Página 130 da Judicial - 1ª Instância - Capital do Diário de Justiça do Estado de São Paulo (DJSP) de 8 de Agosto de 2014

Comentando o primeiro dispositivo, seu idealizador Professor Doutor Miguel Reale escreveu: “Em todo ordenamento jurídico há artigos-chave, isto é, normas fundantes que dão sentido às demais, sintetizando diretrizes válidas ‘para todo o sistema’. Nessa ordem de idéias, nenhum dos artigos do novo Código Civil me parece tão rico de conseqüência como o artigo 113, segundo o qual ‘os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa fé e os usos do lugar de sua celebração’. Note-se que esse dispositivo já figurava, sob nº 112, no Anteprojeto de 1972, antes, pois, de seu conhecimento pelo Congresso Nacional. Desdobrando essa norma em seus elementos constitutivos, verifica-se que ela consagra a eleição específica dos negócios jurídicos como disciplina preferida para regulação genérica das relações sociais, sendo fixadas, desde logo, a eticidade de sua hermenêutica, em função da boa-fé, bem como a sua socialidade, ao se fazer alusão aos ‘usos do lugar de sua celebração’. Eis aí já esboçada a incidência dos três princípios (eticidade, socialidade e operabilidade) que, a meu ver, presidem à atual Lei Civil, conforme penso ter demonstrado em minha conferência intitulada ‘Visão Geral do Código Civil’, publicada pela Revista dos Tribunais como introdução de seu livro Novo Código Civil Brasileiro, 3ª edição. Quanto à apontada predileção pelo instituto dos negócios jurídicos, preferindo-se a espécie ao gênero, fatos jurídicos, cabe notar que no negócio jurídico o que sobreleva não é o aspecto da ‘declaração de vontades’ como sustentam alguns juristas mas sim ‘o encontro das vontades’ para dar nascimento a um conjunto de direitos e obrigações. (...) (...) Com razão o supra transcrito artigo 113 dá preferência aos negócios jurídicos para fixar as diretrizes hermenêuticas da eticidade e da socialidade. No tocante à primeira, andou bem o legislador ao se referir à boa-fé, que é o cerne ou a matriz da eticidade, a qual não existe sem a intentio sem o elemento psicológico da intencionalidade ou do propósito de guardar fidelidade ou lealdade ao passado. Dessa intencionalidade, no amplo sentido que Husserl dá a essa palavra, resulta a boa-fé objetiva, como norma de conduta que deve salvaguardar a veracidade do que foi estipulado. Boa-fé é, assim, uma das condições essenciais da atividade ética, nela incluída a jurídica, caracterizando-se pela sinceridade e probidade dos que dela participam, em virtude do que se pode esperar que será cumprido e pactuado sem distorções ou tergiversações, máxime se dolosas, tendo-se sempre em vista o adimplemento do fim visado ou declarado como tal pelas partes. Como se vê, a boa-fé é tanto forma de conduta como norma de comportamento, numa correlação objetiva entre meios e fins, como exigência de adequada e fiel execução do que tenha sido acordado pelas partes, o que significa que a intenção destas só pode ser endereçada ao objetivo a ser alcançado, tal como este se acha definitivamente configurado nos documentos que o legitimam. Poder-se-ia concluir afirmando que a boa-fé representa o superamento normativo, e como tal imperativo, daquilo que, no plano psicológico se põe como intentio leal e sincera, essencial à juridicidade do pactuado. É o que vê bem Judith Martins Costa quando afirma que a boa-fé, com o advento do novo Código Civil, se transformou em ‘topos subversivo do direito obrigacional’, funcionando ‘como cânone hermenêutico integrativo do contrato; como norma de criação de deveres jurídicos, e como norma de limitação ao exercício de direitos subjetivos’. (...) Por aí se vê como estamos longe da concepção romana seguida pelo Direito anterior conforme à qual ‘neminem laedit qui iure suo utitur’, ou seja, que, no exercício de direito próprio não se causa dano a ninguém. Pelo atual Código Civil, ao contrário, o direito subjetivo, como vimos, deve ser empregado de conformidade com a boa-fé e os usos do lugar. (...) Daí as conseqüências do Art. 187, ao considerar ilícito o comportamento do ‘titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé e pelos bons costumes’.” [g.n.] (Um artigo-chave do Código Civil escrito em 21.06.2003 in http://www.miguelreale.com.br/ acesso em 29.03.2011). A boa-fé objetiva que governa as relações humanas passa pelo processo executivo como a efetiva realização do crédito do credor, respeitando-se a menor onerosidade ao devedor. “Art. 422. