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4 de Maio de 2024

O Código Florestal brasileiro de 1965

Uma análise acerca do Código Florestal de 1965 e seu contexto de criação

Publicado por Andre Batista
há 5 anos

   A gênese do Código Florestal reflete o caráter acumulativo de reconhecimento e proteção dos direitos ambientais ao longo da história. Posto isso, a propositura de um código significa uma maior proteção ao meio ambiente em prol do bem-estar da coletividade.

   Conforme explanado anteriormente, sendo o meio ambiente um direito de terceira geração, verifica-se que, em razão da tutela constitucional dado ao tema, este se harmoniza com outras garantias fundamentais, mormente o princípio da dignidade humana, concluindo-se, portanto, que é direito e dever de todos e do Estado um meio ecologicamente equilibrado.

   Nesse aspecto, para que haja a continuação da espécie humana, faz-se necessário o uso consciente do meio ambiente. As restrições normativas são relevantes na medida em que envolvem interesses sociais, econômicos e ecológicos (CARVALHO, 2014).

   Todavia, malgrado a importância do tema e a indispensabilidade de proteção ao meio ambiente, a crise ambiental foi deflagrada com a constatação de que as condições tecnológicas e industriais, junto às formas de organização e gestão econômicas da sociedade, estavam em conflito com a qualidade de vida das pessoas, surgindo, assim, uma necessidade da intervenção do poder público (OLIVEIRA; MONTEIRO, 2014).

   Neste cenário, os principais dispositivos legais de proteção da natureza levaram à criação e à consolidação das primeiras áreas protegidas, sendo criados contemporaneamente no Brasil: o Código Florestal (Decreto 23793/1934), o Código de Águas (Decreto 24643/1934), o Código de Caça e Pesca (Decreto 23672/1934) e o decreto de proteção aos animais (Decreto 24645/1934) (MEDEIROS, 2006).

   Em 1934, o então presidente Getúlio Vargas sancionou o Decreto 23.793/34, promulgando o primeiro Código Florestal, que então seria inserido no ordenamento jurídico brasileiro, sendo criado para preservar as florestas, estabelecendo as regras de exploração florestal e as penas aplicadas àqueles que as transgredissem (MIGALHAS, 2012).

   De acordo com Ahrens (2003), a edição do Código Florestal de 1934 advém da realidade socioeconômica e política da sociedade brasileira no início do século XX. A cafeicultura avançava pelos morros que constituem a topografia do Vale do Paraíba, substituindo toda a vegetação nativa, bem como a criação extensiva e expansiva de gado, outra forma de utilização das terras, fazia-se de modo extensivo e com mínima técnica. Além disso, a introdução de espécies de Eucalyptu reduziu a atividade florestal ao puro extrativismo.

   Nesse entendimento, Ahrens (2003) ressalta:

Foi nesse cenário que o Poder Público decidiu interceder, estabelecendo limites ao que parecia ser um saque ou pilhagem dos recursos florestais (muito embora, até então, tais práticas fossem lícitas). A mencionada “intervenção”, necessária, materializou-se por meio da edição de um (primeiro) Código Florestal, o de 1934.

   Desse modo, verifica-se que, embora o Código Florestal de 1934 tenha sido um avanço no sentido de proteção ambiental, tratando o meio ambiente não apenas como sujeito à ordem econômica, mas também como patrimônio, muitas de suas normas não foram cumpridas, sendo consideradas apenas como “decorações legislativas” (CARVALHO, 2016).

   Diante disso, fez-se necessária a substituição do referido diploma legal pela Lei 4.771 de 15.09.1965, que instituiu o segundo Código Florestal, trazendo grandes modificações legislativas. A novel legislação conservou mecanismos, como o da reserva legal, atestando, no seu artigo 16, que as florestas de domínio privado, ressalvadas aquelas de utilização limitada e as de preservação permanente, podiam ser exploradas, desde que fossem respeitados limites estabelecidos de acordo com as regiões do país (MELLO, 2010).

   Ainda neste contexto, Mello (2010) destaca que a reserva legal, prevista no Código Florestal de 1965, também sofre uma modificação na sua perspectiva, assumindo uma finalidade de conservação da vegetação nativa, deixando de ter apenas um propósito econômico da vegetação nativa por floresta plantada, cessando a isenção de sua implementação em áreas próximas à floresta.

   Sobre o Código Florestal de 1965, acrescentam Nogueira e Siqueira (2004, p. 6) que a nova legislação surge no momento de crescimento da consciência ambiental na década de 1960. Todavia:

[...] o Código merece críticas porque nasce com uma vertente biocêntrica, indiferente ao ser humano, contagiado pela ideia de preservação do ecossistema, sem qualquer participação antrópica, ao qual denominam ambientalismo desumano, ou seja, sem a incorporação da vertente humana. (MELLO, 2010, p. 125).

