Página 410 da Caderno Jurisdicional do Tribunal de Justiça do Diário de Justiça do Estado de Santa Catarina (DJSC) de 20 de Maio de 2019

as partes, a cláusula de reserva de domínio é válida e eficaz desde a celebração do contrato escrito. Sendo válida e eficaz, entre as partes, a cláusula de reserva de domínio, tem-se que as quatro máquinas objeto desta demanda em momento algum passaram a ser de propriedade da sociedade falida e, por conseguinte, da apelada. Conforme dispõe o art. 521, do CC, na compra e venda com pacto adjeto de reserva de domínio, o vendedor reserva para si a propriedade da coisa vendida até o pagamento integral do preço pelo comprador, transferindo-se, até a quitação, somente a posse. No caso, não tendo sido pago integralmente o preço, as máquinas nunca pertenceram à compradora. Somente integram a massa falida objetiva os bens do patrimônio do devedor. É apenas em relação a estes que os credores da falida têm expectativa legítima, quanto à arrecadação e liquidação para pagamento de seus créditos. A massa falida, objetiva ou subjetiva, não é terceiro, para fim do art. 522, do CC. Logo, a ela é oponível a cláusula de reserva de domínio, ainda que o contrato não tenha sido objeto de registro. (...) Aplica-se à hipótese, mutatis mutandis, o mesmo racional já firmado pelo c. STJ quanto à desnecessidade do registro de contrato de alienação fiduciária de bens móveis fungíveis para que se aplique, a estes, o art. 49, § 3º, da Lei n. 11.101/05 (concernente à recuperação judicial), reconhecendo-se a propriedade do credor fiduciário (ao qual se equipara expressamente, naquele dispositivo legal, o vendedor no contrato de compra e venda com reserva de domínio) e a consequente extraconcursalidade do crédito, a despeito da inexistência do registro. Confira-se: [...] 3.1. A constituição da propriedade fiduciária, oriunda de cessão fiduciária de direitos sobre coisas móveis e de títulos de crédito, dá-se a partir da própria contratação, afigurando-se, desde então, plenamente válida e eficaz entre as partes. A consecução do registro do contrato, no tocante à garantia ali inserta, afigura-se relevante, quando muito, para produzir efeitos em relação a terceiros, dando-lhes a correlata publicidade. [...] 3.4. [...] Assentado que está que o direito creditício sobre o qual recai a propriedade fiduciária é de titularidade (resolúvel) do banco fiduciário, este bem, a partir da cessão, não compõe o patrimônio da devedora fiduciante a recuperanda, sendo, pois, inacessível aos seus demais credores e, por conseguinte, sem qualquer repercussão na esfera jurídica destes. Não se antevê, por conseguinte, qualquer frustração dos demais credores da recuperanda que, sobre o bem dado em garantia (fora dos efeitos da recuperação judicial), não guardam legítima expectativa. [...] 5. Recurso especial provido, para restabelecer a decisão de primeiro grau que acolheu a impugnação apresentada pelo Banco recorrente, para excluir dos efeitos da recuperação judicial seu crédito, garantido pela cessão fiduciária.” (REsp 1.412.529 / SP, 3ª T., Rel. para acórdão Min. Marco Aurélio Bellizze, j. em 17.12.2015). O Min. Raul Araújo, do C. STJ, já teve oportunidade de apreciar a questão especificamente quanto a bem objeto de contrato de compra e venda com reserva de domínio não registrado, esposando o mesmo entendimento aqui exposto por este Relator: [...] Deveras, a Suscitante não demonstra, cabalmente, qualquer modificação do estado de fato da causa capaz de, após incerta superação do óbice da coisa julgada, afastar a regra do 49, § 3º, da Lei 11.101/2005 que exclui o credor titular da posição de proprietário fiduciário ou de proprietário em contrato de venda com reserva de domínio dos efeitos da recuperação judicial. Com efeito, em arrimo de sua tese, defende que decisões do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais e do Juízo da Recuperação Judicial (nas fls. 255 e 275) concluíram que ‘o crédito da Simisa Simioni Metalúrgica Ltda. deve se sujeitar aos efeitos da recuperação judicial da Suscitante’, uma vez que o contrato de compra e venda com reserva de domínio não foi levado a registro no domicílio do devedor, conforme disposto nos artigos 521 e 522 do Código Civil’, que, a seguir, são transcritos: Art. 521. ‘Na venda de coisa móvel, pode o vendedor reservar para si a propriedade, até que o preço esteja integralmente pago.’ Art. 522. ‘A cláusula de reserva de domínio será estipulada por escrito e depende de registro no domicílio do comprador para valer contra terceiros.’ Todavia, a análise do teor dos dispositivos transcritos produz conclusão distinta, a de que a cláusula de reserva de domínio depende de registro no domicílio do comprador apenas para valer contra terceiros, mas, por óbvio independe do mesmo registro para valer contra os próprios contratantes, até mesmo porque sempre um deles (no caso, o promovente da busca e apreensão) é o próprio proprietário fiduciário. (CC 139897, Rel. Min. Raul Araújo, decisão monocrática proferida em 30.04.2015.) Deste Julgador: RECUPERAÇÃO JUDICIAL. CONTRATO COM GARANTIA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE BEM IMÓVEL. IMPUGNAÇÃO REJEITADA ANTE A AUSÊNCIA DE REGISTRO DO TITULO NO CARTÓRIO DE TÍTULOS E DOCUMENTOS. AGRAVO DO IMPUGNANTE. RETIFICAÇÃO DO QUADRO DE CREDORES IMPERIOSA. CONTRATO COM GARANTIA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE BEM IMÓVEL QUE NÃO SE SUBMETE AOS EFEITOS DA RECUPERAÇÃO E PRESCINDE DO REGISTRO NO CARTÓRIO DE REGISTRO DE TÍTULOS E DOCUMENTOS. PRECEDENTES DO STJ E DESTA CÂMARA. Ao passo que o crédito com garantia fiduciária não se sujeita ao plano de recuperação judicial (art. 49, § 3º, da Lei nº 11.101/05), o registro do instrumento particular, no Cartório de Registro de Títulos e Documentos do domicílio da recuperanda, apenas é necessário para ser oponível para terceiros, não entre as partes, razão pela qual sua ausência não enseja obrigatoriamente a sua submissão ao plano de recuperação judicial. AGRAVO A QUE SE DÁ PROVIMENTO. (Agravo de Instrumento nº 400XXXX-54.2017.8.24.0000, de Lages, rel. Des. Gilberto Gomes de Oliveira, j. 21.03.2019, com a participação dos Des. Túlio Pinheiro e Jaime Machado Junior). Nestes termos, de rigor o provimento do agravo, haja vista que os contratos com garantia de alienação fiduciária ou com reserva de domínio, caso dos autos, não se submetem aos efeitos da recuperação judicial. A despeito disto, e malgrado a recuperanda tenha subsidiariamente defendido que o caminhão objeto da pactuação são essenciais à atividade que desenvolve (transporte) - o que é, aparentemente, natural -, tal discussão não pode vir a tona neste momento. Primeiro, porque a decisão do magistrado a quo não se debruçou sobre a matéria, razão pela qual constituiria flagrante inovação recursal. Segundo, porque o objeto da impugnação é restrito à exclusão do crédito da impugnante do quadro geral de credores, arrolado que foi na classe quirografária, tendo em vista não se submeter aos efeitos da recuperação judicial, na forma do art. 49, § 3º, da Lei nº 11.101/05. Desta feita, se se trata de bem essencial ou não à recuperanda, tal discussão deverá ser suscitada e esquadrinhada no bojo da própria recuperação judicial, oportunidade em que se averiguará se o prazo de blindagem, por exemplo, já se findou ou se foi prorrogado ou, se terminantemente findo, há alguma excepcionalidade no caso concreto, nos termos da jurisprudência do STJ. Para colorir: É sedimentada, ademais, a jurisprudência mitigando o rigor do prazo de suspensão das ações e execuções, que poderá ser ampliado em conformidade com as especificidades do caso concreto; de modo que, em regra, uma vez deferido o processamento ou, a fortiori, aprovado o plano de recuperação judicial, é incabível o prosseguimento automático das execuções individuais, mesmo após transcorrido o referido lapso temporal (REsp nº 1.212.243-SP, rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJe de 29.09.2015). Nestes e nos termos da jurisprudência deste Tribunal e da Corte Superior, na forma do art. 932, V, do CPC e art. 132, XVI, do Regimento Interno deste Tribunal, dá-se provimento ao agravo para se julgar procedente a impugnação oposta pela DAF Caminhões Brasil Indústria Ltda. contra Transportadora Telles Ltda. para se reconhecer que, como o contrato de fls. 41/43 dos autos de origem é garantido por reserva de domínio, não se submete ele ao quadro geral de credores, na forma do art. 49, § 3º, da Lei nº 11.101/05. A análise da essencialidade ou não do bem objeto da contratação deverá ser feita em momento oportuno pelo juízo da recuperação. Decorrência da procedência da impugnação, a recuperanda-impugnada responde por custas e honorários que, na forma do art. 85 do CPC, ante a simplicidade do caso, são fixados em R$ 10.000,00. Publiquese. Intimem-se. Comunique-se, de imediato, o magistrado de origem. Com o trânsito em julgado, arquive-se com a devida baixa. Cumpra-

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