Busca sem resultado
jusbrasil.com.br
30 de Abril de 2024

São Paulo suspende 1º pedido de aposentadoria de pessoa trans no estado por ‘dúvidas jurídicas’

Após mudança de nome e gênero em documentos, agente penitenciário é obrigado a voltar ao trabalho até análise do caso pela Procuradoria Geral do Estado. Dia da visibilidade trans é celebrado nesta quarta-feira (29).

Publicado por Correção FGTS
há 4 anos

O estado de São Paulo lida pela primeira vez com um pedido de aposentadoria de uma pessoa trans e analisa se o tempo de trabalho a ser considerado é aquele estabelecido para homens ou mulheres. Enquanto isso, o servidor público em questão foi mandado de volta ao trabalho no Centro de Detenção Provisória do Butantã.

No Dia da Visibilidade Trans, celebrado nesta quarta-feira (29), o agente penitenciário e homem trans Jill Alves reivindica o direito de se aposentar.

Aos 54 anos e com quase 32 anos de trabalho no sistema prisional, Jill deu entrada no pedido de aposentadoria no dia 11 de julho de 2019 com a documentação que tinha, no gênero feminino. O protocolo determinava que, após o envio da documentação, ele trabalhasse por mais 3 meses e depois aguardasse em casa a decisao da São Paulo Previdência (SPPrev).

Paralelamente, duas semanas mais tarde, teve a notícia de que a retificação de nome e gênero que havia solicitado há 4 anos como homem trans fora aceita e que a nova certidão estava disponível no cartório. Jill encaminhou os novos documentos com a alteração dos dados pessoais para a Secretaria da Administração Penitenciária (SAP).

Agente penitencirio Jill Alves de Moraes a primeira pessoa trans a solicitar aposentadoria do servio pblico e enfrenta dvidas jurdicas Foto Marcelo BrandtG1
Agente penitenciário, Jill Alves de Moraes é a primeira pessoa trans a solicitar aposentadoria do serviço público e enfrenta 'dúvidas jurídicas' — Foto: Marcelo Brandt/G1

Quando recebeu os novos dados, a SPPrev indeferiu temporariamente o pedido e recorreu à Procuradoria Geral do Estado (PGE) para entender se Jill deveria ter o tempo contribuição definido para homens ou para mulheres.

“Faltando 10 dias para encerrar minhas atividades no serviço público, recebi um ofício informando que o pedido fora indeferido por ‘dúvidas jurídicas relevantes’ e orientando que eu não me afastasse até a decisão. Isso faz 4 meses e nenhuma decisão foi tomada”, contou Jill ao G1.

“Eu acho que como os 90 dias de análise já se passaram e eles continuam com dúvidas, eu poderia ao menos aguardar isso em casa. A rotina na unidade prisional é muito difícil, um ambiente insalubre e perigoso, com um risco iminente, que demanda constante estado de alerta”, diz ainda.

Em nota, a SPPrev confirmou que esta é a primeira vez que uma pessoa trans entra com pedido de aposentadoria no serviço público do estado de São Paulo e acrescentou que um segundo caso similar também aguarda parecer da Procuradoria Geral do Estado.

O órgão explicou que solicitou consultoria jurídica à PGE porque os critérios de concessão de aposentadoria são diferentes para homens e mulheres. Acrescentou que os processos estão em análise, sem previsão de quando serão solucionados.

O advogado que defende o servidor afirma que a SPPrev deveria se basear no direito adquirido.

“O que vale é a data da reunião dos requisitos reunidos pelo Jill, estes são o patrimônio jurídico dele, que deveriam protegê-lo. É o direito adquirido. Se a Reforma Previdenciária proposta agora pelo governador João Doria (PSDB) for efetivada ou se Jill realizou a transição de gênero a posteriori desta data, isto é um problema dele, não diz respeito ao Estado”, argumentou Sergio Moura, advogado do Sindicato dos Funcionários do Sistema Prisional do Estado de São Paulo (Sifuspesp).

Falta jurisprudência

A transexualidade é um conceito tão novo que ainda não consta em todos os dicionários, e há somente um ano e meio deixou de ser considerada doença pela Organização Mundial de Saúde (OMS).

