O que é a livre convicção dos indícios e presunções?
Já que o TSE vai rediscutir a Resolução nº 23.396/2013...
Pois é. Na medida em que parece que o TSE terá que rediscutir a proibição de o Ministério Público e a Polícia investigarem de ofício crimes eleitorais, a comunidade jurídica poderia pressionar o Parlamento para alterar a redação do artigo 23 da LC 64/90 (que estabelece casos de inelegibilidade etc.).[1] Afinal, em tempos de discussão de doações eleitorais e do modo como vai se investigar, parece que viria a calhar a introdução de pressupostos democráticos nessa legislação.
Explico. Segundo o artigo 23 da LC 64, “O Tribunal formará sua convicção pela livre apreciação dos fatos públicos e notórios, dos indícios e presunções e prova produzida, atentando para circunstâncias ou fatos, ainda que não indicados ou alegados pelas partes, mas que preservem o interesse público de lisura eleitoral”.
Não encontrei na literatura jurídica especializada — e peço desculpas se estiver fazendo injustiças — comentário apontando para a incompatibilidade da disposição (ou parte dela) com a Constituição Federal (na verdade, como verão no final desta coluna, encontrei algo mais grave, como a defesa da ponderação...). O que impressiona, de todo modo, é que o Parlamento tenha aprovado esse ditame legal.
Aqui entra minha chatice epistêmica e minha (in) vocação constitucional (não esqueçamos: sou anterior à Constituição — portanto, passei pelo processo de recepção e filtragem hermenêutico-constitucional), ou seja, minha mania de querer compatibilizar as leis com a Constituição... Explico: na democracia, pressupõe-se que decisões judiciais sejam prolatadas a partir de provas provadas e que as-decisões-não-sejam-produto-de-impressão-ou-opinião-pessoal-do-julgador.
Para ser mais claro: de que adianta colocarmos na lei os anseios da sociedade em relação a determinado contexto se, ao fim e ao cabo, deixamos que os Tribunais apreciem livremente os “fatos”? Deixa ver se entendi bem: o Poder Judiciário (Eleitoral) possui o poder de apreciar livremente fatos públicos e notórios, além dos indícios e presunções e provas ainda que não alegadas pelas partes... Como assim “presunções”? Posso presumir alguma coisa, mas daí a existir provas, a distância é quilométrica. E, por favor, não venha alguém invocar Malatesta, aquele que mal-atesta...
O vício hermenêutico
O que está por trás desse vício hermenêutico para o qual nem mesmo o Poder Legislativo se atentou? Na verdade, o Parlamento, ao aprovar esse dispositivo, deu um tiro no pé, porque retira a apreciação das irregularidades (lato sensu) ocorridas nos pleitos eleitorais a partir de critérios objetivos e entrega-os à livre apreciação de outro poder. E não se diga que tudo isso é para preservar o interesse público de lisura eleitoral, bastando, para tanto, lembrar da meia dúzia de votos comprados no caso do processo envolvendo o casal Capeberibe (Amapá) para constatarmos que a “a coisa não é bem assim”. O problema é esse: quanto mais apostamos na subjetividade (por exemplo, em presunções), mais aumenta o grau de insegurança. E de injustiças.
Comparando o referido artigo 23 com o artigo 131 do CPC[2] (que é de 1973, portanto, plena ditadura militar), é possível constatar que esse (artigo 131) é mais democrático (embora igualmente problemático) do que o dispositivo aprovado na democracia. Pelo menos esse dispositivo exige fundamentação, que não baseada em presunções (para ficar só nisso).
O Brasil é pródigo nesse tipo de “delegação”. Na verdade, o que se pode esperar de um sistema jurídico ou da dogmática jurídica que aceita pacífica e passivamente uma Lei como nome de chocolate suíço (Lindt), a tal LINDB — com pretensão de ser a “Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro”?
O conjunto da “obra”
Vejamos: mesmo com a vigência de um novo Código Civil desde 2003, continuamos com o fantasma da velha Lei de Introdução ao Código Civil de 1942, não obstante ter recebido uma nova denominação. Assim, com a edição da Lei 12.376, em 2010, passou a ter o título de Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB). Um dos pilares da Lei é o artigo 4º, que, ao lado do artigo 126...
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