apartamento 02, bloco 45 do Condomínio Residencial Colinas de Piracicaba, objeto da Matrícula 56.043 do 1º Registro de Imóveis local, por escritura pública de 12.09.2014. Constou que, no negócio, o de cujus adquiriu o usufruto vitalício, ao passo que coube à ré, sua companheira, a nua propriedade (R.8 e R.9, fls. 18).A ré esclareceu que o verdadeiro valor desse negócio foi de R$ 160.000,00 e não os R$ 80.000,00 que constaram na escritura (R$ 26.666,67 do usufruto mais R$ 53.333,33 da nua propriedade, totalizando R$ 80.000,00). De fato a compra e venda ocorreu por R$ 160.000,00, pois é esse o valor que constou do antecedente compromisso de venda e compra (fls. 84/85). A autora concorda que a compra se deu por R$ 160.000.00, de modo que o pagamento dessa quantia é fato incontroverso.Em depoimento pessoal, a ré disse que o de cujus, tendo se separado judicialmente, era proprietário de imóvel em Nova Odessa SP. Vendeu esse imóvel e se mudou para Piracicaba. Com o valor da venda do imóvel de Nova Odessa, adquiriu imóvel próximo ao SESI, nesta cidade. Como era imóvel distante do centro, acabou por vender esse imóvel e, com o preço obtido, comprou o imóvel da Rua Dr. Alvim, objeto da Matrícula 65.784 do 1º Registro de Imóveis local. Essa compra teria ocorrido quando o de cujus já havia iniciado a união estável com a ré, mas o imóvel foi registrado exclusivamente em nome dele. Posteriormente, ainda segundo o depoimento pessoal da ré, o imóvel da Rua Dr. Alvim teria sido vendido pelo de cujus por R$ 157.000,00. Esse valor foi empregado na compra do imóvel objeto desta ação, da Matrícula 56.043, por R$ 160.000,00, com aquisição do usufruto em favor do de cujus e da nua propriedade em nome da ré. Para a compra do segundo imóvel, diante da diferença de preço (R$ 157.000,00 x R$ 160.000,00), foram pagos aos vendedores mais R$ 3.000,00. Segundo a ré, ela teria contribuído, com recursos próprios, com cerca de metade dessa diferença, ou seja, cerca de R$ 1.500,00. Teria contribuído, ainda, para as despesas de escritura e registro.Em relação a essa versão do depoimento pessoal da ré, é de se observar que provavelmente ela fez confusão quanto ao valor da venda do imóvel da Rua Dr. Alvim, pois disse que teria sido vendido por R$ 157.000,00, mas, na verdade, como está expresso no compromisso de venda e compra de fls. 52/56, o preço foi de R$ 167.000,00, superior aos R$ 160.000,00 pagos pelo apartamento do Colinas de Piracicaba.Se a casa foi vendida por valor superior ao do apartamento comprado em seguida, entendo não haver dúvida de que, na verdade, ao contrário do afirmado pela ré, o preço do apartamento foi pago integralmente com o produto da venda da casa da Rua Dr. Alvim. Por outro lado, dada oportunidade para a ré indicar outros bens pertencentes ao de cujus na época do negócio jurídico questionado, ela não se manifestou.Assim delimitados os fatos relevantes para a solução da causa, é de se observar, em primeiro lugar, ser incontroverso que o de cujus e a ré viviam em união estável há cerca de dez anos. O regime de bens da união estável é o da comunhão parcial de bens, salvo se houver pacto escrito dos companheiros em contrário, como estatui o art. 1.725 do Código Civil. Como não houve pacto escrito entre o de cujus e a ré, a união estável deles era regida pela comunhão parcial de bens.Na comunhão parcial, são particulares, exclusivos do cônjuge ou companheiro, não se comunicando com o outro, os bens que cada um possui ao se casar ou constituir união estável, e os sub-rogados em seu lugar. É a regra do art. 1.659, I, do Código Civil.No caso concreto, pela sequência de negócios jurídicos acima apontada, não há dúvida de que o de cujus era proprietário do imóvel em Nova Odessa, antes da constituição da união estável com a ré. Com o preço da venda desse imóvel, comprou, sucessivamente, o das proximidades do SESI, o da Rua Dr. Alvim e, finalmente, o apartamento no Colinas. Entendo, assim, não haver dúvida de que esse último imóvel foi adquirido com o produto da venda de bem particular do de cujus, anterior à constituição da união estável, e, portanto, o produto usado para a compra era particular, de propriedade exclusiva do de cujus. O apartamento, em suma, é bem sub-rogado em lugar do imóvel de propriedade exclusiva do de cujus, antes da constituição da união estável. E, portanto, não se comunicou com a ré, nos termos do referido inc. I do art. 1.659 do Código Civil.Parte do valor da venda do imóvel da Rua Dr. Alvim, que era de titularidade exclusiva do de cujus, foi empregado por ele