STJ aplica inversão do ônus da prova em Ação Civil Pública para tutela de direito ambiental (Info. 404)
Informativo, STJ nº: 0404
Período: 24 a 28 de agosto de 2009.
As notas aqui divulgadas foram colhidas nas sessões de julgamento e elaboradas pela Assessoria das Comissões Permanentes de Ministros, não consistindo em repositórios oficiais da jurisprudência deste Tribunal.
SEGUNDA TURMA
ACP. DANO AMBIENTAL. ÔNUS. PROVA.
Trata-se da inversão do ônus probatório em ação civil pública (ACP) que objetiva a reparação de dano ambiental. A Turma entendeu que, nas ações civis ambientais, o caráter público e coletivo do bem jurídico tutelado e não eventual hipossuficiência do autor da demanda em relação ao réu conduz à conclusão de que alguns direitos do consumidor também devem ser estendidos ao autor daquelas ações, pois essas buscam resguardar (e muitas vezes reparar) o patrimônio público coletivo consubstanciado no meio ambiente. A essas regras, soma-se o princípio da precaução. Esse preceitua que o meio ambiente deve ter em seu favor o benefício da dúvida no caso de incerteza (por falta de provas cientificamente relevantes) sobre o nexo causal entre determinada atividade e um efeito ambiental nocivo. Assim, ao interpretar o art. 6º, VIII, da Lei n. 8.078/1990 c/c o art. 21 da Lei n. 7.347/1985, conjugado com o princípio da precaução, justifica-se a inversão do ônus da prova, transferindo para o empreendedor da atividade potencialmente lesiva o ônus de demonstrar a segurança do empreendimento. Precedente citado : REsp 1.049.822-RS , DJe 18/5/2009. REsp 972.902-RS, Rel. Min. Eliana Calmon, julgado em 25/8/2009.
NOTAS DA REDAÇAO
A Constituição da Republica Federativa do Brasil de 1988 foi a primeira brasileira a dispor em seu texto sobre o meio ambiente. Prevê o artigo 225 que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preserva-lo para as presentes e futuras gerações . Mas foi com o anterior advento da Lei 7.347/85 que o Ministério Público (em especial) e também os demais legitimados ativos à Ação Civil Pública começaram a propor de forma intensa medidas judiciais para a defesa do meio ambiente.
Vale dizer que recai sobre a defesa do meio ambiente a observância do princípio da responsabilidade objetiva. Isso em razão do disposto no artigo 14, 1º, da Lei 6.938/81 que prevê: Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade . O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente. O entendimento é também do Ministério Público de São Paulo, cujo Conselho Superior editou a Súmula 18 com o seguinte teor: em matéria de dano ambiental, a Lei 6.938/81 estabelece a responsabilidade objetiva, o que afasta a investigação e a discussão da culpa, mas não se prescinde do nexo causal entre o dano havido e ação ou omissão de quem cause o dano. Se o nexo não é estabelecido, é caso de arquivamento do inquérito civil ou das peças de informação.
Logo se vê que é ampla a preocupação em apresentar aos legitimados pelo zelo do meio ambiente a mais ampla facilitação no que tange aos instrumentos jurídicos aplicáveis. Neste sentido, o Tribunal da Cidadania, por meio de sua Segunda Turma, entendeu por bem utilizar da teoria da inversão do ônus da prova no âmbito da Ação Civil Pública. Assim o fez, aplicando o disposto no artigo 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor, que dispõe:
Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
(...)
VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova , a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências ; (grifos nossos).
No processo civil vige a regra do ônus da prova, segundo a qual incumbe ao autor a prova dos fatos constitutivos de seu direito e ao réu a prova quanto aos fatos modificativos ou extintivos do direito do autor. Nosso Código de Processo Civil, nas lições de Fredie Didier, adotou a teoria estática de distribuição do ônus da prova, embora jurisprudencialmente venha sendo construído o entendimento para aplicação da teoria da distribuição dinâmica do ônus da prova, de acordo com a qual o ônus da prova deve ser atribuído a quem, no caso concreto, puder se desincumbir dele.
Art. 333. O ônus da prova incumbe:
I - ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito;
II - ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.
Parágrafo único. É nula a convenção que distribui de maneira diversa o ônus da prova quando:
I - recair sobre direito indisponível da parte;
II - tornar excessivamente difícil a uma parte o exercício do direito.
A inversão do ônus da prova, por sua vez, prevista legalmente nos termos supra citados pelo Código de Defesa do Consumidor, aplicada no âmbito do direito ambiental apresenta-se como instrumento de extrema importância e que vem ao encontro de todos os preceitos constitucionais que visam proteger o meio ambiente. Merecedora de louvores a decisão tomada no recurso que deu origem ao presente informativo que, em verdade, beneficia não o autor, mas a sociedade detentora do patrimônio público coletivo consubstanciado no meio ambiente.
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