Página 716 do Diário de Justiça do Distrito Federal (DJDF) de 7 de Agosto de 2020

Também alega a autora a decadência do direito de rever administrativamente o ato de concessão da pensão. Invoca, para tanto, o art. 54 da lei 9784/99, que prevê prazo decadencial de cinco anos para que a Administração anule atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários, salvo comprovada má-fé. Na situação em análise, a revisão administrativa não incidiu sobre o ato de concessão da pensão temporária, e sim sobre o pagamento de proventos mensais recebidos indevidamente, no período compreendido entre 12/04/2007 a 30/06/2016. Com razão a embargante ao defender a aplicabilidade do art. 54 da lei 9.784/99, por se tratar de norma especial em relação ao art. 114 da lei 8.112/90, que trata da revisão dos atos ilegais da administração de forma genérica, vale dizer, quando dele não decorrerem efeitos favoráveis aos administrados, o que não é o caso. Sucede que o prazo decadencial mencionado só se aplica nas hipóteses em que não seja comprovada a má-fé do destinatário do ato, o que não é o caso da embargante. Na verdade, o que ensejou a decisão do TCDF que determinou a devolução dos proventos recebidos foi o fato de ter ela convivido com uma pessoa em união estável e não ter efetuado a respectiva comunicação ao Poder Público. Patente, assim, a sua má-fé no recebimento das verbas, de forma que não incide qualquer prazo decadencial sobre o direito de revisão do ato pela Administração No tocante à alegação de que a pretensão da embargada está parcialmente fulminada pela prescrição quinquenal, convém registrar que o Supremo Tribunal Federal recentemente manifestou-se recentemente sobre o tema no Recurso Extraordinário 636886/ AL (tema 899), fixando a seguinte tese: ?É prescritível a pretensão de ressarcimento ao erário fundada em decisão de Tribunal de Contas.? No voto vencedor, restou assentado que o prazo prescricional de tais pretensões é regulado pelos arts. 174 do Código Tributário Nacional e 40 da lei 6.830/80, Lei de Execução Fiscal. Com isso, impõe-se o reconhecimento de que a ação para cobrança do crédito em questão prescreve em cinco anos, contados da sua constituição definitiva, vale dizer, da data em que o acórdão do Tribunal de Contas do Distrito Federal tornouse imutável na esfera administrativa, pois neste momento considera-se formado o título executivo extrajudicial. Como a decisão proferida pelo TCDF é datada de 14/12/2017 (id. 34522644, pag. 14), e a execução fiscal foi ajuizada em 14/01/2019, não há que se cogitar de prescrição da pretensão ressarcitória. Aliás, o raciocínio esposado pelo embargante sequer se aplica ao presente caso, uma vez que constituído o título executivo englobando todos proventos recebidos irregularmente, a prescrição tem como termo inicial a data da sua constituição, seguindo a sistemática prevista pelo CTN para constituição e cobrança do crédito tributário. Enfrentadas todas as preliminares arguidas, passo à análise do mérito propriamente dito. Quanto às alegações de cerceamento de defesa na formação do título e nulidade do processo administrativo por violação ao contraditório e à ampla defesa, argumenta a embargante que não lhe foi apresentada a fundamentação do acórdão de improcedência do pedido de reforma da decisão, o que teria impossibilitado a elaboração e protocolo do recurso cabível tempestivamente. Afirma ainda que o TCDF dificultou o exercício do seu direito de defesa, ao condicioná-la ao comparecimento físico da embargante no local para prestar esclarecimentos, bem como não apresentou dados acerca do valor da condenação e respectivos encargos, além de outras informações relevantes. Neste ponto, a embargante não trouxe aos autos qualquer comprovação dos argumentos tecidos. Verifico, inicialmente, que foi concedido a ela prazo de vinte dias para comparecer ao IPREV/DF a fim de prestar os esclarecimentos devidos, conforme id. 34522495, prazo suficiente para que ajustasse seus compromissos pessoais a fim de atender ao chamado. Ademais, a embargante apresentou defesa hígida no processo administrativo, manifestando-se sobre o mérito das imputações. Verifique-se que as informações não poderiam ser passadas por outro meio que não o presencial porque o acesso ao processo era restrito, por conter informações pessoais (id. 34522576). Além disso, as impressões de tela constantes das páginas 16 e 17 da inicial demonstram apenas que a embargante foi encaminhada à SEPLAV/DF para que fosse disponibilizado o seu acesso ao processo. Saliento que a alegação de cerceamento de defesa, bem como a nulidade do processo administrativo por violação ao contraditório e ampla defesa, demandam prova cabal tanto do fato em si quanto do prejuízo sofrido. Como a embargante não trouxe aos autos cópia integral dos autos do processo em que foi formado o título, e tampouco demonstração da negativa em disponibilizar cópia de peças processuais, não ficaram demonstrados os fatos constitutivos do seu direito. Ressalto que eventual falta de acesso a dados referentes à evolução da dívida e seus encargos na esfera administrativa não traria, a princípio, qualquer prejuízo, pois a sua defesa deveria versar sobre a imputação de manutenção de união estável concomitante com o recebimento da pensão. Quanto à alegação de que a decisão do TCDF não pode ser considerada título executivo, melhor sorte não lhe