Página 2750 da Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte III do Diário de Justiça do Estado de São Paulo (DJSP) de 6 de Agosto de 2020

FERES PAIXÃO (OAB 186458/SP), BRUNA VITOR DA CÂMARA SANTOS (OAB 313035/SP)

Processo 100XXXX-64.2017.8.26.0625 - Procedimento Comum Cível - Perdas e Danos - Alexandre Marcos Caçador - Juliane Cristina Carvalho Santos - VISTOS. Autor: ALEXANDRE MARCOS CAÇADOR Suma do pedido: condenação da ré a promover a transferência cadastral de veículo que lhe vendeu e do pagamento da dívida referentes as multas por infrações de infrações de trânsito no valor de R$ 297,95, além de indenização por danos morais, no importe de R$ 5.000,00 por seu nome ter sido inserido no Cadin e pelas pontuações negativas no prontuário de sua CNH. Pede a antecipação da tutela. Ré: JULIANE CRISTINA CARVALHO DOS SANTOS Síntese da defesa: revel Principais ocorrências: emenda à inicial; indeferimento da antecipação da tutela; citação postal; respostas a requisição de informações. É o relatório (CPC/15, art. 489, I) DECIDO. I - A ausência de resposta, pese a regular citação, importa na adoção das drásticas conseqüências preconizadas pelo art. 344 do CPC/15, presumindo-se verdadeiros os fatos articulados na inicial, notadamente aquilo que diz respeito à realidade da compra e venda de automotor (veículo Fiat Uno, placas CYG-0407) em 23/08/2010. Acentua-se porém que a revelia importa tão-somente em reconhecimento de veracidade dos fatos afirmados e não reconhecimento de procedência do pedido. II.a Admitindo-se que a ré adquiriu o veículo do demandante, incumbia-lhe promover a transferência do veículo, tal como estampado no art. 123, § 1º do Código de Trânsito Brasileiro: “No caso de transferência de propriedade, o prazo para o proprietário adotar as providências necessárias à efetivação da expedição do novo Certificado de Registro de Veículo é de trinta dias, sendo que nos demais casos as providências deverão ser imediatas”. Logo, ao adquirente é atribuído o dever de tomar as providências para a transferência de titularidade do automóvel. II.b Todavia, interessa lembrar o que estampa o art. 134 do Código de Trânsito Brasileiro: “No caso de transferência de propriedade, o proprietário antigo deverá encaminhar ao órgão executivo de trânsito do Estado dentro de um prazo de trinta dias, cópia autenticada do comprovante de transferência de propriedade, devidamente assinado e datado, sob pena de ter que se responsabilizar solidariamente pelas penalidades impostas e suas reincidências até a data da comunicação”. É dizer: ao vendedor é atribuído o ônus de comunicar ao órgão de trânsito a alienação, no prazo de trinta dias, sob a cominação de ser havido como responsável solidário por sanções derivadas de infrações de trânsito. Se a lei expressa essa solidariedade, não pode o autor dela pretender livrar-se. A propósito, já se decidiu que: “Alienado veículo automotor sem que se faça o registro, ou ao menos a comunicação da venda, estabelece-se, entre o novo e o antigo proprietário, vínculo de solidariedade pelas infrações cometidas, só afastadas quando é o Detran comunicado da alienação, com a indicação do nome e endereço do novo adquirente”. O demandante concorreu para o resultado danoso com sua própria omissão. II.c Assim e em princípio, se autor e ré não se desincumbiram de ônus que lhes tocava, a solução que alvitra este Juízo é a de reconhecimento de situação análoga à de culpa concorrente, visto que ambos concorreram para o resultado danoso, como aliás já foi proclamado em precedente. Como são idênticas as condutas omissivas e com mesma eficiência contribuíram para o dano, em tese, eventual indenização haveria de ser rateada, cabendo à ré o pagamento de metade do montante que seria devido. III Entretanto, uma particularidade da espécie afasta a possibilidade de identificação de culpa: a inicial não afirma que à ré foi entregue o documento de transferência com o indispensável reconhecimento de firma por autenticidade. Em consonância, vê-se que o autor declarou que não foi localizado registro de reconhecimento de firma no Tabelionato que (disse) habitualmente utilizava (fls. 44) e por requisição do Juízo também não foi encontrado esse ato nos demais tabelionatos de Taubaté (fls. 324/344). Sem esse documento a demandada não poderia (nem que quisesse) ter promovido a alteração cadastral, desincumbindo-se do dever de que trata o art. 123, § 1º, do Lei nº 9.503/97 (Código de Trânsito Brasileiro). Por corolário, não há “culpa” que lhe seja atribuível. E isso afasta o dever de indenizar, ainda que mitigado. IV.a Tendo-se em mente que a ré não dispunha do documento