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4 de Maio de 2024
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    STJ firma que não há presunção de paternidade quanto ao descendente que se nega a realizar o exame de DNA

    há 14 anos

    DECISAO

    Recusa de parentes em realizar exame de DNA não gera presunção absoluta de paternidade

    A presunção relativa decorrente da recusa do suposto pai em submeter-se ao exame de DNA, nas ações de investigação de paternidade, não pode ser estendida aos descendentes, por se tratar de direito personalíssimo e indisponível. Com este entendimento, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve decisão da Justiça do Mato Grosso do Sul que julgou improcedente o pedido de suposta filha de um médico falecido para ter reconhecido o direito à presunção absoluta da paternidade em razão da recusa dos parentes em se submeterem ao exame de DNA. A decisão foi unânime.

    Segundo os autos, a suposta filha ajuizou ação de investigação de paternidade na comarca de Aquidauana (MS) contra os parentes do médico afirmando que a sua mãe e o suposto pai mantiveram um relacionamento em 1954, um ano antes do seu nascimento. Sustentou, que após o óbito do suposto pai, procurou os parentes para que realizassem o exame de DNA, mas todos se negaram a comparecer ao laboratório. Diante da recusa, argumentou que caberia aos familiares o ônus de apresentar provas que desconstituísse a presunção relativa da ação. Entretanto, o pedido foi julgado improcedente pelo juiz de primeiro grau.

    Desta decisão, a suposta filha apelou ao Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul (TJMS). O pedido foi novamente negado sob o fundamento de que a negativa dos parentes em se submeterem ao exame de DNA não constituia presunção absoluta da paternidade. Os desembargadores afirmaram ainda que o conjunto de provas não foi suficiente para demonstrar a relação amorosa entre a mãe e o médico.

    Inconformada, a suposta filha recorreu. No STJ, reiterou a inversão do ônus da prova. Apontou que a recusa à perícia médica ordenada pelo juiz poderia suprir a prova que se pretendia obter com o exame (artigo 232 do Código Civil). Neste sentido, afirmou que ninguém está isento de colaborar com o Poder Judiciário para o descobrimento da verdade (artigo 339 do Código de Processo Civil). Além disso, alegou ser impossível a exigência do TJMS em apresentar provas irrefutáveis do relacionamento afetivo entre a sua mãe e o suposto pai, pois já se passaram muitos anos.

    Em sua decisão, o relator do processo, ministro Luis Felipe Salomão, desconsiderou a possibilidade de presunção em razão da negativa dos familiares em se submeterem ao exame de DNA. Diante do exposto, a recusa do descendente, quando no pólo passivo da ação de investigação de paternidade, em ceder tecido humano para a realização de exame pericial, não se reveste de presunção relativa e nem lhe impõem o ônus de formar robusto acervo probatório que desconstitua tal presunção, frisou. (REsp 714969/MS, Min. LUIS FELIPE SALOMAO - QUARTA TURMA, julgado em 04.03.2010)

    NOTAS DA REDAÇAO

    A pretensão de ter a paternidade definida é viabilizada em nosso ordenamento nos termos da Lei85600/92 que estabelece que o reconhecimento de filhos é feito:

    Art. 1º O reconhecimento dos filhos havidos fora do casamento é irrevogável e será feito:

    I - no registro de nascimento;

    II - por escritura pública ou escrito particular, a ser arquivado em cartório;

    III - por testamento, ainda que incidentalmente manifestado; IV - por manifestação expressa e direta perante o juiz, ainda que o reconhecimento não haja sido o objeto único e principal do ato que o contém.

    O mesmo texto é reproduzido no art. 1.609 do CC/02. É o meio que tem aquele que não tem em seu favor a presunção legal da paternidade de ver o seu direito de reconhecimento à filiação tutelado pelo Estado.

    Neste instrumento processual o que se pretende é o reconhecimento da filiação. A filiação para a doutrina compreende a relação de parentesco consanguíneo, em primeiro grau e em linha reta, que liga uma pessoa àquelas que a geraram, ou a receberam como se as tivesse gerado (RODRIGUES, 2002:323).

    No caso em comento o que pretendeu a requerente foi ter em seu favor a garantia de presunção juris tantum pela negativa da produção de exame de DNA pelos descedentes do suposto pai, possibilidade essa havida do parágrafo único do referido art. 1.609 do CC: Parágrafo único. O reconhecimento pode preceder o nascimento do filho ou ser posterior ao seu falecimento, se ele deixar descendentes.

    A discussão exsurge do fato que quanto ao pai biológico tem-se assentado na jurisprudência que a recusa na realização do exame de D.N.A gera uma presunção relativa de paternidade, sendo assim publicada a Súmula 301 do STJ que diz: Em ação investigatória, a recusa do suposto pai a submeter-se ao exame de DNA induz presunção juris tantum de paternidade.

