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16 de Junho de 2024

Desaposentação contribui para aprofundar o retrocesso em termos de direitos sociais

Publicado por Justificando
há 8 anos

O ano de 2016 continua a surpreender a população brasileira deixando como legado um verdadeiro pacote de maldades contra o povo trabalhador. Após o golpe midiático-parlamentar, que levou ao governo federal um representante ilegítimo e sem votos, instaurou-se um retrocesso social em velocidade máxima nas áreas mais sensíveis à população carente e necessitada: cortes em educação, cultura e saúde, ataques aos direitos trabalhistas e sociais. Esse rompimento contou com a participação do Supremo Tribunal Federal (ou pelo menos da maioria de seus membros) que desde há muito tempo vem descontruindo o sistema de princípios que visam à inclusão social permeado na Constituição Federal, ao invés de defender os valores e objetivos sobre os quais foi erigida, como já escrevi em outra oportunidade.

Mas a decisão do STF de ontem (26), ao julgar a questão da desaposentação, contribui ainda mais para aprofundar o retrocesso em termos de direitos sociais, prejudicando todos os aposentados já que, nas palavras de Lewandowski, “não é raro que beneficiários da Previdência, como seus proventos não são suficientes, se vejam compelidos a voltar ao mercado de trabalho” e, com isso, voltem a contribuir para os cofres da Previdência Social. Enfrentei o tema como procurador federal junto ao INSS e, de fato, não há nenhum dispositivo legal que proíba a desaposentação.

Melhor explicando: nos Recursos Extraordinários 381.367, de relatoria do ministro Marco Aurélio; 661.256, com repercussão geral, e 827.833, ambos de relatoria do ministro Luís Roberto Barroso, restou decidido por sete votos a quatro que a desaposentação é inconstitucional por não estar prevista em qualquer legislação. Mas é justamente por conta disso que a desaposentação encontra força em princípios e valores que visam a melhoria da condição social da população. A ideia da desaposentação não é fazer uma revisão do benefício concedido, mas a troca da aposentadoria antiga por uma nova, baseada nas contribuições feitas após a volta ao trabalho. A concessão de um novo benefício por tempo de contribuição, com base nos pagamentos que o aposentado voltou a fazer quando retornou ao trabalho remunerado é medida justa e que atende à regra de equidade.

Ao contrário do que entende a Advocacia-Geral da União no sentido de que a revisão da aposentadoria sem a devolução dos valores viola a Constituição Federal, pois contraria o “caráter contributivo da Previdência Social e a necessidade de preservação do equilíbrio entre suas receitas e despesas”, a noção da desaposentação está prevista dentre os objetivos da seguridade social do art. 194, incisos II e V do texto constitucional que prevê a “uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais” e a “eqüidade na forma de participação no custeio”. Nas palavras da Min. Rosa Weber, em voto divergente, “os segurados têm direito de serem reinseridos no regime da Previdência Social ao voltarem a fazer os pagamentos”, dado o caráter contribuitivo do sistema de previdência pública.

Ao assumir a Presidência da Suprema Corte, a Ministra Cármen Lúcia disse que iria pautar prioritariamente matérias de cunho social (trabalhista e previdenciário). Nesse ritmo, seria melhor parar. Não haverá necessidade de reforma trabalhista ou previdenciária a julgar pelas últimas decisões do STF. Talvez o Poder Executivo prefira evitar o desgaste natural que essas medidas trariam junto à população (em que pese ter sido aprovada na Câmara dos Deputados a desastrosa PEC 241) e aguardar outras decisões da Suprema Corte, fato que já foi confirmado em parte pelo atual Presidente da República.

A questão central é sobre quais são os princípios e valores que devem se sobrepor: o da economia fiscal acima de tudo ou o da melhoria da condição social do trabalhador. O Supremo já decidiu. Resta lamentar.

Átila da Rold Roesler é juiz do trabalho na 4ª Região e membro da Associação Juízes para a Democracia (AJD). Pós-graduado em Direito e Processo do Trabalho e em Direito Processual Civil. Foi juiz do trabalho na 23ª Região, procurador federal junto ao INSS e delegado de polícia civil. Publicou os livros: Execução Civil – Aspectos Destacados (Curitiba: Juruá, 2007) e Crise Econômica, Flexibilização e O Valor Social Do Trabalho (São Paulo: LTr, 2015). Autor de artigos jurídicos em publicações especializadas. Professor na pós-graduação na UNIVATES em Lajeado/RS e na FEMARGS – Fundação Escola da Magistratura do Trabalho do Rio Grande do Sul.

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