A reclamação como recurso para a validade do precedente no Direito Administrativo
Por Claudio Henrique de Castro, auditor do Tribunal de Contas do Paraná.
claudiocastro@tce.pr.gov.br
O Código de Processo Civil instituiu a figura da reclamação como recurso atípico de acordo como art. 988, § 1º que prevê o seu cabimento para garantir a autoridade das decisões do tribunal, nos termos do inciso I do mesmo artigo. São legitimados a parte interessada e o Ministério Público, nos termos do caput do art. 988.
Caso seja julgada procedente a reclamação, o tribunal cassará a decisão exorbitante de seu julgado ou determinará medida adequada à solução da controvérsia, nos termos do art. 992, todos do CPC.
A Lei nº 9.784/98 garante na esfera administrativa a segurança jurídica, que também é válida para garantia da validade do precedente, no caput do art. 2º e no inciso IX.
O precedente nos Tribunais de Contas dos Estados, dos Municípios e da União tem grande repercussão aos jurisdicionados. O Direito brasileiro contempla o brocardo jurídico “nemo excusat ignorantia legis” - isto é, a ninguém vale a escusa de ignorar a lei, consagrado no art. 3º do Decreto-lei nº 4.657 de 1942.
Para a Administração Pública, a coletânea das decisões dos tribunais de contas tem grande expressão nas expectativas jurídicas quanto a determinadas condutas positivas ou negativas, ativas ou omissivas, quando se firma um precedente ou se consolida um entendimento nestas instâncias.
A Constituição Federal prevê que a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação, nos termos do inciso LXXVIII, do art. 5º. Este dispositivo deve ser interpretado também quanto à sua celeridade pós-processual, isto é, para aqueles processos que foram julgados pelo Poder Judiciário e na esfera administrativa e que são conhecidos e divulgados para o agir preventivo de condutas ativas ou omissivas.
As competências administrativas dos tribunais de contas encontram-se encartadas no art. 71, incisos I a XI da Constituição Federal e possuem um fundo jurisdicional administrativo que cria expectativas de condutas ativas e omissivas para os jurisdicionados. E esta atividade gera expectativas e acima de tudo pacifica controvérsias e resolve conflitos para ao final criar a segurança jurídica quanto a suas decisões futuras, com base em seus precedentes.
Assim, a reclamação, a partir do CPC, pode ser utilizada como meio processual atípico em qualquer fase processual para, em conjunto com outro recurso administrativo ou de forma isolada, fazer com que a esfera administrativa aprecie eventual conflito entre a decisão tomada no processo e anterior precedente firmado pelo tribunal, no caso o tribunal de contas.
Nas hipóteses de suspensão do precedente ou da sua alteração, seus efeitos devem ser integralmente preservados até a data da alteração, nos termos do art. 2º, inciso XIII da Lei nº 9.784/98, que proíbe a interpretação retroativa.
Os códigos e as leis administrativas certamente não contemplam ainda a possibilidade da reclamação, mas ela pode ser utilizada amplamente, com base nos fundamentos constitucionais expostos e na analogia aos dispositivos do CPC.
A pergunta final é ´quando um precedente vale para o caso novo?´ A resposta é simples: quando seus fundamentos e motivações fático-jurídicas foram idênticos e até semelhantes ao caso novo.
O princípio da confiança no precedente em face da segurança jurídica e a expectativa legítima que ele gera na sociedade e na comunidade jurídica não pode ser, casuisticamente, alterado em prol do jeitinho no direito administrativo brasileiro, que as vezes molda a nova decisão de acordo com o calibre das partes envolvidas, a notoriedade do caso ou aos interesses extraprocessuais que se fazem presentes.
Portanto, a reclamação surge no Direito Administrativo como mais uma garantia aos cidadãos em ver asseguradas as decisões dos precedentes que lhe geraram confiança e segurança jurídica na atuação administrativa e na interpretação das leis.
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