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23 de Maio de 2024
  • 2º Grau
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Detalhes

Processo

Partes

Publicação

Julgamento

Relator

Allan Titonelli Nunes

Documentos anexos

Inteiro Teor1b57b49b9919ef37f712d1a537677ff3.pdf
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Inteiro Teor

TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DO RIO DE JANEIRO

ACÓRDÃO

RECURSO ELEITORAL (11548) - XXXXX-86.2020.6.19.0090 - Volta Redonda - RIO DE JANEIRO

RELATOR: DESEMBARGADOR ELEITORAL ALLAN TITONELLI NUNES

RECORRENTE: SILVANA APARECIDA DOS SANTOS

Advogados da RECORRENTE: RICARDO GONCALVES PINTO - RJ80033-A, JULIO PRUDENTE NOGUEIRA - RJ156563-A

EMENTA

ELEIÇÕES 2020. RECURSO ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA DESAPROVADA NA ORIGEM. CANDIDATA A VEREADOR. DOAÇÃO ESTIMÁVEL EM DINHEIRO A CANDIDATO DO MESMO PARTIDO. VALOR PROVENIENTE DO FEFC E DESTINADO À COTA FEMININA. IRREGULARIDADE GRAVE. DEVOLUÇÃO DOS RECURSOS AO TESOURO NACIONAL. DESPROVIMENTO DO RECURSO.

1. Recurso eleitoral contraposto à sentença que desaprovou as contas da candidata, que concorreu ao cargo de vereador nas eleições de 2020, por irregularidade consistente na doação estimável em dinheiro de recurso proveniente do FEFC especificamente reservado à cota feminina em favor de candidato do mesmo partido (PSL).

2. Conforme determinado pelo STF na ADPF Nº 738, com aplicação nas eleições de 2020, os incentivos às candidaturas políticas de pessoas negras deve observar o percentual mínimo do FEFC e ser calculado separadamente, no âmbito de cada gênero.

3. Tal norma de decisão passou a ter aplicabilidade e eficácia erga omnes a partir de 25/09/2020, com a publicação do ato judicial no Diário da Justiça Eletrônico (DJE nº 236), na forma do art. 102, § 1º, da CRFB/88 e dos arts. , §§ 1º e , da Lei nº 9.882/99.

4. Inexistência de lacuna jurídica a autorizar a pretendida aplicação por analogia do art. 17, § 6º, da Resolução TSE nº 23.607/2019, em face de regra expressa e específica

regulamentando a matéria, estabelecida na ADPF nº 738 em 24/09/2020, portanto, antes da data em que realizada a doação pela candidata recorrente, em 11/11/2020.

5. Norma de decisão do STF atualmente positivada nos §§ 4º e 6º do art. 17 da Resolução TSE nº 23.607/2019, que expressamente consignam que o percentual de recursos do FEFC destinado a candidatos negros difere do montante reservado a candidaturas de mulheres negras, a depender da proporção de negros (as) e não negros (as) em cada gênero, em um mesmo partido político.

6. A teor do § 2º do art. 16-D da Lei nº 9.504/97 e do § 10 do art. 17 da Resolução TSE nº 23.607/2019, compete exclusivamente à agremiação partidária - e não à candidata por ato próprio - receber e distribuir recursos públicos oriundos do FEFC.

7. Expressividade do montante doado irregularmente que perfaz 10,21% da movimentação financeira global da campanha, suficiente para afastar o emprego dos postulados da razoabilidade e proporcionalidade.

8. Doação irregular que frustra a finalidade precípua da ação afirmativa da cota de gênero, materializada na aplicação obrigatória e exclusiva de valores provenientes do FEFC, no percentual mínimo de 30% (trinta por cento), no fomento das candidaturas femininas, ex vi dos arts. 17, § 8º, da CRFB/88 e 17, § 4º, inciso I, da Resolução TSE nº 23.607/2019.

9. Irregularidade grave passível de desaprovação das contas, resultando em obrigação de devolução de valores ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 17, § 9º, da Resolução TSE nº 23.607/2019, tal como determinado na sentença recorrida.

