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4 de Maio de 2024

TRF1 afasta, por decisão unânime, a incidência do delito de receptação para bens imóveis.

Com essa interpretação do art. 180 do Código Penal, advogados do estado do Amazonas obtêm vitória contra denúncia apresentada pelo Ministério Público Federal.

há 2 anos

Advogados do estado do Amazonas obtiveram sucesso em habeas corpus impetrado para obter o trancamento de ação penal em relação a supostos delitos de receptação para bens imóveis e lavagem de dinheiro. A decisão transitou em julgado no último dia 23/9. O feito é considerado por especialistas como de grande repercussão para o direito penal ambiental.

Entenda o caso:

Em março de 2021, o Ministério Público Federal ofereceu denúncia contra empresário com acusação de que o mesmo teria adquirido imóveis rurais supostamente provenientes de grilagem na cidade de Lábrea (AM) e, ainda, dissimulado a sua origem, colocando-os em nome de terceiros.

Neste caso, o cliente não poderia ser acusado de receptação, pois a legislação brasileira não prevê receptação de bens imóveis - lotes de terra, no caso em questão”, explica a advogada criminalista Carla Luz, sócia-fundadora do escritório Chíxaro Luz Advogados, localizado na cidade de Manaus, capital amazonense.

Em resposta à acusação, a defesa do paciente alegou a atipicidade das condutas imputadas, ante a impossibilidade receptação de bens imóveis, e por consequência, a atipicidade da conduta de lavagem de capitais. O juízo de 1ª instância rejeitou a tese, e a defesa impetrou um habeas corpus junto ao TRF1, que foi acatado em unanimidade pelos desembargadores da 3ª Turma.

“Para configurar lavagem de capitais é necessário que os valores tenham origem em um crime antecedente. Se não há receptação, se o terreno não foi adquirido de maneira ilegal, então não há porque se falar em lavagem de capitais”, afirma o advogado criminalista Eduardo Queiroz, que atuou diretamente no caso. Ele explicou que, além da tese contra a receptação, a Justiça Federal também acatou a tese da defesa contra a denúncia de lavagem de dinheiro.

Após a publicação do acórdão, o MPF recorreu da decisão. No entanto, não teve seu recurso admitido e o processo transitou em julgado em 23/09/2022.

De acordo com Lino Chíxaro, advogado com longa experiência em Direito Penal e sócio-fundador do escritório Chíxaro Luz Advogados: "este julgado preserva o princípio da legalidade, que é um dos pilares do Direito Penal ocidental. Isso se transforma num precedente paradigmático que tem influência em outros casos similares. O julgado impede a aplicação da lei com base em noções particulares de justiça ou de interpretações políticas por parte do Judiciário. Esse é um caso típico de ativismo judicial que deve ser combatido no âmbito das ciências criminais."

Acerca do julgamento:

A 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região – TRF1, na sessão de julgamento de 15/02/2022, à unanimidade, concedeu, em parte, a ordem de habeas corpus para determinar o trancamento da ação penal nº 1005282-05.2021.4.01.3200, em relação aos delitos previstos no art. 180, § 6.º, do Código Penal e art. 1.º da Lei n.º 9.613/1998.

Em março de 2021, o Ministério Público Federal (MPF) ofereceu denúncia contra o paciente e outros acusados pelo suposto cometimento do delito previsto no artigo art. 180, § 6.º, do Código Penal e art. 1.º da Lei n.º 9.613/199, dentre outras acusações. Segundo o órgão ministerial, o paciente teria adquirido imóveis rurais provenientes de grilagem e, ainda, dissimulado a sua origem colocando-os em nome de terceiros.

Os advogados do paciente alegaram a impossibilidade de receptação de bens imóveis, e por consequência, a atipicidade da conduta de lavagem de capitais. Porém, o juízo de 1ª instância rejeitou a tese apresentada pela defesa e determinou o prosseguimento do processo. Contra essa decisão, a defesa do paciente impetrou habeas corpus ao TRF1, tendo sido distribuído à Desembargadora Federal Mônica Sifuentes. No julgamento do HC, a relatora apresentou voto pela concessão parcial da ordem de habeas corpus, destacando:

verifico que procede a afirmação de que a conduta imputada ao paciente (receptação) não se reveste da tipicidade formal pertinente, descaracterizando-se, assim, a pretensa figura delitiva alegada”.

Ainda, a relatora ressaltou:

O Supremo Tribunal Federal, em julgado da relatoria do Ministro Moreira Alves, já decidiu que, em face da legislação penal brasileira, só as coisas móveis ou mobilizadas podem ser objeto de receptação. Interpretação do art. 180 do Código Penal. Assim, não é crime, no direito pátrio, o adquirir imóvel que esteja registrado em nome de terceiro, que não é o verdadeiro proprietário ( RHC n. 57.710/SP, Segunda Turma, DJ de 16/5/1980). No Superior Tribunal de Justiça há precedente no mesmo sentido, de atipicidade do delito de receptação de bem imóvel”.

Ademais, ainda salientou o seguinte acerca da configuração do crime de lavagem de dinheiro:

"No tocante ao crime de lavagem de dinheiro, previsto no art. , da Lei 9.613/1998 (ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal), para a sua configuração é necessário que os valores tenham origem em um crime antecedente, ainda que a condenação de um independa da condenação do outro. O ora paciente foi denunciado também pela prática do crime previsto no artigo da Lei n. 9.613/1998, em função da ocultação do crime de receptação. De acordo com a Denúncia, o ora paciente haveria ocultado e dissimulado a origem hipoteticamente criminosa, bem, ainda, a disposição prévia de um imóvel rural havido como proveniente, diretamente, de uma infração penal, qual seja, a de receptação (art. 180 do Código Penal). Se o crime antecedente é elementar do tipo de lavagem de dinheiro, a inexistência do crime antecedente impossibilita a condenação pelo delito de lavagem. Portanto, reconhecida uma excludente de tipicidade, não há crime antecedente e, por consequência, a absoluta impossibilidade de subsunção típica pela ausência da elementar"infração penal"constante no artigo 1º da Lei de Lavagem”. (grifo nosso).

A relatora foi acompanhada pelos demais desembargadores que participaram do julgamento. Após a publicação do acórdão, o MPF recorreu da decisão. No entanto, não teve seu recurso admitido e o processo transitou em julgado em 23/09/2022.

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