Página 3113 da Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte III do Diário de Justiça do Estado de São Paulo (DJSP) de 17 de Novembro de 2017

Sandra. Segundo a vítima, isso ocorrera no final de março de 2014, provavelmente após o levantamento por parte dela própria do benefício daquele mês, porém, em setembro daquele ano foi procurada pela funcionária pública Catarina, a qual indagava sobre o seu benefício, assim se descobrindo que ele continuava a ser sacado. Maria Aparecida ainda elucidou que noticiou os fatos à autoridade policial em outubro daquele ano, quando já tinha reavido o cartão perante a acusada, isso através de seu filho Hurias, para quem Sandra efetivamente o entregara, juntamente com a senha, conforme efetivamente se infere do B.O. encartado às fls. 08/10, de modo que foram apenas 5 os saques indevidos, entre os meses de abril e agosto de 2014, no valor unitário de R$80,00, totalizando R$400,00. Hurias confirmou tal entrega, feita pessoalmente por Sandra Aparecida da Silva, acompanhada da tentativa de pagamento de R$320,00, o que recusou, ratificando que cinco foram os saques indevidos. Paralelo às declarações da vítima, seu filho e da estagiária Danubia, a servidora Catarina, à época coordenadora do CRAS, esclareceu que após ter Sandra Aparecida da Silva deixado o setor de benefícios do Renda Cidadã, ajudando a nova servidora responsável pelo acompanhamento dos benefícios e estranhando o fato do não comparecimento mensal e obrigatório da beneficiária Maria Aparecida, que continuava a levantar os valores, foi que entrou em contato com ela, descobrindo que há meses entregara o cartão e senha a pedido de Sandra. Ainda segundo Catarina, vindo à tona essa situação, no mesmo dia a Ré formalizou um memorando solicitando o desligamento de João Pinto Primo, e conseguindo contato com essa pessoa de hábitos simples apenas uma semana depois, a depoente descobriu que ele também havia entregue cartão e senha para Sandra. A vítima João Pinto Primo, de maneira simples mas convincente, salientou que se aposentou no final de 2013, recebeu por alguns meses, durante o ano de 2014, o benefício Renda Cidadã, até que resolveu comparecer no setor responsável pela administração do benefício para noticiar a concomitância e que acabou devolvendo cartão e senha para a Ré, a quem também reconheceu em sala própria, sendo que, embora a vítima não se recorde as datas, pelo que percebeu à época, o benefício havia sido recebido em três oportunidades depois de tal entrega. Extrato encartado às fls. 61, corroborando o quanto declinado na denúncia, sob as luzes das declarações dessa vítima, indica que os saques indevidos, efetivados após a entrega do cartão e senha para Sandra, ocorreram nos dias 22/07; 22/08 e 25/09 do ano de 2014. Quanto à vítima Maria Aparecida, o extrato de fls. 67, analisado sob as luzes do depoimento dela e de seu filho, Hurias, indica que os saques indevidos ocorreram nos dias 21/05 (para dois meses acumulados); 24/06; 22/07 e 22/08 do ano de 2014. É certo que há saques na conta de ambas as vítimas, no dia 25/09/14, e uma vez que a testemunha Catarina noticiou que no mesmo dia que os fatos relacionados à vítima Maria Aparecida viram à tona, Sandra encaminhou memorando solicitando o cancelamento do benefício titularizado por João Pinto, presume-se, por razões lógicas (sob pena de auto-incriminação infantil por parte da acusada) , que esses dois saques (o último na conta de João Pinto) foram realizados pela Ré, todavia, uma vez que a vítima Maria Aparecida mencionou a efetivação de apenas cinco saques indevidos por parte de Sandra (o último deles em agosto de 2014), sendo que após teria a própria prejudicada, a partir da devolução do cartão, continuado a receber o benefício a que fazia jus, até janeiro de 2015 (fls. 57), a incongruência deve ser interpretada em favor da Ré. Interrogada, a Ré negou peremptoriamente as acusações. Esboçou a tese de retaliação em virtude de posturas firmes que tem de tomar em decorrências das funções desempenhadas, muitas vezes motivo de insatisfação por parte de postulantes de benefícios públicos, mas não aduziu qualquer motivo concreto para que pessoas em distintas posições, não só os beneficiários vítimas João Pinto e Maria Aparecida, quanto a servidora já aposentada Catarina, a estagiária Danubia e o filho de uma vítimas, Hurias, inventassem história tendente a prejudica-la, armando todo um cenário da prática de nada menos de oito peculatos em continuação delitiva. Poder-se-ia, em cogitação, imaginar que o cartão de Maria Aparecida teria sido apropriado por outro funcionário do CRAS, quiça pela estagiária que o recebeu das mãos dessa