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé.” Interpretando o disposto no artigo 422, do Código Civil, a Comissão formada no âmbito do Conselho da Justiça Federal para as Jornadas de Direito Civil, organizadas pelo Eminente Ministro Ruy Rosado de Aguiar Júnior, em Brasília em 2007, redigiram os seguintes enunciados: “24 Art. 422: Em virtude do princípio da boa-fé, positivado no art. 422 do novo Código Civil, a violação dos deveres anexos constitui espécie de inadimplemento, independentemente de culpa. 25 Art. 422: O art. 422 do Código Civil não inviabiliza a aplicação pelo julgador do princípio da boa-fé nas fases pré-contratual e pós -contratual. 26 Art. 422: A cláusula geral contida no art. 422 do novo Código Civil impõe ao juiz interpretar e, quando necessário, suprir e corrigir o contrato segundo a boa-fé objetiva, entendida como a exigência de comportamento leal dos contratantes. 27 Art. 422: Na interpretação da cláusula geral da boa-fé, deve-se levar em conta o sistema do Código Civil e as conexões sistemáticas com outros estatutos normativos e fatores metajurídicos. 168 - Art. 422: O princípio da boa-fé objetiva importa no reconhecimento de um direito a cumprir em favor do titular passivo da obrigação. 169 - Art. 422: O princípio da boa-fé objetiva deve levar o credor a evitar o agravamento do próprio prejuízo. 170 -Art. 422: A boa-fé objetiva deve ser observada pelas partes na fase de negociações preliminares e após a execução do contrato, quando tal exigência decorrer da natureza do contrato. 361 Arts. 421, 422 e 475: O adimplemento substancial decorre dos princípios gerais contratuais, de modo a fazer preponderar a função social do contrato e o princípio da boa-fé objetiva, balizando a aplicação do art. 475. 362 Art. 422: A vedação do comportamento contraditório (venire contra factum proprium) funda-se na proteção da confiança, tal como se extrai dos arts. 187 e 422 do Código Civil. 363 Art. 422: Os princípios da probidade e da confiança são de ordem pública, sendo obrigação da parte lesada apenas demonstrar a existência da violação.” [g.n.] Posta a questão nestes termos, tem-se que assegurar ao devedor a blindagem do salário, está-se diante de injustiça e de conduta antijurídica. Sobre o tema, a Egrégia Corte Bandeirante: “AÇÃO DE COBRANÇA. FASE DE EXECUÇÃO. AUSÊNCIA DE BENS PASSÍVEIS DE CONSTRIÇÃO. PENHORA SOBRE REMUNERAÇÃO. MÉDICO. IMPENHORABILIDADE MITIGADA ANTE AS PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. A impenhorabilidade prevista no artigo 649, IV, do Código de Processo Civil deve ser interpretada com cautela, na medida em que a finalidade satisfativa da execução seja atendida, preservando-se o necessário à manutenção digna do devedor. 2. Verificada a inexistência de outros bens passíveis de penhora, e havendo prova de que o devedor recebe valores que possibilitem o adimplemento da dívida sem prejuízo da sua subsistência, admite-se a mitigação da mencionada norma, desde que haja uma limitação razoável, prestigiando-se o princípio da efetividade do processo de execução, da autonomia da vontade, da função social do contrato, bem como o princípio da menor onerosidade. 3. A interpretação sistemática afasta a conclusão que a decisão é contra-legem. 4. Recurso que deve ser parcialmente provido para manter a penhora de 30% sobre os proveitos auferidos pelo recorrente junto à Santa Casa de Santos e à Unimed Santos, porém no LIMITE TOTAL de R$ 2.295,06, por mês (e não sobre cada um dos rendimentos), até a satisfação total da quantia devida a título de honorários advocatícios. 5. Agravo de instrumento parcialmente provido.” [g.n.] (TJSP, 18ª Câmara de Direito Privado, Agravo de Instrumento nº 016XXXX-18.2011.8.26.0000, Relator Desembargador Alexandre Lazzarini, J. 26.10.2011, v.u.). No caso concreto, a parcela bloqueada refere-se comprovadamente a verbas salariais (fls. 81/86), superior à média nacional. Como efeito, como argumento de reforço, legalmente, o salário-mínimo é assim conceituado e possui os seguintes contornos, na forma do Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943 (Consolidação das Leis do Trabalho): “Art. 76 -Salário mínimo é a contraprestação mínima devida e paga diretamente pelo empregador a todo trabalhador, inclusive ao trabalhador rural, sem distinção de sexo, por dia normal de serviço, e capaz de satisfazer, em determinada época e região do País, as suas necessidades normais de alimentação, habitação, vestuário, higiene e transporte. (...) Art. 81 - O salário mínimo será determinado pela fórmula Sm = a + b + c + d + e, em que a, b, c, d e e representam, respectivamente, o valor das

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