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5 de Maio de 2024

O Juiz Impedido ou Suspeito: Constituição Federal, Código de Processo Penal e Lei Orgânica da Magistratura Nacional.

Direito Constitucional - Processo Penal.

Publicado por Rodrigo Lessa Tarouco
há 6 anos

Por Rodrigo Lessa Tarouco - OAB/PE n. 43.931

Nos últimos meses, temos acompanhado diversas notícias sobre políticos em processos criminais, dentre eles o Ex-Presidente Luís Inácio Lula da Silva, o Lula. Em seu processo, uma das preliminares de argumentação trazida pela defesa aborda a suspeição do juiz Sérgio Moro. Mas, o que o Código de Processo Penal e a Constituição Federal falam sobre este assunto?

Pensando nisso, resolvi fazer uma análise sobre esta preliminar apresentada pela defesa do Ex-Presidente Lula, sem contudo decidir se houve ou não alguma impossibilidade (suspeição ou impedimento) do magistrado, deixando isso à livre convicção do leitor.

Adianto que serão utilizadas as seguintes normas: Constituição Federal (Título IV, Capítulo III - Do Poder Judiciário), Código de Processo Penal (Título VIII, Capítulo I - Do Juiz) e a Lei Orgânica da Magistratura Nacional (LOMAN). Acredito ser mais didático trazer a análise do caso da norma menor (LOMAN) até a maior (CF/88), isso porque há um avança gradativo no assunto, possibilitando uma maior compreensão.

Segundo o art. 36 da LOMAN existem três vedações atribuídas ao juiz, são elas: o magistrado não pode exercer atividades de comércio e em participar de sociedade empresarial, salvo na condição de acionista ou quotista; e é vedado exercer cargo de direção ou técnico de sociedade civil, associação ou fundação, salvo de associação de classe, de forma não remunerada. Essas duas primeiras hipóteses de vedação são necessárias, pois é fundamental que o magistrado esteja totalmente determinado em exercer as suas atividades como juiz, se caso fosse ele um empresário, daria maior atenção à sua atividade privado.

A terceira hipótese está relacionada com o exercício da sua atividade de juiz, sendo-lhe proibido emitir opinião sobre processo pendente de julgamento que esteja consigo ou com outro colega, bem como atacar de forma ofensiva ato (s) decisório (s) proferidos por outro (s) magistrado (s).

Este é um ponto de extrema preocupação, pois está diretamente ligada com o devido processo legal, pois, se o magistrado divulga em suas redes sociais a sua opinião sobre determinado processo que está para o seu julgamento, onde está a imparcialidade no julgamento? de que adiantará a sustentação oral ou os pedidos em audiência? Observar estes comandos normativos é dar credibilidade ao processo e respeitar às partes, além de possibilitar um julgamento justo.

Já o Código de Processo Penal, em seus arts. 252 e 254, apresenta as suas hipóteses de impedimento e suspeição, respectivamente. Assim, será impedido de exercer a jurisdição, o magistrado que tiver interesse no feito ou que tiver alguma relação de parentesco, até o terceiro grau, na linha colateral, ou com o seu cônjuge, ou que esses tenham interesse no feito, ou que esses estejam no processo como parte (s), advogado (s), defensor (es), membro (s) do Ministério Público, autoridade (s) policial (is), auxiliar (es) da justiça ou perito (s).

Mais uma vez, quis a legislação garantir o princípio que, ao meu ver, é o mais importante para o respeito ao devido processo legal, a imparcialidade do magistrado. Quem quer ter como juiz o marido da parte ré, sendo você autor da ação?! Certamente, ter-se-á um julgamento favorável à parte contrária.

As outras hipóteses apresentadas pelo art. 252 do CPP tratam do magistrado que, por alguma razão, teve contato anterior com o processo que posteriormente chegou para ser julgado por si. Um exemplo fácil de entender é que o magistrado que servirá como testemunha em um processo, não poderá julgado, pois decidirá segundo a sua versão testemunhal, não segundo as provas dos autos do processo.

Como se percebe, quando se tratar de impedimento do magistrado, têm-se questões objetivas, ex.: ser casado com a parte ré. Não tem como fazer prova do contrário, basta que haja a comprovação simples do matrimônio ou o levantamento da questão, para que se tenha o impedimento. Contudo, esta facilidade não se observa quando se estuda a suspeição, pois essa advém de uma análise subjetiva do caso para que então se perceba sobre a influência no julgamento.

Os casos de suspeição estão estabelecidos no art. 254 do Código de Processo Penal e trazem, basicamente, uma relação de afinidade além do respeito profissional ou tiver relação negocial.

