Página 1330 do Diário de Justiça do Estado de Pernambuco (DJPE) de 24 de Outubro de 2016

SENTENÇA O Ministério Público, no uso de suas atribuições ofereceu denúncia em face de JOHNNY JOSÉ BARROS DA SILVA , devidamente qualificado na peça inicial acusatória, como incurso nas penas dos artigos 147 e 331, ambos do CP. Emerge da peça inaugural de pretensão punitiva, em síntese que: No dia 27/01/2012, por volta das 18h, na Oficina Bela Vista, localizada na cidade de Iati-PE, o denunciado após apresentar-se publicamente em estado de embriaguez, e causar escândalo, ameaçou de morte o Sr. Nadiel Paz da Silva, na porta de seu trabalho. A vítima pediu que chamassem a polícia, com a chegada dos policiais o denunciado, aos gritos, disse que “não devia nada a ninguém” e para o Cabo Adilson Honorato Alves “vocês são uns merdas, uns cachorros, uns filhos da puta, seus porras”. Em audiência preliminar (fl. 39), a vítima manifestou o desejo de representar o autor do fato. Sendo indeferido o pedido de transação penal, pois o acusado já respondeu a outros TCO’s. Denúncia recebida em 21/11/2013 (fl. 44). Resposta a acusação, fls. 57/59. Em instrução foi colhido o depoimento das vítimas, bem como procedeu-se ao interrogatório do acusado. (Fls. 70, 88 e 99) Alegações Finais apresentadas pelo Ministério Público às fls. 100/101 e pela defesa às fls. 103. É o relatório necessário. Passo a decidir. De início, convém registrar a regularidade processual, encontrando-se o feito isento de vício ou nulidades, sem falhas a sanar, havendo sido devidamente observados, durante a sua tramitação, os princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório, não estando a persecução penal atingida pela prescrição. DO CRIME DE AMEAÇA (ART. 147 DO CP) Prevê o artigo1477 doCPP: Art. 147 – Ameaçar alguém, por palavra, escrito ou gesto, ou qualquer outro meio simbólico, de causar-lhe mal injusto e grave : Pena – detenção, de um a seis meses, ou multa. Parágrafo único – Somente se procede mediante representação. É cediço que a relevância penal do crime de ameaça encontra-se a aptidão de impactar a tranquilidade da vítima e cercear sua liberdade, a ponto de, pelo terror ou pânico causado, deixar de se conduzir com liberdade. Neste sentido, também o TJRS: APELAÇÃO CRIMINAL. AMEAÇA. ART. 147 DO CP . ATIPICIDADE DA CONDUTA. SENTENÇA CONDENATÓRIA REFORMADA. A relevância penal do crime de ameaça está na capacidade de atingir a paz de espírito da vítima e cercear sua liberdade, a ponto de, pelo terror ou pânico causado, deixar de se conduzir com liberdade. Sem esses pressupostos satisfeitos, como ocorre na espécie, não existe, juridicamente, ameaça. No caso em exame, não ficou demonstrada a presença de todas as elementares do tipo penal, mormente no tocante à efetiva intimidação da vítima, o que torna o fato atípico. RECURSO PROVIDO. (Recurso Crime Nº 71005311402, Turma Recursal Criminal, Turmas Recursais, Relator: Lourdes Helena Pacheco da Silva, Julgado em 24/08/2015). TJ-RS - Recurso Crime: RC 71005311402 RS Verifico, da análise dos autos, que não restou demonstrada abalada a tranquilidade da vítima diante do fato ocorrido. Aliás, ressalte-se que a conduta restringiu-se a um único episódio, e que não foi demonstrado, sequer motivo ou vantagem pessoal do agente para a prática da conduta delitiva. Demais disso, não há provas suficientes nos autos que corroborem o depoimento da vítima. Destarte, ausente uma das elementares do crime, tenho por não existir a materialidade deste, sendo, portanto, a absolvição medida de rigor. DO DESACATO (ART. 331 DO CÓDIGO PENAL) O crime de desacato está previsto no art.3311,CPP, que reza: Art. 331. Desacatar funcionário público no exercício da função ou em razão dela: Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, ou multa. A testemunha confirmou o seu depoimento da esfera policial e afirmou em Juízo que o réu estava exaltado e embriagado no momento do fato. No mesmo sentido, a vítima, afirmou que o acusado demonstrava ter ingerido bebida alcóolica. Ora, o crime de desacato exige a configuração do dolo específico consistente no propósito de ofender o funcionário em razão do exercício regular de sua função pública. Em outras palavras, para a configuração do delito de desacato é preciso haver o dolo específico consistente na finalidade determinada de que o agente tenha