10. Recurso eleitoral DESPROVIDO, confirmando-se a sentença de desaprovação das contas da campanha da recorrente e mantendo-se a ordenação de estorno da quantia de R$ 5.107,00 (cinco mil cento e sete reais) ao Tesouro Nacional.

ACORDAM OS MEMBROS DO TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DO RIO DE JANEIRO, NOS TERMOS DA DECISÃO QUE SEGUE:

POR UNANIMIDADE, DESPROVEU-SE O RECURSO, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR.

RELATÓRIO

Trata-se de recurso eleitoral interposto por SILVANA APARECIDA DOS SANTOS, candidata ao cargo de vereador nas eleições de 2020 no Município de Volta Redonda/RJ, contra a sentença proferida pelo Juízo da 90a Zona Eleitoral (ID XXXXX), que, à vista do repasse irregular de recursos oriundos do FEFC, julgou desaprovadas as suas contas de campanha e determinou a devolução ao Tesouro Nacional do valor de R$ 5.107,00 (cinco mil cento e sete reais).

Na sentença, consignou o magistrado a quo que a candidata repassou recursos do FEFC destinados às campanhas femininas ao candidato Wesley da Silva Freitas, em inobservância ao art. 17 da Resolução TSE nº 23.607/2019, o que configura irregularidade grave apta a atrair a desaprovação das contas.

Em suas razões recursais (ID XXXXX), a recorrente defende a regularidade da doação em questão, destacando os seguintes argumentos:

"(i) a concreta efetivação de ações afirmativas no sentido de privilegiar a participação política de pessoas negras, não restringindo, onde a norma não restringiu, o repasse a esses candidatos;

(ii) a ausência de previsão em resolução que tratasse dos valores referentes à cota racial, bem como ausência de norma que a limitasse;

(iii) e, por fim, aplicação dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade diante da boa-fé, tanto do donatário quanto da doadora, como também do valor ínfimo aplicado pelas doadoras na campanha do Recorrente."

Menciona a decisão proferida pelo STF em setembro de 2020 na ADPF nº 738, que determinou a aplicação dos incentivos às candidaturas negras nas eleições 2020, ressaltando que a matéria não foi regulamentada em tempo hábil pelo TSE, motivo pelo qual a candidata, em aplicação analógica do art. 17, § 6º, da Resolução TSE nº 23.607/2019, realizou doação apenas para candidatos negros do mesmo partido.

Destaca, finalmente, que há possibilidade de aplicação dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade e que não praticou qualquer ato jurídico que pudesse resultar em abuso de poder econômico, agindo com total transparência, lisura e lealdade no pleito eleitoral.

Sob tal ótica, requer o provimento do recurso para julgar aprovadas as contas, ainda que com ressalvas, bem como para afastar a determinação de devolução do valor ao Tesouro Nacional.

Mediante o parecer de ID XXXXX, a Procuradoria Regional Eleitoral oficia pelo desprovimento do recurso.

É o relatório.

VOTO

Conforme relatado, o Juízo da 90a Zona Eleitoral julgou desaprovadas as contas de Silvana Aparecida dos Santos, candidata a vereador no Município de Volta Redonda/RJ nas eleições de 2020.

No presente recurso, a candidata, em síntese, sustenta que o repasse efetuado em benefício do candidato Wesley da Silva Freitas, no montante de R$ 5.107,00 (cinco mil cento e sete reais), encontra respaldo na efetivação das ações afirmativas que privilegiam a participação política de candidatos negros.

Ademais, menciona a decisão proferida pelo STF na ADPF nº 738, que determinou a observância dos incentivos às candidaturas negras nas eleições de 2020, ressaltando que a matéria não havia sido regulamentada em tempo hábil pelo TSE, motivo pelo qual a candidata, em aplicação analógica do art. 17, § 6º, da Resolução TSE nº 23.607/2019, realizou doações apenas para candidatos negros do mesmo partido.