Vejamos, os incisos I e o IV estão diretamente ligados com a afinidade entre o magistrado e as pessoas envolvidas no processo. No inciso IV, o juiz será suspeito sempre que aconselhar qualquer das partes, já o inciso I diz que o magistrado que for amigo íntimo ou inimigo capital de uma das partes, acrescento que isso vale também para os seus representantes (membro do MP, defensores e advogados).

É muito comum que advogados, defensores e principalmente membros do Ministério Público tenham alguma vivência com os magistrados, uma vez que trabalham frequentemente nas audiências, contudo, o que quis o legislador foi trazer a relação intima ou a inimizade capital, ou seja a cumplicidade na amizade ou o ódio entre eles.

Essa preocupação se justifica, logicamente, pois haverá influência direta no julgamento e consequentemente não se fará justiça, mas sim "favor" ou vingança, coisas que não são alvos do objetivo do processo. A maior dificuldade que se percebe nestes dois incisos é a subjetividade que o assunto traz ao processo. Não há algo escrito que diga a partir de onde começa a amizade íntima ou a inimizade capital.

Recentemente, o Ministro Gilmar Mendes julgou um processo em que foi padrinho do réu, será que o seu voto não teve influência da amizade intima? Não critico o voto do Ministro, até porque ele mesmo disse que não se sentia suspeito ou impedido. No julgamento do recurso do Ex-Presidente Lula, o filho do Desembargador-relator é apadrinhado pelo juiz Sérgio Moro.

Os dois magistrados possuem ligações corriqueiras com aqueles, será que não há comentários ou até mesmo um sentimento por parte do julgador modificando as suas decisões por razões de afinidade com aquelas pessoas? Como eu disse anteriormente, não tenho a intenção de proferir o meu pensamento, mas sim instigar o pensamento crítico dos meus leitores.

Os outros casos de suspeição trazidos pelo CPP tratam de relação comercial, não podendo o juiz decidir em causas onde faça parte de sociedade interessada no processo ou for credor ou devedor, tutor ou curador, de qualquer das partes.

Por fim, aquela que é a norma mais importante para o ordenamento jurídico brasileiro, a Constituição Federal. Essa traz em seu art. 95 as hipóteses de vedação relacionadas ao processo. Em primeiro lugar, o juiz não poderá exercer outra atividade que não seja a sua, salvo o magistério. Como se vê, a Constituição Federal impõe ao magistrado a dedicação exclusiva abrindo apenas um exceção.

Continua o texto Constitucional que é vedado ao magistrado receber valores do processo e de pessoas a qualquer título. Aqui há um objetivo de blindar o magistrado das ofertas e compras de decisões ou trocas de favores, bem como uma impossibilidade de que o magistrado receba algum valor do processo por julgá-lo.

Por fim, é o magistrado proibido de exercer atividades politico-partidária, ou seja, o magistrado pode ter uma opinião política, mas ele não pode participar da vida política, envolver-se com partido ou ser militante, pois isso poderá prejudicar o seu julgamento caso saiba que determinado político seja parte em processo sob sua competência. Segundo a LOMAN, art. 26, II, c, o exercício de atividade politico-partidária é causa de perda do cargo de magistrado.

Sobre este tema de suspeição, a defesa do Ex-Presidente Lula trouxe exatamente estes dois pontos ao processo, arguindo-os como preliminares, dizendo que o juiz de primeiro grau não poderia ter julgado o caso, pois exerce atividade politico-partidária, estando diretamente ligado ao partido do PSDB, como também teria antecipado o seu julgamento.

Espero ter ajudado e me disponho a responder duvidas e comentários.


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Excelente texto nobre Doutor. Vemos que o Brasil vive hoje uma grande crise de identidade jurídica, pois o sistema econômico e os holofotes tem tido grande influência no meio social. Quanto aos fundamentos jurídicos apresentados no seu artigo são de fato de grande relevância, no entanto, o que se percebe é que a sociedade perdeu totalmente a crença na justiça. O poder judiciário, infezmente deixou-se macular pela opinião pública. Se não for pedir muito, gostaria que vossa senhoria escrevesse um artigo sobre duas verdades no mundo: a verdade dos meios e a verdade dos fins. Sugiro que o nobre Doutor se inspirasse em Maquiavel capítulo XVIII em que ele diz que "os meios serão sempre julgados honrosos e por todos louvados, porque o povo sempre se deixa levar pelas aparências e pelos resultados, e no mundo não existe senão o povo". Seu texto nos convida para a reflexão e assim, surge em mim uma grande preocupação na minha vida acadêmica: será que vale a pena continuar crendo na justiça? Ou a justiça, como insinua Platão, pode ser relativa? continuar lendo