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3 de Maio de 2024

STF decide: não cabe ANPP em crimes raciais e injúria racial

Incompatibilidade do ANPP com crimes raciais, segundo o sistema constitucional vigente.

Publicado por Joao Gerbasi
há 7 meses

Resumo da notícia

Neste artigo faço um apanhado do voto do Ministro Relator Edson Fachin, nos autos do RHC 222.599/SC - apenas com objetivo informativo.

Em sessão virtual do dia 16/12/2022 a 06/02/2023, sob a presidência do Ministro André Mendonça, e sob relatoria do Ministro Edson Fachin, a Segunda turma do STF, por maioria, negou provimento ao RHC 222.599/SC, para definir que é incabível o oferecimento do Acordo de não persecução penal, nos crimes raciais, incluindo o crime de injúria racial previsto no artigo 140, § 3º, do CP.

Voto do Ministro Relator

Para o ministro relator, Edson Fachin, além de negar o prequestionamento à matéria, decidiu também que não assiste razão à defesa quanto ao mérito da questão.

Combate ao preconceito como objetivo fundamental da República

Nos termos do voto relator, a promoção do bem de todos, sem preconceito de origem, raça, sexo, cor, idade ou qualquer outra forma de discriminação constitui um dos objetivos fundamentais da República Federativa, estando expressamente previsto no artigo 3º da Constituição Federal, vejamos:

Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
(...)
V - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

Seguindo essa linha de raciocínio, para o Ministro, a constituição federal delimita o alcance material do acordo de não persecução penal – e com compromissos internacionais.

Para tanto, impeditivo de qualquer despenalização, o artigo 5º, inciso XLI, previu a necessidade de o legislador punir tais crimes:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
XLI - a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais;

Compromissos Internacionais assumidos pelo Brasil

Rememorando os compromissos e tratados internacionais assumidos pelo Brasil, o Ministro relator traz à baila uma sucessão de documentos que reforçam o endurecimento do combate ao preconceito e intolerância:

1. Convenção Internacional Sobre a Eliminação de Todas as Formas de preconceito racial

Aprovada em 1967 pela ONU, e ratificada pelo Brasil em 1969.

2. Convenção Interamericana contra o Racismo, discriminação racial e Formas correlatas de intolerância.

Aprovada na 43ª Sessão Ordinária da Assembleia Geral da ONU, em 05.06.2013, e ratificada no Brasil pelo Decreto Legislativo nº 1/2021 em 19.02.2021.

Essa sucessão de compromissos indica uma evolução no combate à discriminação, isto porque, a convenção interamericana, mais recente, ampliou tal proteção também aos ambientes privados, o que segundo o relator:

A ratificação da Convenção interamericana contra o Racismo, a Discriminação Racial e Formas Correlatas de Intolerância reafirma a decisão do Estado Brasileiro de reprimir de forma mais severa o racismo (...) (pg. 05).

Reserva legislativa e interpretação teleológica

Conforme o art. 28, inciso IV do CPP, o legislador optou por impedir a aplicação do ANPP no seguinte caso:

Art. 28-A:

§ 2º O disposto no caput deste artigo não se aplica nas seguintes hipóteses:

IV - nos crimes praticados no âmbito de violência doméstica ou familiar, ou praticados contra a mulher por razões da condição de sexo feminino, em favor do agressor.

Nos termos do voto relator, essa proibição decorre de uma incompatibilidade do ANPP com o sistema constitucional que veda atos discriminatórios, indicando uma proteção aos direitos fundamentais e compromisso assumidos pelo Brasil – e nesse sentido, não seria uma hipótese única, pois em interpretação analógica, os crimes raciais também mereceriam o mesmo tratamento.

Conclusão do voto seguido pela maioria do Tribunal

Por tudo que foi exposto, para a corte o ANPP não é aplicável aos crimes raciais e injúria racial. Esquematizando os argumentos utilizados no voto relator, podemos concluir:

  • Incompatibilidade com o sistema constitucional e objetivos da república – que expressamente manda criminalizar condutas discriminatórias.
  • Os tratados assinados pelo Brasil reforçam que, a preocupação ao combate à discriminação aumentou nos últimos anos.
  • O legislador proibiu o ANPP expressamente nos crimes contra a mulher em situação de violência doméstica – o que permite, em técnica hermenêutica, ampliar tal vedação aos crimes raciais.

Votos vencidos: Min. André Mendonça e Min. Nunes Marques.

Referências:

Supremo Tribunal Federal (stf.jus.br)

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