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Associações - Ed. 2023

Associações - Ed. 2023

5.1. A Liberdade de Associação Como Direito Individual

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Sumário:

O tema dos direitos fundamentais é explorado pelo pensamento jurídico nas mais diversas direções. Partindo-se do pressuposto de que nos direitos fundamentais se encontram os alicerces da ordem jurídica, a tarefa de revelar as diferentes gerações, dimensões e perspectivas desses direitos apresenta-se como um meio para poder se extrair a maior eficácia jurídica possível desses direitos.

Neste capítulo, objetiva-se expandir a liberdade de associação como direito subjetivo, tomando em conta não apenas a liberdade individual de associação como também os direitos da própria associação constituída.

Vale ressaltar que a opção de, neste capítulo, tratar da liberdade de associação privilegiando as perspectivas subjetivas não exclui o caráter objetivo desse direito fundamental. 1

Para tratar dessa perspectiva subjetiva da liberdade de associação, pode-se perceber a existência de um complexo direito de associação, assim qualificado por comportar múltiplas dimensões, 2 especificamente: a) as dimensões individual e institucional; b) as dimensões interna e externa; c) as dimensões positiva e negativa.

Como direito fundamental individual, a liberdade de associação envolve o direito de se associar (liberdade de constituir uma nova associação ou de aderir a uma associação previamente constituída) e, em sua dimensão negativa, o direito de não se associar (e, por exemplo, de não ser compelido a arcar com contribuições associativas de organizações das quais não se faz parte).

Em sua dimensão institucional, a liberdade de associação envolve a ampla possibilidade de organização interna da associação, de escolha do subtipo associativo que seja mais adequado para o desenvolvimento de atividades associativas e o direito à personificação “se a atribuição de subjectividade jurídica, sem condicionalismos arbitrários ou excessivos, for o meio mais idôneo para a prossecução de fins”. 3

Na dimensão interna, destacam-se as relações jurídicas que se constituem entre a associação e os associados. Por sua vez, na dimensão externa, a liberdade de associação projeta-se nos inúmeros atos e atividades que podem ser desenvolvidos por estas organizações e, também, pela razoável imunidade que essas organizações gozam sobre as ingerências estatais.

Sob este viés, a liberdade de associação envolve não apenas as situações jurídicas garantidas às pessoas que desejam se associar ou deixar de se associar, mas também as situações jurídicas titularizadas pela associação tida como uma entidade (expressão aqui em sentido amplíssimo e, portanto, não correspondente à noção tradicional de pessoa jurídica) que não se confunde com os seus associados.

Em todas essas dimensões (individual e institucional/interna e externa), verificam-se situações jurídicas ativas e passivas. O exemplo mais claro disso, já antes ressaltado, se dá com a reconhecida diferença entre a liberdade de se associar (dimensão positiva) e a liberdade de não se associar (dimensão negativa).

Assim, para tratar da liberdade de associação na perspectiva subjetiva, o tema será didaticamente organizado nos itens seguintes que correspondem, por sua vez, às diferentes dimensões antes explicadas.

5.1. A liberdade de associação como direito individual

Na perspectiva de um direito subjetivo individual, a liberdade de associação encontra uma vinculação sistemática com as liberdades políticas e, especialmente, com a liberdade de opinião.

A real possibilidade de elaborar opiniões, de fixar estas opiniões e mantê-las ao longo do tempo, bem como de transmiti-las com a maior amplitude possível, desempenha-se em considerável medida pelo direito subjetivo de constituir e de participar de uma associação.

Segue-se, nesse particular, o entendimento de Konrad Hesse que, a despeito de referenciar o seu pensamento no direito positivo alemão, apresenta ideias integralmente aplicáveis ao direito brasileiro: “a liberdade de associação é pressuposto essencial da formação de uma opinião ‘pública’, da ‘formação preliminar da vontade política’, da oportunidade igual da minoria e de um processo político”. 4

Na perspectiva de direito subjetivo individual, portanto, sobressai no direito de associação sua autêntica característica de liberdade individual, uma vez que imantizada com o princípio maior de autodeterminação e responsabilidade da pessoa humana.

Não se trata do exercício de uma liberdade decorrente da liberdade de iniciativa, pelo menos nas associações em sentido estrito. Esta é uma das razões pelas quais, adiante, defende-se inadequado atribuir uma natureza jurídica contratual às associações sem fins econômicos (assunto explorado no capítulo VI, item 6.1.1).

Como direito subjetivo individual, a liberdade de associação estende-se tanto numa perspectiva positiva (liberdade de se associar) quanto numa perspectiva negativa (liberdade de não se associar ou, ainda, de deixar uma associação).

5.1.1. A liberdade de associação em sua vertente individual positiva

A liberdade de associação em sua vertente individual positiva abrange, pelo menos, dois poderes: o poder de constituição de uma associação e o poder de adesão a uma associação previamente constituída.

Para exercer o poder de constituição de uma associação, no entanto, mostra-se necessária a união de, pelo menos, duas pessoas. O entendimento predominante é de que não se mostra necessário um número mínimo de sujeitos (para além de dois) para constituir uma associação. 5

Há um debate sobre a possibilidade de se reconhecer a liberdade de associação (por exemplo, em sentido positivo) em favor das pessoas jurídicas. Noutras palavras: seria garantido às pessoas jurídicas o direito de se associar?

