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2 de Maio de 2024

TJDFT decide: plano de saúde deve fornecer medicamento nuclear (psma-lutécio 177) para tratamento de câncer de próstata.

2ª Turma Cível do TJDFT entendeu que a operadora de saúde não se exime dever de cobertura apenas por se tratar de medicamento extra rol.

Publicado por Aline Vasconcelos
há 9 meses

O autor ajuizou ação contra a operadora de saúde porquanto foi diagnosticado com adenocarcinoma de próstata e, após o insucesso com outras medicações, lhe foi receitada, em caráter de urgência, terapia com o radioisótopo lutécio-177 juntamente com a medicação 177Lu-PMSA, tratamento da medicina nuclear, o que foi negado.

O plano de saúde argumentou que a negativa foi amparada nas regras de cobertura de tratamentos experimentais estabelecidas pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) (Resolução Normativa n. 465/2021), de modo que agiu dentro do exercício regular de seu direito.

Diante da recusa do plano de saúde, o consumidor entrou com ação judicial junto ao TJDFT com o patrocínio deste escritório de advocacia.

Em primeira instância, o magistrado condenou o plano de saúde:

  • 1) a autorizar o custeio do tratamento do apelado, conforme prescrito por seu médico assistente, sob pena de multa;
  • 2) ao pagamento de indenização por danos materiais no valor de R$ 45.883,50 (quarenta e cinco mil, oitocentos e oitenta e três reais e cinquenta centavos);
  • 3) ao pagamento de reparação por dano moral no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais); e
  • 4) ao pagamento das custas e dos honorários, fixados em dez por cento (10%) sobre o valor da condenação.

Recorrente da condenação, a operadora de saúde interpôs Apelação, a qual teve seu provimento negado pela 2ª Turma Cível do TJDFT.

Confira-se trecho do voto condutor do acórdão proferido:

A utilização de medicamento fora das hipóteses previstas na bula não caracteriza o tratamento como experimental, especialmente porque quem decide se a situação concreta de enfermidade do paciente está adequada ao tratamento conforme as indicações da bula daquele específico remédio é o profissional médico, não a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) ou a operadora de plano de saúde.
É inadmissível permitir que a operadora negue a cobertura de tratamento sob a justificativa de que a doença do paciente não está contida nas indicações da bula. Essa conduta representa inegável ingerência na ciência médica em inaceitável prejuízo do paciente enfermo.”

E ainda, o relator destacou que:

“A questão relativa à intromissão da operadora nos protocolos adotados pelo médico assistente se demonstra ainda mais sensível quando considerado o nítido interesse financeiro da operadora em detrimento do pleno reestabelecimento da saúde do beneficiário.”

Assim, por unanimidade, a 2ª Turma do TJDFT entendeu que ao negar autorização para tratamento indicado como imprescindível à vida do beneficiário cometeu ato ilícito, ainda mais quando se viu obrigado a arcar com os custos do tratamento, o que não teria ocorrido caso a cobertura fosse autorizada pela operadora, estando assim caracterizado o nexo de causalidade.

Por consequência, o colegiado negou provimento ao recurso da operadora de saúde.

Destaca-se que ainda que um determinando medicamento não conste no rol, se houver indicação médica justificando a necessidade do uso da medicação, o plano não pode negar a cobertura.

Até porque, o § 12 do art. 10 da Lei 9.656/1998, incluído pela Lei 14.454/2022, estabelece que o rol de procedimentos e eventos em saúde suplementar, atualizado pela ANS a cada nova incorporação, constitui a referência básica para os planos privados de assistência à saúde contratados a partir de 1º de janeiro de 1999, não sendo, portanto, taxativo.

A alteração promovida pela Lei nº 14.454/2022, ao incluir os § 12 e § 13 ao art. 10 da Lei nº 9.656/98, estabeleceu critérios que permitem a cobertura de exames ou tratamentos de saúde que não estão incluídos no rol de procedimentos e eventos em saúde suplementar, quais sejam:

  • comprovação da eficácia, à luz das ciências da saúde, baseada em evidências científicas e plano terapêutico; ou
  • recomendações pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec); ou
  • exista recomendação de, no mínimo, 1 (um) órgão de avaliação de tecnologias em saúde que tenha renome internacional, desde que sejam aprovadas também para seus nacionais.

