Página 1929 do Diário de Justiça do Distrito Federal (DJDF) de 30 de Julho de 2019

submissão excessiva e desproporcional, apatia; além da restrição do acesso à água limpa e a presença de grande quantidade de fazes secas nos pelos e nas gaiolas, indicando que a limpeza do local e dos animais não era adequada. Além do relatório que, repito, foi elaborado pela profissional que acompanhou os policiais no flagrante, há, ainda, todos os demais documentos médicos comprovando que a grande maioria dos 32 cães apreendidos teve que ser submetida à análise e tratamentos veterinários, por força das patologias apresentadas. Os documentos de fls. 17/79 foram atestados por vários profissionais que corroboram o conteúdo do relatório produzido no momento do flagrante. Dentre os trinta e dois cães apreendidos, vinte e sete necessitaram de cuidados e análise clínica, sendo certo que um cão macho, da raça Yorkshire Terrier, veio a óbito. (fls. 25/79) Nesse sentido, não há falar em desentranhamento do laudo por não ter sido assinado por dois peritos. Ao contrário, o relatório de fls. 14/16 foi convalidado com os diagnósticos produzidos pelos profissionais que subscreveram os documentos acostados às fls. 17/79, os quais ostentam, inclusive, fotos detalhadas dos casos mais evidentes de maus tratos. O fato de alguns documentos médicos terem sido assinados dias após o flagrante, somente reforça a conclusão de que algumas patologias eram mais severas a ponto de demandarem cuidados médicos mais longos. A propósito, sobre os relatórios médicos, o fato de policiais da área de proteção animal, veterinários e integrantes de ONG's dedicadas à causa animal estabelecerem interlocução em redes socis não afasta a idoneidade dos pareceres e diagnósticos produzidos. Não há, aqui, qualquer suspeição. Ao contrário, é natural e salutar que profissionais e ativistas de causa tão nobre - como é o caso - compartilhem informações e integrem uma mesma rede de iniciativas de proteção aos animais. O fato é que as provas produzidas pela acusação não foram desconstituídas pela defesa, a despeito de todo o preparo intelectual e sofisticação argumentativa demonstrados pelos advogados. É que os relatórios do veterinário Guido Antônio Domingues, acostados às fls. 157/159, não esclarecem absolutamente as condições às quais os cães eram submetidos. A uma, porque os atestados de fl. 158 e 159 foram emitidos em 2015, quase dois anos antes dos fatos, ao passo que o atestado de 157 ostenta data posterior aos fatos, época em que, inclusive, os animais já haviam sido apreendidos. A duas, porque, em seu depoimento, o veterinário revelou que costumava ir à casa da ré somente para vacinar os cães e que normalmente ficava apenas na parte da frente do imóvel e, esporadicamente, ia aos fundos da residência, exatamente onde ficavam os animais. Informou, ainda, que não mantinha o prontuário dos cães que eram vacinados. (fls. 137 e verso). Ora, o relato desse profissional é por demais lacunoso a ponto de colocar em risco a robustez do material probatório produzido pela acusação. Nesse sentido, soou meramente retórica sua assertiva de que esteve na casa da ré em 15 de junho para vacinar alguns animais, os quais aparentavam bom estado. O mesmo se pode afirmar em relação aos atestados sanitários de fls. 174/176, assinados pelo veterinário Guido Antônio Domingues em 2017. As demais testemunhas arroladas pela defesa tampouco esclareceram as condições às quais os cães eram submetidos no período em que ocorreu o flagrante. Por fim, não é crível a hipótese ventilada pela defesa de que os animais podem ter sofrido lesões após o seu recolhimento, eis que tal suposição contraria o conjunto probatório produzido neste feito. Quanto à autoria, de igual forma, o acervo probatório colacionado aos autos, tanto na Delegacia de Polícia, como em Juízo, é uníssono e convergente no sentido de demonstrar ser a acusada responsável pela prática delituosa a ela imputada. A testemunha Jeison Pabulo Andrade afirmou que "(...) ao chegar à residência da denunciada, se identificou como policial, bem como teve a sua entrada franqueada ao imóvel pelo companheiro da denunciada; que a denunciada também estava no local; que foi conduzido pela denunciada até os fundos da residência onde encontrou várias gaiolas; (...) que a denunciada disse que os animais estavam temporariamente alocados na referidas gaiolas, enquanto era realizada limpeza do quintal; (...) que, por ser uma situação característica de maus-tratos, conduziram a denunciada à delegacia para registro da ocorrência policial; (...)" - (fls. 133/134) Ademais, em seu interrogatório, a acusada reconheceu que os cães apreendidos eram de sua propriedade. Vejamos: "(...) que tinha trinta e dois cachorros e somente comercializava os filhotes; (...) que reconhece as fotos de fls. 12/13 como sendo a sua residência; que, quando utilizava as jaulas, colocava até seis cachorros em cada uma; que, no dia da apreensão, algumas jaulas tinham