No direito italiano, por força de interpretação literal do art. 18 da Constituição italiana, 6 há quem defenda que a liberdade de associação se restringe à união entre cidadãos , excluindo a possibilidade de abrangência dessa garantia à união entre pessoas jurídicas, numa reafirmação da relação indissociável entre associação e comunidade. 7

Entre nós, Pontes de Miranda posiciona-se no sentido de limitar a liberdade de associação exclusivamente às pessoas físicas, como uma decorrência direta da Declaração de Direitos do Homem. 8

Não deve haver dúvidas de que a união em associação corresponde a uma garantia estabelecida em razão das necessidades humanas. Como defendido antes, a liberdade de associação em última análise, reflete a liberdade de autodeterminação responsável do ser humano. Por consequência lógica, sua justificativa primária reside nas liberdades humanas.

Ocorre que, atualmente, muitas necessidades humanas só podem ser adequadamente alcançadas mediante a união de outras organizações menores, ou seja, por meio de uma associação de associações , também chamadas de associações híbridas.

Os exemplos são inúmeros. Pense-se em uma associação entre sociedades empresárias com o objetivo de discutir e desenvolver soluções para a atuação em determinado setor do mercado. A abrangência da atuação de uma associação entre sociedades empresariais pode ser muito maior do que a abrangência de uma associação apenas entre os empresários individuais. Reflita-se sobre uma associação para proteção dos direitos humanos. Os contornos de uma associação entre as diversas outras associações defensoras do mesmo objetivo podem ser muito diferentes de uma união entre ativistas políticos não organizados.

Nesses termos, não se justifica a limitação da união em associação apenas aos seres humanos. Conforme observa Tamburrino, nas associações de associações, a base criativa continua a residir no indivíduo, ainda que sua expressão se dê coletivamente, mediante órgãos. 9

Na atualidade, restringir a liberdade associativa à união entre pessoas naturais significa excluir uma série de importantíssimas manifestações associativas em razão de um individualismo que não é justificável e que, em última análise, acaba resultando em limitações às aspirações legitimamente organizadas.

A liberdade de constituição das associações, ainda, deve ser compatibilizada com os diversos subtipos associativos previstos pelo legislador.

5.1.2. Existiria um direito de ingresso numa associação?

A garantia da liberdade de associação em sentido positivo quando apresentada como a possibilidade de aderir a uma associação previamente constituída conduz a uma outra questão: como lidar com as situações em que uma associação veda o ingresso de uma pessoa física ou jurídica?

Existiria um direito de se associar?

A resposta, em princípio, é negativa. Nenhuma associação, numa primeira análise, poderia ser compelida a aceitar alguém como associado. Uma resposta absoluta a respeito do assunto, todavia, mostra-se insuficiente.

Diante da amplitude de possibilidades de organização interna, utilizando-se da distinção verificável nas sociedades anônimas, pode-se dizer que podem existir associações abertas e associações fechadas, conforme seja mais ou menos personalíssima a posição de associado.

O direito italiano, imerso na compreensão de que o ato constitutivo da associação seria um contrato associativo, procura resolver a questão pela lente do direito dos contratos. As associações, assim, poderiam estruturar-se como contratos abertos em que o número de associados não seria predeterminado e, por consequência, novos sujeitos poderiam aderir àquele contrato numa adesão sucessiva à organização previamente constituída.

Sob o manto do direito contratual, aquele que desejasse participar de uma associação encaminharia uma “proposta” que poderia ser aceita ou não. Inexistiria, portanto, um direito de participação em associações, por mais que os estatutos estruturassem a entidade de maneira aberta.

Referidas cláusulas estatutárias, segundo Francesco Galgano, seriam voltadas para proteger os interesses dos atuais associados e, em princípio, não serviriam para sustentar um efeito perante terceiros não associados de participar da associação. 10

Em obra clássica sobre o tema no direito italiano, Domenico Rubino defende que “a associação pode normalmente recusar o ingresso de um ou outro sujeito: e, assim, significa que a manifestação de vontade deste último deve ser aceita pela associação, a cada vez, com um oportuno ato”. 11

A questão sobre um direito de participação numa associação, todavia, como antes explicado, não se esgota em uma resposta peremptória. Há que se avaliar o subtipo associativo, a estrutura organizacional interna à associação e o papel desenvolvido pela específica associação em questão.

Considerando o subtipo associativo dos sindicatos , por exemplo, seria possível defender um direito do trabalhador pertencente a uma determinada categoria de participar de uma associação sindical (art. 8.º da CF).

Já em relação à estrutura organizacional interna da associação, o modelo das associações em geral no direito civil (art. 53 do CC brasileiro) cria uma presunção relativa de que as associações seriam fechadas pela intransmissibilidade da posição de associado: “Art. 56. A qualidade de associado é intransmissível, se o estatuto não dispuser o contrário”.

O mesmo Código Civil , no entanto, reconhece que esta é uma questão que diz respeito à organização interna que se adota em cada associação. O art. 54, nesse sentido, estabelece que “Art. 54. Sob pena de nulidade, o estatuto das associações conterá: (...) II – os requisitos para a admissão, demissão e exclusão dos associados”.

Na hipótese de, a contrario sensu do art. 56 do CC , estabelecer-se nos estatutos que a qualidade de associado é transmissível, por exemplo, o regular ato de transmissão (em vida ou após a morte) em favor de um determinado sujeito conferiria a este um direito de participação, um direito de acesso aos quadros da associação.

Por fim, considerando o papel desenvolvido por algumas associações, merece especial atenção o tema de um direito de participação em associações que, não obstante sua feição de direito privado, acabam …

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jusbrasil.com.br
5 de Junho de 2024
Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/doutrina/secao/541-a-liberdade-de-associacao-e-os-limites-para-o-controle-estatal-54-a-liberdade-de-associacao-em-sua-dimensao-externa-associacoes-ed-2023/1804174163