Sendo que, na grande maioria dos casos, quando o médico prescreve determinado tratamento medicamentoso, via de regra há o preenchimento desses requisitos, quer seja pela comprovação da eficácia à luz das ciências da saúde ou quer seja pela recomendação de, no mínimo, 1 (um) órgão de avaliação de tecnologias em saúde que tenha renome internacional.

E assim sendo, mesmo não previsto no rol da ANS, nasce assim o dever de cobertura pelo plano de saúde.

Reforça todo o dito o enunciado do Conselho Nacional de Justiça, no FONAJUS:

ENUNCIADO Nº 73 A ausência do nome do medicamento, procedimento ou tratamento no rol de procedimentos criado pela Resolução da Agência Nacional de Saúde Suplementar - ANS e suas atualizações, não implica em exclusão tácita da cobertura contratual.

Vale lembrar que as operadoras de planos de saúde funcionam como garantidoras do Estado, tendo o dever de zelar pela norma constitucional.

A garantia do direito à saúde, a toda evidência, é a garantia do próprio direito à vida, como assegura o artigo da Constituição Federal.

Desse modo, se você recebeu indicação de medicamentos que devem ser custeados pelo plano de saúde, é possível abrir uma reclamação no site da ANS.

Em alguns casos, a intervenção do órgão é suficiente para que a operadora resolva a situação, mas em outros casos somente com a intervenção e acionamento do judiciário para sanar a abusividade.

O que deve constar na prescrição médica?

No relatório médico a ser enviado ao plano de saúde deve constar obrigatoriamente:

  1. · o objetivo na realização do tratamento
  2. · quadro clínico no paciente
  3. · histórico clínico do paciente com a descrição de todos tratamentos antes realizados
  4. · a imprescindibilidade na realização do tratamento
  5. · a urgência/emergência na realização
  6. · o risco de não realização
  7. · a inexistência de substituto terapêutico
  8. a comprovação de eficácia de uso segundo a literatura médica.
  9. orçamento

A orientação acima se dá baseado no enunciado de Direito da Saúde do Conselho Nacional de Justiça:

ENUNCIADO Nº 15 As prescrições médicas devem consignar o tratamento necessário ou o medicamento indicado, contendo a sua Denominação Comum Brasileira - DCB ou, na sua falta, a Denominação Comum Internacional - DCI, o seu princípio ativo, seguido, quando pertinente, do nome de referência da substância, posologia, modo de administração e período de tempo do tratamento e, em caso de prescrição diversa daquela expressamente informada por seu fabricante a justificativa técnica.

E mais:

ENUNCIADO Nº 67 As informações constantes do receituário médico, para propositura de ação judicial, devem ser claras e adequadas ao entendimento do paciente, em letra legível, discriminando a enfermidade pelo nome e não somente por seu código na Classificação Internacional de Doenças - CID, assim como a terapêutica e a denominação genérica do medicamento prescrito.

Qual o entendimento do judiciário?

Quando a negativa do plano de saúde é levada ao judiciário, o entendimento, ainda que não consolidado, se funda no dever do plano de saúde custear o tratamento medicamentoso.

Para o Superior Tribunal de Justiça (STJ), "não é cabível a negativa de tratamento indicado pelo profissional de saúde como necessário à saúde e à cura de doença efetivamente coberta pelo contrato de plano de saúde". (Processo: REsp 1.874.078).

O entendimento firmado pelo judiciário é no sentido de que, embora as operadoras de planos de saúde possam, com alguma liberdade, limitar a cobertura, a definição do tratamento a ser prestado cabe ao profissional de saúde, de modo que, se o mal está acobertado pelo contrato, não pode o plano de saúde limitar o procedimento terapêutico adequado.

Reforçando o exposto, considerando a crescente busca junto aos tribunais diante da negativa de cobertura de medicamentos pelo plano de saúde, algumas súmulas foram editadas pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ/SP):

Súmula 95: “Havendo expressa indicação médica, não prevalece a negativa de cobertura do custeio ou fornecimento de medicamentos associados a tratamento quimioterápico.”
Súmula 96: “Havendo expressa indicação médica de exames associados a enfermidade coberta pelo contrato, não prevalece a negativa de cobertura do procedimento.”
Súmula 102: “Havendo expressa indicação médica, é abusiva a negativa de cobertura de custeio de tratamento sob o argumento de sua natureza experimental.”