Por tais razões, requer a aprovação das suas contas de campanha, ainda que com ressalvas.

Não assiste razão jurídica à recorrente.

O TSE, capitaneado pelo voto do Relator da Consulta nº XXXXX-47.2019.6.00.0000, Min. Luís Roberto Barroso, respondeu afirmativamente o quesito pertinente à possibilidade de determinar-se o custeio proporcional das campanhas dos candidatos negros com recursos do FEFC, nos seguintes termos:

"(...). Os recursos públicos do Fundo Partidário e do FEFC e o tempo de rádio e TV devem ser destinados ao custeio das candidaturas de homens negros na exata proporção das candidaturas apresentadas pelas agremiações".

Por maioria de votos, o TSE modulou a produção inicial dos efeitos do julgamento para as eleições de 2022, o que deu causa ao ajuizamento no STF pelo Partido Socialismo e Liberdade da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 738, pretendendo o PSOL a concessão de medida cautelar para que os incentivos às candidaturas de pessoas negras incidissem já nas eleições de 2020, considerando "a contrariedade ao art. 16 da Constituição Federal e a necessidade imediata da implementação de medidas visando à alteração do reconhecido estado de coisas constitucional".

Em 09/09/2020, o Relator da ADPF nº 738, Min. Ricardo Lewandowski, deferiu a medida cautelar pleiteada pelo PSOL e determinou a imediata aplicação dos incentivos às candidaturas de pessoas negras, nos exatos termos da resposta do TSE à Consulta nº 600306- 47.2019, ainda nas eleições de 2020, consignando que "o TSE não promoveu nenhuma inovação nas normas relativas ao processo eleitoral, concebido em sua acepção mais estrita, porquanto não modificou a disciplina das convenções partidárias, nem os coeficientes eleitorais e nem tampouco a extensão do sufrágio universal", bem assim que a implementação dos incentivos não causaria prejuízo às agremiações políticas, sobretudo porque a propaganda eleitoral ainda não havia começado.

Verificada a necessidade de orientação acerca da forma adequada de dar-se cumprimento imediato à sua decisão, o Relator, sem prejuízo da regulamentação oportuna pelo TSE, em complementação à medida liminar deferida, estabeleceu em 24/09/2020 diretrizes de cunho obrigatório, a saber (com meus grifos):

"1. O volume de recursos destinados a candidaturas de pessoas negras deve ser calculado a partir do percentual dessas candidaturas dentro de cada gênero, e não de forma global. Isto é, primeiramente, deve-se distribuir as candidaturas em dois grupos - homens e mulheres. Na sequência, deve-se estabelecer o percentual de candidaturas de mulheres negras em relação ao total de candidaturas femininas, bem como o percentual de candidaturas de homens negros em relação ao total de candidaturas masculinas. Do total de recursos destinados a cada gênero é que se separará a fatia mínima de recursos a ser destinada a pessoas negras desse gênero;

2. Ademais, deve-se observar as particularidades do regime do FEFC e do Fundo Partidário, ajustando-se as regras já aplicadas para cálculo e fiscalização de recursos destinados às mulheres;

3. A aplicação de recursos do FEFC em candidaturas femininas é calculada e fiscalizada em âmbito nacional. Assim, o cálculo do montante mínimo do FEFC a ser aplicado pelo partido, em todo o país em candidaturas de mulheres negras e homens negros será realizado a partir da aferição do percentual de mulheres negras, dentro do total de candidaturas femininas, e de homens negros, dentro do total de candidaturas masculinas. (...);

4. A aplicação de recursos do Fundo Partidário em candidaturas femininas é calculada e fiscalizada em cada esfera partidária. Portanto, havendo aplicação de recursos do Fundo Partidário em campanhas, o órgão partidário doador, de qualquer esfera, deverá destinar os recursos proporcionalmente ao efetivo percentual (i) de candidaturas femininas, observado, dentro deste grupo, o volume mínimo a ser aplicado a candidaturas de mulheres negras; e

(ii) de candidaturas de homens negros. Nesse caso, a proporcionalidade será aferida com base nas candidaturas apresentadas no âmbito territorial do órgão partidário doador. A fiscalização da aplicação do percentual mínimo será realizada no exame das prestações de contas de campanha de cada órgão partidário que tenha feito a doação."