Retificao de nome e gnero de Jill saiu em meio a processo de solicitao de aposentadoria So Paulo Previdncia no sabe se considera tempo de trabalho determinado para homem ou para mulher Foto Marcelo BrandtG1
Retificação de nome e gênero de Jill saiu em meio a processo de solicitação de aposentadoria; São Paulo Previdência não sabe se considera tempo de trabalho determinado para homem ou para mulher — Foto: Marcelo Brandt/G1

Se por um lado o Brasil dificulta a inclusão das minorias e é a nação que mais mata travestis e transexuais no mundo, por outro, as 4 milhões de pessoas trans do país, o equivalente a 2% da população brasileira, respondem com resistência e luta, conquistando gradativamente respaldo institucional para sobreviver.

“O Estado me deu a possibilidade de ser quem eu sou. Eu não teria dinheiro para realizar a mastectomia, comprar os hormônios e me consultar com psicólogos e endocrinologistas. Eu acho que eles esqueceram que as pessoas trans envelheceriam e não se prepararam para isso. Não pode ser só pão e circo – tive a oportunidade, mas também preciso de direitos”, desabafou Jill.

O advogado Sergio Moura enxerga uma falta de coerência na postura do Estado, que, de um lado garantiu a possibilidade de ser das pessoas trans, e por outro não possui máquina pública pronta para recebê-las.

“Quem diz que a mudança de gênero e identidade é um direito de cidadania é o próprio Estado na condição de legislador, executor das leis e julgador de casos concretos. Então é obrigação do Estado brasileiro estar aparelhado para aquilo que ele diz que é cidadania”, afirma. “A máquina pública está montada em cima da padronização de que as pessoas são homens ou mulheres, sem outra via. Por isso o pedido dele está sendo postergado, porque ele é um homem trans."

Nesta quarta-feira 29 Dia da Visibilidade Trans agente penitencirio e homem trans Jill Alves de Moraes corre a capital paulista com uma pasta cheia de documentos reivindicando direito de se aposentar Foto Marcelo BrandtG1
Nesta quarta-feira (29), Dia da Visibilidade Trans, agente penitenciário e homem trans Jill Alves de Moraes corre a capital paulista com uma pasta cheia de documentos reivindicando direito de se aposentar — Foto: Marcelo Brandt/G1

Fonte: G1

Leia Também:

  • Publicações703
  • Seguidores732
Detalhes da publicação
  • Tipo do documentoNotícia
  • Visualizações813
De onde vêm as informações do Jusbrasil?
Este conteúdo foi produzido e/ou disponibilizado por pessoas da Comunidade, que são responsáveis pelas respectivas opiniões. O Jusbrasil realiza a moderação do conteúdo de nossa Comunidade. Mesmo assim, caso entenda que o conteúdo deste artigo viole as Regras de Publicação, clique na opção "reportar" que o nosso time irá avaliar o relato e tomar as medidas cabíveis, se necessário. Conheça nossos Termos de uso e Regras de Publicação.
Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/noticias/sao-paulo-suspende-1-pedido-de-aposentadoria-de-pessoa-trans-no-estado-por-duvidas-juridicas/804117594

Informações relacionadas

Maiara Moreira, Jornalista
Notíciashá 4 anos

Brasil não possui leis previdenciárias e nem número significativo de pessoas trans aposentadas

Layany Martins Oliveira, Advogado
Modeloshá 5 anos

[Modelo] Recurso inominado - Juizado Especial Cível

2 Comentários

Faça um comentário construtivo para esse documento.

Não use muitas letras maiúsculas, isso denota "GRITAR" ;)

Complicado mesmo, mas acho que esse caso pode servir de base para os demais, como disse Jill, todos envelhecemos e claro que a definição da aposentadoria para os trans, uma hora ou outra deve acontecer.

Particularmente eu defendo o fato de que o mesmo tenha TODOS os direitos no gênero ao qual se define, e se identifica, assim entendo ser justo. continuar lendo

Os operadores jurídicos, todos atados a preconceitos, e com eles interpretam a lei, não estão preparados para a aplicação do Texto Constitucional. continuar lendo