intenção de ultrajar o funcionário público, o que não existe se as ofensas forem proferidas quando o réu se encontrar em estado de descontrole emocional, como no presente caso. Se, por ocasião da ação policial, os ânimos já estavam alterados, como ficou demonstrado na oitiva das testemunhas, ainda que o acusado tenha proferido expressões ofensivas aos agentes, não se pode ter como evidenciado o proceder doloso àquele imputado, não refletindo a ação praticada o propósito de depreciar a função exercida pelos agentes policiais. Para a caracterização do delito de desacato, é necessário o elemento subjetivo do injusto (dolo específico), consistente na vontade de ultrajar e desprestigiar a função pública exercida pelo ofendido, não bastando para tanto a mera enunciação de palavras ofensivas resultantes de desabafo ou revolta efêmera do agente. Os tribunais pátrios vêm pacificando orientação no sentido de que não se caracteriza o desacato, por exclusão do dolo, nos casos em que a conduta advém de exaltação momentânea do agente, que atua sob o efeito de cólera ou irritação. Consoante esta corrente majoritária, o desacato requer o elemento subjetivo do injusto - dolo específico, para a doutrina tradicional -, consistente na vontade de ultrajar e desprestigiar a função pública exercida pelo ofendido, não bastando, para tanto, a mera enunciação de palavras consideradas ofensivas, resultantes de desabafo ou de revolta efêmera do agente. Nesse sentido, colaciono os precedentes que seguem: HC - PENAL - DESACATO - O crime de desacato significa menosprezo ao funcionário público. Reclama, por isso, elemento subjetivo, voltado para a desconsideração. Não se confunde apenas com o vocábulo grosseiro. Este, em si mesmo, é restrito à falta de educação, ou de nível cultural. - STJ, HC 7515/RS, Relator Ministro LUIZ VICENTE CERNICCHIARO, 6ª Turma, DJ 02.08.1999 p. 223. PENAL. DESACATO. ART. 331 DO CP . NÃO CONFIGURAÇÃO. ABSOLVIÇÃO MANTIDA. CORRUPÇÃO ATIVA. ART. 333 , CAPUT, DO CP . DEPOIMENTO DE POLICIAL. VALOR PROBATÓRIO. CRIME FORMAL. REFORMATIO IN MELLIUS. POSSIBILIDADE. PENA DE MULTA. REDUÇÃO. PENAS SUBSTITUTIVAS. 1. Para configuração do crime de desacato, é imprescindível que a ofensa seja proferida na presença do funcionário público ofendido, não se caracterizando o delito quando dela tomou conhecimento de forma indireta. Não há desacato contra órgão público, pois o tipo requer que a ofensa seja assacada contra funcionário público no exercício da função ou em razão dela. De igual modo, não se perfectibiliza o desacato, por exclusão de dolo, se o agente atua sob o efeito de cólera ou irritação. - TRF/4ªR, ACR Nº 2003.71.07.003188-0/RS, Relator Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ, 8ª Turma, D.J.U. de 27/04/05. (sublinhei). Do mesmo modo, a jurisprudência é pacífica no sentido de que a embriaguez e a exaltação dos ânimos retiram o dolo específico do desacato: TJMG: APELAÇÃO CRIMINAL - DESACATO - FATO QUE NÃO CONFIGURA O DELITO - PROVA INSUFICIENTE PARA A CONDENAÇÃO. Impropérios e xingamentos proferidos e direcionados a funcionário público em clima de exaltação e nervosismo não configuram o delito de desacato em face da ausência do elemento subjetivo do tipo, ou seja, do dolo específico . Por outro lado, não havendo prova suficiente de que o xingamento foi direcionado ao funcionário público, podendo ter sido um desabafo pela situação em que se encontrava o denunciado, não há que se falar em condenação. Provimento do recurso que se impõe.(Apelação Criminal nº 1.0555.04.910503-7/001, 3ª Câmara Criminal do TJMG, Rio Paranaíba, Rel. Antônio Carlos Cruvinel. j. 23.11.2004, unânime, Publ. 01.02.2005). Por tais argumentos, a absolvição do acusado é medida que se apresenta inescusável e imperiosa, ante a não caracterização do dolo específico do crime de desacato. Ante o exposto , julgo IMPROCEDENTES as pretensões punitivas expostas na peça inaugural, para ABSOLVER o réu JOHNNY JOSÉ BARROS DA SILVA , já qualificado, com arrimo no artigo 386, III e VII do CPP. Sem custas. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. CUMPRA-SE. Garanhuns-PE, 11 de outubro de 2016. Mariana Zenaide Teófilo Gadelha Juíza Substituta

PROCESSO N.º 000XXXX-70.2012.8.17.0680

AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO DE PERNAMBUCO

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