Na sequência, em observância a tais diretrizes, o TSE editou a Resolução nº 23.665/2021, que alterou a Resolução nº 23.607/2019, incluindo no art. 17 os §§ 4º, 5º-A, 6º, 7º e 10:

"§ 4º Para o financiamento de candidaturas femininas e de pessoas negras os partidos devem destinar os seguintes percentuais do montante recebido do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) (STF: ADI nº 5.617/DF, DJE de 3.10.2018, e ADPF- MC nº 738/DF, DJE de 29.10.2020; e

TSE: Consulta nº 0600252-18, DJE de 15.8.2018, e Consulta nº 0600306-47, DJE de 5.10.2020):

I - para as candidaturas femininas o percentual corresponderá à proporção dessas candidaturas em relação a soma das candidaturas masculinas e femininas do partido, não podendo ser inferior a 30% (trinta por cento);

II - para as candidaturas de pessoas negras o percentual corresponderá à proporção de:

a) mulheres negras e não negras do gênero feminino do partido; e

b) homens negros e não negros do gênero masculino do partido; e

III - os percentuais de candidaturas femininas e de pessoas negras será obtido pela razão dessas candidaturas em relação ao total de candidaturas do partido em âmbito nacional.

(...).

§ 5º-A A regularidade da aplicação mínima dos percentuais mencionados nos incisos I e II do § 4º deste artigo será apurada na prestação de contas do diretório nacional do partido político.

§ 6º A verba do Fundo Especial de Financiamento das Campanhas (FEFC) destinada ao custeio das campanhas femininas e de pessoas negras deve ser aplicada exclusivamente nestas campanhas, sendo ilícito o seu emprego no financiamento de outras campanhas não contempladas nas cotas a que se destinam.

§ 7º O disposto no § 6º deste artigo não impede: o pagamento de despesas comuns com candidatos do gênero masculino e de pessoas não negras; a transferência ao órgão partidário de verbas destinadas ao custeio da sua cota- parte em despesas coletivas, desde que haja benefício para campanhas femininas e de pessoas negras.

(...).

§ 10. Os recursos correspondentes aos percentuais previstos no § 4º deste artigo devem ser distribuídos pelos partidos até a data final para entrega da prestação de contas parcial."

Da leitura conjunta das diretrizes "1" e "3" fixadas pelo STF (ADPF nº 738) com os §§ 4º e 6º do art. 17 da Resolução TSE nº 23.607/2019, extrai-se claramente que as verbas do Fundo Especial de Financiamento de Campanha - FEFC destinadas ao fomento de candidaturas femininas não se confundem com as receitas destinadas às candidaturas de pessoas negras. Com efeito, os montantes destinados às candidaturas negras são calculados separadamente, no âmbito de cada gênero, feminino e masculino, ou seja, "do total de recursos destinados a cada gênero é que se separará a fatia mínima de recursos a ser destinada a pessoas negras desse gênero."

Outrossim, diferentemente do que defende a combativa defesa da recorrente, havendo regra expressa e específica regulamentando a matéria, estabelecida pelo STF na ADPF nº 738 em 24 de setembro de 2020, portanto antes da data em que realizadas as doações irregulares, em 11 de novembro de 2020 (ID XXXXX), não existe lacuna jurídica a ser colmatada por meio da aplicação analógica do § 6º do art. 17 da Resolução TSE nº 23.607/2019, invocado a pretexto de legitimar a doação realizada em favor da participação política de candidatos negros na campanha eleitoral de 2020.

