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17 de Maio de 2024
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    DO PRAZO INICIAL DA PRESCRIÇÃO DISCIPLINAR

    A prescrição do procedimento administrativo disciplinar, não obstante ser tema de rara aplicação, continua gerando tormentosas controvérsias doutrinárias e, principalmente, para aqueles que labutam com o direito administrativo, porque nem sempre há uma previsão legal explícita sobre o prazo inicial da prescrição administrativa disciplinar.

    Ultimamente, a discussão em torno do assunto vem ganhando maior relevância junto ao Tribunal de Justiça do Piauí, sempre que há julgamentos referentes a instauração ou não de processos administrativos disciplinares contra magistrados, ante a dificuldade de enfrentamento dos elementos balizadores do lapso temporal para o exercício do Direito.

    O que se busca com essas rápidas considerações sobre a hipótese, é destacar que a prescrição, em qualquer área do direito, funciona como matéria de ordem pública, capaz de estabilizar as relações jurídicas com reflexos importantes na vida de um modo geral dentro do mundo jurídico, extinguindo-se em determinado momento ante a passagem do tempo e a inércia do titular da ação punitiva.

    Como observa VITTA, citado por CRETELLA JÚNIOR: "O decurso do tempo tem extraordinária influência sobre o mundo do direito, pois em razão desse evento natural, nascem e desaparecem relações jurídicas, quer para aquisição, quer para perda de direitos".

    A prescritibilidade da pretensão punitiva da Administração Pública, como sabido, é hoje princípio constitucional contido no art. 37, parágrafo 5º da Carta Magna, que reza: "a lei estabelecerá os prazos de prescrição para os ilícitos praticados por qualquer agente, servidor ou não, que causem prejuízo ao erário, ressalvadas as respectivas ações de ressarcimento".

    Com base nesse enunciado constitucional, o ensinamento de BACELLAR FILHO: "vedada está a criação de situações de imprescritibilidade mediante analogia".

    A insegurança jurídica, desde o período da história Medieval não é mais admitida, tanto que STF, em nome da estabilidade das relações jurídicas, impôs limites no disposto pelo parágrafo 3º, do art. 142 da Lei 8.112/90, que propugnava pela interrupção da prescrição ad eternum, até que decisão final fosse proferida por autoridade competente quando da abertura de sindicância ou a instauração de processo disciplinar.

    Na hipótese do referido parágrafo 3º, do art. 142, prevalece hoje a "prescrição intercorrente" no procedimento administrativo disciplinar, não havendo como aceitar-se a interrupção da prescrição, como ocorre na seara do direito penal, que estipula como imprescritíveis apenas os crimes de racismo, o ressarcimento ao erário e crime praticado pela ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático de Direito. Fora dessas situações legais não há falar em imprescritibilidade dos atos praticados.

    A Lei Complementar nº 35/79 é silente em relação à prescrição administrativa, fato que tem gerando entendimento jurisprudencial no sentido de se aplicar, subsidiariamente, os dispositivos da Lei nº 8.112/90, que dispõe sobre o regime jurídico dos servidores publicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais.

    A referida lei, bem como alguns estatutos dos servidores públicos de vários Estados brasileiros, estabelecem a contagem do prazo inicial da prescrição do processo disciplinar a partir do momento em que o fato investigado se tornou conhecido, desprezando-se a data em que ocorreu.

    A mesma lei fixa como março de interrupção da prescrição "a abertura de sindicância ou a instauração de processo disciplinar, até a decisão final proferida pela autoridade competente" (art. 142, 1º e 3º).

    Importante lembrar que esse enunciado não está se referindo à sindicância na sua concepção clássica de procedimento preparatório, mas tão-somente àquela destinada à aplicação de penalidades de advertência ou suspensão, tal como previsto no art. 145, II, da mesma Lei 8.112/90.

    Esse tipo de sindicância ou investigação, que no âmbito dos tribunais de justiça incumbe à Corregedoria Geral, é a que consubstancia a ação disciplinar passível de prescrição e, consequentemente, o único ato capaz de interromper o respectivo prazo prescricional.

    Nesse sentido, já veio de decidir o Superior Tribunal de Justiça: "a sindicância que interrompe o fluxo prescricional é aquela realizada como meio sumário de apuração de falhas e aplicação de penalidades outras que não a demissão, e não o procedimento meramente apuratório e estabelecedor de fatos desprovidos do contraditório e da ampla defesa e que não dispensa a posterior instauração do processo administrativo" (RMS. 10.316/SP, Rei. Min., Vicente Leal).

    Na esfera administrativa, como se vê, é, pois de suma importância a fixação do "dies a quo", ou seja, do prazo em que começa a fluir o lapso prescricional da transgressão disciplinar.

    Na esfera penal, por outro lado, a questão é simples. Nesta a prescrição começa a ser contada a partir da falta disciplinar prevista como crime, pois esta é a regra do Código Penal (art. 111, inciso I).

    Vale lembrar que os estatutos funcionais consideram o "dies a quo" da prescrição a ciência do fato pela autoridade administrativa.

    O Estatuto dos Servidores Públicos Civis do Estado do Piauí, por exemplo, dispõe que "o prazo da prescrição começa a correr da data em que o fato se tornou conhecido" (art. 163, 1º). Já o parágrafo 3º reza que "a abertura de sindicância ou a instauração de processo disciplinar interrompe a prescrição, até a decisão final, proferida por autoridade competente".

    Portanto, o direito público não mais aceita uma duração do processo administrativo disciplinar fora do principio da razoabilidade contido no art. , inciso LXXVIII, da Constituição Federal, porque o direito não pode servir como uma eternização de uma futura punição disciplinar só manejada quando a Administração Pública afirmar que tomou conhecimento de um fato após o transcurso do tempo, passando a ideia de um processo perpétuo como ocorria no direito romano onde as ações eram perpétuas e os interessados a elas podiam recorrer a qualquer tempo.

    Impõe, pois, concluir que diante do silêncio da LOMAN - Lei Orgânica da Magistratura Nacional - acerca da prescrição administrativa das penalidades nela previstas, e na moldura jurisprudencial em torno do tema, inclusive do STJ, na hipótese de faltas disciplinares punidas com pena de censura ou advertência, é possível a aplicação subsidiária da lei 8.112/90, sendo que o lapso a ser observado em relação à pena de censura seria semelhante àquele relativo à pena de suspensão, elencado no Regime Jurídico Único dos Servidores Públicos Civis da União, ainda que se trate de infrações disciplinares cometidas por magistrados.

    Inconcebível é, em suma, como destacado no escorreito voto do Ministro Março Aurélio, no RMS nº 23.436/DF: "que se entenda, interpretando os preceitos da Lei nº 8.112/90, que, uma vez aberta a sindicância ou instaurado o processo disciplinar, não se cogite mais, seja qual for o tempo que se leve para a conclusão do feito, da incidência da prescrição. (...) Não é crível que se admita encerrar a ordem jurídica verdadeira espada de Dâmocles a desabar sobre a cabeça do servidor a qualquer momento".

    Des. Valério Chaves Pinto - TJPI.

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    Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/noticias/do-prazo-inicial-da-prescricao-disciplinar/2586895

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