socorre. Ainda que o art. 71, § 3º, da CF/88 faça alusão somente ao TCU, o seu art. 75 dispõe que as normas estabelecidas nesta seção aplicam-se, no que couber, à organização, composição e fiscalização dos Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal, bem como dos Tribunais e Conselhos de Contas dos Municípios. Assim, a Constituição Federal confere expressamente força de título executivo às decisões de que decorra imputação de débito proferidas por Tribunais de Contas estaduais, municipais ou distrital. Também sustenta a embargante que a cobrança é indevida, porque ela preenchia todos os requisitos dispostos em lei à época da sua concessão. Sem razão. De acordo com a lei 3373/58, em seu art. , inciso II, parágrafo único, a pensão em tela é temporária, e devida somente a filhas solteiras, que perderão o benefício se, após os 21 anos, vierem a ocupar cargo público permanente. Com isso, por interpretação a contrario sensu, as beneficiárias que se casarem automaticamente perdem o direito ao benefício, ainda que não ocupem cargo público permanente. Ainda que a embargante não tenha se casado, passou a conviver com outra pessoa em união estável (o que é incontroverso nos autos), o que se equipara ao casamento, na forma do art. 226, § 3º, da CF/88. A tese de irrepetibilidade de verba alimentar em razão da boa-fé da embargante igualmente não prospera. Não existe controvérsia nos autos quanto ao fato de que ela conviveu em união estável com outra pessoa quando era pensionista, o que não se coaduna com a alegação de boa-fé, haja vista que a lei que embasa o pagamento da pensão é clara ao dispor que apenas filhas solteiras podem receber a pensão temporária. Lado outro, é de conhecimento público que a união estável se equipara ao casamento para todos os efeitos, razão pela qual não se sustenta a alegação de que ela desconhecia o direito aplicável à espécie. Está clara, assim, a má-fé da embargante no recebimento dos proventos. A jurisprudência deste e. TJDFT é pacífica neste sentido, senão vejamos: APELAÇÕES CÍVEIS. DIREITO PREVIDENCIÁRIO E DIREITO CIVIL. AÇÃO REVISIONAL DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. PREJUDICIAIS DE DECADÊNCIA E PRESCRIÇÃO REJEITADAS. PRESTAÇÕES SUCESSIVAS. REDUÇÃO DO BENEFÍCIO PELA ENTIDADE PREVIDENCIÁRIA. FUNCEF. ERRO DE CÁLCULO. LEGALIDADE. DESCONTOS RETROATIVOS. IMPOSSIBILIDADE. VERBA DE NATUREZA ALIMENTAR. IRREPETIBILIDADE. RESTITUIÇÃO SIMPLES. MÁ-FÉ NÃO COMPROVADA. DANOS MORAIS. INOCORRÊNCIA. SENTENÇA MANTIDA. 1. O prazo decadencial do art. 178 do Código Civil não se aplica quando a entidade previdenciária não promoveu a anulação do negócio jurídico, mas tão somente a revisão do benefício pago mensalmente à participante, sob a alegação de erro de cálculo. 2. De acordo com a súmula 427 do STJ, o prazo prescricional aplicável para a pretensão concernente à revisão de benefício de aposentadoria complementar é quinquenal; todavia, tratando-se de prestações sucessivas, a prescrição não atinge o fundo de direito. 3. A FUNCEF, ao enviar ofício à participante com quadro demonstrativo da evolução correta do benefício saldado, cumpriu seu ônus de demonstrar a razão que ensejou o recálculo do benefício. 4. Diante da constatação do erro de cálculo que resultou no valor originário do benefício, é possível a revisão do valor, porquanto entendimento contrário albergaria enriquecimento ilícito da participante. 4.1. Não há razão para se falar em ato jurídico perfeito que acarretaria a imutabilidade do valor do benefício, visto que é dever da entidade avaliar a correção dos valores pagos, bem como é imperioso que resguarde o equilíbrio financeiro e atuarial, podendo efetuar a revisão de acordo com o regulamento do plano. 5. Apesar de ser possível a revisão do benefício, não é cabível que a entidade previdenciária exija do participante a restituição de todos os valores recebidos a maior por erro de cálculo exclusivo da FUNCEF. 5.1. Isto porque, além de a participante não ter concorrido para o erro e ter recebido os valores de boa-fé, a verba tem natureza alimentar, sendo, portanto, irrepetível. 5.2. O ressarcimento dos descontos retroativos a ser feito pela entidade previdenciária deve ser na forma simples, uma vez que não foi demonstrada a má-fé, requisito este indispensável para a repetição em dobro, consoante entendimento do STJ (AgInt no REsp 1336998/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 12/11/2019, DJe 26/11/2019). 6. As contribuições extraordinárias que a participante alega ter vertido para a entidade não se destinaram a suprir o déficit causado pelo pagamento a maior do próprio benefício, mas sim para equacionamento de outros déficits apurados. 6.1. Logo, tais contribuições extraordinárias pagas pela participante não refutam o direito da entidade de revisar e até mesmo reduzir, com base nas regras de cálculo do benefício previstas em regulamento próprio, o valor pago. 7. Não havendo conduta ilícita por parte da entidade previdenciária, não há razão para pleitear indenização por danos morais. 8. Prejudiciais de mérito rejeitadas. Recursos conhecidos e não providos. Honorários recursais majorados. (Acórdão 1255817, 07212597420198070001, Relator: ROBERTO FREITAS, 3ª Turma Cível, data de julgamento: 9/6/2020, publicado no DJE: 26/6/2020. Pág.: Sem Página Cadastrada.) CIVIL E FAMÍLIA. AÇÃO MONITÓRIA.

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