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16 de Junho de 2024
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    O Brasil conta com uma excessiva judicialização da saúde

    Publicado por Consultor Jurídico
    há 11 anos

    O tema que me cabe é o da judicialização da saúde, em cuja abordagem adotarei a metodologia retórica de Peter Haberle, que consiste na formulação de um catálogo de perguntas, as quais, uma vez respondidas, permitirão intuir a extensão e a complexidade da matéria. E as questões são as seguintes:

    1) Quais os fundamentos do dever do Estado de tutelar a saúde?

    2) O que explica o assombroso quadro de judicialização da saúde?

    3) Nesse domínio, quais são os temas objeto de judicialização?

    4) Quais são as críticas reiteradas às decisões judiciais nessa matéria?

    5) Como o Poder Judiciário tem se posicionado a respeito do problema?

    Passo às repostas:

    Quais os fundamentos do dever do Estado de tutelar a saúde?

    Ainda em seu preâmbulo, a Constituição da Republica Federativa do Brasil indica que o Estado democrático por ela instituído se destina a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça.

    Já o artigo 1º, inciso III, erige a dignidade da pessoa humana como fundamento da própria República e do Estado democrático de direito.

    Nessa mesma linha, nos artigos , parágrafos 1º e 2.º, 6.º e 196 a 200, a Carta Magna trata da igualdade, do direito à vida, da eficácia imediata dos direitos fundamentais e do direito à proteção e à saúde.

    O direito à saúde está relacionado em nossa constituição como um direito social. Os direitos sociais, tal como os direitos de liberdade, são direitos fundamentais constitucionalmente reconhecidos, porque considerados como imprescindíveis ao desenvolvimento do homem, de modo a assegurar a dignidade cabível a cada ser humano individual e socialmente [3] .

    Portanto, a Constituição de 1988 afirma o direito à saúde como direito fundamental, que demanda ações do Estado contra a carência que atinge o indivíduo. Exige do Estado deveres de respeito, deveres de proteção e deveres de promoção [4] .

    O que explica o assombroso quadro de judicialização da saúde?

    Se o cumprimento dos deveres estatais de promoção do acesso individual aos bens jusfundamentalmente protegidos são negligenciados, o caminho natural é que haja uma invocação jurídica de um determinado direito social, como é o caso do direito à saúde, em determinada situação concreta. O mesmo se diga em relação ao descumprimento de contratos por parte das operadoras de planos de saúde.

    Mas, por que isso ocorre com maior intensidade agora do que antes? Por exemplo, uma pesquisa feita em 2008 sobre a judicialização da saúde revelou que no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul foram localizadas 111 decisões relacionadas à saúde suplementar com pedidos assistenciais, somente no ano de 2005, número superior ao total das decisões analisadas de 1991 a 1998 [5] .

    Está claro que, neste momento, aparece com vigor o protagonismo social e político do Poder Judiciário, coincidindo com o fenômeno da deslegitimação dos poderes políticos e da crise de crença na autoridade pública.

    Neste novo cenário, o Judiciário vem recebendo diferentes tipos de demandas, que terminam por promover uma significativa pressão sobre o aparato judicial.

    A função do Judiciário sofreu substancial modificação. Passou a atuar como órgão calibrador de tensões sociais, solucionando conflitos de conteúdo social, político e jurídico, e também implementando o conteúdo promocional do Direito. Coube-lhe o desafio eliminar a distância entre a promessa de direito e a sua efetivação.

    A ideia de acesso à Justiça não mais se limita ao mero acesso aos tribunais: não se trata apenas e somente de possibilitar o acesso à Justiça enquanto instituição estatal, mas de viabilizar o acesso à ordem jurídica justa [6] . Trata-se, a rigor, da promoção da cidadania àqueles que se encontram em condição social desfavorável.

