Página 953 da Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte III do Diário de Justiça do Estado de São Paulo (DJSP) de 12 de Junho de 2017

preliminar de ilegitimidade ativa, pois pode o autor, isoladamente, postular indenização material e moral pelo alegado atraso na entrega do imóvel, já que não se trata de caso de litisconsórcio necessário. Passo ao mérito.O autor celebrou contrato particular de promessa de compra e venda de unidade imobiliária com a ré SPAZIO CAMPO BIANCO INCORPORAÇÕES SPE LTDA, integrante do mesmo grupo econômico da ré MRV ENGENHARIA E PARTICIPAÇÕES S/A, em 05 de dezembro de 2010 (págs. 13/25). Por meio desta ação, busca o autor indenização material e moral, diante do alegado atraso na entrega do imóvel. Invoca abusividade da parte final do item 5 do quadro resumo: no aludido item, é indicado, num primeiro momento, o mês de abril de 2013 para entrega do imóvel; na parte final, contudo, consta que se trata de mera estimativa, devendo prevalecer, para quaisquer fins, como data da entrega das chaves, vinte e quatro meses após a assinatura do contrato de financiamento bancário (pág. 14). Também sustenta que é abusiva a cláusula quinta do contrato, segundo a qual “A PROMITENTE VENDEDORA se compromete a concluir as obras do imóvel objeto deste contrato até o último dia do mês mencionado no item 5 do Quadro Resumo, salvo se outra data for estabelecida no contrato de financiamento com instituição financeira. Nesta hipótese, deverá prevalecer, para fins de entrega das chaves, a data estabelecida no contrato de financiamento” (pág. 19). Pois bem. O Código de Defesa do Consumidor estabelece que as relações de consumo devem se pautar pela boa-fé e pelo equilíbrio entre fornecedores e consumidores (art. 4º, III); daí porque, nos contratos de adesão, reconhecida a condição de hipossuficiência (art. 4º, I), as cláusulas são interpretadas favoravelmente ao aderente (art. 47 do CDC; art. 423 do CC). Não por outro motivo são consideradas nulas as cláusulas que ofendam os princípios do sistema jurídico a que pertençam (art. 51, § 1º, I) e que as ameacem o equilíbrio contratual (art. 51, § 1º, III). A previsão de prazos múltiplos, indefinidos ou indeterminados, ou então vinculados a evento futuro e incerto (como o é o condicionamento ao contrato de financiamento), constitui flagrante violação aos preceitos mencionados -mesmo porque é vedado ao fornecedor deixar de estipular prazo para o cumprimento da obrigação quando igual direito não é dado ao consumidor-aderente (art. 39, XII). Neste sentido: “COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA. Ação de rescisão contratual c.c. indenização por danos morais e repetição de indébito. Obra não concluída no prazo contratual. Prazo indeterminado para entrega da obra. Inadmissibilidade. Rescisão do contrato por inadimplemento da vendedora. Restituição integral das parcelas pagas. Direito do promitente comprador, nos termos do art. 53 do CDC e das Súmulas nº 1 e 3 do TJSP. Ação procedente. RECURSO DESPROVIDO” (TJSP - Apelação nº 001XXXX-46.2013.8.26.0577 - 3ª Câmara de Direito Privado - Desembargador Relator ALEXANDRE MARCONDES - julgado em 16.09.2014). No mesmo diapasão: “COMPRA E VENDA -Imóvel -Atraso na conclusão das obras - Variação do prazo para o seu término a partir da assinatura do financiamento que é ilegal, nula de pleno direito - Arts. 39, XII, e 51, IV e XV, do CDC - Obrigatoriedade da oferta - Art. 30 do CDC - Responsabilidade exclusiva das construtoras - Fortuito interno que se identifica na espécie - A cláusula que prevê a tolerância de 180 dias, viés obrigacional do necessário equilíbrio, não é per se abusiva e deve ser prestigiada diante da dimensão e da complexidade do produto/serviço que se obteve - Tese amplamente majoritária neste Tribunal, já admitida pelo STJ - Atraso dimensionado a partir do interesse da autora - As taxas de evolução de obra, embutidas nas parcelas ordinárias, só devem ser devolvidas a partir da mora - Recurso provido em parte” (TJSP - 8ª Câmara de Direito Privado - Apelação nº 003XXXX-29.2011.8.26.0309 - Relator Des. FERREIRA DA CRUZ - j. 06.05.2015). Como destacado no voto do eminente Des. Rel. FRANCISCO LOUREIRO, no julgamento da Apelação nº 000XXXX-55.2014.8.26.0084, pela 1ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo: “Permitir às construtoras a inclusão de múltiplos prazos para a entrega dos imóveis prejudicaria sobremaneira os consumidores, pois os impediria de estimar com precisão a data de recebimento do imóvel, além do que os colocaria em desvantagem excessiva frente à