até seis cachorros; que reconhece os aparatos de fls. 12/13 como de sua propriedade e utilizados no manejo dos animais; (...) que cria os cachorros como hobbie; que a sua casa não é conhecida como canil; que apenas comercializa os cães a partir de indicação de conhecidos; que utiliza a renda com a venda dos filhotes para os cuidados dos seus cães; (...)" Por todo o exposto, não se pode afastar a autoria e materialidade criminosas em relação ao delito mencionado, em face das provas constantes dos autos, as quais se revelaram contundentes o suficiente para embasar o decreto condenatório. As provas testemunhal e documental, sobretudo as fotografias e relatórios elaborados por profissionais da área (médicos veterinários), corroboraram a formação do convencimento desta julgadora, não havendo qualquer elemento concreto apto a invalidar tais provas. Por fim, deve-se esclarecer que não há elementos nos autos que permitam imputar à acusada a prática do delito de maus tratos agravada pela morte de animal, prevista no § 2º do artigo 32, da Lei nº 9605/98, como requerido pelo assistente de acusação Projeto de Adoção São Francisco. À vista do exposto, JULGO PROCEDENTE A PRETENSÃO PUNITIVA ESTATAL deduzida na denúncia, para condenar ANTÔNIA MARY GOMES DE SOYZA, devidamente qualificada nos autos, como incursa nas penas do artigo 32, caput, da Lei nº 9.605/98. PASSO À INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA. A conduta merece reprovação, pois a ré tinha consciência e agiu com vontade dirigida à prática delituosa, o que revela a sua culpabilidade. A ré não registra maus antecedentes. Não há elementos que permitam traçar as características de sua personalidade, tampouco a adequação de sua conduta social. As circunstâncias e motivos do crime são aqueles comuns ao tipo penal em questão e não agravaram a conduta e tampouco resultaram em consequências mais gravosas. Por fim, para o delito em questão, não há que se falar em comportamento da vítima. Considerando as circunstâncias judiciais que são completamente favoráveis à ré e, sendo necessária e suficiente para reprovação e prevenção do crime, aplico a pena-base no mínimo cominado em abstrato, ou seja, 03 (três) meses de detenção. No segundo estágio de aplicação da pena, à míngua de circunstâncias agravantes e/ou atenuantes, mantenho a reprimenda em 03 (três) meses de detenção, estabilizando-a neste patamar em razão da ausência de causas de aumento e diminuição. Quanto à pena pecuniária, cabe destacar que, por força do que dispõe o artigo 18, da Lei nº 9.605/98, a pena de multa será calculada segundo os critérios do Código Penal. Na primeira fase, condeno a ré ao pagamento de 10 (dez) dias-multa, devendo cada dia-multa ser calculado à razão de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época do fato, devidamente corrigido (artigo 49 do CP), à míngua de maiores elementos sobre a capacidade financeira da ré, estabilizandoa neste patamar em virtude da ausência de circunstância agravante e/ou de causas de aumento ou diminuição da pena. Com fundamento no artigo 33, § 2º, alínea c, do Código Penal, prescrevo-lhe o regime prisional aberto. À vista do permissivo contido no artigo da Lei nº 9605/98, considerando que a condenada preenche os requisitos legais, substituo a pena privativa de liberdade por uma restritiva de direitos, na forma a ser estabelecida pela Vara de Execuções Penais. A ré não foi presa cautelarmente pelos fatos narrados nestes autos, razão pela qual não há que se falar na detração estabelecida na Lei 12.736/2012. Por força do artigo 387, § 1º, do Código de Processo Penal e, consoante artigo 313, após as alterações introduzidas pela Lei nº 12.403/2011, verifica-se que não estão presentes os requisitos para a prisão preventiva da acusada nem para a imposição de qualquer outra medida cautelar, motivo pelo qual poderá recorrer em liberdade, se por outro motivo não estiver preso. Deixo de fixar valor mínimo para a reparação do prejuízo causado à vítima, nos termos do artigo 387, inciso IV do Código Penal, tendo em vista que não houve exercício do contraditório a respeito. Condeno a ré ao pagamento das custas processuais. Eventual causa de isenção deverá ser apreciada pelo Juízo da Execução Penal. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Após o trânsito em julgado, expeça-se carta de guia e oficie-se ao Tribunal Regional Eleitoral para os fins previstos no artigo 15, III, da Constituição da República. Em seguida, remetam-se os autos ao Ministério Público para que se manifeste acerca dos animais apreendidos, descritos no auto de apresentação e apreensão de fl. 10 Taguatinga/DF, 24 de junho de 2019. Gláucia Falsarella Pereira Foley Juíza de Direito .

CERTIDAO

Figura representando 3 páginas da internet, com a principal contendo o logo do Jusbrasil

Crie uma conta para visualizar informações de diários oficiais

Criar conta

Já tem conta? Entrar