    Mas, por que o acesso à Justiça e a luta por direitos se orienta, crescentemente, em direção ao Judiciário? Na verdade, demandas que antes eram dirigidas ao Legislativo e são apresentadas, agora, ao Judiciário, na expectativa de que ele venha a suprir determinados serviços negligenciados pela Administração Pública.

    Registre-se que o atual protagonismo do Judiciário é menos o resultado desejado por esse Poder e mais um efeito inesperado da transição para a democracia, sob a circunstância de uma reestruturação das relações entre o Estado e a sociedade. E a denominada crise do Poder Judiciário nada mais é do que a sua súbita adaptação à feição contemporânea da sociedade brasileira, sem estar equipado material, conceitual e doutrinariamente para dar conta da carga de novos problemas que a sociedade passou a lhe apresentar [7] .

    Não bastasse isso, na questão específica da proteção à saúde, o Brasil mantém um intrincado e gigantesco sistema de prestação de serviços de saúde, direcionado à prestação universal e gratuita de serviços de assistência [8] , que envolve todos os Estados da federação, os quais devem atuar articuladamente. O Sistema Único de Saúde, embora tenha representado grande avanço na assitência à população, não tem a eficâcia desejada, notadamente em razão das características socioeconômicas brasileiras, em que avultam impressionantes desigualdades sociais e regionais, e da grandeza do espaço geográfico a ser coberto [9] , bem assim a existência de órgãos com atuvidades concorrentes ou complementares.

    Assim, são notórias as falhas no serviço de saúde, de insuficiência de quadro médico, de baixa qualificação do serviços em geral, de carências materiais elementares, de superlotação de equipamentos públicos de saúde [10] , de terceirização de mão-de-obra, fragilidade dos programas de prevenção de doenças, falta de medicamentos, entre outros.

    Some-se a tudo os incalculáveis pontos de atrito que podem ser gerados nas relações contratuais entre o consumidor e as operadoras de planos de saúde suplementar e está delineado o cenário da absurdamente excessiva judicialização da saúde no Brasil.

    Nesse domínio, quais são os temas objeto das demandas judiciais?

    Registre-se, inicialmente, que não há dados definitivos quanto a esta questão.

    De qualquer modo, aqui é necessário fazer uma divisão entre as ações promovidas em face do Estado e aquelas ajuizadas contra os operadores de planos de saúde.

    Quanto a estas últimas, ações contra as operadoras de planos de saúde, as discussões no âmbito do Fórum Nacional de Saúde do Conselho Nacional de Justiça identificou como as mais comuns as que envolvem, entre outros, os seguintes temas [11] :

    Contratos de pano de saúde antigos (antes da Lei 9.656/98) e o Direito Intertemporal

    Esse é um problema recorrente e que apresenta divergência de interpretação entre o STJ e o STF, ainda não enfrentada.

    O STF entende que a lei nova não se aplica aos efeitos dos contratos celebrados antes da vigência da nova lei e sim aos ocorridos a partir dela, em respeito ao ato jurídico perfeito.

    Já o STJ tem aplicado a lei nova (inclusive o Estatuto do Idoso, no caso de aumento de preço por variação etária) nos contratos firmados antes da vigência dela, desde que o aumento tenha ocorrido depois.

    Isso gera muitos recursos. As operadoras alegam no STJ (em sede de Recurso Especial) a violação de garantia constitucional e a corte não conhece da matéria, porque entende que é da competência do STF. A operadora então interpõe o Recurso Extraordinário e o STF não conhece da matéria porque importa em exame do contrato para saber a data da celebração do negócio e, portanto, implica em exame de prova, o que não é possível naquela Corte.

    O resultado é uma insegurança jurídica que envolve mais de 7 milhões de usuários que ainda tem contratos antigos, sem falar naqueles que foram celebrados antes do Estatuto do Idoso e depois da Lei 9.656/98.

    Cobertura nos Casos de Urgência e Emergência

    O prazo para atendimento de urgência e emergência fixado na lei é de 24 horas, sem qualquer distinç...

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