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16 de Junho de 2024

ARTIGO DO DIA: Crime contra a Empresa de Correios e Telégrafos: competência federal ou estadual

há 14 anos

LUIZ FLÁVIO GOMES

Doutor em Direito penal pela Universidade Complutense de Madri, Mestre em Direito Penal pela USP, Diretor-Presidente da Rede de Ensino LFG e Co-coordenador dos cursos de pós-graduação transmitidos por ela. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998) e Advogado (1999 a 2001). Twitter: www.twitter.com/ProfessorLFG. Blog: www.blogdolfg.com.br - Pesquisadora : Áurea Maria Ferraz de Sousa.

Como citar este artigo : GOMES, Luiz Flávio. SOUSA, Áurea Maria Ferraz de. Crime contra a Empresa de Correios e Telégrafos: competência federal ou estadual . Disponível em http:// www.lfg.com.br - 08 de julho de 2010.

A jurisprudência nacional sempre entendeu que a competência para julgar crimes praticados contra a EBCT (Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos) era da Justiça Federal, tendo em vista o disposto no artigo 109, IV, da Lei Maior de acordo com o qual compete aos juízes federais processar e julgar as infrações penais praticadas em detrimento de bens da União ou de suas empresas públicas, sendo nesta modalidade que se enquadram os Correios.

Informativo nº 87 - STF

Crime Contra Empresa Pública Federal

À vista do que dispõe o art. 109, IV, da CF que diz da competência dos juízes federais para processar e julgar as infrações penais praticadas em detrimento de bens da União ou de suas empresas públicas, a Turma deferiu habeas corpus para anular acórdão do Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo que condenara o paciente por roubo de bens de Agência de Correios e Telégrafos, determinando a remessa dos autos à Justiça Federal. HC 75.944-SP, rel. Min. Março Aurélio, 7.10.97

Embora num primeiro momento o entendimento tenha sido neste sentido, a orientação foi sendo modificada. Em abril deste ano, ao julgar o Conflito de Competência 108.946, o Min. Og Fernandes posicionou-se diferentemente, indicando que a competência é sim da Justiça Estadual; na oportunidade, o Ministro informou que esta seria a posição pacífica do STJ sobre o assunto: CC 108.946 PR

20/04/2010

(...)

Conforme entendimento pacificado desta Corte, compete à Justiça Estadual o julgamento de delitos praticados em desfavor de agência franqueada dos Correios, que é a responsável por eventuais perdas, danos, roubos, furtos ou destruição de bens cedidos pela franqueadora, não configurado prejuízo à EBCT.

Nas lições de Og Fernandes, é inerente ao contrato de franquia a responsabilidade da agência franqueada da ECT por eventuais perdas, danos, roubos, furtos ou destruição de bens cedidos pela franqueadora, logo, na hipótese de crimes contra o patrimônio nas agências de Correios não há prejuízo patrimonial à Empresa Pública.

Aliás, neste sentido foi a orientação jurisprudencial em 2005, da Sexta Truma do STJ:

COMPETÊNCIA. ROUBO. AGÊNCIA. CORREIOS.

Trata-se de paciente condenado pela prática de roubo contra a Empresa Brasileira de Correios. Aduz o paciente que a ECT é empresa pública federal e os crimes praticados contra ela devem ser processados e julgados pela Justiça Federal, sendo assim, pugna ver reconhecida a nulidade do processo. O Min. Relator explicitou que este Tribunal tem posição definida quanto à competência, fundando-se as decisões na constatação da exploração direta da atividade pelo ente da administração indireta federal - em que a competência é da Justiça Federal (art. 109, IV, CF/1988)- ou se existe franquia - que é a exploração dos serviços de correios por particulares -, quando a competência é da Justiça estadual . Isso posto, a Turma concedeu a ordem para declarar nulo todo o processo desde o recebimento da denúncia e remeter os autos para a vara criminal federal na qual a impetração indica haver a apuração inicial dos fatos. Precedente citado : CC 46.791-AL , DJ 6/12/2004. HC 39.200-SP, Rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa, julgado em 29/11/2005 . (Destacamos)

Atento a este entendimento Renato Brasileiro ( Competência Criminal , Editora Jus Podivm: 2010, p. 241) leciona que:

Quanto à infração penal praticada em detrimento de agência da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, importa destacar que o Superior Tribunal de Justiça tem fundamentado suas decisões na constatação da exploração direta da atividade pelo ente da administração indireta federal caso em que a competência seria da Justiça Federal, nos termos do art. 109, inciso IV, da Constituição Federal ou se objeto de franquia, isto é, a exploração do serviço por particulares quando então se verificaria a competência da Justiça Estadual.