   Diante do que já foi exposto, constata-se que o Código Florestal foi instrumento primordial na tutela jurídica do meio ambiente, pois definiu objetivamente as bases para a proteção territorial dos principais ecossistemas florestais e demais formas de vegetação naturais do país (MEDEIROS, 2006).

   Ademais, o supracitado diploma legal tinha como principais objetivos legitimar as ações dos serviços florestais em franca implementação em alguns estados brasileiros desde o final do século XIX, bem como de regularizar a exploração do recurso madeireiro, estabelecendo as bases para sua proteção. Foi, também, o primeiro instrumento de proteção brasileiro a definir claramente tipologias de áreas a serem especialmente protegidas (MEDEIROS, 2006).

   Além disso, destaca Ayala (2010) que um Código Florestal trata-se de um desafio que exige um elevado grau de compromisso das instituições, com a implementação de graus de sensibilidade ecológica na execução da tarefa estatal de proteção do meio ambiente e uma profunda transformação normativa da ordem jurídica.

   Diante disso, os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário vêm, ao longo do tempo, buscando positivar as questões que o tema exige. Nota-se, portanto, que o código buscou ser muito específico quanto às várias demandas que o meio ambiente pode experimentar no que diz respeito às áreas de conservação, por exemplo.

   Contudo, embora o Código Florestal de 1965 pretendesse a tutela e proteção de um meio ambiente equilibrado, este não satisfazia as demandas da bancada ruralista, estando no sentido contrário dos interesses econômicos, surgindo diversas propostas de alteração do referido diploma.

   Quanto à proposta de alteração do Código Florestal, Garcia (2012) afirma que esta deve ser um marco de forma a induzir o cumprimento das regras e, por isso, deve ser redigida de forma clara e se adequar à realidade do país para enfrentar o desafio de equilibrar produção agrícola e preservação ambiental.

   Guimarães et al (2012) aduzem que as primeiras discussões sobre um projeto de lei ambiental datam de 1999, com o objetivo de ampliar a utilização de terras para a agronomia, visando ao crescimento econômico. Assim, seguiu-se com os projetos de lei 6.425/06 e 5367/09, todos voltados para os interesses da bancada ruralista.

Uns dos principais argumentos para a modificação do Código Florestal seria a expansão da agricultura e a falta de áreas para o cultivo da mesma para avanço da economia do país. Portanto, um dos temas mais polêmicos discutidos para aceitação do mesmo em bancada seria a drástica diminuição sob a preservação florestal (GUIMARÃES; CHIMENES; ANDRADE; BEZERRA; LEMKE, 2012, p. 03).

   Como resultado das discussões legislativas, foi promulgado um Novo Código Florestal, considerado fruto da influência ruralista na Câmara dos Deputados e Senado, sendo alvo de críticas por preterir a proteção ao meio ambiente em detrimento do interesse econômico de classes específicas.

REFERÊNCIAS:

AHRENS, Sérgio. O “novo” código florestal brasileiro: conceitos jurídicos fundamentais. Disponível em: < http://egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/anexos/26462-26464-1-PB.pdf >. Acesso em: 10 de março de 2018.

AYALA, Patryck de Araújo. Constituição ambiental e sensibilidade ecológica: notas para a reflexão sobre um direito ambiental de segunda geração na jurisprudência brasileira. Revista de Direito Ambiental. Vol. 60. ano. 15. p. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010.

CARVALHO. Ely Bergo de. O Código Florestal brasileiro de 1934: a legislação florestal nas disputas pelo território, um estudo de caso. Disponível em:< http://www.seer.ufrgs.br/index.php/anos90/article/view/47974/39224 >. Acesso em 20 de maio de 2018.

GUIMARÃES, Verônica Maria Bezerra; CHIMENES, Marielly Mattoso; ANDRADE, Camila Souza de; BEZERRA, Roberto Araújo; LEMKE, Ana Paula. O Novo Código Florestal e seus reflexos para a gestão ambiental. II Congresso de Direito Ambiental. IBEAS- Instituto Brasileiro de Estudos Ambientais. Disponível em:< http://www.ibeas.org.br/congresso/Trabalhos2011/V-003.pdf >. Acesso em 19 de março de 2018.

MEDEIROS, Rodrigo. Evolução das tipologias e categorias de áreas protegidas no Brasil. Disponível em:< http://www.scielo.br/pdf/asoc/v9n1/a03v9n1>. Acesso em 10 de março de 2018.

MELLO, Yuri Lopes de. Reserva legal: fundamento constitucional e políticas públicas. Revista de Direito Ambiental. Vol.60. ano. 15. p. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010.

OLIVEIRA, Marcela Matos Fernandes de; MONTEIRO, Márcio Augusto Ferreira. O poder público e a preservação do meio ambiente. Disponível em: < https://jus.com.br/artigos/30304/o-poder-publicoea-preservacao-do-meio-ambiente >. Acesso em 10 de março de 2018.


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