    A presunção relativa pode ser refutada quando da análise do conjunto probatório formado nos autos. Assim, aplica-se a presunção contra quem se recusou, justamente quando o conjunto de provas formalizado no processo apoia, ou em outras palavras sustenta, a tese evidenciada por quem pretende a negação ou a afirmação da paternidade. Nesse sentido foram as manifestações da Corte:

    Processual civil. Investigação de paternidade. DNA. Recusa. Agravo regimental. I. - A recusa injustificada do réu em submeter-se ao exame de DNA, aliada às demais provas e circunstâncias dos autos, inclusive de indicativos de esterilidade do pai registral, leva à presunção de veracidade das alegações postas na inicial, mesmo porque somente o próprio agravante poderia comprovar, submetendo-se ao exame, a tese negativa da paternidade. II. - Não havendo o que modificar na decisão agravada, nega-se provimento ao agravo regimental. (AGA nº 322374/RS, relator Ministro Antônio de Pádua Ribeiro, DJ de 12/05/2003).

    Segundo a jurisprudência do STJ, a recusa do investigado em submeter-se ao exame de DNA constitui prova desfavorável ao réu, pela presunção que induz de que o resultado, se realizado fosse o teste, seria positivo em relação aos fatos narrados na inicial, já que temido pelo alegado pai. (REsp. n.º 409285/PR, relator Ministro Aldir Passarinho Júnior, DJ de 26/08/2002) .

    Estabelecem ainda os arts 231 e 232 do CC quanto à prova de determinados eventos relevantes ao direito tutelado que:

    Art. 231. Aquele que se nega a submeter-se a exame médico necessário não poderá aproveitar-se de sua recusa.

    Art. 232. A recusa à perícia médica ordenada pelo juiz poderá suprir a prova que se pretendia obter com o exame.

    Ocorre que para o STJ, posição com a qual pactuamos, a paternidade compreende direito personalíssimo, cabendo apenas a quem detém a paternidade reconhece-la ou refuta-la.

    Daí decorre a razão do enunciado de Súmula 301 que atribuiu contra quem se recusa a realização de exame de DNA, a presunção relativa.

    É inclusive o que se extrai da lei civil em seu art. 1.601:

    Art. 1.601. Cabe ao marido o direito de contestar a paternidade dos filhos nascidos de sua mulher, sendo tal ação imprescritível. Parágrafo único. Contestada a filiação, os herdeiros do impugnante têm direito de prosseguir na ação.

    É ao suposto pai que cabe o direito de contestar a filiação, sendo clara a norma no sentido de que o herdeiro só pode prosseguir em ação por ele previamente ajuizada, ressaltada a natureza personalíssima do direito em comento.

    Veja que como se depreende de todo o ora exposto, não há falar em paternidade sem outros elementos que comprovem a paternidade. Como o que se pretende é apurar o fato que dá base ao direito pleiteado, ou seja o estado de filiação, a mera recusa em realizar exame de DNA não pode sozinho dar ensejo ao reconhecimento pretendido. O que ocorrerá é a recusa aliada a outros elementos que indiquem a paternidade que permitirá o reconhecimento desejado. Do contrário não se falaria em presunção relativa, mas absoluta, não se admitindo inclusive prova em contrário. Aquele que se recusa ao exame, por exemplo, pode apresentar laudo de esterilidade desconstituindo a possibilidade de ser pai.

    Portanto, o que se tem de fato é que havendo a recusa da paternidade aliada a elementos fáticos que apontem para a paternidade, e não havendo desconstituição do direito por meio de provas que venham ilidir as provas que corroboram com a paternidade, é que a presunção restará contra aquele que se recusou a realização do exame.

    A mesma presunção não pode ser apontada contra os descendentes uma vez que a estes não cabe a prova da paternidade. Não há falar em presunção relativa no caso dos descendentes, devendo a parte que alega provar que é de fato filho. Permitir tal presunção seria o mesmo que transferir a um terceiro o direito/dever de reconhecer que fulano é meu filho. Não é razoável.

    Acertado o posicionamento do Tribunal da Cidadania a nosso ver.

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    1 Comentário

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    Respeito o posicionamento da respeitável instituição, inclusive por ser a corrente majoritária, todavia, discordo diametralmente. É preciso mudar o pensamento no Brasil e, consequentemente, a jurisprudência, para que a prova impossível ou demasiadamente custosa, quando há meios para a demandada se submeter a exames simples, é ônus apenas da parte demandante, incutindo na sociedade a ideia do enriquecimento ilícito e sem causa. continuar lendo