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19 de Maio de 2024
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    A licitude da prova bancária obtida no exterior conforme a lei local e sem autorização judicial

    Publicado por Rogério Tadeu Romano
    há 3 anos

    A LICITUDE DA PROVA BANCÁRIA OBTIDA NO EXTERIOR CONFORME A LEI LOCAL E SEM AUTORIZAÇÃO JUDICIAL

    Rogério Tadeu Romano

    Ultimamente, são diversos os casos envolvendo a obtenção de prova nos Estados Unidos com relação a crimes de evasão de divisas que são julgados na jurisdição do Brasil.

    É conhecida a discussão sobre se todo compartilhamento de provas entre Brasil e Estados Unidos deveria passar pelas autoridades centrais de ambos os países, e se é ilícita a colaboração informal entre as respectivas agências investigativas e órgãos acusadores.

    O ministro Teori Zavascki argumentou, no voto que proferiu em 2009, que “a norma constitucional do art. 105, I, i, não instituiu o monopólio universal do STJ de intermediar essas relações com estados estrangeiros”.

    O artigo 105, I, i estabelece:

    Compete ao Superior Tribunal de Justiça:

    I – processar e julgar, originariamente:

    i) a homologação de sentenças estrangeiras e a concessão de exequatur às cartas rogatórias.

    Naquele caso, houve pedido de cooperação jurídica, especificamente para compartilhamento de prova.

    “O compartilhamento de prova é uma das mais características medidas de cooperação jurídica internacional, iterativamente prevista nos acordos bilaterais e multilaterais que disciplinam a matéria”, acrescentou o ministro no seu voto, proferido em 2009.

    “Consideradas essas circunstâncias, bem como o conteúdo e os limites próprios da competência prevista no art. 105, i, i da Constituição, a cooperação jurídica requerida não dependia de expedição de carta rogatória por autoridade judiciária da Federação da Rússia e, portanto, nem de exequatur ou de outra forma de intermediação do Superior Tribunal de Justiça, cuja competência, conseqüentemente, não foi usurpada”, concluiu o ministro.

    Repita-se, então, o que entendeu o STJ, na CR 438, que, levando em consideração a necessidade de ampla cooperação com as autoridades estrangeiras, por força de lei (Lei 9.613/98, art. , § 1º), por força de compromisso internacional (Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional, art. 18, §§ 3º e 8º) e por força do princípio da efetividade do Poder Jurisdicional no novo cenário de cooperação internacional no combate ao crime organizado transnacional, é perfeitamente viável que um pedido de medidas de caráter executório – como buscas e apreensões, bloqueios e quebras de sigilo bancário – seja atendido independentemente de homologação de sentença estrangeira.

    Observe o caso do MLAT.

    O Acordo de Assistência Judiciária em Matéria Penal firmado entre os governos da República Federativa do Brasil e dos Estados Unidos da América, precisamente por meio de seu artigo I, item 1, alínea 'h', prevê o amplo alcance da cooperação jurídica mútua entre os países, ressalvando, apenas, a inviolabilidade das leis do Estado requerido

    Consoante orientação da Corte Especial do STJ , 'um sistema eficiente de comunicação, de troca de informações, de compartilhamento de provas e de tomada de decisões e de execução de medidas preventivas, investigatórias, instrutórias ou acautelatórias, de natureza extrajudicial. O sistema de cooperação, estabelecido em acordos internacionais bilaterais e plurilaterais, não exclui, evidentemente, as relações que se estabelecem entre os órgãos judiciários, pelo regime das cartas precatórias, em processos já submetidos à esfera jurisdicional. Mas, além delas, engloba outras muitas providências, afetas, no âmbito interno de cada Estado, não ao Poder Judiciário, mas a autoridades policiais ou do Ministério Público, vinculadas ao Poder Executivo' (Rcl 2.645/SP, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, CORTE ESPECIAL, julgado em 18/11/2009, DJe 16/12/2009).

    O Acordo de Assistência Judiciária em Matéria Penal entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo dos Estados Unidos da América, internalizado no ordenamento pátrio pelo Decreto n. 3.810/01, objetiva facilitar a execução das tarefas das autoridades responsáveis pelo cumprimento da lei de ambos os países, na investigação, inquérito, ação penal e prevenção do crime por meio de cooperação e assistência judiciária mútua em matéria penal, não sendo possível extrair da norma invocada qualquer proibição à existência de outras formas de cooperação para combater a prática criminosa, como ocorreu, com êxito, no caso em análise

    O caráter cooperativo amplo do MLAT, quanto à forma de assistência entre os países signatários, sempre com propósito, é óbvio, de promover o controle da criminalidade transnacional e, com isso, o progresso da humanidade, comportamento que, cabe acrescentar, tem assento constitucional no âmbito do Direito interno - ex vi art. , IX, da CF.