A uma porque, como visto, o percentual destinado a candidaturas de pessoas negras difere daquele revertido para mulheres negras, a depender da proporção de negros (as) e não negros (as) em cada gênero do partido. A propósito, ressalta-se que, como esse parâmetro foi definido em complementação à medida cautelar inicialmente deferida nos autos da ADPF nº 738, desde 25/09/2020 (DJE nº 236), a norma de decisão do STF passou a ter aplicabilidade e eficácia contra todos, na forma do art. 102, § 1º, da CRFB/88 c/c os arts. , §§ 1º e , e 10, § 3º, da Lei nº 9.882/99, de modo que a posterior publicação, em 09/12/2021, da Resolução TSE nº 23.665/2021, observou o efeito vinculativo inerente às decisões proferidas em controle concentrado de constitucionalidade e regulamentou as diretrizes anteriormente fixadas pelo Pretório Excelso.

A duas porque o § 2º do art. 16-D da Lei nº 9.504/97 e o § 10 do art. 17 da Resolução TSE nº 23.607/2019 fixam exclusivamente no partido político - e não nos próprios candidatos - a incumbência e a responsabilidade de distribuir internamente os recursos do FEFC, do que decorre a manifesta e inequívoca irregularidade do fato da candidata Silvana Aparecida dos Santos, por ato próprio e discricionário, ter transferido ao candidato Wesley da Silva Freitas recursos do FEFC que lhe foram repassados pelo Diretório Nacional do PSL, destinados especificamente às candidaturas negras e femininas (ID XXXXX).

Por outro lado, estando caracterizada a irregularidade identificada na origem, não se aplicam no caso concreto os postulados da proporcionalidade e da razoabilidade, como pretendido pela recorrente.

Como se sabe, a jurisprudência atual do C. TSE chancela a aplicação dos aludidos postulados para viabilizar a aprovação com ressalvas das contas quando constatada a observância de três requisitos cumulativos: (i) a identificação de falhas que não comprometem a higidez do balanço (aspecto qualitativo); (ii) percentual ou valor inexpressivo do total irregular (aspecto quantitativo); e (iii) ausência de má-fé do prestador das contas (aspecto qualitativo) (REsp nº 060085315, Rel. Min. Benedito Gonçalves, DJE de 25/04/2022).

Quanto à delimitação do conteúdo (pressuposto) do conceito jurídico indeterminado "valor módico", o TSE adota como balizas, para as prestações de contas de candidatos, o valor máximo de R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) como espécie de 'tarifação do princípio da insignificância' como valor máximo absoluto entendido como diminuto". Demais disso, corrobora também com a aplicação dos postulados da proporcionalidade e da razoabilidade quando," ainda que superado o valor de 1.000 UFIRs, (...) o valor total das irregularidades não supera 10% do total da arrecadação ou da despesa. "(AgR-REspEL XXXXX-14, Rel. Min. Edson Fachin, DJE de 13/08/2020).

Na espécie, o valor de R$ 5.107,00 representa 10.21% da movimentação financeira da campanha da recorrente, o que demonstra, tanto sob o viés absoluto quanto relativo, a expressividade do montante em questão, a afastar a aplicação no caso dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, nos termos da jurisprudência do TSE:

"ELEIÇÕES 2018. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA. DEPUTADO ESTADUAL. CONTAS DESAPROVADAS. DOAÇÃO. CUSTEIO DE CANDIDATURA NÃO COLIGADA. VEDAÇÃO DO ART. 19, § 1º, DA RES.-TSE 23.553.SÍNTESE DO CASO

(...).

6. Este Tribunal Superior adota ‘como balizas, para as prestações de contas de candidatos, o valor máximo de R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) como espécie de 'tarifação do princípio da insignificância' como valor máximo absoluto entendido como diminuto e, ainda que superado o valor de 1.000 UFIRs, é possível a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade para aquilatar se o valor total das irregularidades não supera 10% do total da arrecadação ou da despesa, permitindo-se, então, a aprovação das contas com ressalvas’ (AgR-REspEL XXXXX-14, rel. Min. Edson Fachin, DJE de 13.8.2020).