necessário, a apreciação da pretensão se desloca da hipótese de imposição de obrigação de fazer (a transferência cadastral) para a de interpretação do pedido por aquilo que nele está implícito, ou seja, o reconhecimento da existência da relação jurídica para que sirva o provimento declaratório como suporte para registro no órgão de trânsito. Nesse ponto a revelia exerce decisivamente seu efeito e admite-se que seja veraz a alegação de que foi tratada compra e venda do veículo (ainda que com intermediação de terceiro fls. 15), com transmissão da posse direta em 10/9/2010. IV.b Enfatiza-se que a sentença puramente declaratória limita-se a conferir o valor segurança ao reconhecimento de existência de determinada relação jurídica. Não é imposta condenação a agir ou deixar de agir, muito menos a terceiro (como o é o Estado-Administração). Assim, não é “determinado” ao órgão de trânsito a obrigação de promover a transferência cadastral. Apenas passa a dispor o autor de provimento jurisdicional que torna certa a existência da compra e venda, franqueando que seja requerida a prática do ato. Será expedida carta de sentença. V.a É relevante reiterar (fls. 25) que o provimento não dispõe de eficácia retroativa, como não o seria a própria condenação postulada. O efeito é ex nunc, muito embora reconheça que o negócio jurídico aconteceu em certo momento passado. Demais disso, a legislação de trânsito não autoriza que eventuais penalidades por infrações às regras de circulação sejam “transferidas”. V.b Inacolhível dessarte a pretensão de imposição de condenação à ré para “transferir pontuação” negativa lançada em seu desfavor para registro no prontuário da CNH. Independentemente de ser ou não a ré a responsável pela infração, a obrigação pretendida é inexequível, porque não pode ainda que quisesse praticar ato capaz de produzir o resultado. O prazo para esse fim está escoado faz muito (CTB, art. 257, § 7º). Frisa-se que não se tem aqui hipótese de pretensão deduzida também em desfavor da Fazenda Pública, para que promova essa “transferência” por força de provimento que reconheça que o autor não cometeu a infração e não existe situação de solidariedade. V.c Repete-se: é injurídico pretender-se impor ordem a órgão interno da estrutura do Executivo Estadual em demanda na qual não figuram como parte (nem o Estado), tanto mais quando não há nenhuma indicação de que estejam a cometer ato ilegal ou abusivo. A Fazenda Pública não é parte e não pode ser compelida a abdicar de crédito e/ou transferi-lo a outrem. Ademais, a modificação de propriedade cadastral não opera com efeito retroativo, de modo que a “dívida” é reclamável pela Administração àquele que figura como responsável. Note-se: “compete à Administração Pública o controle das multas decorrentes de infração de trânsito, bem assim a renovação de carteira nacional de habilitação, de modo que o pedido de transferência de pontuação das multas impostas administrativamente não pode ser objeto de análise nestes autos, uma vez que o órgão competente não compõe o pólo passivo da presente ação”. VI É passível de acolhimento a pretensão cumulada de condenação ao pagamento (em reembolso) ao autor daquilo que lhe é imputado a título de multa por violação às regras de circulação. Admitido que a ré recebeu a posse do automóvel em 10/9/2010 é intuitivo que, independentemente da solidariedade em relação ao Estado, a ré é responsável pela satisfação de multa que sobreviessem a essa data. Na hipótese, os documentos de fls. 17/22 noticiam a concorrência de débito de R$ 297,95 advindo de multas por infrações cometidas em data posterior à venda. Ressalta-se que não há pedido certo e determinado para satisfação de eventuais impostos não solvidos. Mercê do princípio da adstrição é vedada a imposição de condenação a respeito. VIIPor fim e como alerta para evitar eventual aplicação da sanção preconizada pelo art. 1.026, § 2º, do Código de Processo Civil/15, enfatiza-se que a despeito da redação de seu art. 489, § 1º, com anova lei não houve substancial modificação na ideia de que “o órgão julgador não está obrigado a se manifestar sobre todos os argumentos colacionados pelas partes para expressar o seu convencimento, bastando, para tanto, pronunciar-se de forma geral sobre as questões pertinentes para a formação de sua convicção”, de modo que “desde que os fundamentos adotados sejam bastantes para justificar o concluído na decisão, o órgão jurisdicional não está obrigado a rebater, um a um, todos os argumentos utilizados pela parte”. Em paralelo, lembra-se que “a contradição que autoriza os embargos

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