que se trata de instrumento que tutela a liberdade de locomoção, característica incompatível com as pessoas jurídicas. É a posição do STF.

Com efeito, o STF entende que, mesmo quando a pessoa jurídica for acusada de crime ambiental não pode ser paciente (beneficiária) de habeas corpus considerando que, ainda que condenada, a pessoa jurídica, por razões de ordem lógica, não receberá uma pena privativa de liberdade (não será presa), sendo reprimida com outras espécies de sanção penal. Como o habeas corpus tutela a liberdade de ir e vir, não haveria qualquer sentido em admitir o pedido. Nesse sentido, confira-se trechos do seguinte julgado:

(...) 1. O habeas corpus é via de verdadeiro atalho que só pode ter por alvo - lógico - a "liberdade de locomoção" do indivíduo, pessoa física. E o fato é que esse tipo de liberdade espacial ou geográfica é o bem jurídico mais fortemente protegido por uma ação constitucional. Não podia ser diferente, no corpo de uma Constituição que faz a mais avançada democracia coincidir com o mais depurado humanismo. Afinal, habeas corpus é, literalmente, ter a posse desse bem personalíssimo que é o próprio corpo. Significa requerer ao Poder Judiciário um salvo-conduto que outra coisa não é senão uma expressa ordem para que o requerente preserve, ou, então, recupere a sua autonomia de vontade para fazer do seu corpo um instrumento de geográficas idas e vindas. Ou de espontânea imobilidade, que já corresponde ao direito de nem ir nem vir, mas simplesmente ficar. (...) Pessoa Jurídica que somente poderá ser punida com multa e pena restritiva de direitos. Noutro falar: a liberdade de locomoção do agravante não está, nem mesmo indiretamente, ameaçada ou restringida.

(HC 88747 AgR, Relator: Min. Carlos Britto, Primeira Turma, julgado em 15/09/2009)

2ª corrente: Sim, é possível que a pessoa jurídica seja paciente de habeas corpus no caso de estar sendo acusada de crime ambiental e se o writ tiver sido proposto em favor da pessoa jurídica e também das pessoas físicas que forem corrés na ação penal. É o que entende o STJ.

Antes de detalharmos melhor esta corrente, convém fazer uma explicação prévia:

O STJ, no caso de ações penais propostas contra pessoas jurídicas por crimes ambientais, adota a chamada teoria ou sistema da dupla imputação (ou de imputações paralelas).

De acordo com esta teoria, admite-se a responsabilidade penal da pessoa jurídica em crimes ambientais desde que haja a imputação simultânea do ente moral e da pessoa física que atua em seu nome ou em seu benefício, uma vez que não se pode compreender a responsabilização da pessoa jurídica dissociada da atuação de uma pessoa física, que age com elemento subjetivo próprio (Resp nº 564960/SC). Trata-se, portanto, de crime em que o concurso de pessoas (jurídica e física) é necessário.

Entendido isso, deve-se explicar que, para o STJ, a pessoa jurídica pode ser admitida como paciente de habeas corpus nos casos de crimes ambientais, desde que as pessoas físicas que também foram acusadas figurem conjuntamente como pacientes do habeas corpus.

Nas palavras da própria Corte: tem-se admitido a pessoa jurídica como paciente, apenas nos casos de crimes ambientais, quando as pessoas físicas também se apresentam nesta qualidade, no mesmo pedido, por estarem a sofrer coação ilegal à sua liberdade de ir e vir (RHC 24933/RJ).

De acordo com o STJ, se o HC é impetrado em favor dos réus pessoas física e jurídica, não haveria sentido não conhecer da impetração apenas quanto à pessoa jurídica uma vez que, se a pessoa física for excluída, não subsistirá também o processo para a pessoa jurídica (HC 147541 / RS).

Exemplo prático:

A sociedade limitada X foi denunciada, juntamente com seus dirigentes Michel e Luan, pela prática de crime ambiental. Reparem que existem três réus nesta ação penal: a pessoa jurídica X, “Michel” e “Luan”.

Os advogados da pessoa jurídica X impetram habeas corpus no Tribunal pedindo o “trancamento” da ação penal e apontando como paciente apenas a pessoa jurídica. Pelo entendimento do STJ, o habeas corpus não seria conhecido. Confira-se:

(...) II. A jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça consolidou-se no sentido de que o habeas corpus não se presta para amparar reclamos de pessoa jurídica, na qualidade de paciente, eis que restrito à liberdade ambulatorial, o que não pode ser atribuído à empresa.

III. Admite-se a empresa como paciente tão somente nos casos de crimes ambientais, desde que pessoas físicas também figurem conjuntamente no pólo passivo da impetração, o que não se infere na presente hipótese (Precedentes).

IV. Recurso ordinário desprovido, nos termos do voto do Relator.

(RHC 28.811/SP, Rel. Min. Gilson Dipp, quinta turma, julgado em 02/12/2010, DJe 13/12/2010).

Em síntese:

É possível a impetração de HC em favor de pessoa jurídica que pratique crime ambiental?

STF: NÃO. Pessoa jurídica pode cometer crime ambiental, mas não pode ser paciente de HC porque nunca poderá ser presa.

STJ: Depende:

· Se o HC é impetrado em favor apenas da pessoa jurídica, não será conhecido.

· Se o HC é impetrado em favor da pessoa jurídica e dos corréus pessoas físicas, poderá ser conhecido e ter seu mérito julgado.

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Muito obrigado! continuar lendo

Simplesmente excelente Dra! continuar lendo