7. Na espécie, depreende-se do acórdão regional que a irregularidade detectada corresponde à quantia de R$ 30.000,00 e que o candidato prestador das contas arrecadou o montante total de R$ 224.005,26, efetuando gastos que somam R$ 223.690,73, de maneira que a falha corresponde a 13,39% das receitas auferidas e 13,41% das despesas realizadas em campanha, o que inviabiliza a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, haja vista se tratar de valores expressivos em termos absolutos e percentuais.

CONCLUSÃO

Agravo regimental a que se nega provimento."

(Recurso Especial Eleitoral nº 0600745-38, Rel. Min. Sergio Banhos, DJE de 25/02/2022).

"ELEIÇÕES 2018. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA. DEPUTADO FEDERAL. DESAPROVAÇÃO. FALHAS GRAVES. COMPROMETIMENTO DA TRANSPARÊNCIA DO AJUSTE CONTÁBIL. SÚMULAS 24 E 30 DO TSE. DESPROVIMENTO.

(...).

2. O Tribunal Regional rejeitou as contas da candidata em razão de irregularidades graves; não apresentação de contratos e recibos de despesas contratadas; divergência de valores nos gastos sem justificativas para quantias pagas em excesso ou a menor; transferência de recursos do FC para outro candidato sem a indicação de benefício para a campanha própria; inconsistências entre a movimentação financeira declarada e a registrada nos extratos bancários; falha na compensação de cheques; gastos irregulares com recursos do FEFC, circunstâncias que não só exigem o reexame de fatos e provas para sua reforma, bem como afastam sobremaneira a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, diante do comprometimento da transparência do ajuste contábil.

3. A conformidade entre o entendimento do acórdão recorrido e a jurisprudência do TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL atrai a aplicação da Súmula 30 do TSE.

4. Agravo Regimental desprovido."

(AREspE nº 0607521-85, Rel. Min. Alexandre de Moraes, DJE de 04/08/2021).

No mesmo sentido, confira-se julgado recente deste Tribunal:

"ELEIÇÕES 2020. RECURSO ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA DESAPROVADA NA ORIGEM. CANDIDATO AO CARGO DE VEREADOR DO MUNICÍPIO DE VOLTA REDONDA. RECEBIMENTO DE DOAÇÕES ESTIMÁVEIS EM DINHEIRO DE CANDIDATAS. VALORES PROVENIENTES DO FEFC E DESTINADOS ÀS COTAS RACIAL E FEMININA. IRREGULARIDADE GRAVE. DEVOLUÇÃO DOS RECURSOS AO TESOURO NACIONAL. DESPROVIMENTO DO RECURSO. CONFIRMAÇÃO DA SENTENÇA.

1. Sentença de desaprovação das contas de campanha do candidato recorrente, que se autodeclara negro, com causa no recebimento de doações estimáveis em dinheiro, efetuadas por candidatas do mesmo partido (PSL), com recursos provenientes do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), especificamente destinados às cotas feminina e racial.

(...).

3. Na ADPF nº 738, o STF determinou a imediata aplicação, ainda nas eleições 2020, dos incentivos às candidaturas de pessoas negras, estabelecendo, em 24/09/2020, diretrizes cogentes quanto à forma adequada de cumprimento da decisão. Nestas orientações, consignou o Pretório Excelso que "o cálculo do montante mínimo do FEFC a ser aplicado pelo partido, em todo o país em candidaturas de mulheres negras e homens negros será realizado a partir da aferição do percentual de mulheres negras, dentro do total de candidaturas femininas, e de homens negros, dentro do total de candidaturas masculinas", donde se conclui que os montantes endereçados a candidaturas negras serão calculados separadamente, no âmbito de cada gênero.

(...).

5. Havendo regra expressa e específica regulamentando a matéria, estabelecida pelo STF na ADPF nº 738, em 24/09/2020, portanto antes das datas em que realizadas as doações recebidas pelo recorrente, em 11 e 12/11/2020, não existe lacuna jurídica a ser colmatada por meio da aplicação por analogia do § 6º do art. 17 da Resolução TSE nº 23.607/2019, invocado a pretexto de legitimar o recebimento irregular pelo candidato de recursos provenientes do FEFC.