vítima, e que vindo à tona a situação, a vítima João Pinto, por ser cidadão de hábitos simples e compreensão limitada, teria se confundido com a realização de saques após a entrega do seu cartão, fato não ocorrido, tudo em prejuízo da acusada. Mas tal possibilidade resta seguramente afastada pela ênfase com a qual a vítima Maria Aparecida disse ter sido contatata, via telefone, por Sandra, para que entregasse cartão e senha, bem como pela igual segurança com a qual João Pinto disse também ter entregue cartão e senha diretamente para Sandra (sendo infantil, aliás, a evasiva dada pela Ré para justificar a expedição de um memorando postulando pela exclusão dessa vítima do programa no mesmo dia em que descobertos os crimes praticados em face de Maria Aparecida: porque sabia que ele havia se aposentado, ora, mas então por que cumprindo dever ao menos moralmente inerente ao cargo, não o fez isso antes?) e, por peremptório, pelo depoimento de Hurias, dizendo que Sandra lhe entregou pessoalmente o cartão da genitora, tentando pagar R$320,00 para abafar o caso. No mais, as testemunhas arroladas pela Ré e ouvidas nesta audiência, quais sejam, Sandra Aparecida dos Santos, Maria Quitéria da Silva, Alcides Baldassim e Cildete Saroba, agentes públicos ou beneficiários de programas sociais, limitaram-se a aduzir a boa conduta da acusada quanto às relações com eles estabelecidas, mas o fato de não ter ela se apropriado de numerário de outros cidadãos que porventura atendeu ou não cometido outros crimes que sejam de conhecimento dessas pessoas, não afasta a possibilidade de ter atuado criminosamente em detrimento de Maria Aparecida e João Pinto, apropriando-se de numerário pertencente a essas vítimas, em proveito próprio, valendo para tanto da facilidade proporcionada pelo cargo ocupado, de assistente social, para o qual concursada, tendo assumido pelas regras da CLT, em 18/04/2012, conforme aqui declinou. Comprovadas, portanto, autoria e materialidade de parte dos crimes continuados imputados na inicial, mais especificamente 5 apropriações em continuidade delitiva praticadas contra Maria Aparecida e 3 outras praticadas contra João Pinto, a condenação se impõe. Passo à fixação da pena, adotado o sistema trifásico. Na primeira fase, considerado que, embora a condição de funcionário público integre o próprio tipo penal, a apropriação (aqui considerada a primeira delas, em face de Maria Aparecida) se deu num cenário de atendimento a cidadãos de baixa renda, com isso indicada acentuada falta de respeito por parte da Ré a direitos mínimos de pessoas que atende, uma das razões da existência da sua profissão, bem como observado, pelo seu contexto, que outros funcionários públicos poderiam ter sido colocados sob suspeita, circunstância a indicar pouco caso para com a dignidade de seus pares, tenho que a pena-base deve ser dobrada, restando aqui fixada em 04 anos de reclusão e 20 dias-multa, cada qual no mínimo legal, à míngua de elementos a respeito da capacidade financeira. Na segunda fase, ausentes agravantes ou atenuantes, mantenho inalterada a pena. Na terceira fase, presente a causa especial de aumento de pena prevista no artigo 71, caput, do CP, e verificado que outros 7 foram os crimes cometidos em continuidade delitiva, ou seja, mediante semelhantes condições de tempo, lugar e maneira de execução, os quais atingiram duas vítimas, elevo em 2/3 a pena-base, tornando-a definitiva em 6 anos e 8 meses de reclusão e 32 dias-multa. Deixo de considerar em favor da Ré, nesta última fase, o relativamente modesto valor total das apropriações, uma vez que, nas circunstâncias, essa valoração vem em seu desfavor, vez que estava a se apropriar daquilo que equivalia ao mínimo vital para as vítimas, em situação de miséria. O regime de cumprimento será o inicial semiaberto, a despeito da primariedade. diante da gravidade do contexto, já analisada na primeira fase, e da letra do art. 33, § 2º, b, do CP. Diante do montante de reprimenda aplicada, não há que se falar em substituição ou suspensão da pena. Ante o exposto, sem digressões, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a ação penal ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO e o faço para CONDENAR a Ré SANDRA APARECIDA DA SILVA, por incurso no art. 312, § 1º, c/c art. 71, caput (por oito vezes), ambos do CP, à pena privativa de liberdade de 06 anos e 8 meses de reclusão, a ser cumprida no regime inicial semiaberto, e 32 dias-multa, cada qual no mínimo legal. Ainda, nos termos do art. 92, I, alíneas a e b, do CP, uma vez que a pena aplicada é superior a quatro anos e, além disso, o crime foi

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