para a compra da nua propriedade do apartamento em favor de sua companheira. Houve, portanto, não a compra pura e simples da nua propriedade pela ré, mas a doação pelo de cujus à ré do valor respectivo, que permitiu a compra da nua propriedade. O claro intento do de cujus foi o de favorecer sua companheira, subtraindo o imóvel da sucessão hereditária dele. Reservou em favor dele o usufruto vitalício. Com sua morte, o usufruto se extinguiria, consolidando-se a propriedade plena em favor da ré, excluindo-se da sucessão, assim, os cinco filhos dele, frutos do casamento anterior. Tem razão a autora, portanto, ao afirmar que se tratou de negócio jurídico simulado, pois encobriu doação do de cujus à ré. Nos termos do art. 167 caput do Código Civil: “Art. 167. É nulo o negócio jurídico simulado, mas subsistirá o que se dissimulou, se válido for na substância e na forma”. Por aplicação dessa regra, subsiste o negócio jurídico praticado, não como compra e venda pura e simples, mas reconhecendo-se que houve doação pelo de cujus à ré do valor com o qual ela adquiriu a nua propriedade. Visou, ainda, com a reserva de usufruto vitalício em favor dele, assegurar que na abertura da sucessão dele coubesse à ré a propriedade plena do imóvel, consumando-se, assim, a doação em favor dela da totalidade do imóvel, evitando-se que ela tivesse de partilhar o imóvel com os filhos dele, frutos de relacionamento anterior.Resta examinar quais as consequências jurídicas da doação, para deslinde desta demanda. Dentre outros fundamentos legais, a autora argumenta ter havido violação do art. 549 do Código Civil, segundo o qual: “Art. 549. Nula é também a doação quanto à parte que exceder à de que o doador, no momento da liberalidade, poderia dispor em testamento”.Não há dúvida de que houve violação dessas regra legal. Não há prova de que o de cujus tinha outros bens ao tempo da doação efetuada à ré. Ele visou contemplar a companheira, portanto, com 100% de seu patrimônio, quando poderia dispor somente de 50. A doação entre companheiros é negócio jurídico válido, lícito, constituindo adiantamento de herança, a impor a colação do bem recebido em doação, para igualar as legítimas dos herdeiros necessários. Com efeito, dispõe o art. 544 do Código Civil: “Art. 544. A doação de ascendentes a descendentes, ou de um cônjuge a outro, importa adiantamento do que lhes cabe por herança”. Embora o art. 544 não faça referência explícita à doação de um companheiro a outro, tal doação deve ser considerada, igualmente, adiantamento de herança. Pois, sendo adiantamento de herança, impõe que o donatário colacione o bem doado no inventário dos bens deixados pelo doador, a fim de igualar as legítimas dos herdeiros necessários. Caso a doação de um companheiro a outro não constituísse adiantamento de herança e não se impusesse a colação, ocorreria o paradoxo de o cônjuge estar obrigado à colação e o companheiro não. A lei infraconstitucional estaria tratando pior o cônjuge do que o companheiro, o que resultaria em situação absurda e contrária ao texto constitucional. Pois é possível admitir discussão sobre a equiparação ou não dos efeitos do casamento e da união estável perante a Constituição, mas é impensável admitir que a união estável possa ser melhor tratada do que o casamento. Em suma, se o cônjuge está obrigado a trazer à colação bens recebidos do outro cônjuge por doação, como dispõem os arts. 544 e 2.003, ambos do Código Civil, a mesma obrigação deve ser reconhecida em face do companheiro, sob pena de se consagrar o referido paradoxo, de tratar melhor o companheiro do que o cônjuge.Trata-se, na verdade, portanto, não de doação inoficiosa, mas de doação a impor colação. A doação inoficiosa é nula na parte inoficiosa, no que excede a metade disponível. Na parte invasiva da parte indisponível, a doação é inválida, como expressamente estatui o art. 549 do CC. Trata-se de nulidade, mas com o diferencial de que depende de reclamo do herdeiro necessário prejudicado para que seja promovida a redução aos limites da parte disponível. No caso de colação, a doação não padece de invalidade. Ao contrário, constitui negócio jurídico lícito, válido, com a particularidade de que tem natureza jurídica de adiantamento de herança, conforme a expressa previsão do art. 544 do CC. Por ter essa natureza jurídica, acarreta a obrigação de o donatário colacionar o bem doado a fim de igualar as legítimas dos herdeiros necessários. De se reconhecer, ainda, pelas circunstâncias do negócio jurídico praticado, como acima já salientado, ter ficado