    O MLAT não faz qualquer tipo de restrição à soberania do Estado signatário que, na posse de informações legalmente obtidas e documentadas, capazes de, em tese, revelar atividade delitiva relevante, decida submetê-las ao conhecimento das autoridades do outro país, competentes para eventual persecução criminal de comportamento contrário ao seu ordenamento jurídico.

    O art. 13 da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro determina que a prova dos fatos ocorridos em país estrangeiro rege-se pela lei que nele vigorar quanto aos meios de produzir-se. Dessa forma, a prova licitamente produzida em outro país certamente poderá ser aproveitada nas investigações levadas a efeito no Brasil, exceto em se tratando de prova que a lei brasileira desconheça, o que não é o caso, portanto, não ocorreu violação ao art. 157 do CPP.

    Essas as conclusões hauridas no julgamento do AgRg nos EDcl no REsp 1704644/RS, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 13/11/2018, DJe 30/11/2018.

    Em seu art. 1º, n. 2, h, o MLAT busca desburocratizar a cooperação internacional em matéria penal, pois permite a utilização de "qualquer outra forma de assistência não proibida pelas leis do Estado requerido". No mesmo sentido, o art. 17 determina que: "Os termos de assistência e demais procedimentos contidos neste acordo não constituirão impedimento a que uma parte preste assistência à outra com base em dispositivos de outros acordos internacionais aplicáveis, ou de conformidade com suas leis nacionais. As partes podem também prestar-se assistência nos termos de qualquer acordo, ajuste ou outra prática bilateral cabível"

    Observe-se do no art. 1º, n. 5, do Tratado, cujo teor é o seguinte: "O presente acordo destina-se tão-somente à assistência judiciária mútua entre as partes. Seus dispositivos não darão direito a qualquer indivíduo de obter, suprimir ou excluir qualquer prova ou impedir que uma solicitação seja atendida".

    Assim a finalidade do MLAT é facilitar a cooperação entre os Estados signatários, não só pelo rito do art. 4º (em que a solicitação é feita pela autoridade central do país requerente), mas também por "qualquer outra forma de assistência" (art. 1º, n. 2, h), "ajuste ou outra prática bilateral cabível" (art. 17). Tratar o procedimento formal do art. 4º como impositivo, sob pena de nulidade das provas obtidas por formas atípicas de cooperação, desconsideraria o teor destes textos normativos e violaria frontalmente o art. 1º, n. 5, do MLAT.

    Para o tema de validade de provas obtidas no exterior há o julgado:

    “A provas obtidas por meio de cooperação internacional em matéria penal devem ter como parâmetro de validade a lei do Estado no qual foram produzidas, conforme a previsão do art. 13 da LINDB”( APn 856/DF, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, CORTE ESPECIAL, julgado em 18/10/2017, DJe 6/2/2018).

    Entender pela impossibilidade de compartilhamento de provas por meio de cooperações jurídicas internacionais significa inviabilizar a persecução penal de, além dos crimes de evasão de divisas e de lavagem de capitais, tantos outros delitos transnacionais, como o tráfico internacional de drogas, o tráfico internacional de pessoas, a pedofilia por meio da rede mundial de computadores, o tráfico internacional de armas, entre outros. Atenta ao fenômeno da criminalidade globalizada e transnacional, essa eg. Corte Superior em diversas ocasiões tem afirmado e reafirmado a validade de provas produzidas no exterior e compartilhada por meio de cooperação jurídica internacional (AgRg no REsp 1656153/PR, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 24/5/2018, DJe 30/5/2018).

    Para o caso, recentemente, o STJ enfrentou, no julgamento do AREsp 701833, em que foi relator, na Quinta Turma, o ministro Ribeiro Dantas. Ali se disse, consoante o site do Superior Tribunal de Justiça, em 13 de maio do corrente ano, que em situação de cooperação jurídica internacional, as diligências feitas em países estrangeiros conforme as leis locais são válidas no Brasil mesmo se não houver prévia autorização judicial ou participação das autoridades centrais.

    Com esse entendimento unânime, o colegiado negou provimento a recurso da defesa e manteve a condenação imposta pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) a um réu acusado de crime contra o Sistema Financeiro Nacional.

    O relator, ministro Ribeiro Dantas, explicou que não viola a ordem pública brasileira o compartilhamento de dados bancários que, no exterior, foram obtidos sem prévia autorização judicial, quando tal autorização não era exigida pela legislação local.

    Além disso, ele assinalou que, "respeitadas as garantias processuais do investigado, não há prejuízo na cooperação direta entre as agências investigativas, sem a participação das autoridades centrais

    O julgamento foi feito em caso de crime de evasão de divisas ((artigo​ 22 da Lei 7.492/1986) e por manter depósito de valores no exterior de 1999 a 2005, sem a declaração respectiva ao órgão competente no Brasil.

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