alienante. Ressalte-se, ainda, inexistir justificativa plausível para a previsão de um prazo para a entrega das chaves do imóvel com termo inicial na data da celebração dos contratos de financiamento pelos adquirentes. Além disso, a contratação de financiamento por parte da construtora é fato incerto, que depende apenas e tão somente de sua iniciativa de tomar recursos de terceiro. Não se sabe quando e nem mesmo se ocorrerá. Subordinar a entrega da obra a tal condição teria natureza potestativa e, sem dúvida, abusiva e excessivamente onerosa ao consumidor. A circunstância não repercute diretamente no andamento da obra, sem contar que, nos termos em que redigido, tal prazo implicaria datas diferentes para a entrega das unidades autônomas do edifício (já que podem ser diversas as datas de contratação do financiamento pelos compradores), quando, na verdade, a obra é finalizada em data única”. Fixado o mês de abril de 2013 para a entrega do imóvel, tal prazo deve prevalecer, seja porque, nos termos do artigo 47 do Código de Defesa do Consumidor, as cláusulas contratuais devem ser interpretadas favoravelmente ao consumidor, seja porque a parte final do item 5 do quadro resumo e a cláusula quinta do contrato são mesmo abusivas. Levando em conta a previsão contratual do prazo de tolerância de cento e oitenta dias, que não se afigura ilegal, pois não implica limitação de direito do consumidor, nem o coloca em desvantagem exagerada, as chaves do apartamento deveriam estar disponíveis ao autor em outubro de 2013, mas eles só as recebeu em fevereiro de 2015, com dezesseis meses de atraso. Conforme a Súmula 164 do Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo: “É valido o prazo de tolerância não superior a cento e oitenta dias, para entrega de imóvel em construção, estabelecido no compromisso de venda e compra, desde que previsto em cláusula contratual expressa, clara e inteligível”. Diante da mora da construtora, o autor deixou de usufruir do imóvel. Não pode utilizá-lo para qualquer fim. A falta de entrega do bem na data prevista acarretou-lhe, pois, inegável dano material. Competia à construtora considerar todas as dificuldades do empreendimento, inclusive falta de mão de mão-de-obra e burocracia para obtenção do habite-se, que não constituem caso fortuito ou força maior, antes de marcar a data para a entrega do imóvel perante o consumidor. De acordo com a Súmula 161 do Tribunal de Justiça de São Paulo: “Não constitui hipótese de caso fortuito ou de força maior, a ocorrência de chuvas em excesso, falta de mão de obra, aquecimento do mercado, embargo do empreendimento ou, ainda, entraves administrativos. Essas justificativas encerram ‘res inter alios acta’ em relação ao compromissário adquirente”. Vale salientar também que, segundo a Súmula 160 do Tribunal de Justiça de São Paulo, “A expedição do habite-se, quando não coincidir com a imediata disponibilização física do imóvel ao promitente comprador, não afasta a mora contratual atribuída à vendedora”. Não respeitado o prazo de entrega assinalado no contrato, devem as rés arcarem com as consequências daí decorrentes. O prazo de tolerância, aliás, tinha justamente a finalidade de abarcar as situações extraordinárias que poderiam prorrogar a conclusão da obra. Nos termos da Súmula 162 do Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo: “Descumprido o prazo para a entrega do imóvel objeto do compromisso de venda e compra, é cabível a condenação da vendedora por lucros cessantes, havendo a presunção de prejuízo do adquirente, independentemente da finalidade do negócio”.Ainda sobre o tema: “CIVIL E PROCESSUAL. EMBARGOS DECLARATÓRIOS CUJAS RAZÕES SÃO EXCLUSIVAMENTE INFRINGENTES. FUNGIBILIDADE DOS RECURSOS. RECEBIMENTO COMO AGRAVO REGIMENTAL. COMPRA E VENDA. IMÓVEL. ATRASO NA ENTREGA. LUCROS CESSANTES. PRESUNÇÃO. PROVIMENTO. I. Nos termos da mais recente jurisprudência do STJ, há presunção relativa do prejuízo do promitente-comprador pelo atraso na entrega de imóvel pelo promitente-vendedor, cabendo a este, para se eximir do dever de indenizar, fazer prova de que a mora contratual não lhe é imputável. Precedentes. II. Agravo regimental provido” (STJ - AgRg no Ag 1036023/RJ, Rel. Ministro ALDIR PASSARINHO JÚNIOR, QUARTA TURMA, julgado em 23/11/2010, DJe 03/12/2010). No mesmo sentido: “AGRAVO REGIMENTAL - COMPRA E VENDA. IMÓVEL.ATRASO NA ENTREGA - LUCROS CESSANTES - PRESUNÇÃO - CABIMENTO - DECISÃO AGRAVADA MANTIDA - IMPROVIMENTO. 1.- A jurisprudência desta Casa é pacífica no sentido de que, descumprido o prazo

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