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7 de Maio de 2024
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    Caso Dorothy Stang: os fundamentos para a anulação do julgamento dos acusados

    há 15 anos

    Como citar este artigo: GOMES, Luiz Flávio; DONATI, Patrícia. Caso Dorothy Stang: os fundamentos para a anulação do julgamento dos acusados . Disponível em http://www.lfg.com.br. 08 de abril de 2009.

    A missionária Dorothy Stang, de 73 anos, coordenadora da CPT (Comissão Pastoral da Terra) foi assassinada no dia 12 de fevereiro de 2005, com três tiros, numa estrada próxima de área em litígio entre assentados e fazendeiros, pela posse de terra.

    O julgamento dos acusados - Rayfran das Neves Sales e Vitalmir Bastos de Moura - aconteceu em maio de 2005. O primeiro também conhecido como 'Bida', acusado de ser um dos mandantes foi absolvido e Vitalmir, denunciado como executor do crime, foi condenado a 28 anos de prisão.

    A anulação do julgamento (de ambos) se deu em razão de recurso interposto pelo Ministério Público, com os seguintes fundamentos, acolhidos pelo TJ/PA (Tribunal de Justiça do Pará): a absolvição de 'Bida' se deu em razão de um vídeo apresentado pela defesa, em que outros acusados o inocentaram. De acordo com o parquet a juntada desse vídeo se deu de forma irregular, em desobediência ao princípio do contraditório: o vídeo fora juntado no dia do julgamento, em caráter inédito, sem a ciência prévia da acusação. Para o MP, o depoimento foi decisivo para que o Conselho de Sentença absolvesse 'Bida'. Em resumo, o pedido de anulação do julgamento levou em conta o fato de o Conselho de Sentença ter proferido decisão contrária às provas dos autos, nos termos do art. 593 , III , d do Código de Processo Penal (CPP).

    Art. 593 - Caberá apelação no prazo de 5 (cinco) dias: III - das decisões do Tribunal do Júri, quando:

    d) for a decisão dos jurados manifestamente contrária à prova dos autos .

    Em relação ao julgamento de Rayfran das Neves Sales, a anulação se deu em virtude de os jurados não terem aceitado a qualificadora de promessa ou paga de recompensa, ou seja, por não terem reconhecido a ocorrência do chamado homicídio mercenário, o que também evidencia a contrariedade da decisão em relação às provas dos autos.

    Mas, o que seria decisão manifestamente contrária à prova dos autos?

    De acordo com a lei penal processual, trata-se de decisão adversa ao mérito da causa, o que deixa patente a ocorrência de error in judicando , o que possibilita a determinação de um novo julgamento. Em outras palavras, uma decisão arbitrária, já que se dissocia, por completo, das provas dos autos, contrária à verdade apurada ao longo da instrução processual: um grave erro do Conselho de Sentença.

    É lógico que não podemos esquecer que no procedimento previsto para o Tribunal do Júri vigora o princípio da íntima convicção dos jurados, conforme muito bem ponderado na decisao do TJ/PA. Mas, essa convicção não pode ignorar as provas produzidas e contidas nos autos.

    Uma observação se impõe neste momento: por força do princípio da soberania reconhecido aos veredictos do Tribunal do Júri (art. , XXXVIII , 'c', da Constituição Federal), o recurso de apelação tem caráter restrito, não devolvendo à Superior Instância o conhecimento pleno da lide, já que o juízo ad quem não produz nova decisão, mas apenas controla o julgamento do Tribunal Popular. Sendo assim, não competiria ao Tribunal apreciar questão de mérito, mas apenas se a decisão dos jurados correspondeu às provas efetivamente produzidas. Foi exatamente nesse sentido a decisao do TJ/PA que reconheceu a anulação, determinando a realização de novos Júris para os réus. Ou seja, ambos serão novamente submetidos ao Tribunal do Júri.

    Vale lembrar que, com a decisao do TJ/PA, Vitalmir ficará sujeito ao terceiro julgamento, uma vez que, ao ser condenado pela primeira vez (em maio de 2005), a pena maior de 20 anos, valeu-se de recurso então vigente - o protesto por novo Júri, uma opção que desapareceu do ordenamento jurídico brasileiro, com o advento da Lei nº. 11.689 /08.

    Outro ponto que deve ser observado é a possibilidade do agravamento da pena imposta ao réu Vitalmir, sem a caracterização da reformatio in pejus , por se tratar de recurso exclusivo da acusação. Aliás, é esse o objetivo buscado: para o MP deve ser reconhecida a qualificadora do art. 121 , § 2º do CP (homicídio cometido mediante paga ou promessa de recompensa).

    A da restauração da prisão preventiva de Vitalmiro é séria. De acordo com os fundamentos apontados "impõe-se a necessidade de restabelecer a prisão preventiva em desfavor do apelado Vitalmiro Bastos de Moura, posto que respondeu a todo o processo encarcerado, por necessidade da ordem pública, conveniência da instrução criminal e aplicação da lei penal ".

    Essa é a regra geral: se o acusado permaneceu em liberdade durante o processo, em liberdade deverá ser mantido, até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória. Se, respondeu o processo em cárcere, assim será mantido se houver motivo que justifique o cerceamento de sua liberdade.

    Será que, depois de praticamente três anos em liberdade, ainda há motivos para que Vitalmiro permaneça preso durante o processo? Em caso afirmativo, cabe ao magistrado fundamentar a sua decisão em fatos concretos, pois, apenas assim é possível concretizar um dos princípios basilares do Direito Penal: não culpabilidade (presunção de inocência).

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