6. Norma de decisão do STF atualmente positivada nos §§ 4º e 6º do art. 17 da Resolução TSE nº 23.607/2019, que expressamente consigna que o percentual de recursos do FEFC destinado a candidatos negros difere do montante reservado a candidaturas de mulheres negras, a depender da proporção de negro (as) e não negro (as) em cada gênero, em um mesmo partido político.

7. A teor do § 2º do art. 16-D da Lei nº 9.504/97 e do § 10 do art. 17 da Resolução TSE nº 23.607/2019, compete apenas ao partido político - e não ao candidato - receber e distribuir recursos públicos do FEFC, do que decorre a manifesta e inequívoca irregularidade das transferências diretas realizadas por ato voluntário das doadoras em benefício do recorrente, notadamente por se tratar de recurso a ser aplicado exclusivamente nas candidaturas femininas.

8. A jurisprudência atualmente consolidada no TSE chancela o emprego dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade para viabilizar a aprovação com ressalvas das contas de campanha eleitoral quando, somado à ausência de indícios de má-fé do prestador e de prejuízos à análise da regularidade da contabilidade (aspectos qualitativos), o valor das irregularidades é considerado módico (aspecto quantitativo).

9. O total das doações estimáveis em dinheiro recebido pelo prestador das contas ¿ R$ 5.379,00 (cinco mil trezentos e setenta e nove reais), valor

absoluto que corresponde a aproximadamente 74% das despesas movimentadas em campanha ¿ caracteriza importe que atinge percentual deveras elevado no montante global, abarcando igualmente valor absoluto expressivo, circunstâncias que impedem, quanto ao aspecto quantitativo, a aplicação concreta dos postulados da proporcionalidade e da razoabilidade, nos termos da jurisprudência do C. TSE.

10. Irregularidade que desatende também o aspecto qualitativo, pois a malversação dos recursos oriundos do FEFC decorre de violação às diretrizes cogentes estabelecidas pelo STF na ADPF nº 738 , que, como visto, são anteriores à implementação das doações em benefício do candidato.

(...).

13. Recurso desprovido, à vista do uso irregular de recursos do FEFC destinados à cota racial e feminina, confirmando-se a desaprovação das contas de campanha e determinação de devolução do valor de R$ 5.379,00 (cinco mil trezentos e setenta e nove reais) ao Tesouro Nacional."

(Recurso Eleitoral nº 060070887, Rel. Des. Tiago Santos Silva,DJE - DJE de 20/07/2022)

Por fim, em essência, a doação realizada irregularmente pela prestadora das contas frustra a finalidade precípua da ação afirmativa da cota de gênero, materializada na aplicação obrigatória e exclusiva de valores provenientes do FEFC, no percentual mínimo de 30% (trinta por cento), no fomento das candidaturas femininas, na forma dos arts. 17, § 8º, da CRFB/88 e 17, § 4º, inciso I, da Resolução TSE nº 23.607/2019.

Sendo assim, tem-se que a falha em questão decerto prejudica a regularidade das contas da candidata, independentemente da eventual boa-fé do donatário e da doadora, ora recorrente.

No mais, efetivamente caracterizada a irregularidade grave a resultar na desaprovação das contas, é de rigor a devolução pela recorrente ao Tesouro Nacional dos valores envolvidos, consectário legal do art. 17, § 9º, da Resolução TSE nº 23.607/2019, não havendo reparo a ser feito na sentença recorrida.

Ante o exposto, voto pelo DESPROVIMENTO do recurso eleitoral, confirmando-se a desaprovação das contas de campanha da candidata Silvana Aparecida dos Santos e a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional do valor de R$ 5.107,00 (cinco mil cento e sete reais), nos termos da sentença de ID XXXXX.

É como voto.

Desembargador ALLAN TITONELLI NUNES

Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/tre-rj/2362025342/inteiro-teor-2362025345

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