Página 59 do Diário de Justiça do Estado do Paraná (DJPR) de 18 de Dezembro de 2018

Federal n.º 8.080/1990). Daí dispor o art. 35, inciso VII, da referida Lei Federal n.º 8.080/1990 o seguinte: "Art. 35. Para o estabelecimento de valores a serem transferidos a Estados, Distrito Federal e Municípios, será utilizada a combinação dos seguintes critérios, segundo análise técnica de programas e projetos: (...) VII - ressarcimento do atendimento a serviços prestados para outras esferas de governo". Justamente por isso não se há de falar em litisconsórcio passivo necessário com a União Federal. A esse respeito, inclusive, o STJ decidiu, sob o rito dos recursos repetitivos, que "O chamamento ao processo da União com base no art. 77, III, do CPC (art. 130, inc. III, do NCPC), nas demandas propostas contra os demais entes federativos responsáveis para o fornecimento de medicamentos ou prestação de serviços de saúde, não é impositivo, mostrando-se inadequado opor obstáculo inútil à garantia fundamental do cidadão à saúde" (Tema n.º 686, 1.ª Seção, REsp. n.º 1.203.244/SC, Rel. Min. Herman Benjamin, j. em 09.04.2014). Inexistem, assim, motivos a ensejar a remessa deste processo à Justiça Federal para os fins da Súmula 150 do STJ. Rejeita-se a preliminar. II.a.3) Da alegada impossibilidade jurídica do pedido A apelante alega ser juridicamente impossível o pedido formulado na vestibular por configurar indevida ingerência do Poder Judiciário em face do Poder Executivo. Essa tese diz com o mérito da ação, e será, portanto, adiante analisada. II.b) Do mérito É de se consignar, inicialmente, que o STJ afetou o REsp. n.º 1.657.156/RJ ao rito dos recursos repetitivos, fixando, como tese controvertida, a "Obrigatoriedade do poder público de fornecer medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS" (Tema n.º 106). O julgamento desse recurso especial ocorreu em 24.04.2018, com o posterior acolhimento, em 12.09.2018, de embargos de declaração para esclarecer que "A concessão dos medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS exige a presença cumulativa dos seguintes requisitos: (i) Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS; (ii) incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito; (iii) existência de registro do medicamento na Anvisa, observados os usos autorizados pela agência" (1.ª Seção, Rel. Min. Benedito Gonçalves). Essa decisão teve seus efeitos modulados no sentido de que os critérios e requisitos estipulados somente deverão ser exigidos para os processos distribuídos a partir da publicação do respectivo Acórdão, em 04.05.2018. Assim, os efeitos dessa decisão não alcançam os processos distribuídos até então, como é o caso deste, cuja distribuição ocorreu em 25.09.2015 (mov. 3.0). Dito isso, os documentos acostados aos autos (mov. 1.3, p. 4 e mov. 1.6, pp. 8/9), firmados por médico especialista, demonstram que o interessado é portador de "Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (CID 10 F90)", necessitando, para o tratamento dessa doença, do medicamento "Ritalina 10mg (Metilfenidato)". Da justificativa médica consta que "no Brasil, só existe o Metilfenidato para o tratamento de TDAH", havendo, ademais, "diversos relatos na literatura (...) da efetividade da substância do déficit de atenção com hiperatividade". Extrai-se, ainda, que caso não realize tratamento com o fármaco pleiteado, o interessado "continuará com baixo rendimento escolar e com distúrbios de comportamento". Isso basta para se aferir a necessidade do medicamento solicitado, pois o fato de não se encontrar inserido nos Programas do Sistema Único de Saúde (SUS), seus Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas, não impede o direito à sua obtenção e não significa, por si só, que não é garantia de cura ou de melhor qualidade de vida. Predominando em casos que tais o direito fundamental à vida e à saúde (CF, arts. 6.º e 196), este Tribunal vem reiteradamente decidindo que a medicina é ciência que não trabalha com soluções únicas ou absolutas. Os Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas, como fundamento para indeferir o fornecimento de medicamentos, são genéricos e podem não representar a melhor alternativa, sendo digno de maior confiança o diagnóstico e a prescrição realizados pelo médico que atende o paciente, seja ele do SUS ou particular. Esta Câmara, aliás, de há muito decidiu que, "Comprovado por atestado médico que o impetrante deve fazer uso do medicamento solicitado, certo é que tem ele direito líquido e certo a que este lhe seja fornecido pelo Estado" (MandSeg. n.º 662.652-2, Rel. Juiz Eduardo Sarrão, j. em 27.07.2010). O Superior Tribunal de Justiça, no mesmo rumo, já proclamou que "Eventual ausência do cumprimento de formalidade burocrática não pode obstaculizar o fornecimento de medicação indispensável à cura e/ou a minorar o sofrimento de portadores de moléstia grave que, além disso, não dispõem dos meios necessários ao custeio do tratamento" (2.ª Turma, RMS n.º 11.129/PR, Rel. Min. Francisco Peçanha Martins, j. em 02.10.2001). E ainda: "O argumento de que, por não constar da lista do SUS, não deve ser fornecido o medicamento pleiteado pela agravada, não exime a parte agravante do dever constitucionalmente previsto" (1.ª Turma, AgInt. no REsp. n.º 1.268.641/PR, Rel. Min. Sérgio Kukina, j. em 07.02.2017). E não há ofensa ao princípio constitucional da separação dos Poderes pela falta de dotação orçamentária, isto é, indevida ingerência do Judiciário nos negócios da Administração Pública. Segundo José Afonso da Silva, "a saúde, como direito público subjetivo, representa uma prerrogativa jurídica indisponível assegurada à generalidade das pessoas e é decorrência indissociável do direito fundamental à vida, que constitui a fonte primária de todos os demais bens jurídicos, devendo ser resguardada de modo concreto e efetivo, na forma prevista pela Carta Constitucional, regendo-se pelos princípios da universalidade e da igualdade de acesso às ações e serviços que a promovem, protegem e recuperam" (SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 19.