Ainda, os tribunais brasileiros tem julgado os casos nesse sentido:

PLANO DE SAÚDE. Autor diagnosticado com adenocarcinoma de próstata, com indicação para tratamento radioisotópico com o medicamento Lutécio 177 - PSMA. (...) Obrigação de custear o tratamento com o medicamento solicitado. Além do tratamento ser relevante para o controle dos sintomas e redução das lesões metastáticas, a ré não indicou nenhum outro substituto terapêutico, o que autoriza a cobertura, apesar de não previsto em rol da ANS. Laudo médico que ressalta não haver outra opção terapêutica. Referido entendimento está de acordo com tese aprovada pela 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça. DANOS MORAIS CONFIGURADOS. Negativa de custeio que ultrapassou o mero dissabor. Valor da indenização fixado em R$10.000,00 que se entremostra razoável. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. Fixação em 10% sobre o valor da causa que comporta alteração, nos termos do disposto no artigo 85, § 2º, do CPC. Fixação sobre o valor atualizado da condenação. Sentença reformada para fixar os honorários advocatícios em 20% do valor atualizado da condenação. Recurso parcialmente provido. (TJ-SP - AC: 10029766120228260011 SP 1002976-61.2022.8.26.0011, Relator: Fernanda Gomes Camacho, Data de Julgamento: 26/08/2022, 5ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 26/08/2022)

E mais:

PACIENTE COM CANCER DE PRÓSTATA. TRATAMENTO COM PSMA LUTÉCIO. AUSÊNCIA DE PREVISÃO NO ROL DA ANS. INDICAÇÃO MÉDICA. DANO MORAL. DISCUSSÃO ASSENTADA EM INTERPRETAÇÃO RAZOÁVEL DE CLÁUSULA CONTRATUAL. VIOLAÇÃO AO DIREITO DA PERSONALIDADE. INOCORRÊNCIA. MULTA COMINATÓRIA. ATRASO NO CUMPRIMENTO DA DECISÃO QUE CONCEDEU A TUTELA DE URGÊNCIA. APLICAÇÃO. VALOR EXACERBADO. REDUÇÃO. POSSIBILIDADE. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ NÃO COMPROVADA. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. (...) . 3. A relação de procedimentos definidos pela Agência Nacional de Saúde - ANS tem por escopo definir procedimentos, exames médicos e clínicos mínimos e de cobertura obrigatória. Por conta disso, a jurisprudência entende que a listagem é meramente exemplificativa. 4. Não cabe ao plano de saúde eleger o tratamento adequado ao beneficiário, em substituição ao médico assistente, profissional de saúde habilitado e capacitado para indicar a melhor intervenção ou profilaxia recomendada ao paciente e segundo seu quadro clínico. 5. (...) (TJ-DF 07233012820218070001 1603503, Relator: LUÍS GUSTAVO B. DE OLIVEIRA, Data de Julgamento: 17/08/2022, 3ª Turma Cível, Data de Publicação: 26/08/2022)

O que fazer se o plano de saúde negar o pedido de uso do medicamento?

Em havendo indicação médica e tendo o plano de saúde negado o medicamento, o beneficiário deve solicitar por escrito as razões de negativa e poderá buscar um advogado especialista e acionar o judiciário para sanar a abusividade por meio de uma liminar.

Quais documentos necessários para ajuizar uma ação de fornecimento de medicamento?

  • · Relatório médico detalhado, com o histórico terapêutico, laudos médicos e exames que justificam a necessidade do exame;
  • · Documentos que comprovam a recusa do plano de saúde, como protocolos de ligações, troca de e-mails, cartas, negativa por escrito, entre outros;
  • · Carteirinha do plano de saúde, RG e CPF;
  • · Cópia do contrato do plano de saúde;
  • · Três últimos comprovantes de pagamento de mensalidades.

Conclusão

Diante do exposto, conclui-se que a exclusão da cobertura do produto farmacológico nacionalizado e indicado pelo médico assistente para o tratamento da enfermidade significaria negar a própria essência do tratamento, desvirtuando a finalidade do contrato de assistência à saúde.

Caso reste alguma dúvida, nós, do escritório Aline Vasconcelos Advocacia estamos à sua disposição para saná-las, por meio dos canais de atendimento:

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