Recentemente (informativo 439), a Quinta Turma do Tribunal da Cidadania reafirmou este entendimento, oportunidade em que esclareceu mais uma vez as diferenças a serem observadas na fixação da competência:

RECEPTAÇAO. FURTO. ECT.

O recorrente foi denunciado perante a Justiça comum estadual pela prática de receptação dolosa de uma balança de precisão furtada da Empresa de Correios e Telégrafos (ECT). Porém, viu-se condenado por sentença exarada pela Justiça Federal. No especial, insurge-se contra a aplicação da majorante prevista no art. 180, , do CP, incidente quando envolvidos bens de patrimônio de empresa pública federal. Primeiro, note-se que as empresas estatais (empresas públicas e sociedades de economia mista) são dotadas de personalidade jurídica de direito privado, mas possuem regime híbrido, a depender da finalidade da estatal: se presta serviço público ou explora a atividade econômica, predominará o regime público ou o privado. É certo que a ECT é empresa pública, pessoa jurídica de direito privado, prestadora de serviço postal, que, conforme o art. 21, X, da CF/1988, é de natureza pública e essencial, encontrando-se aquela empresa, por isso, sob o domínio do regime público. Ela é mantida pela União e seus bens pertencem a essa mantenedora, consubstanciam propriedade pública e estão integrados à prestação de serviço público. Daí que eles são insusceptíveis de qualquer constrição que afete a continuidade, regularidade e qualidade da prestação do serviço. Nesse contexto, vê-se que é plenamente justificada a tutela a bens, serviços e interesses da União diante do furto de bem pertencente à ECT, razão pela qual se atraiu a competência da Justiça Federal (art. 109, IV, da CF/1988) , vista a conexão entre o furto (principal) e a receptação em questão (acessório). Também se acha albergada nessa tutela a incidência da referida majorante, não se podendo falar que foi dada, no caso, uma interpretação extensiva desfavorável ao conceito de bens da União. Anote-se, por último, que a balança objeto de receptação é diretamente vinculada à prestação do serviço postal, pois é o instrumento utilizado para a pesagem da correspondência. Com esse entendimento, a Turma, por maioria, negou provimento ao recurso. Já o voto divergente entendia ser necessário o decote da majorante, pois não se poderia ampliar o conceito de bem da União para abranger aqueles afetos às empresas públicas. Precedentes citados do STF: AgRg no RE 393.032-MG , DJe 18/12/2009; RE 398.630-SP, DJ 17/9/2004, e QO na ACO 765-RJ , DJe 4/9/2009. REsp 894.730-RS, Rel. originária Min. Laurita Vaz, Rel. para acórdão Min. Arnaldo Esteves Lima, julgado em 17/6/2010 . (Destacamos)

Sobre o assunto, Fernanda Marinela explica que a maioria das lojas dos correios são empresas privadas, sob o regime de franquias, sem que haja natureza de concessão de serviço público. Nesta hipótese, para fins de competência criminal, prevalece o entendimento de que não há lesão ao patrimônio público. Por outro lado, há agências nas quais se explora o serviço público como filiais da própria empresa, conforme dispõe o artigo , do Decreto nº 83.726/79 (Estatuto da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos ECT): Art - A Empresa terá sede na Capital da República e poderá criar dependências em todo o território nacional . Neste caso, eventual infração penal praticada contra seu patrimônio deve ser analisada pela Justiça Federal.

É preciso estar atento a esta distinção, pois para a jurisprudência pátria está cada vez mais sedimentado o posicionamento de que há duas competências diferentes. Na prática, a distinção se faz clara apenas com a análise do instrumento constitutivo da agência, pois impossível diferenciar de plano se os Correios são apenas lojas ou se se trata da própria Empresa ECT.

Assistam nossos comentários em "Jurisprudência Comentada", nosso "Direito em Pílulas" na TVLFG e no LFG News .

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