ª ed. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 808). E essa perspectiva mais abrangente, do enfoque constitucional dos direitos e deveres envolvidos no caso concreto, afasta a discricionariedade dos atos administrativos, permitindo a chamada "judiciabilidade das políticas públicas". Rodolfo de Camargo Mancuso, a propósito do tema, leciona que "no plano das políticas públicas, onde e quando a Constituição Federal estabelece um fazer, ou uma abstenção, automaticamente fica assegurada a possibilidade de cobrança dessas condutas comissiva ou omissiva, em face da autoridade e/ou órgão competente, como, por exemplo, se dá em caso de descumprimento das normas tuteladoras do meio ambiente (...)" (MANCUSO, Rodolfo de Camargo. A ação civil pública como instrumento de controle judicial das chamadas políticas públicas, in Ação civil pública, obra conjunta, coordenação de Édis Milaré. Ed. São Paulo: RT, 2001, p. 726). Por isso, a 4.ª Câmara Cível deste Tribunal já decidiu que "Não há dúvidas de que a Administração deve se acautelar no fornecimento de remédios, porém, isso não pode servir de amparo para a prestação deficiente do serviço que lhe compete, em razão da suposta inviabilização do sistema. O direito à vida e, de forma indissociável, o direito à saúde, são direitos fundamentais garantidos constitucionalmente, nos arts. 5.º e 6.º, caput, da Constituição Federal. Trata-se do direito primordial dos cidadãos, sem o qual de nada servem as demais garantias constitucionais. Assim, não pode ser admitida, sob qualquer justificativa, a negativa de fornecimento de medicamento necessário a preservá-la. A sua realização não se refere a um poder discricionário, e sim atuação administrativa vinculada. Ausência de violação ao princípio da separação de poderes. A inexistência de previsão orçamentária também não justifica a recusa ao fornecimento do remédio, posto que uma vez que existe o dever do Estado, impõe-se a superação deste obstáculo através dos mecanismos próprios disponíveis em nosso ordenamento jurídico" (ApCvReex. n.º 311.119-7, Rel. Juiz Conv. Luís Espíndola, j. em 30.05.2006). A propósito do tema, as Câmaras de Direito Público desta Corte (4.ª e 5.ª) editaram o Enunciado n.º 29 com o seguinte verbete: "A teoria da reserva do possível não prevalece em relação ao direito à vida, à dignidade da pessoa humana e ao mínimo existencial, não constituindo óbice para que o Poder Judiciário determine ao ente político o fornecimento gratuito de medicamentos"2. Além disso, o Estatuto da Criança e do Adolescente prevê, em seu art. 11, caput e § 2.º, que "É assegurado atendimento integral à saúde da criança e do adolescente, por intermédio do Sistema único de Saúde, garantido o acesso universal e igualitário às ações e serviços para promoção, proteção e recuperação da saúde", de modo que "Incumbe ao Poder Público fornecer gratuitamente àqueles que necessitarem os medicamentos, próteses e outros recursos relativos ao tratamento, habilitação ou reabilitação". Ademais, em parecer elaborado ao mov. 17.1, o Núcleo de Apoio Técnico (NAT) deste Tribunal concluiu que "as diferentes apresentações do Metilfenidato apresentam a mesma efetividade e segurança no tratamento medicamentoso da TDAH, sendo a droga de primeira escolha no tratamento deste transtorno". Tampouco há necessidade de comprovação da hipossuficiência, já que a declaração acostada ao movimento 1.3, p. 2, atesta a impossibilidade financeira da genitora do interessado em adquirir o medicamento solicitado. Aliás, se assim não fosse, o Ministério Público não teria intercedido em seu favor. Com relação aos honorários advocatícios, a sentença recorrida se encontra em consonância com o Enunciado n.º 02 das Câmaras de Direito Público (4.ª e 5.ª) desta Corte, segundo o qual, "Em sede de ação civil pública, a condenação do Ministério Público ao pagamento de honorários advocatícios somente é cabível na hipótese de comprovada e inequívoca má-fé; dentro de absoluta simetria de tratamento e à luz da interpretação sistemática do ordenamento jurídico, não pode o 'parquet' beneficiarse dessa verba, quando for vencedor na ação civil pública"3. As custas processuais são devidas pelo ente municipal em razão da sucumbência. Nessas condições, impõe-se negar provimento à apelação e confirmar a sentença recorrida em sede de reexame necessário. Por fim, com fundamento no princípio da cooperação (CPC, art. 14), reforça-se a determinação contida na sentença recorrida no sentido de que o interessado apresente, a cada cento e oitenta dias, relatório médico atualizado ao órgão estatal fornecedor do fármaco, para o fim de verificar a necessidade de continuar a utilizá-lo e também para melhor controle do gasto público. III -DISPOSITIVO ACORDAM os magistrados integrantes da Quinta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em rejeitar as preliminares e, no mérito, negar provimento à apelação, confirmando-se a sentença recorrida em sede de reexame necessário. Acompanharam o voto do Relator os Desembargadores Nilson Mizuta e Carlos Mansur Arida. Presidiu o julgamento o Desembargador Nilson Mizuta, com voto. Curitiba, 11.12.2018 Des. Xisto Pereira -Relator.

0005 . Processo/Prot: 1719802-8 Apelação Cível

. Protocolo: 2017/199439. Comarca: Uraí. Vara: Juízo Único. Ação Originária: 000XXXX-29.2010.8.16.0175 Ordinária. Apelante: Município de Jataizinho.

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